Presidente dos EUA retoma fórmula de sua bem-sucedida campanha de 2016 ao recorrer à imigração ilegal para mobilizar base republicana. Estratégia não ajuda em nada a atacar problema pela raiz nos países de origem.
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"Pensem nas eleições", disse o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a seus 55 milhões de seguidores no Twitter nesta terça-feira (23/10), durante uma sequência de postagens sobre a caravana de migrantes que atravessa o México rumo à fronteira com os EUA.
Se havia alguma dúvida de que Trump tentaria tirar proveito das impressionantes imagens de milhares de migrantes latino-americanos enfrentando condições brutais, caminhado centenas de quilômetros por dia na tentativa de chegar aos EUA, a série de tuítes presidenciais dos últimos dias deixou isso bem claro.
Utilizando jargões militares para descrever a caravana e alegando – sem apresentar provas – que criminosos e "pessoas desconhecidas do Oriente Médio" estariam entre os migrantes, o presidente culpou a oposição democrata e os tribunais americanos por bloquearem políticas migratórias mais rígidas e os governos de El Salvador, Guatemala e Honduras, de onde vieram a maioria dos que integram a marcha, por não impedirem as pessoas de partirem rumo aos EUA.
"O timing não poderia ser um presente maior para o presidente Trump e o Partido Republicano, com a aproximação das eleições legislativas de meio de mandato", avalia Cynthia Arnson, diretora do programa para a América Latina do Centro Wilson. Ela observa que, antes do pleito de novembro, ao associar imigrantes a crimes, o presidente simplesmente voltou a utilizar a cartilha de sua bem-sucedida campanha eleitoral de 2016.
"Acho que é exatamente por isso que o presidente Trump está indo à sua conta no Twitter e fazendo todos os tipos de comentários duros, para apelar à sua base e alimentar esse tipo de medo", disse Arnson. "Há uma mensagem consistente desse governo para equiparar os migrantes aos crimes violentos, embora as evidências mostrem exatamente o contrário."
É improvável que o controverso esforço do presidente de distorcer o flagelo de milhares de migrantes – desesperados o bastante para tomar a dura decisão de deixar suas casas e partir numa árdua jornada na esperança de encontrar porto seguro em solo americano – possa influenciar os eleitores indecisos. Poderá, no entanto, servir para mobilizar o cerne de sua base de apoio, o que numa eleição apertada pode significar um impulso para a vitória.
"Essa eleição será ganha pelo comparecimento às urnas", avalia Karen Alter, cientista política da Universidade Northwestern. "Trump tenta acionar os botões do medo para ativar uma área onde ele é visto como homem forte, principalmente por seu objetivo de reprimir a imigração, na esperança de que possa influenciar o comparecimento dos eleitores."
Um levantamento realizado pelo Centro de Pesquisas Pew, divulgado no início deste mês, corrobora a tese de que essa estratégia poderá dar novo impulso à base republicana. "A imigração ilegal foi apontada como o principal problema nacional entre os eleitores republicanos, mas, entre os democratas, está situada entre o menos relevante em meio a 18 outros temas", diz a pesquisa.
Imigrantes viajam no "trem da morte" para chegar aos EUA
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A tentativa de Trump de transformar a caravana de migrantes em um tema urgente de segurança nacional poderá trazer votos republicanos, mas, além de ser dissimulada, não ajuda em nada a resolver a crise migratória, que está em curso desde 2014, quando os primeiros grupos de menores desacompanhados entraram no país durante o governo do ex-presidente Barack Obama.
"A questão principal é o desmoronamento de governos na América Latina, que gera crises de refugiados", observou Alter.
Em El Salvador, Honduras e outros países, a questão da segurança se agravou de tal maneira que muitas famílias simplesmente sentem que não podem mais permanecer por lá. Com governos incapazes de providenciar sequer a mais básica proteção às pessoas, forças políticas corruptas e grupos ultraviolentos e cartéis de drogas ocupando o vácuo deixado pelas autoridades, a decisão de partir se torna fácil.
