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ConflitosSíria

Como a guerra civil destruiu a economia da Síria

Nik Martin
10 de dezembro de 2024

Economia síria sofreu contração de 85% em quase 14 anos de guerra civil, que dizimou a infraestrutura e desvalorizou a moeda. Reconstrução deverá ser longa e dependerá do apoio internacional.

Refinaria de petróleo em chamas na província de Homs, após ataque de insurgentes
Infraestrutura do setor petrolífero foi duramente atingida pelos conflitos Foto: picture alliance / dpa

Em 2011, quando começou a guerra civil na Síria, o Produto Interno Bruto (PIB) do país era de 67,5 bilhões de dólares. A Síria ocupava o 68º lugar entre 196 países na classificação global do PIB, com uma economia comparável à do Paraguai ou da Eslovênia.

No ano passado, o PIB sírio havia caído para o 129º lugar nessa mesma tabela de classificação, tendo encolhido 85%, para apenas 9 bilhões de dólares, de acordo com estimativas do Banco Mundial. O país está, assim, no mesmo nível do Chade e dos territórios palestinos.

Quase 14 anos de conflito, sanções internacionais e o êxodo de 4,82 milhões de pessoas – mais de um quinto da população – afetaram fortemente a economia do que já era, antes da guerra civil, uma das nações mais pobres do Oriente Médio.

Outros 7 milhões de sírios, mais de 30% da população, são deslocados internos, segundo os dados de dezembro da agência de ajuda humanitária das Nações Unidas.

O conflito devastou a infraestrutura, causando danos duradouros aos sistemas de eletricidade, transporte e saúde. Várias cidades, incluindo Aleppo, Raqqa e Homs, foram destruídas.

A moeda síria sofreu forte desvalorização, o que levou a uma enorme queda no poder de compra. Em 2023, o país teve hiperinflação, segundo o Syrian Center for Policy Research (SCPR), uma organização independente de estudos.

Em junho passado, o SCPR afirmou que mais da metade dos sírios vivia na pobreza extrema e era incapaz de assegurar suas necessidades básicas de alimentação.

Os dois principais pilares da economia da Síria – o setor petrolífero e a agricultura – foram dizimados pela guerra. Em 2010, as exportações de petróleo haviam sido responsáveis por cerca de um quarto da receita do governo, e a produção de alimentos contribuiu com um percentual semelhante para o PIB.

O regime do presidente Bashar al-Assad perdeu o controle da maioria de seus campos de petróleo para grupos rebeldes, inclusive a milícia terrorista Estado Islâmico, mas também para as forças lideradas pelos curdos no nordeste do país.

Assim, uma das prioridades na reconstrução da Síria é o governo da província oriental de Deir Zor, que detém cerca de 40% das reservas de petróleo da Síria e vários campos de gás. A cidade de Deir Zor, capital da província, é a maior do leste do país e foi tomada pelos rebeldes curdos em meio à queda do regime de Assad. Os curdos mantêm um governo autônomo no nordeste da Síria.

Debate sobre fim das sanções

E há ainda as sanções econômicas internacionais, que restringiram severamente a capacidade do governo de exportar petróleo, grãos e algodão. Com a produção de petróleo reduzida a menos de 20 mil barris por dia nas áreas controladas pelo regime, o país tornou-se altamente dependente de importações do Irã, que era um dos principais aliados do regime.

O debate sobre o fim das sanções à Síria já começou. O especialista Delaney Simon, da organização independente International Crisis Group (ICG), voltada à prevenção e resolução de conflitos armados, afirmou que a Síria é um dos países mais sancionados do mundo e que deixar essas restrições em vigor equivale a "puxar o tapete da Síria no momento em que ela tenta se levantar".

Sem o alívio das restrições, os investidores continuarão evitando o país, e as agências de ajuda humanitária poderão ficar receosas em fornecer ajuda humanitária vital à população.

Governo indicado por islamistas

Alguns analistas alertam que pode levar quase dez anos para que o PIB da Síria retorne ao nível anterior à guerra civil e duas décadas para que o país seja totalmente reconstruído. E essas perspectivas podem piorar ainda mais se houver mais instabilidade política.

Assim, antes da começar a enorme tarefa de reconstruir as cidades, a infraestrutura e os setores petrolífero e agrícola, é preciso clareza sobre o novo governo da Síria.

Nesta terça-feira (10/12), os rebeldes que derrubaram Assad, liderados pelo grupo islamista Organização para a Libertação do Levante (Hayat Tahrir al-Sham, ou HTS), anunciaram que o governo interino será comandado por Mohammed al-Bashir, que foi nomeado primeiro-ministro. Bashir disse que foi incumbido de ficar à frente do governo sírio até 1 de março. Em janeiro Bashir havia sido nomeado chefe do "Governo de Salvação", a administração da província de Idlib e de áreas adjacentes, ligada ao HTS.

O próprio HTS é alvo das rigorosas sanções internacionais, pois é classificado como uma organização terrorista pelos Estados Unidos e pelas Nações Unidas. Nações ocidentais e árabes temem que o grupo tente impor um governo fundamentalista islâmico na Síria.

A agência de notícias Associated Press informou que o governo Biden estava avaliando a possibilidade de retirar o HTS da lista de grupos terroristas, citando dois altos funcionários da Casa Branca. Um deles justificou a decisão afirmando que o HTS é um componente importante no futuro a curto prazo da Síria.

O presidente dos EUA, Joe Biden, disse que os Estados Unidos vão dialogar com todos os grupos sírios, também no âmbito do processo liderado pelas Nações Unidas, para que haja uma transição rumo a um país "independente e soberano", com uma nova Constituição.

Biden alertou que a Síria está enfrentando um período de risco e incerteza e que os Estados Unidos ajudarão onde puderem.

A União Europeia comunicou que não está em contato com o HTS ou seus líderes e que vai avaliar não só as palavras, mas também as ações do grupo.

O enviado da ONU para a Síria, Geir Pedersen, declarou que os grupos rebeldes "têm enviado boas mensagens" sobre unidade nacional e inclusão, mas reconheceu que o principal desses grupos é considerado terrorista pela ONU. "Falando francamente, também vimos em Aleppo e Hama coisas tranquilizadoras."

Lento retorno ao cotidiano

Um toque de recolher nacional ordenado pelos rebeldes levou ao fechamento da maioria dos estabelecimentos comerciais em toda a Síria nesta segunda-feira, mas bancos e o comércio começam a reabrir nesta terça. A moeda da Síria continua sendo usada.

O Ministério do Petróleo pediu a todos os funcionários do setor que se dirigissem a seus locais de trabalho a partir de terça-feira, acrescentando que seria fornecida proteção para garantir sua segurança.

O chefe da ajuda humanitária das Nações Unidas, Tom Fletcher, afirmou que sua agência fará tudo o quer puder para apoiar as pessoas necessitadas, incluindo centros de recepção e a distribuição de comida, água, combustível, tendas e cobertores.

Como vários países europeus, inclusive a Alemanha, disseram que suspenderiam a análise de pedidos de refúgio de cidadãos sírios, a agência de refugiados da ONU Acnur pediu "paciência e vigilância" na questão do retorno dos refugiados.

A Áustria foi mais longe do que a maioria dos países da Europa, afirmando que estava preparando um "programa ordenado de repatriação e deportação" para os sírios.

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