Torcedores e jogadores do Chemnitz reverenciam notório extremista com coreografia, discurso e minuto de silêncio. Clube inicialmente justifica realização do ato, depois se distancia, fala em coação e registra ocorrência.
Anúncio
Reiteradamente, clubes de futebol do leste da Alemanha viram notícia por escândalos em torno do comportamento agressivo e extremista de hooligans – que não têm o menor constrangimento em propagar ideais neonazistas e adoram ignorar quaisquer diretrizes de segurança dentro dos estádios.
No último fim de semana, o Chemnitz foi a vítima – e o complacente – da vez. No duelo com o VSG Altglienicke, de Berlim (empate em 4 a 4), as torcidas organizadas e alguns jogadores do Chemnitz reverenciaram publicamente um falecido torcedor do clube – e conhecido nome da cena de extrema direita.
Antes do jogo, um retrato de Thomas H. foi exibido no telão do estádio. Atrás de um dos gols, hooligans executaram uma coreografia em homenagem ao colega morto e fizeram um minuto de silêncio, durante o qual uma cruz branca desenhada num pano preto foi alçada, além de uma faixa com a frase "descanse em paz, Tommy". Os hooligans realizaram também um show de pirotecnia – o que é proibido em estádios alemães – e deram um discurso em honra aos serviços prestados por Thomas H. ao Chemnitz.
Durante a partida, o atacante Daniel Frahn – com passagens pela seleção Sub-19 da Alemanha e pelo RB Leipzig – celebrou seu gol levantando uma camiseta preta com a frase "Support your local Hools" (Apoie os hooligans locais, em tradução livre).
O conjunto de incidentes gerou uma avalanche de críticas e catapultou o Chemnitz em modo de crise. Horas depois do jogo, o gerente comercial do clube, Thomas Uhlig, pediu demissão "para evitar maiores danos ao Chemnitz FC".
Além disso, o clube cortou os laços com Peggy Schellenberger, responsável pela comunicação entre clube e torcedores e também vereadora pelo Partido Social-Democrata (SPD). Schellenberger prestou condolências oficiais a Thomas H. na página dela no Facebook e recebeu duras críticas. Um funcionário do departamento de comunicação do clube e o locutor do estádio também perderam seus cargos. O atacante Frahn recebeu uma multa em dinheiro.
De acordo com Klaus Siemon, o administrador da insolvência do Chemnitz [que entrou em processo de falência em 2018], os acontecimentos no jogo contra o VSG Altglienicke se desviaram tanto da norma "que deve ser esclarecido como foi possível isso acontecer". Ele disse que depoimentos de funcionários do clube sugerem coação, pois haveria risco de distúrbios se a homenagem não ocorresse.
No domingo, o clube inicialmente comunicou que a cerimônia era um ato de humanidade com um torcedor falecido e de forma alguma uma homenagem às posições assumidas por ele em vida, dando a entender que havia concordado com o ato. "É um mandamento da humanidade – aos torcedores do Chemnitz e parentes e amigos que pediram a permissão de uma homenagem", afirmou.
Na segunda-feira endureceu sua posição e registrou ocorrência para esclarecer as circunstâncias que levaram à cerimônia. O clube afirmou que tomou conhecimento que "pessoas relevantes e bem conhecidas da cena extremista de direita viajaram de outras cidades para Chemnitz e a Saxônia para este dia".
O Chemnitz possui um histórico de problemas com agrupamentos de torcedores extremistas – a cena de extrema direita da cidade tem fortes laços com hooligans. Muitos destes grupos chegaram a ser banidos de entrar nos estádios pelo próprio clube: por exemplo, a aliança HooNaRa (abreviação para hooligans, nazistas e racistas), fundada por Thomas H., ou os "NS Boys" – oficialmente "NS" significa "nova sociedade", mas também é a abreviação de nacional-socialismo ou nazismo.
O Chemnitz é um tradicional clube do leste alemão – presença constante na 2. Bundesliga na década de 1990 e rebaixado da 3. Bundesliga na temporada passada – e lidera a Liga Regional Nordeste, apesar dos recentes problemas financeiros. Segue a passos largos para voltar ao futebol profissional na Alemanha.
______________
A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas. Siga-nos noFacebook | Twitter | YouTube
O esporte mais popular do mundo comemora 150 anos de existência e, nesse espaço de tempo, teve momentos de conotação política e influência direta na humanidade, desde trégua em guerras à confraternização de etnias.
Foto: picture-alliance/dpa
A trégua de Natal
Véspera de Natal de 1914. A Europa estava em plena Primeira Guerra Mundial, mas soldados alemães e britânicos organizaram um cessar-fogo não oficial ao longo de toda a frente ocidental. O início da "Trégua de Natal" foi na região de Ypres, na Bélgica, onde as tropas adversárias decoraram as trincheiras, trocaram presentes e jogaram uma partida de futebol.
Foto: PD
O mártir do Wunderteam
No dia 3 de abril de 1938, a Alemanha enfrentou o "Wunderteam" da Áustria no famoso "Jogo da Anexação". Matthias Sindelar (esq. camisa escura) marcou um dos gols da vitória austríaca e comemorou efusivamente na frente dos políticos nazistas. Na Copa de 1938 ele se recusou a defender a Alemanha e, em janeiro de 1939, foi encontrado morto, asfixiado por monóxido de carbono na própria cama.
