Após novo tremor, chanceler federal recebe premiê da Dinamarca sentada. Ao falar abertamente sobre sua saúde, líder alemã quebra paradigmas num país onde demonstrar debilidade já foi um tabu entre governos anteriores.
Anúncio
Por que ninguém pensou mais cedo nesta simples solução? Durante a cerimônia de recepção à nova primeira-ministra dinamarquesa nesta quinta-feira (11/07), em Berlim, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, e sua convidada Mette Frederiksen simplesmente se sentaram em cadeiras. Muito tranquila e sem apresentar tremores, Merkel escutou os hinos nacionais dos dois países.
Na véspera, a líder de 64 anos havia sofrido seu terceiro tremor dentro de poucas semanas, enquanto estava de pé no pátio principal da chancelaria recebendo o primeiro-ministro da Finlândia, Antti Rinne. Pouco tempo depois, ela se apresentou da forma como todos a conhecem por todos esses anos: calma, objetiva e sem grandes emoções.
Com um leve sorriso no rosto, ela afirmou: "Eu estou bem. Já disse outro dia que estou atualmente numa fase de tratamento desde as cerimônias militares ao lado do presidente [ucraniano Volodymyr] Zelensky", quando ocorreram os primeiros tremores, em meados de junho. "Aparentemente, essa fase ainda não terminou, mas há progressos. E eu tenho que viver com isso durante algum tempo ainda. Eu estou muito bem. Não é preciso se preocupar comigo." Merkel disse isso apenas uma hora depois de, mais uma vez, ter tremido intensamente.
A chanceler federal está doente? Suas forças estão chegando ao fim? No dia seguinte ao último episódio de tremores, o maior tabloide alemão escreveu em sua capa: "Simplesmente não para!"
De fato, Merkel recebeu o novo presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, em meados de junho e, no pátio da chancelaria, tremeu violentamente. Nove dias depois, aconteceu novamente, dessa vez no Palácio Bellevue, durante a posse da nova ministra da Justiça: a chanceler federal alemã tremeu, segurou as mãos na frente do corpo, mas logo voltou a seu estado normal.
Sobre o primeiro incidente, ao lado do presidente ucraniano, o governo alemão afirmou que Merkel havia bebido pouco líquido. De fato, o calor havia sido particularmente intenso naquele dia em Berlim. Após o segundo episódio, jornalistas souberam pela chancelaria que a causa poderia ser algum tipo de reação psicológica – o que Merkel agora confirmou oficialmente.
Merkel é vista tremendo em nova cerimônia oficial
01:27
O que parece claro e muito compreensível, no entanto, foi tratado como assunto secreto de Estado pelo gabinete de imprensa do governo. Poucos minutos antes de Merkel afirmar abertamente que teria de viver com o tremor ocasionalmente, sua porta-voz, Ulrike Demmer, ponderou dizendo que estava tudo bem com a chanceler federal.
"Ela participou de todos os seus compromissos da melhor forma nas últimas três semanas", frisou Demmer. E isso é verdade: Merkel não cancelou nenhum compromisso e negociou até altas horas da noite durante a cúpula do G20, no Japão. A líder reiterou: "Estou bem!"
Político doente? Novidade na Alemanha
É novidade que exista uma discussão relativamente aberta na Alemanha sobre o estado de saúde da chanceler federal e sobre como ela se posiciona em relação a isso. Afinal, no passado, comunicações sobre a saúde dos chefes de governo eram uma exceção.
Willy Brandt, chanceler federal da Alemanha pelo Partido Social-Democrata (SPD) no início dos anos 1970, viveu longas fases de depressão sem que os alemães soubessem. Em 1989, pouco antes da queda do Muro de Berlim, Helmut Kohl sobreviveu a uma tentativa de golpe de críticos internos de seu partido numa conferência da União Democrata Cristã (CDU), e isso com uma dor infernal devido a uma doença na próstata. Na época, ninguém ficou sabendo da situação.
Aparentemente, os chanceleres federais sabiam o que estavam fazendo. Os alemães, para quem a confiança na política é um bem valioso, não gostam quando seus líderes ficam debilitados – e, normalmente, também não têm interesse em saber disso.
