Como foi o segundo dia de julgamento de Jair Bolsonaro
4 de setembro de 2025
Advogados de Bolsonaro, Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto fizeram suas sustentações orais. STF retoma julgamento na próxima terça, com os votos dos ministros.
Julgamento conduzido pela Primeira Turma do STF deve terminar em 12 de setembroFoto: Evaristo Sa/AFP
O dia foi de sustentação oral das defesas de quatro dos réus:
- Jair Bolsonaro, ex-presidente
- General Augusto Heleno, ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)
- General Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa
- General Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e vice na chapa de Bolsonaro em 2022
Na terça-feira, já haviam apresentado suas defesas os advogados dos demais quatro réus: tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro; Alexandre Ramagem, ex-chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; e Anderson Torres, ex-ministro da Justiça.
O julgamento será retomado pela Primeira Turma do STF na próxima terça-feira, quando é iniciada a leitura dos votos dos ministros.
Veja o que argumentou a defesa de cada um dos réus na sessão desta quarta-feira:
Jair Bolsonaro
O ex-presidente não compareceu à sessão de julgamento desta quarta-feira. Seu advogado, Celso Vilardi, afirmou que "não há uma única prova" da sua participação na trama golpista e que ele foi "dragado" para os fatos apurados pela Polícia Federal.
Para Vilardi, Mauro Cid, que fez um acordo de colaboração premiada, não é "confiável" e mudou de versão diversas vezes em seus interrogatórios, defendendo que as contradições do tenente-coronel seriam motivos para anulação do acordo.
"Não há uma única prova que atrele o presidente ao Punhal Verde e Amarelo, à Operação Luneta e ao 8 de janeiro. Aliás, nem o delator, que eu sustento que mentiu, chegou a dizer 'participação em Punhal, em Luneta, em Copa, em 8 de janeiro'. Nem o delator. Não há uma única prova", disse Vilardi.
Advogado de Bolsonaro disse que ex-presidente foi "dragado" para os fatos apurados na investigaçãoFoto: Eraldo Peres/AP Photo/picture alliance
Ele afirmou ainda que a defesa não teve tempo suficiente para analisar todas as provas colhidas no processo. "Com 34 anos, é a primeira vez que venho à tribuna, com toda humildade, para dizer o seguinte: não conheço a íntegra desse processo. O conjunto da prova? Eu não conheço. São bilhões de documentos. Numa instrução de menos de 15 dias, seguida de interrogatório. A instrução começou em maio, nós estamos em setembro. Quinze dias de prazo para a defesa", disse.
"Dizer que o crime de abolição do Estado Democrático de Direito começou numa live [com críticas às urnas, feita em julho de 2021], sem violência, é subverter o próprio Código Penal. É a execução da violência que consuma o delito. Não é possível falar em violência numa live sobre o TSE. Onde está a grave ameaça?", questionou.
Celso Vilardi, advogado do ex-presidente, disse também que não teve tempo suficiente para analisar todas as provas colhidas no processoFoto: Evaristo Sa/AFP
O advogado Paulo da Cunha Bueno, que também atuou na defesa de Bolsonaro, afirmou que a mera discussão sobre a decretação de estado de sítio não configuraria um crime.
"O estado de defesa e o estado de sítio são dos atos mais colegiados da nossa legislação. Não são atos de força unilateral do presidente da República. E é indiscutível que o ex-presidente em momento algum deu início para a decretação dessas medidas constitucionais", disse.
Augusto Heleno
O advogado Matheus Milanez, que representa Heleno, afirmou que seu cliente havia se distanciado de Bolsonaro e que, no final do seu governo, mal se reunia com o presidente. Por isso, nunca teria conversado com Bolsonaro sobre uma tentativa de golpe.
"Quando o presidente Bolsonaro se aproxima dos partidos do Centrão e tem sua filiação ao PL, inicia-se sim um afastamento da cúpula do poder", disse Milanez, que citou testemunhos de servidores do GSI segundo os quais "houve uma clara redução da influência do general".
O advogado afirmou que não foi anexado aos autos do processo nenhum diálogo de Heleno com algum outro interlocutor da trama sobre o planejamento ou execução do golpe.
