Como os EUA podem reagir à condenação de Bolsonaro?
12 de setembro de 2025
Após ex-presidente ser condenado a mais de 27 anos de prisão por tentativa de golpe, cresce o temor que o governo Trump lance novas sanções contra o Brasil ou autoridades do país.
Trump se disse surpreso com condenação de seu aliado brasileiroFoto: youtube
A dinâmica contenciosa entre Brasília e Washington ganhou fôlego com a ida aos EUA em fevereiro do deputado federal Eduardo Bolsonaro. Desde então, o filho de Jair Bolsonaro tem intensificado suas articulações políticas em solo americano para conseguir apoio de organizações conservadoras e setores do governo dos EUA, visando pressionar as autoridades brasileiras a partir do exterior para livrar seu pai de sanções legais e políticas no Brasil.
"Caças às bruxas"
Os esforços do deputado brasileiro parecem ter surtido efeito. Em julho, o presidente dos EUA, Donald Trump, enviar carta ao presidente Lula, vinculando a imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros importados à situação jurídica de Bolsonaro, chamando o processo contra o ex-presidente de uma "caça às bruxas".
Rubio ameaçou "responder de forma adequada" à condenação de BolsonaroFoto: Mark Schiefelbein/AP/dpa/picture alliance
Pouco depois da condenação de Bolsonaro, o governo dos EUA sinalizou que pretende impor mais retaliações contra o Brasil.
Em mensagem publicada nesta quinta-feira na rede X, o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, chamou o julgamento do aliado brasileiro de "caça às bruxas" e disse que a Casa Branca vai "responder de forma adequada". Rubio também chamou o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo contra Bolsonaro, de "violador de direitos humanos".
Antes, o próprio Trump também comentou brevemente o resultado do julgamento, afirmando ter ficado surpreso com a condenação e comparando a situação jurídica do aliado brasileiro com os problemas que ele mesmo enfrentou na Justiça americana antes de retornar à Casa Branca.
"Eu assisti ao julgamento. Eu o conheço bem. Como líder estrangeiro, achei que ele foi um bom presidente. É muito surpreendente que isso tenha acontecido. É muito parecido com o que tentaram fazer comigo, mas não conseguiram de jeito nenhum. Mas só posso dizer o seguinte: eu o conheci como presidente do Brasil. Ele era um homem bom", afirmou.
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Sanções contra o STF
Ministros do STF também estão sofrendo sanções de Washington, que suspendeu o visto de entrada nos EUA dos ministros Alexandre de Moraes, Luis Roberto Barroso, Edson Fachin, Dias Toffoli, Cristiano Zanin, Flavio Dino, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia.
Além disso, Moraes também sofreu sanções econômicas, com base na Lei Magnitsky, anunciadas pelo governo americano no final de julho. O magistrado é acusado pela Casa Branca de suprimir a liberdade de expressão e conduzir processos judiciais politizados contra Bolsonaro e censurar a plataformas digitais americanas, afetando não só brasileiros, mas também interesses americanos.
A medida tem entre as punições previstas o bloqueio de bens e contas nos EUA, além da proibição de entrada em território americano.
Possíveis próximos alvos de Trump
Aliados de Bolsonaro apostam, nos bastidores, em uma nova aplicação da Lei Magnitsky nas próximas semanas, em resposta à condenação do ex-chefe do Planalto.
Um dos alvos da sanção pode ser o procurador-geral da República, Paulo Gonet, responsável pela denúncia apresentada contra Bolsonaro. Os aliados do ex-presidente acreditam, ainda, que podem passar a ser alvos da lei a esposa e outros familiares de Moraes, além de empresas associadas.
Alexandre de Moraes é alvo da Lei Magnitsky: sanção pode ser estendida a outras autoridades brasileirasFoto: Adriano Machado/REUTERS
Há quem aposte também que outros ministros do STF podem também ser afetados pela Lei Magnitsky. Após a condenação do pai, Eduardo Bolsonaro alertou que todos os ministros do Supremo que votaram pela condenação do ex-presidente podem enfrentar sanções sob a lei.
Estes seriam os ministros Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin apoiaram Moraes no julgamento, sendo Luiz Fux o único dissidente, que votou pela absolvição de Bolsonaro.
Autoridades do governo brasileiro poderiam também ser alvejadas, segundo afirmou Oliver Stuenkel, professor de relações internacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV), em entrevista à agência de notícias AP.
