Chile condena 20 ex-agentes por crimes na ditadura militar
22 de setembro de 2018
Ex-membros da polícia secreta de Augusto Pinochet são mandados à prisão por participação no sequestro, tortura e assassinato de 12 pessoas entre 1975 e 1977. Maioria das vítimas veio da Argentina, Paraguai ou Bolívia.
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Quase trinta anos após o fim da ditadura militar no Chile, um tribunal do país condenou à prisão vinte ex-agentes da polícia secreta do ex-ditador Augusto Pinochet, por crimes cometidos durante o período. As penas imputadas variam entre 100 dias e 17 anos de detenção.
Os réus foram condenados pelo sequestro e assassinato de 12 pessoas entre 1975 e 1977, no âmbito da chamada Operação Condor, uma campanha conjunta de repressão política promovida por ditaduras de direita na América do Sul com apoio dos Estados Unidos.
A maioria das vítimas era militante de esquerda e foi sequestrada na Argentina, no Paraguai ou na Bolívia. Acredita-se que elas foram levadas à força ao Chile para depois serem torturadas e mortas. Algumas ainda listam oficialmente como desaparecidas.
O Chile e esses outros três países "não só concordaram em deter as vítimas, mas também criaram as condições para aprisionar e trazê-las para o nosso país sob um plano sinistro de confiná-las em locais secretos para interrogar, torturar e, com crueldade extrema, eliminá-las", diz o juiz Mario Carroza na decisão proferida nesta sexta-feira (21/09).
Dois dos ex-agentes, Christoph Willike Floel e Raúl Iturriaga Neumann, foram condenados a 17 anos de prisão. Outros cinco réus receberam a pena de 15 anos; dois foram sentenciados a 10 anos; três ex-agentes, a sete anos; e outros quatro, a cinco anos de prisão.
Os quatro acusados restantes foram condenados a apenas 100 ou 300 dias de cárcere, por terem sido identificados como cúmplices dos crimes.
Todos eles foram agentes da chamada Direção de Inteligência Nacional (Dina), a polícia secreta da ditadura militar de Pinochet (1973-1990). O órgão opressor funcionou entre 1973 e 1977, quando foi substituído pelo Centro Nacional de Informações (CNI).
Apesar dos poucos anos em vigor, a Dina foi responsável por vários casos de infiltração política e violações de direitos humanos, incluindo assassinatos, sequestros, estupros e tortura.
Segundo dados oficiais, cerca de 3.200 chilenos foram mortos por agentes do Estado durante a ditadura Pinochet, dos quais 1.192 ainda são listados como prisioneiros desaparecidos. Além disso, estima-se que 33 mil pessoas foram torturadas e presas por razões políticas.
Regime militar que sufocou a democracia se estendeu por 21 anos. Período foi marcado por perseguições, tortura, censura, crescimento e derrocada econômica.
Foto: Arquivo Nacional
A perseguição política
A perseguição de adversários se concentrou nos meses após o golpe de 1964 e entre o final da década de 60 e início dos anos 70. Mais de 5 mil pessoas foram alvo de punições como demissões, cassações e suspensão de direitos políticos. Ao todo, 166 deputados foram cassados. O regime também perseguiu membros em suas fileiras. Pelo menos 6.951 militares foram presos, desligados e presos.
Foto: Arquivo Nacional
Assassinatos e desaparecimentos
Assim como a perseguição política, os assassinatos de opositores promovidos pelo regime se concentraram em algumas fases da ditadura. Mas todos os generais-presidentes foram tolerantes com a prática. A Comissão Nacional da Verdade (CNV) apontou a responsabilidade do regime militar pela morte de 224 pessoas e pelo desaparecimento de 210 – 228 delas morreram durante o governo Médici (1969-1974).
Foto: Arquivo Nacional
Tortura
Na ditadura, a tortura virou uma prática de Estado. Já no governo Castelo Branco (1964-1967) foram apresentadas 363 denúncias de tortura. Na fase de Médici (1969-1974), seriam mais de 3.500. O relatório "Brasil: Nunca Mais" lista 283 formas de tortura aplicadas pelo regime, como afogamentos, choques elétricos e o pau de arara. Ao longo de 21 anos, houve mais de 6 mil denúncias de tortura.