Advogado de Augusto Heleno (foto) disse que ele havia se distanciado de Bolsonaro e que, no final do seu governo, mal se reunia com o presidenteFoto: Ton Molina/STF
A maior prova do envolvimento de Heleno, diz, seria uma agenda particular, cujas anotações não eram compartilhadas com ninguém, argumentando que aquelas anotações eram apenas "um suporte da memória do próprio general" e não eram usadas nas reuniões do governo.
Milanez disse ainda que, em uma reunião ministerial, Heleno afirmou ser "necessário fazer alguma coisa antes das eleições", o que indicaria uma disposição "republicana" do general".
"O que o general Heleno está trazendo aqui são falas até certo ponto republicanas: após as eleições não tem discussão, quem ganha a maioria dos votos leva", observou o advogado. "Que fique claro: nenhum militar foi procurado pelo general Heleno, nenhum militar foi pressionado [por ele]", disse.
Anúncio
Paulo Sérgio Nogueira
O advogado do ex-ministro da Defesa, Andrew Fernandes, disse que seu cliente tentou demover Bolsonaro de tentativas de golpe de Estado.
"A delação e o depoimento da principal testemunha de acusação, o comandante da Força Aérea brigadeiro Batista Júnior é contundente, acachapante", disse Fernandes.
"O general Paulo Sérgio acabou sendo enredado em uma contumélia. Mas a prova dos autos, a instrução judicial demonstrou, de forma inequívoca, a sua inocência", afirmou.
Defesa de Paulo Sérgio Nogueira (foto) disse que seu cliente tentou demover Bolsonaro de tentativas de golpe de EstadoFoto: Fellipe Sampaio/STF
"Ele assessorou o presidente da República [no sentido] de que nada poderia ser feito diante do resultado das eleições. É o que diz o delator. Se posicionou totalmente contrário a qualquer medida de exceção", completou.
Segundo Fernandes, membros da organização acusada de orquestrar o golpe atuavam para retirar seu cliente do cargo. "Pera lá. Como é que ele fazia parte da organização criminosa? É a prova dos nove. Se estavam lutando para tirá-lo?", questionou.
Ao final de sua fala, a ministra Cármen Lúcia perguntou ao advogado ao que ele se referia quando disse que Paulo Sérgio queria demover Bolsonaro. "Demoveu de quê?", perguntou a ministra. "De qualquer medida de exceção", respondeu Fernandes.
Walter Braga Netto
O advogado José Luis Mendes de Oliveira Lima, que defende o general Walter Braga Netto, afirmou que seu cliente pode ser condenado a morrer na cadeia com base em uma "delação premiada mentirosa" de Mauro Cid.
"Não há a menor dúvida de que a voluntariedade nesse acordo de colaboração premiada ficou à margem. [Mauro Cid] Foi coagido sim, e quem falou não foi este advogado, quem falou foi ele", disse.
Segundo o advogado, foram 15 versões diferentes dadas por Cid para os fatos investigados. Numa das acusações mais graves contra o general, o tenente-coronel disse ter recebido uma grande quantia em dinheiro, dentro de uma sacola de vinho, para financiar a execução do golpe.
Advogado de Braga Netto (foto) disse que seu cliente pode ser condenado a morrer na cadeia com base em uma "delação premiada mentirosa" de Mauro CidFoto: picture alliance/AP/E. Peres
"É razoável imaginar que um delator demore 15 meses para trazer este fato ao eminente relator, ao Ministério Público, à polícia? É um escândalo!", disse. "É com essa mentira que meu cliente vai ser condenado por 20 anos, que meu cliente vai morrer na cadeia?", indagou.
"O Ministério Público instalou um procedimento para que o réu colaborador apresentasse provas e não apresentou. É apenas uma narrativa. Uma narrativa que a Polícia Federal fez e que o Ministério Público abraçou de todas as formas, que é uma narrativa bem colocada, bem escrita, mas absolutamente desprovida de provas", afirmou Oliveira Lima.
A defesa de Braga Netto argumentou ainda que com o general "não foi apreendida cópia de planos, ninguém o relacionou a qualquer ação ilícita, e ele nem sequer tinha em seu celular o contato dos supostos executores dos planos".
bl (Agência Brasil, ots)
Ex-presidentes latino-americanos que já foram presos
A prisão domiciliar de Bolsonaro não é um caso isolado na América Latina. Mais de uma dúzia de líderes de outros países da região, como Argentina, Honduras, Peru e Panamá também enfrentaram problemas com a Justiça.