"Eles vão embora em razão de um desespero total", afirma Alter. "E, por partirem motivados pelo desespero, nada do que o presidente Trump alardear durante seus ataques de raiva – como 'Vou cancelar a ajuda humanitária e construir um muro' – poderá deter as pessoas desesperadas que enfrentam, literalmente, situações de vida ou morte."
Além disso, cortar a ajuda humanitária a países pobres como El Salvador, Guatemala e Honduras poderá apenas aumentar os problemas e, potencialmente, levar um número ainda maior de pessoas a procurar refúgio os EUA.
"Não há nada mais contraprodutivo no médio e longo prazo, uma vez que a única solução duradoura para a crise migratória se encontra na própria região e na mudança das condições de miséria e violência que continuam a fazer com que as pessoas fujam ao perceberem que não há futuro ou segurança dentro de suas próprias fronteiras", afirma Arnson.
Tal iniciativa, segundo as especialistas, exigiria uma mudança das políticas americanas em relação a uma região que vêm sendo ignorada há muito tempo, em detrimento dos países afetados.
"Precisamos prestar uma atenção bem maior ao nosso próprio quintal, mais do que vínhamos fazendo recentemente", observou Alter. "A boa notícia é que, na verdade, não existem terroristas fundamentalistas islâmicos na América Latina. Estas são, na realidade, crises internas para as quais há chances reais de encontrar soluções."
No entanto, em vez de se concentrar na tarefa mais complicada de lidar com as raízes do problema da atual crise migratória, Trump optou pelo caminho bem mais conveniente de "lançar essas bombas de caos para distrair a imprensa e o público americano e tentar motivar as pessoas a comparecer às eleições de novembro", disse Alter.
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Em seu mandato, o ex-presidente americano Donald Trump prometeu construir um muro entre EUA e México. Mas, muito antes disso, esta fronteira já havia sido foco de filmes espetaculares. Veja a lista.
Foto: picture-alliance/United Archives/TBM
John Wayne em guerra
Em meados do século 19, EUA e México entraram em guerra sobre o estado do Texas, que pertencia aos mexicanos, mas foi anexado pelos americanos. A longa disputa foi muitas vezes retratada por Hollywood nos faroestes que detalhavam os violentos conflitos entre colonos americanos e o Exército mexicano. Entre os mais espetaculares está "Álamo" (1960), estrelado por John Wayne e Richard Widmark.
Foto: picture-alliance/United Archives/TBM
Dietrich e a fronteira
Em 1958, Marlene Dietrich fez uma breve aparição no brilhante suspense "A marca da maldade". O diretor Orson Welles, que teve o papel principal no filme, fez da região fronteiriça entre México e EUA o cenário para falar sobre corrupção, tráfico de drogas e outros crimes.
Foto: picture-alliance/United Archives/IFTN
"Rio Bravo"
Quando John Wayne apareceu em "Álamo", a grande era do faroeste americano estava quase no fim. Mas, quando o gênero cresceu na década de 1950, muitos faroestes se passaram na fronteira entre Texas, Novo México e Arizona de um lado, e o México, do outro. Um marco simbólico era o rio Grande que, localizado nesta fronteira, rendeu o título do legendário filme do diretor John Ford, de 1950.
Foto: picture-alliance/Mary Evans Picture Library
A fronteira em faroestes posteriores
No entanto, a fronteira entre os dois países conseguiu manter sua importância em numerosos faroestes lançados posteriormente. A região desempenhou um papel de destaque em "Meu ódio será tua herança" (1969), do diretor Sam Peckinpah, um épico do faroeste selvagem com muito sangue e que enfoca a ilegalidade em uma terra esquecida.
Foto: Imago/Entertainment Pictures
Variações modernas
O diretor americano Robert Anthony Rodriguez tem uma paixão pela região de fronteira, o que talvez se deva às suas raízes mexicanas. Muitos de seus filmes reproduzem o choque de culturas nesta região fronteiriça. Seu filme "Um drink no inferno", de 1996, viu Quentin Tarantino e George Clooney encenando irmãos que roubam bancos e que tentam fugir para o México.
