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Como a UE quer combater a evasão das sanções contra Moscou

22 de março de 2023

Desde o começo da invasão da Ucrânia, União Europeia impôs dez pacotes de medidas punitivas. Mesmo assim, produtos sancionados conseguem chegar do bloco à Rússia.

Ministro alemão da Economia, Robert Habeck, fala em púlpito
Ministro alemão da Economia, Robert Habeck, afirma que seu país quer dificultar a fuga das sanções contra a RússiaFoto: Wolfgang Kumm/picture alliance/dpa

Desde o começo da invasão da Ucrânia, em 24 de fevereiro de 2022, a União Europeia impôs dez pacotes de sanções contra a Rússia. Estes incluem listas de indivíduos, proibições de exportação e importação, e medidas setoriais envolvendo bancos e transportes, assim como a proibição de voos russos no espaço aéreo da UE.

Entre as sanções mais importantes, estão a proibição do transporte de petróleo bruto russo por via marítima e um teto para o preço do petróleo bruto e de produtos petrolíferos. Ainda assim, apesar dos extensos pacotes de sanções, a economia russa não se contraiu tanto quanto o previsto em 2022.

Para Robin Brooks, economista-chefe do Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês), a razão para isso é a falta de sanções numa área importante: "Quando o Ocidente impôs sanções à Rússia, ele eliminou a energia por medo de que um embargo total pudesse fazer os preços do petróleo dispararem, precipitando a economia global na recessão."

As estimativas só para as receitas inesperadas do petróleo foram de 215 bilhões de dólares (R$ 1,3 trilhão), registra Brooks. "Isso não significa que as sanções não funcionaram", ressalta Brooks: a exclusão da  energia do pacote teve consequências graves, proporcionando à Rússia "um monte de dinheiro".

A discussão agora está se deslocando para o cumprimento das sanções, o que é, segundo Maria Demertzis, do think tank Bruegel de Bruxelas, um "grande problema".

Exportações da UE para a Rússia

O cumprimento das sanções também deve incluir instrumentos de repressão a tentativas de contornar essas sanções porque, de alguma forma, os produtos da UE sob proibição de exportação ainda parecem encontrar um jeito de chegar à Rússia.

"Os dados de comércio exterior disponíveis para nós indicam que os bens sancionados pela UE são em grande parte exportados da UE para certos terceiros países, e deles para a Rússia", relatou o Ministério da Economia da Alemanha, em documento publicado no fim de fevereiro.

Segundo o chefe da pasta, Robert Habeck, que apresentou o texto à imprensa, nesse âmbito estão sendo examinados produtos de alta tecnologia e outros bens de uso duplo que podem ser usados para fins militares.

As sanções atuais proíbem a exportação de tecnologia para a Rússia – como semicondutores avançados, componentes eletrônicos e softwares. Também está banida a exportação de bens de uso duplo, como drones ou ferramentas de criptografia, que podem ser empregados tanto para fins civis como militares.

Ao apresentar suas propostas para a mídia sobre um cumprimento mais severo das sanções, Habeck disse que "evasões óbvias das sanções" também são verificadas pela Alemanha, evitando citar terceiros países nem empresas envolvidas.

Envolvimento de países terceiros

Sem registro oficial dos suspeitos, diz Demertzis, "a grande suspeita cairia sobre países que não sancionaram a Rússia". Em sua opinião, dois grandes países são importantes nesse aspecto: Turquia e China.

Beata Javorcik, economista-chefe do Banco Europeu para Reconstrução e Desenvolvimento (Berd) e coautora de um estudo sobre dados comerciais, cita mais três nações: Armênia, Cazaquistão e Quirguistão.

"Olhando-se as exportações agregadas da União Europeia para a Rússia, houve uma queda dramática no volume dessas exportações, em cerca de 60%. Ao mesmo tempo, a Europa Ocidental aumentou as exportações para países como Armênia, Cazaquistão e Quirguistão."

Javorcik explica que ocorrem apenas checagem mínimas quando as mercadorias entram nesses países, já que eles integram a União Aduaneira da Eurásia (UAE), juntamente com Belarus e Rússia.

