O gramado perfeito como símbolo de poder na história
Stuart Braun
26 de novembro de 2024
Na França de Luís 14 o jardim era símbolo de controle sobre a natureza. A moda se espalhou e perdura, mas em tempos de crise climática e falta d'água, os dias dos gramados impecáveis podem estar contados.
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Gramados são como pequenos oásis, uma fatia pessoal da natureza. Mas ao longo da história eles também têm sido usados como símbolos poderosos de ordem e riqueza.
Quando o monarca francês Luís 14, o "Rei Sol", se mudou para Versalhes, em 1661, ele contratou o paisagista André Le Nôtre para projetar os jardins do palácio. O famoso arquiteto compreendia que esses espaços, com seus elaborados gramados, eram manifestos políticos: através deles o soberano comunicava que tudo estava em ordem e sob controle.
Uma peça importante era o tapis vert, o "tapete verde" que ligava o palácio aos jardins: ele não era para se caminhar, fazer piquenique ou para animais pastarem, mas sim um símbolo de status, poder e vitória.
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"Olhando-se de perto, o capim de um prado clássico tem todo tipo de outras plantas, margaridas, violetas, trevo e morangos, por exemplo", comenta o arquiteto paisagista aposentado Ian Thompson, da Universidade de Newcastle, Inglaterra. Porém os impecáveis gramados de Versalhes são da grama pura que venceu essas flores e ervas: eles expressam domínio sobre a natureza, sobre essa entidade desconhecida, potencialmente hostil e perigosa.
No século 17, as ideias sobre a relação do ser humano com a natureza estavam em mutação. O filósofo René Descartes argumentava que a natureza, representada pelo corpo, é caótica e distinta do espírito, da razão humana mais elevada. E essa noção do jardim como mente racional colonizando o corpo irracional perdurou por séculos.
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Através do Canal da Mancha e do Oceano Atlântico
O gramado à la Luís 14 foi em parte adotado do outro lado do Canal da Mancha. Porém no século 18 a aristocracia inglesa introduziu um toque individual, passando a incorporar prados e bosques de árvores e arbustos em seus jardins mais "naturais" – ainda que altamente bem-cuidados e estilizados. Por sua vez, a rainha Maria Antonieta da França adotou essa variante, criando um minijardim inglês em seu palácio.
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Enquanto isso, nos Estados Unidos da América o jardim inglês dominava. O presidente George Washington ordenou a criação de um campo de boliche ao ar livre, o bowling green, e um parque de veados em sua vasta residência e plantação cultivada por escravos de Mount Vernon. Consta que ele teria mandado importar sementes de grama inglesa para esse fim.
Thomas Jefferson, o terceiro presidente americano, autor da Declaração da Independência, também cultivava em sua residência uma área verde apelidada "The Lawn" (o gramado). Algumas décadas mais tarde, a moda tinha tomado conta do país: o primeiro cortador de grama puxado a cavalo foi patenteado em 1830.
Ocaso dos gramados minimalistas?
Inicialmente relegados ao fundo da casa, em breve essas bem mantidas faixas de vegetação ração passaram a ser orgulhosamente exibidas na frente dos lares americanos. Assim como os jardins da realeza francesa e da aristocracia inglesa, nos Estados Unidos do século 20, o quintal de entrada se tornou uma espécie de local de exposição, símbolo de domínio da natureza.
Mas com a condição de que fosse minimalista e imaculado: "É basicamente um pedaço de grama com nada em cima", resume a historiadora ambientalista Jenny Price. "É muito uma coisa de classe, em geral não é permitido colocar nada no jardim de entrada: nada de cadeiras, decoração, nada."
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Ainda hoje, o gramado verdejante é um dos orgulhos da Casa Branca, por exemplo. Contudo a era dos gramados perfeitos pode estar chegando ao fim: Price lembra que eles exigem muita irrigação e pesticidas, e num contexto de mudanças climáticas e escassez d'água, cresce a preferência por árvores e biodiversidade.
"Estamos voltando para o prado florido", afirma Thompson. "E na verdade o jardim suburbano é um dos locais que pode ser um santuário de vida selvagem. Acho que isso deve ser encorajado."
