Como lembrar Holocausto quando não houver mais sobreviventes
16 de fevereiro de 2018
Há cada vez menos pessoas que podem dar testemunhos sobre suas experiências e os horrores do regime nazista, o que impõe um dilema à Alemanha: qual a melhor forma de manter viva a memória?
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Sejam vítimas, criminosos ou cúmplices – há cada vez menos pessoas que podem relatar suas experiências durante a ditadura nazista. Historiadores, políticos e pedagogos se perguntam há tempos como a Alemanha deve se lembrar disso no futuro próximo, sem testemunhas vivas.
A questão também vem se tornando mais evidente à medida que atos de racismo e o antissemitismo têm aumentado. É neste contexto que o Instituto de Pesquisa Interdisciplinar sobre Conflitos e Violência (IKG), sediado em Bielefeld, no oeste da Alemanha, apresentou nesta semana seu estudo “Memo”, o “Monitor Multidimensional da Memória”.
"Nós nos interessamos particularmente no que, no porquê e no modo como as pessoas se recordam da história na Alemanha", diz o diretor da IKG, Andreas Zick.
Um olhar especial foi dirigido à memória do Holocausto. Pois, segundo o especialista, a cultura da lembrança ganha importância diante do antissemitismo e de tentativas de se usar tópicos como a culpa pela guerra para fazer propaganda política.
"No entanto, se falamos em um ‘culto da culpa‘ que é praticado na Alemanha, isso não corresponde à opinião da população", enfatiza Zick. Os entrevistados, segundo ele, se lembram de forma muito mais diferenciada. O passado da própria família desempenha, nesses casos, um papel importante.
A equipe de Zick entrevistou por telefone mais de mil pessoas entre 16 e 92 anos sobre seu próprio passado ou sobre seus antepassados. De acordo com a enquete, 17,6% dos entrevistados disseram ter parentes envolvidos em crimes durante a Segunda Guerra Mundial.
Quase a mesma cifra (18%) foi apurada em relação a pessoas que disseram ter membros da família que ajudaram potenciais vítimas. A grande maioria dos entrevistados (54,4%) relatou ter vítimas na família.
De acordo com o estudo, a proporção de pessoas que se sentem culpadas pelo extermínio dos judeus europeus é baixa. A afirmação "mesmo que eu próprio não tenha feito nada de mal, me sinto culpado pelo Holocausto", foi respondida afirmativamente por apenas 10%.
O que é pouco surpreendente é que quase todos os entrevistados (98,4%) aprenderam sobre o regime nazista na escola. Para os mais jovens, a internet também desempenha um papel importante como fonte de informação.
No entanto, os pesquisadores descobriram que a internet tem pouco impacto, ao ser comparada com a impressão mais forte representada por visitas a lugares históricos, como memoriais ou monumentos.
Na opinião dos entrevistados, os lugares que impressionam de forma mais duradoura são aqueles que relembram a aniquilação de pessoas pelo regime nazista.
Mais de metade dos entrevistados se interessa fortemente pela história da Alemanha (32,5%) ou muito fortemente (27,7%). O temor de que algo parecido com o Holocausto possa se repetir está presente entre os entrevistados. Quase metade deles diz ter essa preocupação de forma moderada para forte (25,6%) ou mesmo forte (21,6%). Os resultados da pesquisa visam contribuir para a criação de novas formas de manter a memória viva na Alemanha.
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Dez filmes sobre o Holocausto
A "cinematografia do Holocausto" é composta de uma vasta lista de filmes. Embora transpor o indescritível para imagens em movimento seja uma tarefa altamente complexa, são diversas as tentativas.
Foto: absolut Medien GmbH
Noite e neblina
Filme de 1955 que estreou no Festival de Cannes, "Noite e neblina", dirigido pelo francês Alain Resnais, foi um dos primeiros documentários a se debruçar sobre o Holocausto. Renais e Chris Marker, na época seu assistente, estavam entre os primeiros cineastas a terem um acesso mais amplo aos arquivos do Holocausto em França, Bélgica, Holanda, Polônia e Alemanha.