A reação americana "também pode envolver restrições mais amplas de vistos para funcionários do governo ou mais tarifas", disse Stuenkel. "É bastante imprevisível", ponderou.
md (AP, ots)
Ex-presidentes latino-americanos que já foram presos
A prisão domiciliar de Bolsonaro não é um caso isolado na América Latina. Mais de uma dúzia de líderes de outros países da região, como Argentina, Honduras, Peru e Panamá também enfrentaram problemas com a Justiça.
Foto: Alan Santos/Brazilian Presidency/REUTERS
Jair Bolsonaro (Brasil)
Acusado de liderar uma trama golpista após a eleição de 2022 e réu em diferentes ações na Justiça, o ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022) teve decretada prisão domiciliar em agosto de 2025 após ser acusado de violar medidas cautelares impostas pelo Supremo, como a proibição de usar redes sociais.
Foto: Evaristo Sa/AFP
Michel Temer (Brasil)
Presidente entre maio de 2016 até o fim de 2018, Michel Temer foi preso em março de 2019, poucos meses depois de deixar o cargo, no âmbito de um desdobramento da Lava Jato. Foi solto quatro dias depois, mas voltou a ser preso por mais seis dias em maio de 2019. O caso foi posteriormente anulado pela Justiça.
Foto: Imago Images/Agencia EFE/F. Bizerra Jr
Fernando Collor (Brasil)
Presidente entre 1990 e 1992, Collor foi condenado por corrupção pelo Supremo em maio de 2023, em um processo que teve origem na Operação Lava Jato. Em abril de 2025, foi levado a um presídio em Maceió, no estado de Alagoas, para cumprir pena de 8 anos e 10 meses de prisão. Seis dias depois, passou a cumprir pena em casa.
Foto: EVARISTO SA/AFP
Lula (Brasil)
Lula, que governou o Brasil entre 2003 e 2010, passou 580 dias na prisão entre abril de 2018 e novembro de 2019, após ser condenado por corrupção. Em março de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou as duas sentenças por irregularidades processuais cometidas pelo Ministério Público e pelo juiz do caso. Assim, conseguiu disputar a eleição de 2022, na qual derrotou Jair Bolsonaro.
Foto: Reuters/R. Buhrer
Cristina Kirchner (Argentina)
Ex-presidente da Argentina (2007-2015) e ex-vice (2019-2023), Cristina Kirchner teve em junho de 2025 uma pena de seis anos de prisão por corrupção confirmada pela Suprema Corte. No mesmo mês, começou a cumprir prisão domiciliar - a a lei argentina que prevê essa possibilidade para pessoas com mais de 70 anos.
O presidente argentino Carlos Menem (1989-1999) enfrentou diversos processos. Em seu primeiro julgamento, em 2008, foi acusado de tráfico de armas para o Equador e a Croácia entre 1991 e 1995. Passou seis meses em prisão domiciliar preventiva em 2001, e foi solto depois que a Justiça anulou as acusações. A partir de 2005, teve imunidade como senador, cargo que ocupou até sua morte em 2021
Foto: Ricardo Ceppi/Getty Images
Jeanine Áñez (Bolívia)
Jeanine Áñez assumiu a presidência interina da Bolívia em 12 de novembro de 2019 como segunda vice-presidente do Senado, dois dias após a renúncia de Evo Morales. Ela foi detida em 13 de março de 2021, e numa decisão polêmica, um tribunal a condenou a 10 anos de prisão pelos crimes de violação de deveres e resoluções contrárias à Constituição. Em agosto de 2025, ele continuava presa
Foto: Juan Karita/AP Photo/picture alliance
Ricardo Martinelli (Panamá)
Ricardo Martinelli, que governou o Panamá de 2009 a 2014, foi preso em junho de 2017 na Flórida. No ano seguinte, foi extraditado para ser julgado em seu país num caso sobre escutas ilegais, do qual foi posteriormente absolvido. Em 2019, foi solto. Em 2024, no entanto, voltou a ser condenado em outro caso e no mesmo ano se abrigou numa embaixada. Em agosto de 2025, vivia como asilado na Colômbia.
