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Como o negacionismo da pandemia entrou na eleição alemã

26 de agosto de 2021

Após organizarem protestos, negacionistas alemães querem espaço na política. Parte deles opta pela sigla de ultradireita AfD, outros fundam um partido para reunir ativistas antivacinas e adeptos de "curas alternativas".

Em protesto, mulher levanta folha com a palavra "liberdade" em alemão
"Liberdade", diz cartaz em protesto negacionista: movimento vê restrições como ataque a direitos constitucionaisFoto: Christian Mang/REUTERS

Henning Hacker, como muitos em seu movimento, diz que não era político até o ano passado. O especialista em TI e advogado de direitos autorais de 41 anos é agora líder berlinense de um novo partido chamado Die Basis ("a base"). 

Ele concorda que a covid-19 é uma doença perigosa "até certo ponto", mas argumenta que não é perigosa o suficiente para justificar as medidas que foram impostas na Alemanha. "No início, minha impressão realmente foi achar que, embora as medidas possam ser um pouco exageradas, eles querem garantir segurança, parece ser razoável", afirma. "Mas então, quando ficou claro que as medidas não ajudavam e que a disseminação estava dentro dos limites de uma infecção comum, pensei: 'agora todas as medidas serão revertidas'."

Imune a argumentos

Como isso não aconteceu, Hacker entrou em ação política, acreditando que estava defendendo as liberdades constitucionais da Alemanha. "Eu apenas pensei 'como pode ser? Os direitos básicos só podem ser suspensos em emergências'", diz. Então ele se juntou aos protestos contra o lockdown que ocuparam ruidosamente muitas praças de cidades alemãs ao longo do ano passado, e que incluíam algumas figuras como populistas, membros da extrema direita e propagadores de teorias conspiratórias.

Hacker se tornou um dos membros fundadores do Die Basis em julho passado. Ele é imune a todos os argumentos apresentados por virologistas e outros especialistas que apareceram em todos os canais, implorando ao público para levar o novo vírus a sério. A ideia de que as medidas de prevenção do governo podem ter sido a razão pela qual a disseminação da covid-19 na Alemanha e o número de mortos permaneceram relativamente baixos no verão passado, ou que essas medidas foram necessárias para proteger os hospitais de serem sobrecarregados – nenhum desses argumentos o impressionam.

Para Hacker, o fato de as unidades de terapia intensiva da Alemanha nunca terem estado cheias prova que o confinamento não era necessário e que todas as medidas de saúde pública atualmente em vigor – incluindo a aplicação de vacinas – são não apenas desnecessárias, mas também possivelmente prejudiciais.

Henning Hacker, cofundador do partido Die BasisFoto: Benjamin Knight/DW

Partido de protesto

Thomas Bräuninger, professor de ciência política da Universidade de Mannheim que escreveu sobre como novos partidos são formados, descreve o Basis como um "partido de protesto clássico", sustentado por uma única questão. Mas isso não significa, segundo ele, que aqueles que se aderem ao partido têm apenas uma motivação. "É um grupo extremamente heterogêneo de indivíduos que têm motivações muito diferentes", diz Bräuninger. "Há uma desconfiança geral das elites. E essas pessoas acham que as coisas não podem continuar assim, que o governo deveria ouvir o povo."

Embora os argumentos do Die Basis contrariem os conselhos de autoridades de saúde pública, a sigla representa uma certa onda de sentimento anti-lockdown que está tendo um efeito perceptível na atual campanha eleitoral da Alemanha.

O Partido Liberal Democrático (FDP) e o partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD) foram adotando posições contra o lockdown mais duras à medida que a campanha eleitoral avançava.

No final de julho, o líder do FDP, Christian Lindner, pediu uma "garantia política" de que não haveria novos confinamentos no segundo semestre. A colíder da AfD, Alice Weidel, fez praticamente a mesma exigência em termos mais ruidosos na mesma época, divulgando uma declaração afirmando que "com suas políticas de lockdown, o Estado está destruindo a prosperidade da sociedade".

Agora, no final de agosto, até mesmo o candidato a chanceler da União Democrata-Cristã (CDU), Armin Laschet, que é apoiado por Angela Merkel, aparentemente concordou com essa pressão, aparecendo no tabloide Bild para proclamar que "nunca mais haverá um lockdown" se ele for eleito.

Reviravolta

A intervenção de Weidel é particularmente notável porque em março de 2020 ela estava igualmente irritada com o governo por não impor medidas de saúde pública mais duras. Quando os casos de coronavírus em toda a Alemanha mal chegaram a um total de mil, ela disse em um comunicado que "o comportamento dos políticos é irresponsável e põe em risco a vida das pessoas em nosso país".

Alice Weidel, da AfD: "Políticas de lockdown destroem a prosperidade da sociedade"Foto: Kay Nietfeld/dpa/picture-alliance

Mas essa é uma reviravolta perfeitamente razoável, de acordo com Ronald Gläser, porta-voz da AfD no partido de Berlim. "Estávamos sendo apresentados como histéricos quando Weidel disse que as fronteiras tinham que ser fechadas e o país tinha que se preparar para um cenário de desastre", afirma ele. "Mas então o governo viu a chance de usar as limitações dos direitos básicos para criar uma situação de emergência, como em uma guerra. Não estamos negando o vírus, mas o perigo deve ser encarado com sobriedade."

Gläser admite que a AfD está agora buscando o mesmo grupo de eleitores do Basis, mas que o novo partido ainda precisa provar que pode ganhar votos "fora de sua bolha". "Somos uma força confiável para as pessoas preocupadas com essas limitações aos direitos básicos", acrescenta.

AfD não era alternativa

Die Basis agora afirma ter 25 mil membros na Alemanha, o que não é desprezível, já que a AfD atualmente tem 32 mil membros, e há certos paralelos entre os dois partidos.

Ambos foram fundados em resposta direta ao que consideraram medidas governamentais drásticas e ilegais impostas em resposta a uma crise. A AfD foi formada em 2013 por um grupo de economistas eurocéticos irritados com a ajuda da Alemanha às economias mais fracas da União Europeia. Em 2015, no entanto, a AfD se metamorfoseou num movimento movimento nacionalista anti-islamização diante da crise dos refugiados.

"Mas os paralelos são limitados", diz Hacker. Ele e muitos dos membros de seu partido acreditam que os partidos maiores são simplesmente oportunistas ao enviar agora mensagens contra o lockdown.

"Entre os partidos estabelecidos, não vimos nenhum realmente aberto aos nossos principais pontos de crítica", diz. Mas ele também vê pouca coisa em comum com os populistas de ultradireita. "A AfD é um pouco nacionalista demais para muitos de nós."

Pronunciamentos de membros do Die Basis revelam ainda uma mistura de posições antivacinas e desconfiança do consenso científico. Segundo a imprensa alemã, além de propagadores de teorias conspiratórias, o partido tem atraído adeptos de curas alternativas e outros tratamentos pseudocientíficos. Apesar de membros do partido expressarem que querem distância da extrema direita, pesquisadores que acompanham a cena extremista da Alemanha apontam que o partido não faz esforços efetivos nesse sentido. Um dos candidatos do partido ao Parlamento foi acusado recentemente de expressar declarações antissemitas.

O partido ainda não mostrou força eleitoral. Em março, a legenda participou das eleições regionais do estado de Baden-Württemberg e conquistou apenas 1% do eleitorado.

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