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Como as tarifas de Trump atingem a China

Arthur Sullivan av
16 de maio de 2019

As exportações chinesas para os EUA estão sujeitas a tarifas desde 2018. A Casa Branca afirma que o efeito é devastador, enquanto Pequim aposta na própria capacidade de resistência. A verdade está em algum lugar no meio.

Presidente Xi Jinping recebe Trump na China em novembro de 2018
Presidente Xi Jinping (esq.) recebeu Trump em novembro de 2018Foto: Getty Images/T. Peter

Na última década, o crescimento da economia chinesa vem se desacelerando, lenta porém consequentemente. De um acréscimo anual do PIB de 12% em 2010, agora essa taxa está reduzida a pouco mais da metade. Em 2018 o crescimento foi de 6,6%, o que seria motivo de comemoração em praticamente qualquer grande economia ocidental. Para a China, porém, é o menor desde 1990.

Em 2018, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, também começou a impor tarifas sobre as importações chinesas, uma prática que ele mantém, tendo há apenas poucos dias aplicado uma nova carga de sanções. Allan von Mehren, analista-chefe do Danske Bank, vê uma relação apenas parcial entre os dois fenômenos.

"Acho que a desaceleração é provavelmente 50% por causa da guerra comercial e 50% devido à repressão ao shadow banking, que prejudicou o canal de crédito para o setor privado", diz. Em sua opinião, o maior impacto das tarifas sobre a economia chinesa foi a incerteza que criaram e o subsequente dano ao clima de negócios: "Isso deu um golpe nos gastos dos consumidores e nos investimentos privados, também no setor de exportações."

Os dados econômicos da China divulgados nesta quarta-feira (15/05) não foram encorajadores: o crescimento das vendas a varejo (de ano a ano) caiu para o nível mais baixo desde 2003, confirmando a afirmativa de Von Mehren de que os consumidores estão se retraindo. As cifras sobre a produção industrial também acusam problemas: aqui, o crescimento caiu significativamente em abril, em relação ao mês anterior.

Mas no total os dados econômicos sugerem que as tarifas de Trump causaram poucos danos diretos à economia chinesa, além do mencionado impacto sobre o clima de negócios. Segundo Von Mehren, esse efeito foi abrangente, com exceção do setor de construções, em que os pacotes de estímulo do governo ajudaram a manter robustas as vendas de casa.

Entretanto o próprio governo chinês reconheceu o impacto do conflito comercial com os EUA sobre sua economia. Em março, ele revisou para 6% a 6,5% sua meta de crescimento para 2019, com o primeiro-ministro Li Keqiang apontando uma "profunda mudança em nosso ambiente externo", numa clara referência à problemática comercial com os EUA.

Desde julho, quando as tarifas americanas começaram a ter pleno efeito, Pequim adotou medidas de incentivo fiscal para impulsionar investimentos e consumo. Além disso, vem tentando melhorar o acesso ao crédito para o setor privado, após a devassa no sistema de shadow banking, o setor de empréstimos não regulado que opera fora do sistema bancário regular.

O fato de a economia chinesa continuar esfriando diante de tais medidas indica que Trump confrontou a segunda maior economia do mundo com desafios significativos. Um outro risco apontado por Von Mehren, baseado em "indícios anedóticos", é algumas companhias transferirem sua produção da China para outros países asiáticos, como o Vietnã.

Esse processo começou com os painéis solares, passando para o aço e alumínio. Agora, praticamente todos os 476 bilhões de dólares em mercadorias exportadas anualmente da China para os EUA estão sujeitos a algum tipo de tarifa, de 10% para cima.

As tarifas, no entanto, não são automaticamente pagas pelos exportadores chineses: na maioria das vezes os importadores americanos optam por arcar com o custo adicional. Embora o volume de exportações tenha começado a decair em julho, quando as sanções entraram em vigor, a China ainda vende três vezes mais produtos para os EUA do que vice-versa.

O fato de as firmas americanas seguirem comprando grandes volumes de produtos chineses talvez explique por que Trump tentou aumentar a pressão sobre o país asiático nas últimas semanas. Sua tática mais recente foi declarar "emergência nacional" os sistemas de telecomunicações feitos por "adversários estrangeiros", numa óbvia alusão à Huawei.

Apesar de tudo, porém, a China é capaz de encarar a escalada de hostilidades comerciais, afirma Allan von Mehren: "Não acho que para a China seja urgente tomar uma resolução, ou que ela vá fazer concessões extras por causa do aumento de pressão. Acho que agora ela está se preparando para uma longa guerra comercial, e acredita que tem mais resistência."

Embora convencido que a necessidade de pacotes de incentivo governamental tenha atrasado alguns objetivos chineses de longo termo, como o abandono gradual das empresas e projetos de infraestrutura estatais, em diversos aspectos ele considera o conflito comercial um "presente estratégico" para a China, por ter evidenciado a necessidade de certas reformas econômicas no país.

"O que mais importa para a perspectiva de futuro são reformas, educação e investimento para modernizar a produção. Enquanto a China se mostrar comprometida com isso, acho que a perspectiva ainda é amplamente positiva."

Para além da pura economia, uma preocupação mais profunda é a deterioração generalizada das relações sino-americanas. "O sentimento antichinês parece estar crescendo rápido nos EUA, e temo que o país comece a desafiar a China em todos os fronts", aponta o analista-chefe do Danske Bank.

Se isso significar alguma forma de conflito militar, seja em torno do Taiwan ou do Mar da China Meridional, o atual conflito comercial até parece algo inofensivo, em comparação.

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