Imprensa alemã obtém acesso exclusivo à investigação sobre o envolvimento da montadora com o regime: cooperação era maior do que se pensava e teria tido o conhecimento da chefia da companhia em Wolfsburg.
Anúncio
Uma força-tarefa investigativa formada pelo jornal Süddeutsche Zeitung e as emissoras estatais NDR e SWR obteve acesso exclusivo à investigação externa, ordenada pela própria Volkswagen, sobre o papel de sua filial brasileira na ditadura militar (1964-1985).
Segundo reportagens publicadas no domingo (23/07), a filial brasileira da montadora colaborou de forma mais ativa do que antes se imaginava com os militares na perseguição de opositores do regime.
Análise extensa de documentações mostrou quão participativo foi o papel da Volkswagen do Brasil e sugere que a sede em Wolfsburg tomou conhecimento disso - o mais tardar em 1979.
Os repórteres alemães analisaram documentos corporativos localizados na filial brasileira e na sede alemã, papéis classificados como secretos pelo Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e relatórios confidenciais do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha.
"Operários eram presos na planta da fábrica e, em seguida, torturados: a colaboração da Volkswagen com a ditadura militar brasileira foi, aparentemente, mais ativa do que antes presumido", escreveu o Süddeutsche Zeitung.
Os repórteres alemães também tiveram acesso às atas de investigação do Ministério Público de São Paulo. Além disso, eles realizaram entrevistas com alguns ex-funcionários da Volkswagen do Brasil – muitos confirmaram que foram detidos na fábrica em 1972. Eles faziam parte de um grupo oposicionista e distribuíram folhetos do Partido Comunista e organizavam reuniões sindicais.
Os veículos de comunicação alemães corroboraram que a filial brasileira espionou seus trabalhadores e suas ideias políticas, e os dados acabaram em "listas negras" em mãos do Dops. As vítimas lembraram como foram torturadas durante meses, após terem se unido a grupos opositores.
"A Volks roubou dois anos da minha vida", disse Lúcio Bellentani, ex-operário da montadora e agora com 72 anos, que afirmou ter sofrido oito meses de tortura e ter passado outros 16 meses na prisão. "Indiretamente a Volkswagen foi responsável por numerosos casos de tortura e perseguição. A Volkswagen deve ter a dignidade de reconhecer sua responsabilidade por esses atos."
Espionagem e colaboração com Dops
Em 2016, a montadora alemã nomeou para uma investigação sobre seu passado o historiador Christopher Kopper, que confirmou a existência de "uma colaboração regular" entre o departamento de segurança da filial brasileira e o órgão policial do regime militar.
"O departamento de segurança atuou como um braço da polícia política dentro da fábrica da Volkswagen", antecipou Kooper, pesquisador da Universidade de Bielefeld, à imprensa alemã. Segundo ele, a montadora "permitiu as detenções" e pode ser que, ao compartilhar informações com a polícia, "contribuísse para elas". Ele sugeriu que a montadora alemã peça desculpas aos ex-funcionários afetados pela conduta.
De acordo com protocolos internos da Volkswagen, as chefias da montadora na Alemanha e em São Paulo trocaram memorandos referentes às detenções de funcionários. O conselho da multinacional tomou conhecimento da conduta em São Bernardo do Campo, cidade satélite de São Paulo, o mais tardar em 1979, quando funcionários brasileiros viajaram à Alemanha para confrontar o então presidente da companhia, Toni Schmücker.
A sede da montadora se negou a comentar o conteúdo das alegações e reiterou ter encarregado o historiador Kooper de investigar e apresentar um parecer sobre a questão. Kooper apresentará suas conclusões até o final do ano.
Galpões cedidos aos militares
Há quase dois anos foi aberta em São Paulo uma investigação sobre a Volkswagen do Brasil para determinar a responsabilidade da empresa na violação dos direitos humanos durante a ditadura de 1964 a 1985.
Conforme estabeleceu a Comissão Nacional da Verdade (CNV), que examinou as violações dos direitos humanos cometidas pela ditadura militar, muitas empresas privadas, nacionais e estrangeiras, deram apoio tanto financeiro como operacional ao regime militar.
No caso da Volkswagen, a comissão constatou que alguns galpões que a empresa tinha numa fábrica de São Bernardo do Campo foram cedidos aos militares, que os usaram como centros de detenção e tortura. Além disso, a comissão sustentou que encontrou provas que a multinacional alemã doou ao regime militar cerca de 200 veículos, depois usados pelos serviços de repressão.
PV/abr/ots
60 anos da Kombi no Brasil
Com mais de 1,5 milhão de unidades produzidas, a Kombi tem a história de maior longevidade da indústria automobilística mundial. Em 2017, a célebre van completa 60 anos de produção no Brasil. E a VW anuncia um sucessor.
Foto: Caroline Gutman
Ídolo do transporte
Desenvolvida pelo holandês Ben Pon, a Kombi foi lançada na Alemanha em 1950. Sete anos mais tarde, há 60 anos, a VW dava início à produção de sua perua no Brasil. Para comemorar a data, este ídolo do transporte está recebendo em 2017 diversas homenagens, com vários desfiles de Kombis no Sambódromo de São Paulo. A foto mostra miniaturas dos primeiros modelos da van no Museu da VW em Wolfsburg.
Foto: DW/Carlos Albuqerque
Primeiro carro nacional
A partir de 1953, Fuscas e Kombis passaram a ser montados no Brasil com peças importadas da Alemanha. Em setembro de 1957, a Kombi se tornou, mesmo antes do Fusca, o primeiro carro produzido no país pela fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo. Começou assim a história de maior longevidade da indústria automobilística mundial. Na foto, a primeira Kombi com 50% de componentes nacionais.