Foto: Arquivo Nacional
A luta armada
Ao dar o golpe, os militares citaram a corrupção e o esquerdismo do governo Jango. A luta armada, às vezes apontada como razão de ser da ditadura, nem foi mencionada. Só em 1966 ocorreram as primeiras ações relevantes de grupos de esquerda, que cometeriam atentados e assaltos com o objetivo de promover uma revolução. Em 1974, todos já haviam sido aniquilados, mas a ditadura duraria mais uma década
Foto: Arquivo Nacional
Os atos institucionais
O regime militar recorreu a uma série de decretos chamados atos institucionais para manter seu poder. Entre 1964 e 1969 foram promulgados 17 atos, que estavam acima até da Constituição. Alguns promoveram a cassação de adversários (AI-1) e a extinção dos partidos políticos existentes (AI-2). O mais duro deles, o AI-5, instituiu em 1968 a censura prévia na imprensa e a suspensão do "habeas corpus".
Foto: Arquivo Nacional
A censura
Boa parte da imprensa apoiou o golpe, mas vários jornais passaram a criticar o regime, alguns mais cedo, outros mais tarde. Com o AI-5, passou a vigorar uma censura prévia em vários meios de comunicação. O regime censurava até más notícias, promovendo uma imagem fictícia da realidade do país. Epidemias, desastres e atentados eram temas vetados. Músicas, filmes e novelas também foram censurados.
Foto: Arquivo Nacional
Colaboração com outras ditaduras
Junto com os regimes da Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai, a ditadura brasileira integrou a Operação Condor, uma aliança para perseguir opositores no Cone Sul. O regime também ajudou a treinar oficiais chilenos em técnicas de tortura. Um dos casos mais notórios de colaboração foi o sequestro em 1978 de dois ativistas uruguaios em Porto Alegre, que foram entregues ao país vizinho.
Foto: Biblioteca da Presidência da República
O milagre econômico...
Após três anos de ajustes, os militares promoveram a partir de 1967 investimentos e oferta de crédito. A fórmula deu resultados. Entre 1967 e 1973, a expansão do PIB brasileiro foi de 10,2% ao ano. O país passou a ser a décima economia do mundo. O crescimento aumentou a popularidade do regime durante a fase mais repressiva da ditadura. Mas o "milagre brasileiro" duraria pouco.
Foto: Arquivo Nacional
... e a derrocada econômica
A conta do "milagre" chegou após os dois choques do petróleo e uma série de decisões desastradas para manter a economia aquecida. Ao fim da ditadura, o país acumulava dívida externa 30 vezes maior que a de 1964 e inflação de 225,9% ao ano. Quase 50% da população estava abaixo da linha de pobreza. Os militares pegaram um país com graves problemas econômicos e entregaram um quebrado.
Foto: Biblioteca da Presidência da República
Corrupção
A censura e a falta de transparência favoreceram a corrupção. O período foi marcado por vários casos, como o Coroa-Brastel, Delfin, Lutfalla e a explosão de gastos em obras. O regime promoveu e protegeu figuras como Paulo Maluf e Antônio Carlos Magalhães, que já nos anos 70 eram suspeitos em casos de corrupção. Também abafou casos, como a compra superfaturada de fragatas do Reno Unido nos anos 70.
Foto: Biblioteca da Presidência da República
Grandes obras
A ditadura promoveu obras faraônicas, divulgadas com propaganda ufanista, como Itaipu e a ponte Rio-Niterói. Algumas foram marcadas por desperdícios e erros, como a Transamazônica e as usinas de Angra. Em 1969, o regime criou uma reserva de mercado para as empreiteiras nacionais ao proibir a atuação de estrangeiras. É nessa época que empresas como a Odebrecht passam a dominar as obras no país.
Foto: Arquivo Nacional
Anistia e falta de punições
Em 1979, seis anos antes do fim da ditadura, foi promulgada a Lei da Anistia, perdoando crimes cometidos por motivação política. Mas ela tinha mão dupla: garantiu também a impunidade para agentes responsáveis por mortes e torturas. No Chile e na Argentina, dezenas de agentes foram condenados por violações de direitos humanos após a volta da democracia. No Brasil, ninguém foi punido.