Civis correm risco em ofensiva contra o EI, dizem ativistas
4 de março de 2015
Anistia Internacional e Human Rights Watch temem que milícias xiitas, apoiadas pelo Irã, ataquem moradores sunitas durante a operação para recuperar Tikrit, bastião do "Estado Islâmico" no Iraque.
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Organizações de defesa de direitos humanos alertaram nesta quarta-feira (04/03) que civis podem estar correndo grande perigo em meio à operação para recuperar a cidade iraquiana de Tikrit das mãos do "Estado Islâmico" (EI). Cerca de 30 mil soldados do Iraque, voluntários, milicianos xiitas e combatentes de tribos sunitas participam da ofensiva, a maior já realizada contra os jihadistas, iniciada nesta segunda-feira.
Algumas lideranças e combatentes descreveram a operação como uma oportunidade de vingar o massacre cometido pelo EI contra centenas de novos recrutados, de maioria xiita, em junho do ano passado. Durante a última grande operação de Bagdá, que fez com que o EI fosse expulso da província de Diyala, combatentes xiitas supostamente executaram ao menos 70 civis sunitas.
"Milícias paramilitares xiitas já realizaram ataques de represália contra civis sunitas que não tem envolvimento nas hostilidades [...] Estamos preocupados com a possível recorrência e aumento de ataques desse tipo durante a operação em curso", afirma Donatella Rovera, da Anistia Internacional.
Ao anunciar a ofensiva em Tikrit, o primeiro-ministro iraquiano, Haider al-Abadi, disse que "nessa batalha, não há um lado neutro", argumentando que qualquer iraquiano que escolhesse a neutralidade estaria apoiando os jihadistas.
Joe Stork, da organização Human Rights Watch, vê a declaração do premiê como preocupante. "Qualquer pessoa que não esteja participando diretamente das hostilidades deve ser protegida contra ataques."
Apoio do Irã
As milícias xiitas que participam da ofensiva contam com o apoio do Irã. O general Martin Dempsey, chefe do Estado-maior dos EUA, afirmou ser notável o posicionamento aberto de Teerã em seu apoio às milícias, para quem fornece, sobretudo, armamentos. Dempsey alertou, no entanto, que a influência do Irã não deve conduzir a uma divisão religiosa entre os iraquianos.
Tikrit, a 170 quilômetros de Bagdá, fica numa estratégia via de ligação com o norte do país. A atual ofensiva é considerada um teste para as forças iraquianas para um ataque à cidade de Mossul, bastião do EI no norte do país e segunda maior cidade do Iraque.
Até agora, a coalizão liderada pelos EUA não reagiu. Os ataques aéreos contra posições do EI na região foram realizados, aparentemente, só pela Força Aérea iraquiana. Segundo o Pentágono, Bagdá não teria pedido apoio.
"Estado Islâmico": de militância sunita a califado
Origens do grupo jihadista remontam à invasão do Iraque, em 2003. Nascido como oposição ao domínio xiita e inicialmente um braço da Al Qaeda, EI passou por mudanças e virou uma ameaça internacional.
Foto: picture-alliance/AP Photo
A origem do "Estado Islâmico"
A trajetória do "Estado Islâmico" (EI) começou em 2003, com a derrubada do ditador iraquiano Saddam Hussein pelos EUA. O grupo sunita surgiu a partir da união de diversas organizações extremistas, leais ao antigo regime, que lutavam contra a ocupação americana e contra a ascensão dos xiitas ao governo iraquiano.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Braço da Al Qaeda
A insurreição se tornou cada vez mais radical, à medida que fundamentalistas islâmicos liderados pelo jordaniano Abu Musab al Zarqawi, fundador da Al Qaeda no Iraque (AQI), infiltraram suas alas. Os militantes liderados por Zarqawi eram tão cruéis que tribos sunitas no Iraque ocidental se voltaram contra eles e se aliaram às forças americanas, no que ficou conhecido como "Despertar Sunita".
