STF aceita denúncia contra senador pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Segundo acusação, ele teria recebido mais de 29 milhões de reais por desvios em subsidiária da Petrobras.
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A segunda turma do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou nesta terça-feira (22/08), por unanimidade, a denúncia contra o ex-presidente e senador Fernando Collor (PTC-AL). Com a decisão, o parlamentar se torna réu nas investigações da Operação Lava Jato.
A denúncia, apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em agosto de 2015, acusa o senador pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Segundo a PGR, Collor teria recebido mais de 29 milhões de reais em propina ao usar sua influência política em contratos firmados pela BR Distribuidora, empresa subsidiária da Petrobras.
A acusação afirma que o senador teria comprado carros de luxo com o dinheiro da propina, incluindo marcas como Lamborghini, Ferrari, Bentley e Land Rover. Em julho de 2015, os veículos foram apreendidos na residência de Collor em Brasília, conhecida como Casa da Dinda.
A PGR pede ao STF, além da condenação à prisão, a perda do mandato no Senado, o pagamento de uma multa de 154,75 milhões de reais e o sequestro de bens no valor de 30,9 milhões de reais.
Além de Collor, a matéria acusava outras sete pessoas, incluindo sua mulher, Caroline Serejo Collor de Mello, mas apenas duas também viraram rés: Pedro Paulo Bergamaschi Leoni Ramos, considerado operador particular de Collor, e Luis Pereira Amorim, administrador de empresas do senador.
O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo, votou por aceitar a denúncia contra o ex-presidente. O voto foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello, que fazem parte da segunda turma do STF.
Além de rejeitar a denúncia contra cinco dos acusados, Fachin recusou ainda as acusações contra Collor de peculato e obstrução de Justiça, incluídas na denúncia da PGR.
Em comunicado divulgado nesta terça-feira, o parlamentar classificou a decisão da segunda turma do STF como "uma primeira derrota à Procuradoria-Geral da República", afirmando que os ministros da Corte, "em discurso unânime, repudiaram os excessos da acusação".
"O senador acredita que, como no passado, terá oportunidade de comprovar sua inocência na fase seguinte do processo, colhendo, mais uma vez, o reconhecimento de sua inocência", diz a nota.
A partir de agora, as defesas poderão apresentar provas de inocência, com depoimentos de testemunhas e contestações jurídicas. Os réus também serão ouvidos. Ao fim do processo, no julgamento, os acusados serão condenados ou absolvidos.
Collor é investigado em outros cinco inquéritos decorrentes da Lava Jato no Supremo. Com a decisão desta terça-feira, ele se torna o terceiro senador réu na operação, além de Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Valdir Raupp (PMDB-RO).
EK/abr/lusa/ots
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
Foto: Reuters/S. Moraes
As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
Foto: imago/Fotoarena
As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
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Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
Foto: J. Sorges
De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
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As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
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As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
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O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
Foto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS/C.Faga
Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.