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Como a China quer se tornar a potência naval do Pacífico

Dang Yuan
11 de março de 2024

De olho em Taiwan e em rivalizar com os EUA, Pequim tem expandido e modernizado sua marinha. Planos incluem novos porta-aviões, alimentando especulações que regime já estaria desenvolvendo embarcações nucleares.

O porta-aviões chinês Liaoning
O porta-aviões chinês Liaoning. Originalmente uma embarcação soviética, navio fez a China entrar numa nova era navalFoto: ANTHONY WALLACE/AFP

A ameaça de uma guerra paira sobre a ilha de Taiwan. A República Popular da China não esconde que deseja a reunificação com o território que considera uma província renegada, se necessário, até mesmo pela força das armas. Na apresentação do relatório anual das ações do governo ao Congresso Nacional do Povo – principal órgão Legislativo da China comunista –, o primeiro-ministro, Li Qiang, reafirmou a determinação de Pequim de "promover resolutamente a causa da reunificação da China".

Segundo ele, isso faz parte da "estratégia geral" do regime. A declaração em si não é nova. No entanto, observadores notaram a ausência da palavra "pacífica" depois de "reunificação", em contraste com as formulações de relatórios de anos anteriores.

Pequim aponta que vê como uma ameaça potencial o fato de que a República da China – como Taiwan se autodenomina oficialmente – recebe garantias de segurança dos Estados Unidos. Cinco porta-aviões dos EUA estão atualmente no Pacífico, de acordo com relatos da mídia americana. Recentemente, políticos da China têm mostrado uma predileção em falar sobre "paz e segurança em ambas as margens". Muitos especialistas estão gradualmente se convencendo de que não se trata mais apenas do Estreito de Taiwan, mas do Oceano Pacífico como um todo.

Com o objetivo de realmente controlar as águas reivindicadas, Pequim tem expandindo significativamente sua marinha, ainda pouco poderosa em comparação com a de outras potências. O ponto mais ao sul do Mar da China Meridional fica a cerca de 2.000 quilômetros do continente. Pequim quer ampliar ainda mais seu raio de ação. E para isso quer contar com mais porta-aviões.

Dois em serviço, mais dois em construção

Dois porta-aviões se encontram atualmente em serviço na marinha chinesa. O primeiro, chamado Liaoning, foi batizado em homenagem a uma província onde o navio de guerra sofreu adaptações. Ele era originalmente um porta-aviões inacabado da antiga marinha da União Soviética.

Batizado inicialmente como Riga, ele começou a ser construído na década de 1980 e, com a dissolução da União Soviética, ficou em poder da Ucrânia. Seu casco inacabado foi comprado pela China em 1998 por meio de um intermediário de Macau por 20 milhões de dólares. Inicialmente, o empresário alegou que desejava converter a embarcação em um hotel e cassino flutuantes. Em 2012, rebatizado como Liaoning, o porta-aviões entrou em serviço na Marinha da China após ser remodelado e modernizado.

Como a China pode resolver a guerra – ou gerar uma maior

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O segundo porta-aviões, chamado Shandong, também recebeu o nome de uma província costeira da China. Com pequenas modificações, a embarcação é uma cópia do Liaoning produzida inteiramente na China. Desde 2019, esse porta-aviões tem navegado principalmente no Mar Meridional da China.

Um terceiro porta-aviões, batizado de Fujian, encontra-se em construção em um estaleiro em Xangai. Como seus dois antecessores, ele tem propulsão convencional, mas, em contraste com os porta-aviões de raiz soviética, o Fujian tem um design inteiramente desenvolvido na China. Espera-se que ele entre em serviço em 2025. Como os outros dois, é movido a combustível comum, o que limita seu raio de ação.

Mas há especulações sobre um quarto porta-aviões, que estaria sendo construído ao lado do Fujian. "Não estou ciente de nenhuma dificuldade técnica com o quarto porta-aviões", disse o almirante Yuan Huazhi indiretamente sobre os rumores a um repórter de Hong Kong, nos bastidores do Congresso Nacional do Povo.

