País sul-americano elege sucessor do presidente Juan Manuel Santos, tendo como favoritos uribista e ex-guerrilheiro esquerdista. Acordo com Farc e refugiados venezuelanos são principais temas da campanha.
Anúncio
Eleitores colombianos vão às urnas neste domingo (27/05) para escolher seu novo presidente, sucessor de Juan Manuel Santos. O clima é de polarização, com dois candidatos favoritos: o uribista Iván Duque, representando a direita, e o ex-prefeito de Bogotá e ex-guerrilheiro Gustavo Petro, representando a esquerda.
A inclusão dos ex-combatentes do antigo grupo guerrilheiro Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) na sociedade, as negociações de paz com o Exército de Libertação Nacional (ELN) e a crise migratória venezuelana são alguns dos temas que preocupam a população às vésperas do pleito presidencial.
As eleições deste domingo são decisivas para o futuro do país, que em 2016 assinou um acordo de paz histórico com as Farc e que agora negocia a paz com o ELN. Santos, que recebeu o Prêmio Nobel da Paz por seus esforços para pacificar o país, se despede do governo com um popularidade abaixo da marca de 20%.
Pesquisas eleitorais colocam o oposicionista Duque, do partido Centro Democrático, na liderança. Ele deve ir para o segundo turno, no qual pode ter como rival tanto o esquerdista Petro, do movimento Colômbia Humana, quanto Germán Vargas Lleras, do Movimento Mejor Vargas Lleras, apoiado por parte do oficialismo.
Alguns analistas dão como certa a vitória de Duque no segundo turno. Ele agrada aos eleitores que desejam modificar o acordo de paz com as Farc, pois é o candidato que mais se mostrou em desacordo com o pacto. Seu objetivo é evitar que os ex-guerrilheiros tenham acesso a cargos eletivos antes de cumprir suas penas. Quanto às negociações com o ELN, o político sinalizou que preferiria voltar-se para a via militar.
O candidato é visto por alguns como o homem que poderia chegar à presidência para obedecer as instruções do ex-presidente Álvaro Uribe (2002-2010), que hoje é o líder máximo do conservador Centro Democrático, partido que apesar de se autodenominar de centro, é considerado de direita. Há um ano, quando a campanha mal tinha começado, muitos colombianos afirmaram que votariam "em quem Uribe dissesse", que acabou sendo Duque.
Vargas Lleras, por sua vez, conta com o apoio da parte do eleitorado que apoia uma continuidade das ideias do governo Santos, apesar de o político ter dito que modificará alguns pontos do acordo de paz. Ele é a favor das negociações com o ELN.
Petro defende o pacto alcançado com as Farc e a reintegração dos ex-combatentes à sociedade e é saudado por sua ampla atenção aos setores mais necessitados. Seu lado humano e seu entusiasmo para eliminar a desigualdade social fazem do esquerdista um candidato forte. Ele pretende continuar com as negociações com o ELN.
Cristian Rojas, diretor do programa de Ciências Políticas da Universidade de La Sabana, afirma que os pontos estruturais do acordo de paz com as Farc dificilmente poderão ser mudados, ainda que o novo presidente deva tomar a decisão de continuar com a implementação do acordo ou modificá-lo.
Refugiados venezuelanos
A chegada massiva de refugiados da Venezuela, que deixam o país devido à grave crise econômica e política enfrentada pelo governo de Nicolás Maduro, preocupa o eleitorado colombiano e pode ser uma questão decisiva nas urnas.
Duque propõe a criação de um fundo de atenção humanitária para os imigrantes venezuelanos, um programa de convalidação de diplomas universitários e vistos de trabalho temporários.
Vargas Lleras, acusado de ser populista, adota uma posição radical quanto aos imigrantes: propõe medidas migratórias drásticas, afirmando que os venezuelanos que estão na Colômbia saturam o sistema. Diante da grave situação no país governado de maneira autoritária por Maduro, o candidato promete romper relações com a Venezuela.
