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Com cidade perto do colapso, paulistano continua aglomerando

13 de março de 2021

Mesmo com 84% dos leitos de UTI ocupados, capital paulista tem índices de isolamento social bem abaixo dos níveis de um ano atrás. O dobro de pessoas andam de ônibus hoje, em meio a nova fase vermelha de restrições.

Movimentação no terminal Dom Pedro 2º, em São Paulo
Movimentação no terminal Dom Pedro 2º; número de passageiros mais que dobrou entre a primeira semana de fase vermelha em 2020 e a primeira em 2021Foto: Gustavo Basso/DW

Há um ano o Brasil registrava a primeira vítima do novo coronavírus, uma mulher de 57 anos que havia sido internada em São Paulo no dia anterior. A partir daquele 12 de março de 2020, a capital paulista – desde então a cidade que concentra o maior número de casos de covid-19 no Brasil – foi se esvaziando. No dia 21 do mesmo mês, veio o anúncio da quarentena pelo governo paulista. Por semanas, os poucos moradores que saíam de casa vagaram por uma "cidade-fantasma".

Hoje, quase um ano depois, São Paulo registra mais mortes em um dia do que o total de casos até aquele momento, em meio à nova fase vermelha do Plano SP (estratégia do governo estadual para o combate à covid-19), a com maior índice de restrições de circulação de pessoas. O isolamento, porém, está longe dos níveis de 2020. O índice de lentidão observado pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) é, em média, 15 vezes maior, enquanto o de pessoas circulando em ônibus é 126% maior. Em 30 de março do ano passado, cerca de 900 mil pessoas usaram ônibus pela cidade, contra mais de 2 milhões nesta sexta-feira (12/03).

"O lockdown é horrível; pode até morrer menos gente, mas nós vamos comer o quê?", questiona o ambulante Miguel Pereira. Ele vende coquetéis aos funcionários que deixam a rua 25 de Março, ponto importante de comércio que há um ano se tornara deserto.

"O auxílio emergencial não servia para nada com R$ 600", conta Pereira, que ficou de março a julho sem trabalhar. "Mas neste ano não vou parar; no Brasil ainda vai morrer mais gente que nos Estados Unidos." Aos 27 anos, Pereira diz não saber se contraiu ou não o coronavírus, apesar de trabalhar sem máscara no centro de São Paulo.

Supervisora da UTI do Hospital Geral de Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo, Ana Kelly Araujo observa uma alta no número de pessoas com menos de 50 anos nos últimos três meses. "Os idosos têm naturalmente o sistema imunológico mais sensível, mas os números estão nos mostrando que os mais jovens, quando muito expostos como vem acontecendo, também são atingidos e de modo forte", conta.

Os 20 leitos de tratamento intensivo do hospital estão lotados há mais de uma semana, assim como os de outros 12 hospitais estaduais na Grande São Paulo, de um total de 15.

Para o infectologista Marcos Boulos, professor da Faculdade de Medicina da USP e membro do Centro de Contingência do Coronavírus do Estado de São Paulo, o cenário mais provável é de esgotamento completo do número de leitos em UTIs em todo o estado antes mesmo da próxima segunda-feira (15/03), quando começa a fase emergencial da fase vermelha.

Em 24 de março de 2020, dia em que começava a quarentena oficial em São Paulo, poucos passageiros transitavam pela esvaziada estação da Sé durante o horário de picoFoto: Gustavo Basso/DW

Fase vermelha em 2021

A nova fase vermelha do Plano SP foi criticada quando anunciada no começo deste mês, devido a flexibilizações que não existiam no começo da quarentena, como a liberação de aulas presenciais, partidas esportivas ou cultos e cerimônias religiosas. Até mesmo o Ministério Público passou a analisar a inclusão de igrejas entre os serviços essenciais.

Apesar da flexibilização, o comitê de saúde esperava que a epidemia apresentasse um indicativo de redução, o que ainda não ocorreu. O número de pacientes internados nesta sexta-feira chegou a 22.555 pessoas em todo o estado, o maior desde o início da crise. Destas, 9.777 estão em leitos de UTI e outras 12.778, em enfermarias, considerando hospitais públicos e também particulares.

O total de internados no estado está batendo recordes todos os dias desde 27 de fevereiro. O número demonstra que, nesta sexta-feira, a quantidade de pessoas internadas com covid-19 em São Paulo é 47% maior do que no pico da primeira onda da doença. Em 14 de julho de 2020, quando ocorreu o recorde de pacientes internados do ano passado, eram 15.289 pessoas nessa condição.

Naquele primeiro pico, os índices de isolamento social também eram melhores que os atuais. Na fase laranja, mais aberta, 47% das pessoas permaneceram em casa, contra 41% na última sexta-feira.

Preparando-se para deixar a UTI após duas semanas convivendo com o medo de morrer, o motofretista Cleberson de Oliveira, de 34 anos, lamenta a situação. "É mais fácil mandar um recado para quem está se cuidando do que para os que não estão; estes, que não saem das festas e baladas, vão acabar vendo que quanto menos você se importa, maior vai vir a conta."

A nova fase de controle de circulação – a chamada fase emergencial da fase vermelha, anunciada na última quarta-feira e que começa a valer na próxima segunda – fecha igrejas, impede eventos esportivos e determina que apenas serviços essenciais poderão abrir. As regras são muito semelhantes àquelas de 21 de março de 2020, quando o número de infectados no planeta era menor do que as mais de 275.000 vidas perdidas nos últimos 12 meses no Brasil. Uma conta cara demais e com tendência ao pior.

"É matemática: para cada infectado você faz a conta exponencial, e o número de infectados – reflexo de festas de Natal, ano novo, Carnaval – vai aumentando. Estou muito triste e aflita, porque dias piores virão", lamenta Cristiane Matsnaka, coordenadora do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) de São Paulo.

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