Foto: Volkswagen do Brasil
Primeiro fora da Alemanha
Quatro anos mais tarde, em 1961, a Kombi já tinha 95% de componentes nacionais. O utilitário da VW foi o primeiro veículo produzido pela marca no Brasil e também o primeiro fora da Alemanha. Na foto, uma Kombi fabricada pela Volkswagen do Brasil em 1959. A primeira versão brasileira tinha um motor de quatro cilindros refrigerado a ar – mas que, apesar da robustez, tinha apenas 30 cv de potência.
Foto: Volkswagen do Brasil
Mil e uma utilidades
Na Alemanha, o modelo VW Bus T2 ficou conhecido por "Bulli" e, no Brasil, por "Kombi". Ele se destacou pela versatilidade, sendo adotado tanto para o transporte de passageiros quanto de cargas, como este utilitário lotado de cadeiras de praia.
Foto: Caroline Gutman
Veículo combinado
O nome Kombi é uma abreviação, adotada no Brasil, do termo em alemão Kombinationsfahrzeug, que em português significa "veículo combinado" ou "combinação do espaço para carga e passeio". Com amplo espaço interno e capacidade para transportar uma tonelada de carga, a Kombi foi amplamente aceita no mercado nacional e, a partir de 1970, passou a ser exportada para mais de cem países.
Foto: VW Museum Wolfsburg
Fórmula de sucesso
Segundo a Volkswagen do Brasil, um dos pontos fortes da comercialização da Kombi foi sua fácil adaptação para os mais diversos tipos de uso: além de ter presença assídua em feiras e canteiros de obra, a Kombi também foi usada como veículo de lazer, biblioteca circulante, carro funerário, lanchonete etc. Talvez a versão mais lembrada seja a van escolar. Na foto, a Kombi funciona como ambulância.
Foto: cc/by/sa/Mr.choppers
Resistente, simples e econômico
"Engenharia alemã encontra modo de vida brasileiro". Essa parece ter sido a fórmula do sucesso do utilitário da VW no Brasil. Resistente, econômico e de mecânica simples e fácil manobra, mais de 1,55 milhão de unidades da Kombi foram produzidas no Brasil entre setembro de 1957 e julho de 2013. A foto mostra a linha de montagem da Kombi na fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo.
Foto: Volkswagen do Brasil
Diversas modernizações
Em seus 56 anos de vida, a Kombi passou por diversas modernizações. Em 1992, tornou-se o primeiro utilitário nacional equipado com catalisadores. Em 1997, chegou ao mercado com teto mais alto, porta lateral corrediça e sem parede divisória atrás do banco dianteiro. Além das versões com janelas de vidro ou furgão, a Kombi também foi fabricada como pick-up, com cabine simples (foto) ou cabine dupla.
Foto: cc/by/sa/Rafael Ruivo
Mais flexível
No final de 2005, a Kombi se tornou mais flexível, recebendo um motor capaz de rodar com gasolina, etanol ou com a mistura dos dois. Além disso, com resfriamento a líquido, o motor se tornou até 34% mais potente e cerca de 30% mais econômico do que o antecessor, refrigerado a ar. Na foto, pode-se ver uma Kombi 2006 com motor 1.4 Total Flex.
Foto: Volkswagen do Brasil
Relação custo-benefício
A foto mostra um modelo 2005 com motor refrigerado a ar (esq.) ao lado de um modelo 2006 com motor com refrigeração a água, mais econômico, mais silencioso e mais rápido. Para muitos, a fórmula do sucesso da Kombi é simples: durante décadas, nenhum modelo de utilitário brasileiro apresentou uma relação custo-benefício tão boa. Com o passar dos anos, no entanto, a idade da Kombi começou a pesar.
Foto: cc/by/sa/JasonVogel
Peso dos anos
Apesar da robustez, a Kombi se tornou ultrapassada frente às vans e minivans atuais, levando a Volkswagen a anunciar o fim de sua fabricação no Brasil. Em parte, o culpado também foi o seu sucesso, já que em décadas passadas a marca alemã evitou adotar mudanças substanciais no popular veículo. O golpe de misericórdia veio com a obrigatoriedade dos freios ABS e airbags, a partir de 2014.
Foto: Volkswagen do Brasil
Saia e blusa
Marcando o encerramento da produção de um dos modelos de maior sucesso da marca no Brasil, a VW lançou em agosto de 2013 a Kombi Last Edition, com produção limitada a 1.200 unidades, vendidas na época a 85 mil reais cada. A edição trouxe itens exclusivos, como a pintura azul e branca, tipo "saia e blusa", e elementos que remetem às inúmeras versões do veículo fabricadas no país.
Foto: Volkswagen do Brasil
Sucesso de exportação
Hoje, na Alemanha, não faltam anúncios para venda de "Velhas Senhoras" da VW, importadas do Brasil: uma Kombi fabricada em 1975 pode ser encontrada por 15 mil euros, enquanto um modelo "Last Edition", fabricado em 2013, não sai por menos de 40 mil euros (cerca de 135 mil reais). Os altos custos de importação e licenciamento parecem não espantar os nostálgicos colecionadores alemães.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Stratenschulte
VW Buzz
Atualmente, a montadora de Wolfsburg trabalha numa nova edição da Kombi: o VW I.D. Buzz, com motor elétrico, conectividade e direção automatizada com sensores de radar e ultrassom, como também diversas câmeras laterais. O protótipo do micro-ônibus foi apresentado no Salão do Automóvel de Detroit em janeiro de 2017. Com velocidade máxima de 160 km/h, ele deverá ser lançado no mercado em 2022.