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Como o mundo vê a Alemanha um ano após a crise migratória?

Kathleen Schuster (fc)22 de agosto de 2016

Em meados de 2015, o fluxo de refugiados para a Europa começou a atingir seu ápice e pôs Berlim numa posição de autoridade moral no tema, elevando seu papel de liderança. Mas como isso afetou a imagem do país?

Refugiado faz um "selfie" com Angela Merkel em Berlim
Refugiado faz um "selfie" com Angela Merkel em BerlimFoto: Reuters/F. Bensch

A evolução do discurso em meio à crise dos refugiados

03:00

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Um ano se passou desde que a Alemanha abriu suas portas para centenas de milhares de refugiados, e a chanceler federal Angela Merkel proferiu a famosa frase – que já virou slogan de sua política migratória: "Wir schaffen das" (nós vamos conseguir).

Desde o ano passado, as críticas a Merkel crescem na Alemanha com sinais de que imigrantes estão sobrecarregando o sistema; de que a violência de extrema direita se agravou; e de que o terrorismo islâmico finalmente chegou ao país.

Mas como a crise migratória teve impacto na reputação internacional da Alemanha como um aliado estável, potência econômica e país com uma história conturbada?

Menos hipocrisia europeia

A Europa viu a crise migratória se acentuar lentamente por muitos anos, enquanto instabilidade e pobreza extrema em Oriente Médio, Ásia Central e África levavam pessoas a medidas desesperadas para buscar um refúgio seguro. O ponto de ebulição ocorreu no verão europeu de 2015.

Relatos frequentes de mortes de migrantes no mar e em terra, combinados com as violações pela Hungria dos direitos dos refugiados, motivaram a Alemanha, em coordenação com a Áustria, a suspender o chamado Regulamento de Dublin para refugiados sírios em agosto do ano passado. A decisão liberou os sírios de requererem o pedido de asilo no país de entrada da União Europeia, o que foi visto como um sinal de boas-vindas aos refugiados.

A reputação da Alemanha, então, melhorou em todo o Oriente Médio. De acordo com Mehran Kamrava, analista político da Universidade Georgetown, no Catar, os países europeus muitas vezes são considerados hipócritas por tentarem ensinar o Oriente Médio sobre direitos humanos, porém sem fazer muito pelos refugiados. Os alemães, segundo ele, teriam atenuado essa visão.

Mas Ibrahim Awad, que dirige o Centro de Estudos sobre Refugiados e Migração na American University do Cairo, afirma que existem muitos que pensam que a Europa é também responsável pelo fluxo de refugiados em direção a seu território.

Onze milhões de sírios foram deslocados desde 2011 pela guerra civil, 6 milhões deles internamente. A Turquia acolhe atualmente 2,5 milhões de sírios, seguida por Líbano (1,1 milhão), Jordânia (635 mil) e Egito (117 mil).

Centenas de milhares de imigrantes usaram a Rota dos Bálcãs para chegar à ÁustriaFoto: picture-alliance/dpa/B. Roessler

Desejo por mais

A reputação da Alemanha também recebeu um impulso positivo na Ásia Central e na África – regiões que têm contribuído com um elevado número de refugiados. Particularmente na África, as políticas migratórias de Berlim mudaram amplamente a percepção coletiva de Europa.

"A ideia de Europa como uma fortaleza tem sido sempre de que a Europa fará de tudo para manter os imigrantes do lado de fora", afirma Liesl Louw-Vaudran, do instituto de estudos de segurança ISS, baseado na África do Sul. "Esta é uma mudança de tudo o que nós conhecemos até agora sobre imigração e Europa."

Mas o fechamento das fronteiras internas levou a críticas de que a Europa – sobretudo os países colonizadores – deveria fazer mais para possibilitar a migração organizada. Louw-Vaudran acrescenta, porém, que os governos africanos que apoiam este argumento nunca admitiriam que incentivam a emigração como forma de lucrar com isso.

Alemanha, a estabilizadora

O gesto humanitário da Alemanha teve dois efeitos principais sobre sua reputação com os seus aliados mais importantes: ganhou respeito como uma "autoridade moral" e provou mais ainda seu papel de liderança na União Europeia. Se esse é ou não um desenvolvimento positivo, depende de como um determinado país enxerga.

A China, que vem tentando promover relações diplomáticas mais estreitas com o governo Merkel, vê a decisão do seu parceiro comercial mais importante da União Europeia com admiração e hesitação.

A maior preocupação de Pequim é com a correlação entre a política migratória e o comprometimento da segurança, afirma Xuewu Gu, analista político da Universidade de Bonn. Segundo ele, os chineses consideram que a Alemanha tem um papel fundamental para garantir a coesão europeia, e uma Europa mais forte poderia enfraquecer o domínio dos EUA.

O governo Barack Obama também vê Berlim como seu parceiro europeu mais confiável no momento em que precisa "da coesão do Ocidente para fortalecer uma série de ações políticas que precisam ser colocadas em prática", afirma Cathryn Clüver, diretora do projeto Futuro da Diplomacia, da Universidade de Harvard.

Não somente Obama elogiou a Alemanha por "estar do lado certo da história", mas, em geral, a população americana apreciou o gesto humanitário, vendo uma coincidência com o seu próprio passado de imigração. Quando se trata do acordo sobre refugiados com a Turquia, porém, China e EUA são céticos.

Não só refugiados da Síria e Oriente Médio foram à Alemanha, mas também de países africanos como EritreiaFoto: imago/epd

O bom, o mau e a liderança de Merkel

Para o mundo, Merkel é uma líder política fascinante cujo nome se tornou sinônimo de Alemanha. Ela é, para alguns, é uma mulher consciente, física meticulosa ou a imperatriz "cool" da Europa. Para outros, ela é uma tola cujo poder subiu à cabeça.

Ao longo da última década, seus três governos moldaram a reputação da Alemanha na União Europeia. A um ano das eleições de 2017, seu terceiro mandato poderá ser o último – e isso depende muito da evolução da crise de refugiados.

No ano passado, temas como imigração, terrorismo, extrema direita e o Brexit colocaram Berlim como um gestor de crises versátil, para o desgosto de uns e prazer dos outros.

A economista Anne-Laure Delatte, da Sorbonne, afirma que uma União Europeia centrada na Alemanha implica em questões maiores sobre a eficácia do bloco.

"Nós não deveríamos estar falando sobre a tomada de decisões da Alemanha para a Europa. Nós deveríamos estar falando sobre um grupo de países tomando decisões para eles mesmos", afirma Delatte.

Mas existe ainda uma questão maior, afirma Kalypso Nicolaidis, que chefia os estudos internacionais na Universidade de Oxford: conseguirá a Alemanha, uma "líder relutante", lidar com a reputação internacional como potência, protagonista internacional e, ainda, achar um tom apropriado levando em conta o seu passado nazista?

"Se há um país que está convencido que é problemático ver o ressurgimento de um certo tipo de Alemanha na Europa, esse país é a própria Alemanha", afirma Nicolaidis.

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