Petro, por sua vez, quer criar um modelo de abastecimento alimentar para os refugiados venezuelanos. Apesar de ser criticado por sua proximidade com a esquerda do país vizinho, o candidato à presidência pretende denunciar em instâncias internacionais a violação de direitos humanos na Venezuela.
Guinada à esquerda?
A candidatura de Petro faz a esquerda colombiana sonhar com a possibilidade de chegar pela primeira vez à presidência, aspiração que encontra oposição de parte da sociedade que não vê com bons olhos o passado guerrilheiro do político.
Esta é a segunda tentativa de Petro de assumir a presidência. Em 2010, ele se candidatou pelo Polo Democrático Alternativo (PDA) e obteve 1,3 milhão de votos no pleito vencido por Santos.
Após a derrota, fundou o Movimento Progressista e foi eleito prefeito de Bogotá para o período de 2012 a 2016. Sua gestão foi fortemente criticada por sua politização, que, segundo críticos, deixou a capital colombiana mergulhada em um caos.
Se o esquerdista Petro for eleito presidente, analistas temem que ele não consiga formar uma equipe para governar, aludindo à imagem pouco favorável que construiu nos anos em que foi prefeito de Bogotá. Sem maioria no Congresso, Petro não teria força para impulsionar reformas.
Apesar das críticas, há quem considere que, como prefeito, Petro trouxe avanços no âmbito social e em segurança. Nesta campanha eleitoral, no entanto, ele foi criticado pela amizade com o falecido ex-presidente venezuelano Hugo Chávez e é acusado de querer transformar a Colômbia numa segunda Venezuela.
Além de Duque, Vargas Llleras e Petro, estão na disputa pela presidência Sergio Fajardo, ex-prefeito de Medellín, da Colaizão Colômbia, de centro; e o ex-negociador do acordo de paz com as Farc Humberto De La Calle, do Partido Liberal Colombiano.
LPF/efe/dpa
_______________
A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas. Siga-nos noFacebook | Twitter | YouTube | WhatsApp | App | Instagram
Cronologia do conflito e do processo de paz na Colômbia
Acordo com as Farc foi alcançado após décadas de luta armada e tensões sociais na Colômbia. País trabalha agora na implementação do pacto e na reintegração de ex-guerrilheiro à sociedade.
Foto: Imago/Agencia EFE
Longo caminho da violência à paz
As décadas de violentas tensões sociais, que chegam ao fim com o novo acordo de paz na Colômbia, têm origem na luta no campo, que opôs trabalhadores rurais e proprietários de terras desde os anos 1920. As hostilidades se intensificaram a partir da década de 1960.
Foto: Reuters/J. Vizcaino
1940-1950: A Violência
Enfrentamentos sangrentos entre liberais e conservadores provocam milhares de mortes. O assassinato do liberal Jorge Elíecer Gaitán (foto), em 1948, gera protestos que ficaram conhecidos como "El Bogotazo", dando início ao período denominado "La Violencia". Membros do Partido Comunista são perseguidos, o Exército ocupa povoados e reprime os "lavradores comunistas".
Foto: Public Domain
1964: Farc e ELN
São fundadas as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), contra a concentração de terras, e o Exército de Libertação Nacional (ELN), fruto da radicalização do movimento estudantil e apoiado por adeptos da Teologia da Libertação, que prega a opção pelos pobres. O padre Camilo Torres (foto), guerrilheiro, é morto em combate. O governo colombiano recebe ajuda dos Estados Unidos.
Foto: picture-alliance/AP Photo
1970-1980: M-19 e negociações fracassadas
Surgem outros movimentos clandestinos como o M-19, que protagonizou a trágica ocupação do Palácio da Justiça em 1985 (foto), com mais de 350 reféns. A retomada do prédio pelas Forças Armadas deixa 98 mortos e 11 desaparecidos. O governo abre negociação pela primeira vez com as Farc e o ELN, mas o entendimento fracassa devido ao assassinato do ministro da Justiça.