Quando questionado se o porta-aviões já estaria equipado com um sistema de propulsão nuclear, o oficial político do mais alto escalão da marinha chinesa respondeu evasivamente: "informaremos o público no devido tempo". No entanto, a nova embarcação continua não sendo mencionada na imprensa oficial.

O porta-aviões Liaoning é movido a propulsão convencionalFoto: AFP

Mídia reporta dois porta-aviões movidos a energia nuclear

Antes do início do Congresso do Povo, veículos de imprensa de Hong Kong e Taiwan apontaram que dois porta-aviões movidos a energia nuclear estariam com a construção em andamento – simultaneamente em dois estaleiros. Cada um deles teria dois reatores de sal líquido de tório que gerariam energia por meio de fissão nuclear, segundo os jornais.

"A China quer claramente exibir sua forte ambição de defender suas águas com uma marinha moderna", disse Wang Feng, editor do jornal China Times, de Taipei, a capital de Taiwan.

Li Qiang reafirmou a determinação de Pequim de "promover resolutamente a causa da reunificação da China"Foto: Florence Lo/REUTERS

O almirante Yuan permanece no curso oficial: "Estamos construindo porta-aviões, não para nos igualarmos aos EUA; e certamente não para entrar em guerra com os EUA. Queremos usá-los para defender nossa soberania e integridade territorial", disse.

Em contraste com algumas democracias ocidentais, a bancada do governo no Congresso Nacional do Povo não costuma ser contestada ou obrigada a prestar contas. Questionamentos críticos não costumam ser feitos. Os planos do governo são regularmente aplaudidos e ovacionados pelos 2.980 delegados. E, no Grande Salão do Povo, a forte ambição da China de se tornar uma superpotência militar regional fica bastante clara.

Aumento de gastos militares

Em 2024, os gastos militares da China devem aumentar 7,2%, em comparação com o ano anterior, atingindo a marca de 215,5 bilhões de euros (R$ 1,2 trilhão). Se a economia do país registrar um crescimento de 5% no ano corrente, os gastos de defesa no orçamento podem acabar respondendo por 1,2% do produto interno bruto (PIB). De acordo com o Stockholm International Peace Research Institute (SIPRI), uma organização que se dedica à análise de conflitos, isso colocaria a China em segundo lugar no mundo em termos de gastos com defesa, logo atrás dos EUA.

O porta-aviões chinês Fujian em construção. Essa é a primeira embarcação com design 100% elaborado na ChinaFoto: Li Gang/Xinhua/AP/picture alliance

E esses gastos se refletem na marinha. A tecnologia militar mudou drasticamente desde o fim da Segunda Guerra Mundial, aponta Charles Martin-Shields, do Instituto Alemão de Desenvolvimento. Se contar com porta-aviões movidos a energia nuclear, "uma marinha moderna não precisa mais de cadeias de ilhas como bases de suprimentos para reabastecimento a fim de controlar o vasto Pacífico".

Atualmente, no mundo, apenas os EUA e a França têm oficialmente porta-aviões movidos a energia nuclear.

Um motivo para o aumento das recentes tensões militares na região, apontam especialistas, é o fato de que"William" Lai Ching-te, um crítico da China, assumirá a presidência de Taiwan em maio. "Em princípio, nem a China, nem os EUA estão interessados em um conflito militar", diz Hanna Gers, do Conselho Alemão de Relações Exteriores. "Pessoalmente, acho que bloqueios econômicos são mais prováveis. Mas também sei que todos os cenários possíveis estão sendo discutidos".

Os porta-aviões chineses ainda estão se limitando a navegar nas águas territoriais do país. Mas o almirante Yuan já vem insinuando que a marinha chinesa poderá em breve se dirigir a destinos mais distantes. "Os porta-aviões estão sendo construídos para isso".

Um possível teste seria a atual crise no Oriente Médio. Desde que as milícias houthis do Iêmen passaram a atacar cargueiros no Mar Vermelho, a navegação comercial tem sofrido restrições na região.

"As rotas comerciais através do Mar Vermelho são de importância estratégica para o fornecimento de energia da China", aponta o editor Wang, do China Times.

Entretanto, a Marinha da China ainda não parece capaz de realizar operações defensivas de segurança marítima. Mas isso não deixa de ser mais um argumento a favor do aprimoramento das forças navais do país.