Foto: AP
Aparente contenção
Em junho de 2006, as Forças Armadas dos EUA mataram Zarqawi numa ofensiva aérea e ele foi sucedido por Abu Ayyub al-Masri e Abu Omar al-Bagdadi. A AQI mudou de nome para Estado Islâmico do Iraque (EII). No ano seguinte, Washington intensificou sua presença militar no país. Masri e Bagdadi foram mortos em 2010.
Foto: AP
Volta dos jihadistas
Após a retirada das tropas dos EUA do Iraque, efetuada entre junho de 2009 e dezembro de 2011, os jihadistas começaram a se reagrupar, tendo como novo líder Abu Bakr al-Bagdadi, que teria convivido e atuado com Zarqawi no Afeganistão. Ele rebatizou o grupo militante sunita como Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).
Foto: picture alliance/dpa
Ruptura com Al Qaeda
Em 2011, quando a Síria mergulhou na guerra civil, o EIIL atravessou a fronteira para participar da luta contra o presidente Bashar al-Assad. Os jihadistas tentaram se fundir com a Frente Al Nusrah, outro grupo da Síria associado à Al Qaeda. Isso provocou uma ruptura entre o EIIL e a central da Al Qaeda no Paquistão, pois o líder desta, Ayman al-Zawahiri, rejeitou a manobra.
Foto: dapd
Ascensão do "Estado Islâmico"
Apesar do racha com a Al Qaeda, o EIIL fez conquistas significativas na Síria, combatendo tanto as forças de Assad quanto rebeldes moderados. Após estabelecer uma base militar no nordeste do país, lançou uma ofensiva contra o Iraque, tomando sua segunda maior cidade, Mossul, em 10 de junho de 2014. Nesse momento o grupo já havia sido novamente rebatizado, desta vez como "Estado Islâmico".
Foto: picture alliance / AP Photo
Importância de Mossul
A tomada da metrópole iraquiana Mossul foi significativa, tanto do ponto de vista econômico quanto estratégico. Ela é uma importante rota de exportação de petróleo e ponto de convergência dos caminhos para a Síria. Mas a conquista da cidade é vista como apenas uma etapa para os extremistas, que pretenderiam avançar a partir dela.
Foto: Getty Images
Atual abrangência do EI
Além das áreas atingidas pela guerra civil na Síria, o EI avançou continuamente pelo norte e oeste iraquianos, enquanto as forças federais de segurança entravam em colapso. No fim de junho, a organização declarou um "Estado Islâmico" que atravessa a fronteira sírio-iraquiana e tem Abu Bakr al-Bagdadi como "califa".
Foto: Reuters
As leis do "califado"
Abu Bakr al-Bagdadi impôs uma forma implacável da charia, a lei tradicional islâmica, com penas que incluem mutilações e execuções públicas. Membros de minorias religiosas, como cristãos e yazidis, deixaram a região do "califado" após serem colocados diante da opção: converter-se ao islã sunita, pagar um imposto ou serem executados. Os xiitas também eram alvo de perseguição.
Foto: Reuters
Guerra contra o patrimônio histórico
O EI destruiu tesouros arqueológicos milenares em cidades como Palmira (foto), na Síria, ou Mossul, Hatra e Nínive, no Iraque. Eles diziam que esculturas antigas entram em contradição com sua interpretação radical dos princípios do Islã. Especialistas afirmam, porém, que o grupo faturou alto no mercado internacional com a venda ilegal de estátuas menores, enquanto as maiores eram destruídas.
Foto: Fotolia/bbbar
Ameaça terrorista
Durante suas ofensivas armadas, o "Estado Islâmico" saqueou centenas de milhões de dólares em dinheiro e ocupou diversos campos petrolíferos no Iraque e na Síria. Seus militantes também se apossaram do armamento militar de fabricação americana das forças governamentais iraquianas, obtendo, assim, poder de fogo adicional.