Foto: Getty Images/AFP
Meados dos anos 80: Paramilitares
Surgem numerosos grupos paramilitares de ultradireita, a serviço de grandes proprietários de terras, contra os ataques rebeldes. Ao longo do tempo, vários desses grupos se envolvem com cartéis de droga. Quatro candidatos presidenciais e numerosos políticos de esquerda são assassinados por paramilitares entre 1986 e 1990.
Foto: Carlos Villalon/Liaison/Getty Images
1989: Desmobilização do M-19
O movimento M-19 entrega as armas em outubro de 1989, optando por disputar o poder como um partido político. Seu líder, Carlos Pizarro, candidata-se a presidente. Em 1990, ele é morto durante a campanha eleitoral.
Foto: picture alliance/Demotix/K. Hoffmann
1996: Esquadrões da morte
Grupos paramilitares se reúnem no movimento Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC) e formam "esquadrões da morte" com até 30 mil membros.
Foto: AP
1998-99: Presidente Pastrana tenta negociar
Eleito em 1998, o presidente Andrés Pastrana inicia negociação com as Farc. Conversa também com o ELN (foto) e a AUC. Um vasto território até então controlado pelas Farc, no sul do país, comemora o recuo do grupo. Um massacre interrompe as conversas com a AUC.
Foto: picture-alliance/dpa
2002: Ingrid Betancourt e Álvaro Uribe
Depois que as Farc sequestram um avião, o governo interrompe o diálogo. Em 23 de fevereiro é sequestrada a candidata à presidência Ingrid Betancourt (foto). Álvaro Uribe ganha as eleições em maio, intensifica o combate militar e repudia qualquer entendimento. Ele é reeleito em 2007 e Betancourt, libertada em 2008.
Foto: AFP/Getty Images
2003-06: Recuo dos paramilitares e anistia
Após longas negociações, aproximadamente 32 mil paramilitares da AUC se rendem (foto). Até 2014, cerca de 4.200 deles são julgados por violações dos direitos humanos. Muitos retomam as armas. Em junho de 2005 é aprovada a Lei de Justiça e Paz, uma ampla anistia para membros dos esquadrões da morte.
Foto: picture-alliance/dpa
2007-08: "Falsos positivos"
Políticos de direita, acusados de vínculo com os paramilitares, são detidos em 2007 pela primeira vez. Aliados de Uribe também são atingidos. Em setembro de 2008 é revelado o escândalo batizado de "falsos positivos": entre 2004 e 2008, mais de 3 mil pessoas foram mortas pelo Exército para adulterar a estatística de guerrilheiros eliminados. Centenas de militares foram julgados até agora.
Foto: Jesús Abad Colorado
2012: Iniciados diálogos de paz com Farc
Ex-ministro da Defesa Juan Manuel Santos é eleito presidente da Colômbia em junho de 2010. Dois anos depois, entra em vigor a Lei de Vítimas e Restituição de Terras, para compensar os deslocados pelos combates. Em novembro têm início oficialmente os diálogos de paz entre governo (foto) e as Farc.
Foto: Reuters
2014-15: Santos reeleito e prazo para a paz
Santos se reelege em 2014. O governo colombiano anuncia conversações con o ELN. Enquanto isso, entendimentos com as Farc são interrompidos e reabertos devido a ações militares de ambos os lados. Em 23 de setembro de 2015, em Havana, Santos e Rodrigo Londoño Echeverri (Timochenko), líder das Farc, concordam com a meta de assinar um termo de paz em até seis meses.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Ernesto
2016: Diálogos de paz com ELN
Em 30 de março, Frank Pearl, representante do governo da Colômbia, e Antonio García, chefe da delegação do ELN (foto), anunciam em Caracas o início de um processo formal de diálogos de paz. Em relação às Farc, desacordos levam ao adiamento da assinatura do acordo de paz definitivo, cujo prazo expira em 23 de março.
