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Colômbia entra em terreno incerto após plebiscito

3 de outubro de 2016

Após "não" do povo a acordo, governo e Farc tentam salvar processo de paz. Apelo internacional é para que curso seja mantido, mas resultado mostra que feridas de cinco décadas de guerra ainda estão longe de ser curadas.

Voto no plebiscito das Farc na Colômbia
Foto: picture-alliance/dpa/L. Munoz

Apesar de o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) garantirem que o compromisso com a paz será respeitado, e dos apelos internacionais para que esse curso seja mantido, o resultado do plebiscito deste domingo (02/10) precipitou o país sul-americano em terreno incerto. E mostrou que as feridas de mais de cinco décadas de conflito ainda estão longe de ser cicatrizadas.

O "não" teve uma maioria apertada: apenas 50,22% dos votantes se manifestaram contrários à implementação do acordo de paz recém-assinado. Além disso, mais de um terço dos 34 milhões de colombianos com direito de voto sequer foi às urnas.

Analistas comparam a surpresa com a decisão popular na Colômbia à causada pela opção dos eleitores britânicos, em junho último, a favor da saída do país da União Europeia, o assim chamado Brexit. Além do elevado nível de abstenção, em ambos os casos a voz das urnas acabou contrariando o que indicavam as principais pesquisas de opinião.

Rejeição à "impunidade"

Após 52 anos de guerra civil e mais de 220 mil mortos, o pacto de paz selado em Havana, resultado de quatro anos de negociações, oferecia aos combatentes rebeldes a possibilidade de entregarem as armas à ONU, confessar seus crimes e formar um partido político baseado na ideologia marxista.

Agora, os guerrilheiros que planejavam se reintegrar à sociedade colombiana como civis se deparam com um futuro incerto. Também é difícil prever o que acontecerá com a guerra civil em si, que ambos os lados declararam encerrada em 26 de setembro, ao assinar o acordo de paz com o famoso "balígrafo" – símbolo da transição dos projéteis para a educação no país.

Embora em grande parte das regiões de conflito o "sim" tenha predominado, no centro do país, região da capital e da metrópole econômica Medellín, venceu o voto contrário. A rejeição partiu, sobretudo, dos que consideram o acordo leniente demais para com os rebeldes, oferecendo-lhes o que muitos tacharam de "impunidade".

Cólera e tristeza dos colombianos após resultado do plebiscitoFoto: picture alliance/dpa/L. Muñoz

Tons conciliadores em Bogotá

No entanto, logo em seguida ao choque inicial, o próprio presidente Santos, que não era obrigado por lei a realizar um plebiscito, se mostrou disposto a buscar alternativas. Admitindo não haver um plano B para o fracasso da consulta popular, ele propôs que se convoquem todas as forças políticas nacionais para buscar "espaços de diálogo".

O convite se dirige, sobretudo ao partido de direita radical Centro Democrático, do Álvaro Uribe, que liderou a campanha pelo "não". O ex-presidente respondeu que deseja "contribuir para um grande pacto nacional" que corrija os "erros" do acordo.

As Farc igualmente adotaram um tom conciliador, assegurando, em comunicado oficial, que manterão o cessar-fogo bilateral e definitivo. Seu comandante-chefe, Rodrigo Londoño ("Timochenco"), acrescentou que o grupo guerrilheiro "mantém sua vontade de paz", e quer seguir usando "somente a palavra como arma de construção para o futuro".

Segundo fontes oficiais, apesar de ter colocado seu cargo à disposição do presidente, o chefe da equipe negociadora do acordo, Humberto De la Calle, viajará para Havana com o alto comissário de Paz, Sergio Jaramillo. Juan Manuel Santos informou que a finalidade é "manter informados os negociadores das Farc" sobre o diálogo político que ele pretende iniciar com todos os partidos políticos colombianos.

Decepção e apoio internacional

As reações internacionais foram basicamente de decepção com a rejeição em plebiscito – acompanhada pela esperança de que, ainda assim, o curso pacificador se mantenha.

Comandante "Timochenco" das Farc (c.) comenta derrota do acordo de pazFoto: picture alliance/dpa/E. Mastrascusa

A ONG de direitos humanos Anistia Internacional considerou o resultado uma "oportunidade perdida". O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, enviou seu encarregado especial Jean Arnault nesta segunda-feira à capital cubana, para assistir as delegações de Bogotá e das Farc na busca de uma solução.

Uma semana atrás, Ban estivera presente à assinatura do acordo de paz. "Em Cartagena, testemunhei o profundo desejo dos colombianos por um fim da violência. Conto que eles continuarão, até alcançarem uma paz segura e duradoura", declarou o político sul-coreano.

A porta-voz das Relações Exteriores da Comissão Europeia, Maja Kocijancic, declarou, em coletiva de imprensa: "Neste momento respeitamos o voto dos colombianos, como também respeitaremos as decisões que sejam tomadas adiante."

Está previsto que a alta representante da UE para Política Externa, Federica Mogherini, dê uma declaração em breve, após falar com o presidente Santos e. Em seguida à assinatura do acordo de paz, a UE retirara as Farc de sua lista de organizações terroristas.

Possíveis efeitos econômicos negativos

O ministro alemão do Exterior, Frank-Walter Steinmeier, falou de uma "péssima surpresa". "Os responsáveis políticos [da Colômbia] têm agora o dever para com as vítimas e suas famílias que a esperança de paz apenas despontada não volte a ser destruída."

"O plebiscito está perdido, mesmo assim espero que se consiga ganhar a paz", concluiu o social-democrata alemão. Seu colega norueguês, Borge Brende, desabafou: "Estou desapontado, há tanto em jogo." Oslo já enviou um grupo de diplomatas a Cuba, para também contribuir na busca de soluções.

Em comunicado publicado no site do Ministério russo do Exterior, Moscou manifestou apoio ao país sul-americano: "Reiteramos nossa invariável postura a favor de uma solução política do conflito armado na Colômbia, em prol do progresso social e econômico desta nação amiga da América Latina."

Da mesma forma, o porta-voz do Departamento de Estado americano, John Kirby, prometeu o respaldo de seu país: "A Colômbia pode contar com o apoio continuado dos Estados Unidos, enquanto segue buscando a paz democrática e a prosperidade para todos os colombianos."

A decisão dos eleitores colombianos poderá ter também consequências econômicas para o país. A agência de classificação de risco Moody's considera o resultado "negativo" para o perfil de crédito da Colômbia – atualmente cotado como "Baa2" –, pois provavelmente "minará a capacidade do governo de aprovar outras reformas".

Antes, as agências concorrentes Fitch e Standard & Poor's haviam negado que o resultado do plebiscito teria impacto imediato sobre sua avaliação do país, classificado por ambas como "BBB com perspectiva negativa".

AV/dpa/efe/afp/rtr

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