Foto: picture alliance/Schirner Sportfoto
A partida da morte
O FC Start é provavelmente o maior símbolo esportivo de resistência ao nazismo. Mesmo ciente das consequências, o time (de branco) se recusou a fazer a saudação nazista e ousou vencer - pela segunda vez - a Flakelf, equipe da Força Aérea alemã, no dia 9 de agosto de 1942. Pouco tempo depois, os jogadores foram levados para campos de concentração. A grande maioria morreu sob tortura.
Foto: PD
Capitalismo versus socialismo
Em plena Guerra Fria, no dia 25 de novembro de 1953, a melhor seleção da época, a Hungria, enfrentou a Inglaterra no Estádio de Wembley. O confronto tornou-se importante propaganda para as duas ideologias. Os socialistas, liderados por Ferenc Puskas (esq.), venceram os capitalistas por 6 a 3. Foi a primeira derrota inglesa em casa em 90 anos de futebol.
Foto: Getty Images
"El Clásico"
Assim como o ditador Benito Mussolini sentenciou o "Vencer ou Morrer" para a seleção italiana na Copa de 1938, o general Franco também usou o futebol para enaltecer a Espanha que dirigia. E, em oposição aos catalães, ele usou o Real Madrid como ferramenta propagandista nos anos 50 e 60, originando uma das maiores rivalidades do futebol mundial.
Foto: picture-alliance/dpa
A Guerra das Cem Horas
O futebol é uma atividade de confraternização, mas em 1969 os jogos pelas Eliminatórias entre El Salvador e Honduras transbordaram na "Guerra das Cem Horas". Obviamente as razões do conflito foram de ordem econômica e política, mas a animosidade nos jogos foi o estopim para quatro dias sangrentos com seis mil mortos. No jogo decisivo, em campo neutro, El Salvador venceu e foi à Copa de 70.
Foto: picture-alliance/Sven Simon
A guerra parou para ver Pelé
Em excursão pela África em 1969, o Santos parou a Guerra de Biafra, na Nigéria. O governador da região nigeriana inclusive autorizou a liberação da ponte que ligava a cidade de Benin - local do jogo - e Sapele, para que todos pudessem ver o Rei Pelé (na foto com Eusébio). Assim que o Santos subiu no avião, a guerra recomeçou.
Foto: AP
Final de Copa perto de centro de tortura
Quando o general Jorge Videla assumiu o poder e instalou uma violenta ditadura militar, a Argentina já estava definida como anfitriã da Copa de 78. Houve diversas ameaças de boicote e protestos. Paul Breitner, campeão de 74, se recusou a ir à Argentina, e a seleção holandesa, vice-campeã, protagonizou um último gesto de repúdio ao governo militar, dando as costas a Videla .
Foto: -/AFP/Getty Images
Winnie Mandela Futebol Clube
Durante o Apartheid, o futebol era um dos principais catalisadores na luta contra a segregação racial na África do Sul. Naquele período, o clube Winnie Mandela FC (nome da mulher de Nelson Mandela) servia como refúgio para líderes políticos e sindicais perseguidos pelo regime. Com o fim do Apartheid, em 1994, a seleção sul-africana se tornou um poderoso fator de coesão nacional.
Foto: Getty Images
Drogba, o artilheiro pacificador
Já eram quase cinco anos de conflito entre os rebeldes do norte e o governo na Costa do Marfim, em 2007, quando Didier Drogba propôs que a partida contra Madagascar fosse disputada em Bouaké, a capital dos rebeldes. Armas e diferenças foram colocadas de lado para celebrar a vitória por 5 a 0, um gol para cada ano da guerra que ali cessaria.
Foto: Issouf Sanogo/AFP/Getty Images
Os eleitos de Alá contra o Grande Satã
Na Copa de 98, dois países de relação politicamente marcada pela animosidade se enfrentaram sob suspense em Lyon: Estados Unidos e Irã. Com a pregação antiamericana, os aiatolás tentaram capitalizar o confronto e o trataram como o duelo entre os "eleitos de Alá" e o "Grande Satã". Antes do jogo, porém, iranianos entregaram flores e posaram abraçados com os jogadores dos EUA.
Foto: Stu Forster/Allsport
Afeganistão recupera identidade na bola
Devido à invasão russa, a guerras civis e ao regime talibã, o futebol deixou de ser praticado no Afeganistão entre 1984 e 2002. A primeira partida oficial em território afegão ocorreu apenas no dia 20 de agosto de 2013. Três semanas depois, os afegãos conquistaram seu primeiro título internacional, a Copa da Federação do Sul da Ásia, recuperando um pouco de sua identidade.
Foto: Prakash Mathema/AFP/Getty Images
Futebol como unificador de povos
Com o colapso da Iugoslávia, cresceram as tensões étnicas na região - que o futebol, mesmo que por um instante, conseguiu apaziguar. Com a inédita classificação da Bósnia para a Copa de 2014, sérvios, croatas e muçulmanos foram às ruas festejar. Unidos.