Foto: Alan Santos/Brazilian Presidency/REUTERS
Jair Bolsonaro (Brasil)
Acusado de liderar uma trama golpista após a eleição de 2022 e réu em diferentes ações na Justiça, o ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022) teve decretada prisão domiciliar em agosto de 2025 após ser acusado de violar medidas cautelares impostas pelo Supremo, como a proibição de usar redes sociais.
Foto: Evaristo Sa/AFP
Michel Temer (Brasil)
Presidente entre maio de 2016 até o fim de 2018, Michel Temer foi preso em março de 2019, poucos meses depois de deixar o cargo, no âmbito de um desdobramento da Lava Jato. Foi solto quatro dias depois, mas voltou a ser preso por mais seis dias em maio de 2019. O caso foi posteriormente anulado pela Justiça.
Foto: Imago Images/Agencia EFE/F. Bizerra Jr
Fernando Collor (Brasil)
Presidente entre 1990 e 1992, Collor foi condenado por corrupção pelo Supremo em maio de 2023, em um processo que teve origem na Operação Lava Jato. Em abril de 2025, foi levado a um presídio em Maceió, no estado de Alagoas, para cumprir pena de 8 anos e 10 meses de prisão. Seis dias depois, passou a cumprir pena em casa.
Foto: EVARISTO SA/AFP
Lula (Brasil)
Lula, que governou o Brasil entre 2003 e 2010, passou 580 dias na prisão entre abril de 2018 e novembro de 2019, após ser condenado por corrupção. Em março de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou as duas sentenças por irregularidades processuais cometidas pelo Ministério Público e pelo juiz do caso. Assim, conseguiu disputar a eleição de 2022, na qual derrotou Jair Bolsonaro.
Foto: Reuters/R. Buhrer
Cristina Kirchner (Argentina)
Ex-presidente da Argentina (2007-2015) e ex-vice (2019-2023), Cristina Kirchner teve em junho de 2025 uma pena de seis anos de prisão por corrupção confirmada pela Suprema Corte. No mesmo mês, começou a cumprir prisão domiciliar - a a lei argentina que prevê essa possibilidade para pessoas com mais de 70 anos.
O presidente argentino Carlos Menem (1989-1999) enfrentou diversos processos. Em seu primeiro julgamento, em 2008, foi acusado de tráfico de armas para o Equador e a Croácia entre 1991 e 1995. Passou seis meses em prisão domiciliar preventiva em 2001, e foi solto depois que a Justiça anulou as acusações. A partir de 2005, teve imunidade como senador, cargo que ocupou até sua morte em 2021
Foto: Ricardo Ceppi/Getty Images
Jeanine Áñez (Bolívia)
Jeanine Áñez assumiu a presidência interina da Bolívia em 12 de novembro de 2019 como segunda vice-presidente do Senado, dois dias após a renúncia de Evo Morales. Ela foi detida em 13 de março de 2021, e numa decisão polêmica, um tribunal a condenou a 10 anos de prisão pelos crimes de violação de deveres e resoluções contrárias à Constituição. Em agosto de 2025, ele continuava presa
Foto: Juan Karita/AP Photo/picture alliance
Ricardo Martinelli (Panamá)
Ricardo Martinelli, que governou o Panamá de 2009 a 2014, foi preso em junho de 2017 na Flórida. No ano seguinte, foi extraditado para ser julgado em seu país num caso sobre escutas ilegais, do qual foi posteriormente absolvido. Em 2019, foi solto. Em 2024, no entanto, voltou a ser condenado em outro caso e no mesmo ano se abrigou numa embaixada. Em agosto de 2025, vivia como asilado na Colômbia.