"Isso sugere que as exportações que estavam indo diretamente para a Rússia agora podem estar sendo intermediadas por esses países", diz Javorcik. Demertzis destaca ser muito difícil encontrar dados sobre isso, por ser algo que está sendo ocultado deliberadamente.

Outra dificuldade, segundo Javorcik. é que os dados comerciais não indicam se as empresas sabem que os produtos acabam na Rússia. Essa, porém, é uma área que os Estados-membros da UE e a Comissão Europeia estão atualmente analisando.

Enviado da UE para sanções, David O'Sullivan, participa de missão para evitar evasão das medidas contra MoscouFoto: Getty Images/AFP/M. Ngan

Cooperação entre UE e membros do bloco

Em declaração por escrito, o Ministério da Economia alemão confirma que a Comissão Europeia e o governo alemão monitoram de perto os padrões comerciais no tráfego direto e indireto de mercadorias entre a Rússia e os Estados individuais da UE, visando obter indicações de remessas de evasão e outras violações de sanções.

Os resultados gerais e específicos dessas observações, entretanto, ainda não se encontram disponíveis, acrescenta o ministério: "Estamos procurando exemplos de mudanças significativas nos fluxos comerciais, que não são. em si, indício de evasão, porque também podem ser resultado de diversificação comercial genuína", comenta o enviado da UE para sanções, David O'Sullivan. De particular interesse, acrescentou, são os países vizinhos da Rússia e com quem o comércio russo aumentou significativamente.

Como a implementação das sanções cabe aos países-membros da UE, a Comissão Europeia desempenha um papel de coordenação. O'Sullivan assumiu o cargo de enviado especial em janeiro: "Meu papel é alcançar países terceiros onde acreditamos que pode haver riscos de evasão", explica, referindo-se aos Estados não alinhados com as sanções.

Pressão crescente

Não é apenas a UE que vem tentando dialogar sobre esse problema com países terceiros, mas também os EUA. Em janeiro, a Turquia estava entre um grupo de países visitados pelo subsecretário dos EUA para Terrorismo e Inteligência Financeira, Brian Nelson.

Membro da Otan, Ancara tem estado em destaque há algum tempo e agora parece ter tomado medidas para impedir a evasão de sanções. Conforme relatado pela agência Bloomberg, o país interrompeu o trânsito de mercadorias sancionadas na UE ou nos EUA em 1º de março. Nem a Turquia nem nenhum dos outros países mencionados neste artigo reagiram ao pedido de comentários da DW.

O compromisso político para lidar com a questão da evasão de sanções é forte. Em declaração conjunta após uma reunião há duas semanas, a UE e os EUA se prometeram a aplicar sanções "agressivamente”, para deter e, por fim, acabar com a evasão, acrescentando que tomariam "novas medidas juntos para atingir outros atores de países terceiros em todo o mundo”.

O enviado da UE para as sanções parece estar desempenhando seu papel nessa abordagem. Até agora, O'Sullivan viajou para a Turquia, fez uma visita conjunta aos Emirados Árabes Unidos (EAU) com seus colegas dos EUA e do Reino Unido, e em breve viajará para Quirguistão, Cazaquistão e Uzbequistão para abordar a situação. Entretanto ele enfatiza que nada disso quer dizer que esses países tenham sido identificados como facilitadores concretos para o contorno de sanções.

A maneira como cada Estado-membro pune as empresas por contornarem as sanções, varia. Na Alemanha, as evasões podem resultar em inquérito criminal. "Se surgirem indicações concretas desse tipo a partir de estatísticas comerciais ou outras fontes de informação, elas serão encaminhadas às autoridades responsáveis, que então iniciarão um processo criminal", esclarece o Ministério da Economia alemão.

"Até que um possível julgamento seja iniciado, as informações sobre violações da lei e os resultados das investigações devem ser tratados confidencialmente", acrescenta a pasta. O ministro Habeck também elaborou propostas destinadas a dificultar a evasão das sanções, que estão sendo discutidas com parceiros europeus.

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