Foto: picture-alliance/AP Images/A. Franco
Juan Orlando Hernández (Honduras)
O ex-presidente hondurenho Juan Orlando Hernández (2014-2022) foi extraditado para os Estados Unidos em abril de 2022, onde foi acusado de conspiração para importar cocaína, posse de metralhadoras e armas pesadas e conspiração para possuir tais armas. Em 2024, foi condenado a 45 anos de prisão. Em agosto de 2025, ele seguia detido em uma penitenciária dos EUA
Foto: Andy Buchanan/AFP
Antonio Saca (El Salvador)
Presidente de El Salvador entre 200e e 2009, Antonio "Tony" Saca foi condenado a 10 anos de prisão em 2018 após se declarar culpado por desviar mais de US$ 300 milhões em fundos públicos durante seu mandato. Em agosto de 2025, ele estava cumprindo pena na prisão La Esperanza, em El Salvador.
Foto: Rodrigo Sura/Agencia EFE/IMAGO
Otto Pérez Molina (Guatemala)
General aposentado que governou a Guatemala de 2012 a 2015, Otto Pérez Molina foi preso um dia depois de renunciar ao cargo. Ele foi condenado a 16 anos de prisão por liderar uma rede milionária de fraudes alfandegárias. Ele deixou a prisão em 2024 após pagar fiança.
Foto: Luis Vargas/AA/picture alliance
Álvaro Uribe (Colômbia)
Acusado de fraude processual e suborno, o ex-líder colombiano Álvaro Uribe (2002-2010) ficou 67 dias na prisão em 2020 "devido a possíveis riscos de obstrução da Justiça". Em julho de 2025, foi condenado a 12 anos de detenção, a serem cumpridos em prisão domiciliar.
Foto: Long Visual Press/LongVisual/ZUMA Press/picture alliance
Alberto Fujimori (Peru)
Alberto Fuijimori, que governou o Peru entre 1990 e 2000, deu um autogolpe em 1992. Seu governo foi marcado por vários casos de corrupção. Em 2005, foi preso no Chile e depois extraditadi. Posteriormente, foi condenado a 25 anos de prisão por homicídio qualificado, usurpação de funções, corrupção e espionagem, além de desvio de fundos. Em 2023, foi solto. Fujimori morreu no ano seguinte.
Foto: Martin Mejia/AP/picture alliance
Pedro Castillo (Peru)
Pedro Castillo, destituído da presidência do Peru após ter ordenado a dissolução do Parlamento em dezembro de 2022, foi detido e levado ao presídio de Barbadillo. Às acusações de corrupção que já enfrentava, o Ministério Público acrescentou a do alegado crime de rebelião "por violação da ordem constitucional". Em agosto de 2025, o ex-presidente seguia detido.
Foto: Renato Pajuelo/AP/picture alliance
Pedro Pablo Kuczynski (Peru)
Presidente do Peru de 2016 até sua renúncia em 2018 na esteira de um processo de impeachment, Pedro Pablo Kuczynski foi alvo de prisão preventiva em 2019 no âmbito do escândalo Odebrecht. Alegando problemas de saúde, passou a cumprir a medida em casa. Em agosto de 2025, ainda cumpria várias medidas cautelares, como proibição de deixar o país.
Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Mejia
Ollanta Humala (Peru)
Ollanta Humala (2011-2016) completou seu mandato presidencial no Peru, mas, um ano depois, foi colocado em prisão preventiva. Ele e a esposa foram investigados pelo suposto recebimento ilegal de dinheiro da Odebrecht. Em abril de 2018, o Tribunal Constitucional do Peru revogou a prisão. Em 2021, se candidatou novamente à Presidência, mas recebeu apenas 1,5% dos votos. Em 2025, voltou a ser preso.
Foto: El Comercio/GDA/ZUMA Press/picture alliance
Alejandro Toledo (Peru)
Presidente do Peru entre 2001 e 2006, Alejandro Toledo foi condenado em outubro de 2024 a 20 anos e seis meses de prisão por corrupção. Detido nos EUA em 2023 e extraditado no mesmo ano, ele cumpria pena no Peru em agosto de 2025.
Foto: Guadalupe Pardo/AP/picture alliance
Martín Vizcarra (Peru)
Martín Vizcarra foi o sexto ex-presidente do Peru a se somar à lista de presos. Ele governou o Peru entre 2018 até 2020, quando foi afastado em meio a um processo de impeachment. Sua prisão preventiva em agosto de 2025 envolveu suspeita de risco de fuga em meio a um processo de crime de suborno.