Foto: picture-alliance/Mary Evans Picture Library/Ronald Grant Archive
Minha luta
Coprodução sueco-alemã de 1960, tem direção de Erwin Leiser (1923-1996), que emigrou aos 15 anos de idade, depois do Pogrom de 1938, para a Suécia, onde se tornaria mais tarde um cronista em imagens das atrocidades do regime nazista. No longa-metragem, o diretor reúne material de arquivo da época, como faria em outros filmes posteriores, em um minucioso trabalho de memória daquele período.
Foto: picture-alliance
Shoah
Obra mais importante sobre a memória do Holocausto, o filme de Claude Lanzmann, de 1985, com 9 horas e meia de duração, foi feito no decorrer de 11 anos. O diretor recusa-se a usar imagens de campos de concentração como fazem os documentários convencionais. O registro do horror acontece através do testemunho de sobreviventes – sejam eles vítimas, algozes ou meros espectadores das atrocidades.
Foto: absolut Medien GmbH
A lista de Schindler
Steven Spielberg contou neste filme de 1993 a história de um empresário que, embora conivente com o regime nazista, acabou salvando a vida de mais de mil judeus. A superprodução americana ganhou sete Oscars, incluindo os de melhor filme e direção, embora tenha sido apontada por parte da crítica como um melodrama que prima por transformar a dor em espetáculo.
Foto: picture alliance / United Archives/IFTN
Exílio em Xangai
O longa-metragem de 1997, de Ulrike Ottinger, é um filme sobre o Holocausto no sentido de documento da fuga e da migração dos judeus para Xangai durante o regime nazista. Com 4 horas e meia de duração, o documentário tem como ponto de partida as lembranças de seis judeus alemães, austríacos e russos, que fugiram para Xangai, um dos únicos lugares com fronteiras abertas até 1943.
Do Leste
Coprodução franco-belga de 1993, o documentário de Chantal Akerman é uma viagem realizada pela diretora passando pelo Leste alemão, Polônia, países bálticos e Rússia. O filme documenta não apenas o deslocamento geográfico da cineasta, mas sobretudo sua busca de um Leste que, embora lhe seja estranho, é a terra de origem de sua mãe judia, nascida na Polônia e sobrevivente de Auschwitz.
Balagan
Uma trupe tenta, na israelense Akko, tratar do Holocausto em um coletivo de teatro que envolve também um palestino. A partir daí, o diretor Andres Veiel busca, neste filme de 1994, descobrir as feridas abertas existentes quando se fala do assunto. O documentário não é um filme sobre sobreviventes, mas sim sobre seus filhos e sobre como eles conseguem lidar com essa herança histórico-familiar.
A vida é bela
Tragicomédia encenada pelo italiano Roberto Benigni em 1999, o filme recebeu o Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes e atraiu um imenso público em muitos países. Por ser uma das raras tentativas de abordar o tema dos campos de concentração com humor, teve recepção ambivalente por parte de alguns sobreviventes do Holocausto, que viram aí um perigo de banalização das atrocidades nazistas.
Foto: picture-alliance/dpa
O Pianista
Vencedor da Palma de Ouro do Festival de Cannes em 2002, o filme de Roman Polanski tem roteiro baseado nas memórias de Wladyslaw Szpilman, músico polonês que testemunha como Varsóvia é tomada pelos alemães na Segunda Guerra Mundial e cuja família é assassinada no campo de concentração de Treblinka. O próprio Polanski sobreviveu ao Gueto de Cracóvia e perdeu a mãe assassinada em Auschwitz.
Foto: imago stock&people
O filho de Saul
Filme de 2015 do húngaro László Nemes (ex-assistente de Béla Tarr), tem como protagonista um integrante do Sonderkommando (grupo de prisioneiros judeus encarregados de limpar câmaras de gás e remover cadáveres), cuja ideia fixa é enterrar um garoto. Filme claustrofóbico, cujo uso do primeiro plano, os closes exacerbados e a câmera em constante movimento, tira o espectador de sua zona de conforto.