Reinhold Hanning, de 94 anos, é acusado de ser cúmplice no assassinato de 170 mil pessoas. Sobrevivente do campo de concentração participa como testemunha e faz apelo: "Conte-nos a verdade histórica."
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O julgamento de Reinhold Hanning, ex-guarda do campo de concentração de Auschwitz, começou nesta quinta-feira (11/02) em Detmold, no nordeste da Alemanha.
O aposentado de 94 anos é acusado de ser cúmplice do assassinato de 170 mil pessoas entre janeiro de 1943 e junho de 1944, período em que trabalhou como membro da SS, tropa de elite dos nazistas.
O que mais pesa sobre Hanning é a acusação de que ele trabalhou no campo de concentração durante a chamada "Operação Hungria". Entre maio e julho de 1944, 430 mil judeus húngaros foram deportados para Auschwitz. Cerca de 300 mil foram levados às câmaras de gás imediatamente após a chegada.
Segundo os promotores, Hanning sabia dos assassinatos em massa, do processo de seleção e também dos fuzilamentos. Ele também teria a consciência de que, para a máquina de extermínio funcionar, as vítimas tinham que ser vigiadas por guardas como ele.
Hanning reconhece que fazia a guarda do campo, mas nega ter participado do assassinato dos prisioneiros. O advogado do réu, Johannes Salmen, diz que ele não trabalhou na seção Birkenau, onde mais de 1 milhão de pessoas foram executadas.
"Fale o que você e seus companheiros fizeram"
O julgamento será realizado em 12 sessões, com duas horas de duração cada, até o fim de maio. Três sobreviventes de Auschwitz participam como depoentes.
"Esses processos já deveriam ter ocorrido 40, 50 anos atrás. Mas ainda não é tão tarde para descrever o que ocorreu", afirmou Justin Sonder, de 90 anos.
"Eu lhe exorto a nos contar a verdade histórica. Fale neste local o que você e seus companheiros fizeram e viveram", disse a Hanning outro sobrevivente de Auschwitz, que teve mais de 30 familiares mortos no campo de concentração.
Segundo o advogado de acusação particular, Cornelius Nestler, o envolvimento de Hanning não consistia apenas em vigiar os transportes, mas também em manter as condições desumanas do campo de concentração e tornar as execuções possíveis.
O julgamento do ex-guarda da SS é um dos mais recentes processos a seguirem o precedente jurídico estabelecido em 2011, quando o ucraniano John Demjanjuk se tornou a primeira pessoa a ser condenada na Alemanha apenas por servir como guarda em um campo de concentração, mesmo sem evidências de envolvimento em um ato criminoso específico.
KG/dpa/rtr
A arte e os horrores de Auschwitz
Exposição em Berlim mostra a obra de artistas que sobreviveram aos campos de concentração nazistas. Além de documentar atrocidades, eles fizeram arte.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Os artistas esquecidos
Enquanto a chamada "arte degenerada" dos artistas perseguidos pelo nazismo desperta atenção, quase ninguém conhece o trabalho dos artistas que estavam em campos de concentração. Pintores como Waldemar Nowakowski (foto) estão quase esquecidos. Por isso a importância do livro e da exposição "A morte não tem a última palavra", a ser aberta no prédio do Bundestag em Berlim, a partir de 27 de janeiro.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Horrores de Theresienstadt em gravura
Por mais de 15 anos, o autor, curador e historiador de arte Jürgen Kaumkötter se dedicou à arte dos perseguidos entre 1933 e 1945. Para isso, não considerou apenas quadros que surgiram nessa época, mas também aqueles que tematizaram os acontecimentos em retrospecto. Leo Haas executou esta gravura sobre Theresienstadt em 1947. Mas há também obras feitas no campo de concentração.
Foto: Bürgerstiftung für verfolgte Künste – Else-Lasker-Schüler- Zentrum – Kunstsammlung Gerhard Schneider
Pinturas no "museu do campo"
É sabido que artistas pintaram em Theresienstadt. Mas também em Auschwitz 1 houve um "museu do campo". Lá havia lápis, papel, pincéis à disposição dos artistas, para que executassem encomendas para a SS. Outros motivos surgiram secretamente. Em contrapartida, praticamente não há obras de arte oriundas de Auschwitz 2. Na foto: "Autorretrado de Marian Ruzamski", de 1943/44.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Imagem de sonhos em Auschwitz
O artista Jan Markiel criou esse retrato, em 1944, sem os materiais que tinha oficialmente à disposição em Auschwitz 1. A filha do padeiro do vilarejo próximo de Jawiszowice ajudou o prisioneiro trazendo pão e intermediando mensagens para a resistência. A têmpera utilizada pelo artista veio de pigmentos raspados da parede. O tecido grosso dos colchões de palha serviu como tela.
Foto: Staatliches Museum Auschwitz-Birkenau in Oœwiêcim
Testemunha dos crematórios
Em 1942, aos 13 anos, Yehuda Bacon (na foto, à dir.) veio para Theresienstadt e, em dezembro de 1943, para Auschwitz-Birkenau. Ele foi utilizado como mensageiro – podendo se aquecer nos fornos dos crematórios no inverno. O que testemunhou, ele relatou não somente durante o célebre Julgamento de Auschwitz em Frankfurt, mas também expressou nos desenhos que executou após a guerra.
Foto: Bürgerstiftung für verfolgte Künste – Else- Lasker-Schüler-Zentrum – Kunstsammlung Gerhard Schneider
Símbolo da morte
Yehuda Bacon mostrou esse desenho aos juízes em Frankfurt, como prova dos crimes cometidos em Auschwitz: chaminés retangulares dos crematórios, um chuveiro, pessoas que são apenas esboços. Para o historiador da arte Kaumkötter, esse desenho é um símbolo da morte nas câmaras de gás e da sepultura nos céus. Trata-se não somente de um testemunho, mas também de uma grande obra de arte.
Foto: Yehuda Bacon
A segunda geração
Michel Kichka é um dos cartunistas mais influentes de Israel. Em 2014, ele publicou a novela gráfica "Segunda geração – o que o meu pai nunca me contou", sobre o menino Kichka e o seu pai, sobrevivente de Auschwitz. Os traumas do pai passaram para o filho. Somente quanto ouve o pai contar piadas sobre o campo, Kichka consegue superar seus pesadelos.
Foto: Egmont Graphic Novel
Metáforas do Holocausto
Também os pais da artista israelense Sigalit Landau são sobreviventes do Holocausto, e o professor de desenho dela foi Yehuda Bacon, que trabalha até hoje como artista e professor de arte em Israel. Os trabalhos de Landau são repletos de alusões metafóricas ao Holocausto, como estes sapatos, que logo lembram a montanha de calçados que ainda hoje pode ser vista na exposição permanente de Auschwitz.
Foto: Sigalit Landau
A morte não tem a última palavra
Sigalit Landau coletou cem pares de sapatos em Israel e os afundou no Mar Morto. O mar os envolveu com uma camada de sal curativa – eles se tornaram símbolo da vida, em vez da morte. O desejo da artista era mostrá-los em Berlim, como sinal de que a esperança derrota o desespero. A mostra "A morte não tem a última palavra" está em cartaz até o dia 27 de fevereiro no prédio do Bundestag, em Berlim.