Foto: picture-alliance/AP Images/A. Franco
Juan Orlando Hernández (Honduras)
O ex-presidente hondurenho Juan Orlando Hernández (2014-2022) foi extraditado para os Estados Unidos em abril de 2022, onde foi acusado de conspiração para importar cocaína, posse de metralhadoras e armas pesadas e conspiração para possuir tais armas. Em 2024, foi condenado a 45 anos de prisão. Em agosto de 2025, ele seguia detido em uma penitenciária dos EUA
Foto: Andy Buchanan/AFP
Antonio Saca (El Salvador)
Presidente de El Salvador entre 200e e 2009, Antonio "Tony" Saca foi condenado a 10 anos de prisão em 2018 após se declarar culpado por desviar mais de US$ 300 milhões em fundos públicos durante seu mandato. Em agosto de 2025, ele estava cumprindo pena na prisão La Esperanza, em El Salvador.
Foto: Rodrigo Sura/Agencia EFE/IMAGO
Otto Pérez Molina (Guatemala)
General aposentado que governou a Guatemala de 2012 a 2015, Otto Pérez Molina foi preso um dia depois de renunciar ao cargo. Ele foi condenado a 16 anos de prisão por liderar uma rede milionária de fraudes alfandegárias. Ele deixou a prisão em 2024 após pagar fiança.
Foto: Luis Vargas/AA/picture alliance
Álvaro Uribe (Colômbia)
Acusado de fraude processual e suborno, o ex-líder colombiano Álvaro Uribe (2002-2010) ficou 67 dias na prisão em 2020 "devido a possíveis riscos de obstrução da Justiça". Em julho de 2025, foi condenado a 12 anos de detenção, a serem cumpridos em prisão domiciliar.
Foto: Long Visual Press/LongVisual/ZUMA Press/picture alliance
Alberto Fujimori (Peru)
Alberto Fuijimori, que governou o Peru entre 1990 e 2000, deu um autogolpe em 1992. Seu governo foi marcado por vários casos de corrupção. Em 2005, foi preso no Chile e depois extraditadi. Posteriormente, foi condenado a 25 anos de prisão por homicídio qualificado, usurpação de funções, corrupção e espionagem, além de desvio de fundos. Em 2023, foi solto. Fujimori morreu no ano seguinte.
Foto: Martin Mejia/AP/picture alliance
Pedro Castillo (Peru)
Pedro Castillo, destituído da presidência do Peru após ter ordenado a dissolução do Parlamento em dezembro de 2022, foi detido e levado ao presídio de Barbadillo. Às acusações de corrupção que já enfrentava, o Ministério Público acrescentou a do alegado crime de rebelião "por violação da ordem constitucional". Em agosto de 2025, o ex-presidente seguia detido.
Foto: Renato Pajuelo/AP/picture alliance
Pedro Pablo Kuczynski (Peru)
Presidente do Peru de 2016 até sua renúncia em 2018 na esteira de um processo de impeachment, Pedro Pablo Kuczynski foi alvo de prisão preventiva em 2019 no âmbito do escândalo Odebrecht. Alegando problemas de saúde, passou a cumprir a medida em casa. Em agosto de 2025, ainda cumpria várias medidas cautelares, como proibição de deixar o país.
Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Mejia
Ollanta Humala (Peru)
Ollanta Humala (2011-2016) completou seu mandato presidencial no Peru, mas, um ano depois, foi colocado em prisão preventiva. Ele e a esposa foram investigados pelo suposto recebimento ilegal de dinheiro da Odebrecht. Em abril de 2018, o Tribunal Constitucional do Peru revogou a prisão. Em 2021, se candidatou novamente à Presidência, mas recebeu apenas 1,5% dos votos. Em 2025, voltou a ser preso.
Foto: El Comercio/GDA/ZUMA Press/picture alliance
Alejandro Toledo (Peru)
Presidente do Peru entre 2001 e 2006, Alejandro Toledo foi condenado em outubro de 2024 a 20 anos e seis meses de prisão por corrupção. Detido nos EUA em 2023 e extraditado no mesmo ano, ele cumpria pena no Peru em agosto de 2025.
Foto: Guadalupe Pardo/AP/picture alliance
Martín Vizcarra (Peru)
Martín Vizcarra foi o sexto ex-presidente do Peru a se somar à lista de presos. Ele governou o Peru entre 2018 até 2020, quando foi afastado em meio a um processo de impeachment. Sua prisão preventiva em agosto de 2025 envolveu suspeita de risco de fuga em meio a um processo de crime de suborno.