Foto: picture-alliance/United Archives
Não há lugar para envelhecer
Ganhador de vários Oscars em 2008, entre eles o de melhor filme e direção, "Onde os fracos não têm vez" foi dirigido pelos irmãos Joel e Ethan Coen. A produção aborda as drogas, máfia, assassinatos e fraudes. O filme se passa na fronteira entre EUA e México – um lugar perigoso, onde a morte é comum e poucos envelhecem.
Foto: picture-alliance/dpa/Paramount Pictures
Ao sul de Albuquerque
Albuquerque, no Novo México, é o cenário da extremamente popular série de televisão "Breaking Bad", que foi produzida entre 2008 e 2013. Ela enfoca histórias na região envolvendo drogas. Ao sul de Albuquerque, fica a lendária fronteira entre Estados Unidos e México.
Foto: Frank Ockenfels 3/Sony Pitures
O lado obscuro do comércio
No filme "Desaparecidos" (2007), o diretor alemão Marco Kreuzpaintner escolheu contar a história de crianças mexicanas que atravessam a fronteira para os Estados Unidos como parte do tráfico de escravos sexuais. A estrela de Hollywood Kevin Kline desempenhou o papel principal.
Foto: picture-alliance/kpa
Guerra de drogas na fronteira
"Sicario: terra de ninguém" examina o impacto das guerras do narcotráfico na área de fronteira entre Arizona e México. O cineasta canadense Denis Villeneuve fez o agitado suspense em 2015, tendo Benicio del Toro no papel principal. A obra foi filmada no sul do Arizona.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Lionsgate/Richard Foreman Jr.
Filmes sobre drogas
A questão do narcotráfico parece atrair diretores de forma mágica. Em 2013, o cineasta britânico Ridley Scott filmou um suspense também nesta região fronteiriça. "O conselheiro do crime", estrelado por Brad Pitt e Michael Fassbender, foi filmado em El Paso, no Texas, e na Espanha.
Foto: picture-alliance/dpa
Crime e política
Há 17 anos, o diretor Steven Soderbergh lançou o renascimento dos filmes sobre a guerra das drogas. Em "Traffic", ele retrata a complexa relação entre polícia, traficantes e políticos – cujos laços uns com os outros estão indissociavelmente interligados para além das fronteiras geográficas.
Foto: picture-alliance/United Archives
Histórias de detetive
Além de faroestes e suspenses sobre drogas, inúmeras histórias de detetives e assassinatos misteriosos decorrem na fronteira entre EUA e México. Um clássico do gênero é o filme "O perigoso adeus" (1973), de Robert Altman, baseado em um romance de Raymond Chandler. O filme foi gravado na Califórnia, mas também em Tepoztlán, no México.
Foto: picture-alliance/United Archives/Impress
A fronteira em tempos de globalização
Em 2006, o diretor mexicano Alejandro González Iñárritu filmou o drama narrativo múltiplo "Babel". A obra traça os destinos entrelaçados de várias pessoas de diferentes regiões do mundo, e é uma parábola cinematográfica sobre a questão do significado da fronteira para as pessoas em tempos de globalização.
Foto: picture alliance/kpa
Comédia de fronteira
Não há muito o que rir quando se trata de uma fronteira. A maior parte dos filmes que lida com os laços entre EUA e México tendem à seriedade. Mas, em 2004, James L. Brooks fez a comédia "Espanglês" sobre um encontro com muito clichê entre um americano rico (Adam Sandler) e uma faxineira mexicana (Paz Vega).
Foto: picture-alliance/United Archives
Drama sobre imigração
Nos últimos anos, mais e mais filmes foram produzidos sobre imigração e pobreza na região. No ano passado, a coprodução Alemanha-França-México "Soy Nero" estreou na Berlinale. O diretor Rafi Pitts, com raízes iranianas, conta a história de um jovem mexicano que atravessa a fronteira para os EUA em busca de uma vida melhor.
Foto: picture-alliance/dpa/Neue Visionen
Um clássico moderno
Talvez o filme mais impressionante sobre a imigração do Sul para o Norte tenha sido feito por Cary Fukunaga, em 2009. "Sem identidade" retrata o destino de vários jovens do México que estão tentando chegar aos EUA. Enquanto alguns estão tentando escapar de bandos criminosos de suas cidades, outros procuram o paraíso na Terra.