Foto: Reuters/M. Bello
Junho de 2016 - Dia da paz
Acordo de paz entre o governo colombiano e as Farc foi finalmente concluído. A decisão foi recebida com entusiasmo tanto pela população do país, como pela comunidade internacional. O cessar fogo definitivo foi assinado em Cuba em 23 de junho com a presença do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, e outros presidentes e observadores.
Foto: picture-alliance/dpa/EPA/A. Ernesto
Agosto de 2016 - Acordo histórico
Em 24 de agosto, governo e Farc selaram o acordo final que encerra as negociações de paz realizadas em Havana nos últimos quatro anos. Ele foi assinado pelos chefes das equipes de negociação de ambas as partes, Humberto de la Calle, pelo governo, e Luciano Marín, conhecido como "Ivan Márquez", representando a guerrilha, assim como pelos embaixadores de Cuba e Noruega, fiadores no processo.
Foto: Reuters/E. de la Osa
Setembro de 2016 – Assinatura
Três dias após os líderes das Farc ratificarem por unanimidade o acordo de paz, o documento foi assinado pelo presidente colombiano, Juan Manuel Santos, e pelo número um do grupo armado Rodrigo Londoño Echeverri, conhecido como Timochenko, em Cartagena, em 26 de setembro. Numa cerimônia que lembrou as vítimas da guerra, o líder guerrilheiro pediu perdão pelo sofrimento causado durante o conflito.
Foto: Reuters/J. Vizcaino
Outubro de 2016 – Não
Em 2 de outubro, os colombianos foram às urnas decidir sobre o futuro do acordo de paz. Em resultado surpreendente, 50,22% dos eleitores rejeitaram o documento. Apenas 37% dos colombianos participaram do plebiscito, ou seja, cerca de 13 milhões dos 34 milhões de eleitores.
Foto: picture alliance/AP Photo/A. Cubillos
Outubro de 2016 - Nobel da Paz para Santos
Apenas cinco dias depois do referendo sobre o acordo as Farc, os apoiadores do processo de paz foram reconhecidos internacionalmente. O presidente colombiano Juan Manuel Santos foi homenageado com o Prêmio Nobel da Paz. A cerimônia de premiação foi realizada em dezembro de 2016 em Oslo.
Foto: Getty Images/AFP/T. Schwarz
Novembro de 2016 - Ratificação no Parlamento
Após uma série de alterações no texto original do acordo de paz, o Parlamento colombiano ratificou o pacto em 30 de novembro de 2016.
Foto: Getty Images/AFP/G. Legaria
Junho de 2017 - Desarmamento
A entrega das armas pelos guerrilheiros das Farc ocorreu em três fases sob a supervisão da ONU. Em 27 de junho de 2017, Santos declarou: "Hoje é, para mim e para todos os colombianos, um dia especial, um dia em que trocamos as armas por palavras."
Foto: picture-alliance/dpa/A. Pineros
Agosto de 2017 - As novas Farc
As Farc desarmadas selaram num congresso em 27 de agosto de 2017 o abandono da luta armada e sua reformulação como partido político. O ex-líder guerrilheiro Rodrigo Londoño (foto) foi eleito presidente do partido. Sua saúde fragilizada, no entanto, impediu que ele se candidatasse às eleições presidenciais.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Vergara
Março de 2018 - Farc nas eleições
Pela primeira vez desde o fim da luta armada, representantes das Farc participam de eleições legislativas em 11 de março de 2018. Apesar de o partido das Farc só ter recebido 50 mil votos, ele obteve cinco assentos em cada uma das duas casas legislativas, como determinou o acordo de paz. O partido conservador do antigo presidente Álvaro Uribe foi o grande vencedor do pleito.