O alemão e seu jardim
O jardim é um assunto muito sério na Alemanha. Por isso, o tema reúne uma série de peculiaridades que espelham valores tipicamente alemães.
Foto: picture alliance / Rzepka
"Gemütlichkeit", o aconchego em casa
Em toda a Alemanha, da primavera ao final do outono, terraços e jardins são enfeitados com flores e plantas. O verão é curto no país, por isso o tempo de aproveitar o jardim é vivido intensamente. Seja no começo da primavera, ou na chegada do outono, há rituais que são seguidos à risca para ter um jardim colorido no verão e protegido no inverno.
Foto: picture-alliance/dpa
E o turista pergunta: "É uma favela?"
Em geral, estes pequenos jardins e hortas alugados não são habitados e estão organizados em associações. Para regulamentá-los, há uma legislação nacional (Bundeskleingartengesetz). Estas áreas plantadas servem de compensação verde no espaço urbano. A ideia iniciou no fim do século 18 para combater fome e miséria. Eles foram muito importantes também após a 2ª Guerra, para a produção de alimentos.
Foto: picture-alliance/dpa/H. Schmidt
Valorização do espaço
Se tornou comum famílias que moram em apartamento alugar um pequeno pedaço de terra de agricultores que têm propriedades próximas a áreas urbanas. O tamanho pode ser, por exemplo, 4 x 4 metros. O contrato vale por alguns meses. É interessante especialmente para crianças, que podem cultivar flores e legumes.
Foto: picture-alliance/ZB/P. Pleul
Horários definidos
O barulho do cortador de grama pode ser um fator de conflito entre vizinhos, portanto, quem não tem uma máquina silenciosa e quer evitar confusão, só corta a grama das 9 às 13 e das 15 às 17 horas. Aos domingos e feriados, esse trabalho é tabu. Ou se adquire um robô, como o da foto, que corta a grama sozinho e é silencioso.
Foto: picture alliance/NurPhoto/J. Arriens
Respeito à privacidade
Quando se quer fazer uma festa no terraço ou no jardim, o melhor é logo convidar os vizinhos. Só assim eles não se sentirão incomodados pela fumaça ou chamarão a polícia por causa do barulho. É bom conferir o contrato de aluguel, pois fazer churrasco pode ser proibido. E quanto ao horário de silêncio, ele vale das 22 às 6 horas. Fazer festa pode, mas desde que não incomode os outros.
Foto: Elke Dubois/TZS
A distância da cerca
Antes de plantar árvores e arbustos, é preciso se certificar sobre as regulamentações estaduais quanto à distância a respeitar até a divisa com o vizinho. Isso para que, após alguns anos, a sombra ou os galhos não o incomodem. E atenção: não se pode cortar galhos nem colher frutos sem a permissão do proprietário, mesmo que tenham invadido o terreno da gente.
Foto: Mehdi Haeri
Um produto para cada coisa
Basta querer (e poder) gastar, que as opções nas lojas especializadas são variadas. Não só pelas plantas em si, também há terra e adubo para cada variedade de planta, móveis, ferramentas especiais para todo tipo de trabalho e métodos dos mais variados contra pragas, sejam químicos ou mesmo uma fita cheia de cola para colocar em volta do caule ou tronco e assim evitar formigas.
Foto: picture-alliance/dpa/BUGA 2015/T. Uhlemann
Aproveitamento da chuva e reciclagem do lixo
O recolhimento da água da chuva é comum. E também o lixo, que vai para o tonel de produtos orgânicos, recolhido semanalmente. Ali podem-se descartar não só a grama cortada, mas também galhos de árvores e ervas.
Foto: picture-alliance/dpa/K.D Gabbert
Inspiração não falta
Não só as lojas de plantas oferecem inspiração e mostram novidades. A proximidade com a Holanda – um indiscutível centro de produção de flores – e as exposições estaduais e nacionais de jardinagem e paisagismo também servem de estímulo.
Foto: DW
Anão de jardim, um clichê?
Muitos consideram o anão de jardim uma coisa ultrapassada, mesmo assim ele é considerado cult por muita gente. Hoje em dia, ele está à venda em diferentes materiais e nas mais variadas cores e posições.