Na Alemanha, mais do que em outras democracias, os políticos usufruem ainda de uma esfera de privacidade. Em outros países, isso é visto de forma bem diferente: os Estados Unidos, por exemplo, divulgam relatórios com os níveis sanguíneos do presidente. Na França também não é impróprio falar sobre o estado de saúde do chefe de Estado, pelo menos não até hoje.
Mas o exemplo americano mostra também que nem sempre foi esse o caso: os presidentes Franklin D. Roosevelt e John F. Kennedy ficaram gravemente doentes durante seus mandatos, mas a população não ficou sabendo na época.
Agora, a relação entre opinião pública e doença está mudando também na Alemanha, e casos individuais contribuíram para isso. A popular governadora do estado da Renânia-Palatinado, Malu Dreyer, do SPD, sempre falou abertamente sobre sua esclerose múltipla. Ditaduras e democracias controladas dificilmente fazem isso.
Seja no Leste Europeu, Ásia, África ou América Latina, ditadores e autocratas não ficam doentes, pelo menos não oficialmente. Para sustentar essa imagem de líder saudável, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, anda a cavalo com seu tronco à mostra em meio a paisagens rurais.
Na Alemanha, durante as honras militares, Merkel retirou o drama do debate sobre seu estado de saúde. Ela própria disse: "Tenho que viver com os tremores agora."
Quanto ganha um deputado federal alemão? E a chanceler Angela Merkel e o presidente Steinmeier? Além do salário, parlamentares e autoridades governamentais alemães têm vários outros benefícios.
Foto: picture alliance/dpa/L.Schulze
Salário da chefe de governo
Além de um salário de 18,7 mil euros, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, tem direito como membro do Parlamento à metade da "dieta" de um deputado federal, ou seja, 4,8 mil euros, como também a uma ajuda de custo livre de impostos de 3,3 mil euros e a outros benefícios. No total, sua remuneração chega a cerca de 28,8 mil euros mensais ou quase 345 mil euros (1,55 milhão de reais) anuais.
Foto: Getty Images/AFP/Hoang Dinh Nam
Apartamento funcional
A chefe de governo também tem direito a uma residência completamente equipada. Na Chancelaria Federal (foto), no centro de Berlim, há um apartamento funcional no oitavo andar à sua disposição, mas Angela Merkel preferiu continuar vivendo em sua antiga moradia num prédio de quatro pavimentos onde mora com o esposo em frente à Ilha dos Museus, não muito longe do seu local de trabalho.
Foto: imago/IPON
Aviões governamentais
Um Airbus serve ao transporte aéreo da chanceler Angela Merkel e do presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier. Depois que panes em antigos aviões da frota governamental de 14 aeronaves levaram Merkel a chegar atrasada ao G20 em Buenos Aires no final do ano passado, o governo em Berlim anunciou a compra de três novos A350-900. Planeja-se também uma aeronave reserva sempre à disposição.
Foto: Michael Kappeler/AFP/Getty Images
Stylist, guarda-costas e motorista
Obviamente Angela Merkel tem uma assessora que cuida de seu visual, como também uma chefe de gabinete que trata de sua agenda. Sua proteção é assegurada por uma equipe de 15 a 20 guarda-costas, que trabalham em turnos. O motorista da chefe de governo dirige um Audi A8 blindado. A frota da Chancelaria Federal abrange 20 carros, todos de marcas alemãs: Mercedes, BMW, Audi e Volkswagen.
Foto: Imago
"Dieta" de deputados
Na Alemanha, os 709 parlamentares em Berlim não recebem oficialmente um salário, mas um subsídio também chamado de "dieta". Atualmente, ela corresponde a 9.780 euros, mas é corrigida anualmente em 1° de julho, conforme o aumento do custo de vida. Neste ano, a "dieta" dos deputados federais alemães ultrapassará os 10 mil euros. Esse aumento também afetará as pensões dos parlamentares.
Foto: Getty Images/J. MacDougall
Aposentadoria parlamentar
A cada ano no Bundestag, um deputado alemão tem direito a 2,5% de sua remuneração para sua aposentadoria, ou seja, mais de 251 euros em 2019. A taxa máxima de 67,5%, a ser paga a partir de 67 anos de idade, é alcançada após 27 anos de trabalho parlamentar. Junto a "dieta" e pensão, os parlamentares em Berlim também têm outros benefícios.
