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TerrorismoGlobal

Como é a troca de informações entre serviços de inteligência

David Ehl
26 de março de 2024

No combate ao terrorismo, dicas de governos estrangeiros podem ser essenciais. Os EUA alertaram a Rússia, semanas atrás, sobre um iminente atentado, que acabou ocorrendo. Mas Moscou parece não ter dado ouvidos.

Policiais chegam para socorrer e salvar pessoas na sala de concertos Crocus City Hall, em Moscou
Quase 140 pessoas morreram no ataque terrorista em uma sala de concertos de Moscou. O alerta dos EUA poderia ter evitado o atentado?Foto: Sergei Vedyashkin/Moscow News Agency/REUTERS

No começo do mês, a embaixada americana na Rússia alertou que "extremistas" tinham planos iminentes de um ataque terrorista no país, o que de fato ocorreu em 22 de março, em Krasnogorsk, região metropolitana de Moscou. Um caso raro de informações compartilhadas entre Estados que, definitivamente, não são considerados aliados.

Os serviços secretos, como o próprio nome sugere, trabalham em sigilo. Eles coletam informações relevantes para a segurança nacional ou que ofereçam vantagem aos governos para facilitar decisões políticas. 

Com essa finalidade, até mesmo os aliados podem ser espionados – a Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA), chegou a monitorar um telefone celular da ex-chanceler federal alemã  Angela Merkeldurante anos. Com certeza, teria sido melhor para Washington que o assunto nunca tivesse vindo à tona.

Em outras situações, no entanto, os serviços de inteligência podem compartilhar conhecimento e descobertas. Por exemplo, em 23 de fevereiro de 2022, os EUA repassaram informações para a Alemanha e outros parceiros europeus de que a Rússia invadiria a Ucrânia na noite seguinte. 

Quais informações os EUA compartilharam com a Rússia?

Em 7 de março, a embaixada dos EUA em Moscou alertou o governo local: "extremistas têm planos iminentes de um ataque em grandes agrupamentos de pessoas em Moscou, incluindo concertos. Eventos de massa devem ser evitados por 48 horas".

O atentado terrorista aconteceu duas semanas depois do alerta, mas, acredita-se, que o aviso correspondia ao ataque no Crocus City Hall, que matou ao menos 137 pessoas e feriu mais de uma centena.

Após o atentado em Moscou, vítimas foram lembradas em todo o país, como em KaliningradoFoto: Vitaly Nevar/TASS/dpa/picture alliance

Poucas horas após as primeiras ligações de emergência, a porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, Adrienne Watson, mencionou o aviso de 7 de março.

"O governo dos EUA também compartilhou essas informações com as autoridades russas, como tem sido nossa política há muito tempo, de acordo com o 'dever de alertar'". Outros detalhes ou a fonte das informações não foram divulgados.

As autoridades russas levaram o aviso a sério?

Aparentemente, Moscou não tratou o alerta com a seriedade necessária, acredita Peter Neumann, pesquisador de terrorismo do Kings's College de Londres. "Isso pode ser justificado pelo posicionamento de Vladimir Putin, recentemente, rejeitando publicamente esse alerta. Ele disse que isso é um tipo de guerra psicológica dos americanos para tirar ele do sério. Não levou a sério de forma alguma", disse Neumann em uma entrevista à emissora alemã Deutschlandfunk.

É incomum a transmissão de informações em tempos de guerra?

Embora os EUA não façam parte da guerra na Ucrânia, consideram a Rússia uma ameaça a sua segurança – afinal, Putin faz constantes ataques a Washington.

"Acredito que os americanos tenham tornado público esse aviso, pois, provavelmente, não há mais cooperação entre os serviços de inteligência americano e russo", disse Michael Götschenberg, especialista em segurança da emissora pública alemã ARD.

A sede do serviço secreto russo FSB em MoscouFoto: Maxim Shemetov/File Photo/REUTERS

"Os Estados sempre avisam uns aos outros sobre ataques terroristas iminentes ou planejados através dos seus serviços de inteligência. Isso também costumava acontecer em cooperação com os serviços de inteligência russos. No entanto, presumo que essa cooperação tenha sido interrompida devido à guerra que a Rússia está travando contra a Ucrânia", explica Götschenberg à DW.

O quão estreita é a cooperação sobre terrorismo internacional?

Para a segurança pública internacional, é fundamental que seus guardiões em diferentes países trabalhem juntos, pois grupos como o ramo do Estado Islâmico (EI) no Afeganistão, o Estado Islâmico Khorasan (EI-K), não param nas fronteiras nacionais, como mostram os recentes ataques na Rússia, no Irã e no Afeganistão. 

De acordo com a avaliação de Götschenberg, a troca tem funcionado bem. "Especialmente na área dos serviços de inteligência ocidentais, as informações são constantemente trocadas, as dicas são repassadas e depois processadas pelas respectivas autoridades de investigação. Muitas vezes, as informações acabam sendo irrelevantes. Mas quando há algo a ser investigado, as pessoas são encontradas e presas".

E sempre foi assim?

Quando se fala no "dever de alertar", os serviços secretos dos EUA se referem a uma lei de 1947 e a um decreto emitido pelo ex-presidente Ronald Reagan, em 1981. Na opinião de Michael Götschenberg, a intensidade com que essas informações são realmente transmitidas aumentou, principalmente nos últimos anos.

"É preciso dizer que o 11 de Setembro teve um papel muito importante", acredita Götschenberg. "Foi acordado que isso não poderia mais acontecer, de informações importantes não serem passadas adiante. E ainda hoje é assim".

Como a Alemanha lida com o EI-K?

Para Götschenberg, as autoridades alemãs têm feito um bom trabalho em relação ao combate ao EI-K. "Nos últimos dois anos, tivemos de lidar com várias situações em que se suspeitava de que integrantes do EI-K planejavam ataques. Conseguimos impedir esses atos em um estágio inicial".

Entre o Natal e os primeiros dias de 2024, um esquema de segurança rigoroso foi implantado em torno da Catedral de Colônia - o EI-K teria selecionado a catedral gótica como alvo de um ataqueFoto: Thomas Banneyer/dpa/picture alliance

Em Colônia, cidade com mais de um milhão de habitantes no oeste da Alemanha, supostos integrantes do EI-K já haviam selecionado a catedral, popular entre os turistas, e um festival público como possíveis alvos. E há apenas uma semana, investigadores em Gera, na região central da Alemanha, prenderam dois homens suspeitos de planejarem um ataque ao Parlamento sueco sob a bandeira do EI-K.

O pesquisador de terrorismo Peter Neumann fez a ressalva, na rádio Deutschlandfunk, que, de acordo com a Europol, o número de tentativas de ataques aumentou drasticamente desde 7 de outubro, data do ataque do grupo radical islâmico Hamas a Israel.

"Ainda bem que não aconteceu nada, mas as ameaças estão se tornando mais frequentes. E, às vezes, nada acontece por uma questão de sorte".

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