Foto: picture alliance/dpa/O. Berg
Ajuda de custo e viagens de trem
Além de sua remuneração, cada parlamentar alemão recebe mensalmente uma quantia de 4.418 euros, livre de impostos e corrigida a cada 1° de janeiro. Ele serve para cobrir os custos incorridos no contexto do mandato político, como acomodação e refeições. Despesas de viagens oficiais são ressarcidas, e cada deputado tem direito a viajar gratuitamente de primeira classe em trens na Alemanha.
Foto: picture-alliance/dpa
Parentes às próprias custas
Os parlamentares também têm direito a atuais 21.536 euros mensais para despesa com funcionários. O dinheiro é pago diretamente aos empregados. Se o parlamentar empregar algum familiar, ele vai ter que pagá-lo do seu próprio bolso. O Parlamento também possui um serviço de motoristas que funciona dentro da cidade de Berlim e que pode ser requisitado pelos deputados caso necessitem.
Foto: picture alliance/Markus C. Hurek
Ajuda de reinserção
Os deputados também podem exercer atividades paralelas à sua função no Bundestag, como em conselhos de empresas. O ganho proveniente de tais atividades não é descontado de sua remuneração parlamentar. Para cada ano de mandato, o deputado tem direito ainda a uma chamada "ajuda transitória" para sua reinserção na antiga profissão equivalente a 9.541 euros mensais, pagos até 18 meses.
Foto: Imago/Westend61
Remuneração ministerial
Segundo a União dos Contribuintes da Alemanha (BdSt), os ministros alemães ganham pouco mais de 15 mil euros mensais, mais uma ajuda de custo. Há ainda uma quantia anual livre de impostos de cerca de 3,7 mil euros. Aqueles com mandato parlamentar (atualmente 10 de um total de 15 ministros) ainda recebem uma parcela de sua "dieta" que faz elevar seus salários a mais de 20 mil euros.
Foto: picture-alliance/dpa/M.Kappeler
Voos comerciais
Uma decisão tomada este ano em reação às panes com aviões governamentais estipula que, com exceção do ministro do Exterior, do ministro das Finanças e do ministro do Interior, os demais membros do gabinete deverão recorrer a aeronaves comerciais para seus compromissos oficiais no exterior. Mas todos os ministros têm direito a um carro oficial, que também pode servir para uso particular.
Foto: Fotolia/dell
Ajuda e pensão
Já após um dia no cargo, um ministro tem direito a quase 71 mil euros em ajuda transitória pós-mandato, que pode ascender a 213 mil euros dependendo do tempo que ficou na pasta. E quem foi ministro por ao menos dois anos pode esperar aposentadoria, que é de 28% do salário para quatro anos de mandato. A cada ano adicional, a pensão aumenta 2,4 % até um máximo de 11,3 mil euros.
Foto: picture-alliance/dpa/D. Naupold
"O primeiro homem no Estado"
Na Alemanha, o presidente é o principal cargo estatal, não é à toa que ele é chamado de "o primeiro homem no Estado", mas sua função é, sobretudo, representativa. O chefe de Estado é antes de tudo uma autoridade moral e sua influência vai depender de sua personalidade. Segundo o escritório presidencial, ele recebe um salário de 236 mil euros anuais mais uma ajuda de custo anual de 78 mil euros.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Zinken
Casa, carro e avião
O presidente alemão vive em residência oficial, que hoje está abrigada na Villa Wurmbach no bairro berlinense de Dahlem após reforma do escritório presidencial no Palácio Bellevue (foto); é guiado em limusine blindada com a placa "0-1" e tem uso privilegiado da frota de aviões governamentais. Os benefícios a que têm direito após deixar o cargo foram, no entanto, revisados após recente polêmica.
Foto: picture-alliance/dpa/L. Schulze
Cortes de benefícios
A crítica se dirigia em primeira linha ao ex- presidente Christian Wulff (foto), que renunciou em 2012 após somente 20 meses no cargo, recebendo "soldo honorário" de mais de 200 mil euros anuais. Além de cortes no pessoal do escritório dos ex-presidentes, a partir deste ano, a pensão presidencial vai passar a ser descontada de ganhos provenientes de qualquer atividade que exercer após o mandato.