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Prisão de jornalista influencia relação Alemanha-Turquia

Andrea Grunau rk
14 de fevereiro de 2018

Deniz Yücel, de nacionalidade alemã e turca, completa um ano de prisão no país presidido por Erdogan. Para alguns analistas, jornalista é refém das relações diplomáticas que os dois países tentam normalizar.

Deniz Yücel aparece em cartaz de manifestação realizada em Hamburgo contra jornalistas presos na Turquia
Cartaz de manifestação realizada em Hamburgo contra jornalistas presos na TurquiaFoto: picture alliance / rtn - radio tele nord

Deniz Yücel trabalhava como correspondente para o diário conservador alemão Die Welt quando foi detido pela polícia em Istambul, na Turquia, em 14 de fevereiro de 2017. Um mandado de prisão foi emitido pouco tempo depois. No mês seguinte, o jornalista de 43 anos, de nacionalidade alemã e turca, foi transferido para a prisão de segurança máxima de Silivri.

Por ele ter permanecido sob custódia das autoridades turcas sem uma acusação formal, vários representantes da imprensa e defensores de direitos humanos consideram o correspondente um refém do governo presidido por Recep Tayyip Erdogan.

Leia também: Turquia e Alemanha sinalizam reaproximação

O ministro alemão do Exterior, o social-democrata Sigmar Gabriel, pediu a libertação de Yücel, afirmando que a prisão do jornalista "continua sendo um dos grandes obstáculos nas relações bilaterais entre a Alemanha e a Turquia".

"Continuamos conduzindo o diálogo em direção a um processo rápido e justo", acrescentou Gabriel. "Na nossa visão, o único objetivo é a libertação de Deniz Yücel."

Nesta quarta-feira (14/02), exatamente um ano depois de sua detenção, Yücel e colaboradores estão lançando uma nova antologia, intitulada Wir sind ja nicht zum Spass hier (Não estamos aqui de brincadeira, em tradução livre). Na obra, que conta com várias manifestações de solidariedade de artistas, atores e jornalistas, Yücel diz que sua prisão mostrou uma perspectiva diferente sobre as histórias que ele estava apurando.

"Eu já tinha conversado com vítimas de tortura no passado, inclusive com sobreviventes do Holocausto", escreve o jornalista. "Mas agora sei que, quando se é uma vítima da violência de um Estado, ouve-se esses relatos com outros ouvidos."

Em seu texto, escrito na prisão, Yücel descreve como conheceu Cengiz, um combatente do banido Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), preso em 1996. Com "olhos que expressavam o impronunciável", Cengiz teria descrito a Yücel como foi torturado sadicamente por uma unidade especial do Exército turco. Yücel também descreve uma briga com Cengiz, que, "com o jargão frio de um soldado partidário", teria negado a culpa do PKK na escalada da violência e na morte de civis.

"Deniz Yücel é alguém que nunca mediu palavras em suas reportagens. Ele atacou representantes tanto da direita quanto da esquerda e escreveu análises afiadíssimas", avalia Kristian Brakel, diretor da Fundação Heinrich Böll em Istambul, em entrevista à DW.

O jornalista alemão e turco Deniz YücelFoto: picture-alliance/Eventpress/Stauffenberg

Brakel acredita que Yücel esteja sendo punido por suas duras críticas ao governo turco. "É difícil dizer se o objetivo inicial [da prisão do correspondente] era que a Alemanha cedesse em alguma coisa, mas definitivamente houve uma tentativa de usá-lo para fins de chantagem", afirma. Yücel foi acusado de "incitação ao ódio" e de "propaganda terrorista". Oito textos jornalísticos que ele escreveu ao jornal Die Welt foram mencionados.

Dois deles podem ser lidos na nova antologia de Yücel: uma entrevista com o vice-líder do PKK, que admite que "houve execuções internas", e um texto intitulado O golpista, que descreve como o presidente turco ampliou seus poderes.

Doris Akrap, editora e amiga do correspondente, escreveu no prólogo: "Em outros países, ganha-se prêmios jornalísticos por esse tipo de texto. Na Turquia, o prêmio é a prisão."

Justiça independente?

Depois da tentativa fracassada de golpe de Estado na Turquia, em julho de 2016, o governo começou a prender pessoas de forma maciça, incluindo pelo menos 28 cidadãos alemães (sem contar Yücel). Segundo dados do Ministério do Exterior alemão, apenas seis deles não foram libertados. Entre os que foram soltos estão o ativista de direitos humanos Peter Steudtner e a jornalista e tradutora Mesale Tolu.

O próprio Erdogan se envolveu pessoalmente no caso de Deniz Yücel: "Ele é, realmente, um agente e um terrorista. Não é jornalista de jeito nenhum. E a embaixada alemã o escondeu durante um mês inteiro em sua residência de verão", acusou o presidente turco.

Para Brakel, esse tipo de declaração revela uma paranoia alimentada por alguns oficiais do governo que têm "a ideia de que europeus e americanos querem, juntos, destruir a Turquia".

Sobre uma possível viagem de Yücel à Alemanha, Erdogan chegou a dizer: "De jeito nenhum, jamais enquanto eu estiver à frente do governo." Mas, segundo Brakel, durante conversa com o ministro Sigmar Gabriel, o presidente turco teria feito uma oferta informal "para trocar Yücel por parentes de militares turcos que participaram da tentativa de golpe e que receberam asilo na Alemanha".

O ministro alemão do Exterior, Sigmar Gabriel, serve chá ao homólogo turco Çavusoglu em sua casa em GoslarFoto: Imago/photothek/F. Gaertner

Duas semanas após a prisão do correspondente, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, afirmou: "Jornalistas têm que poder fazer seu trabalho. Por isso, estamos pensando em Deniz Yücel, que está em prisão preventiva na Turquia e cuja libertação é exigida por nós por acreditarmos que ele não fez nada além de buscar um trabalho jornalístico independente." A líder ainda prometeu que "o governo alemão fará tudo o que está em seu poder para assegurar que aconteça exatamente isso".

Por outro lado, críticos avaliam que, num primeiro momento, o governo em Berlim fez pouco para pressionar pela libertação de cidadãos alemães na Turquia. Kristian Brakel explica que existem tantas relações intrincadas nas áreas econômica, militar e cultural que é difícil para a Alemanha "exercer muita pressão sem se prejudicar ao mesmo tempo".

Reaquecendo relações diplomáticas

Os governos da Alemanha e da Turquia demonstraram que estão comprometidos em restaurar a normalidade em sua tensa relação. Recentemente, Gabriel visitou seu homólogo turco, Mevlüt Çavusoglu, e também o recebeu em sua própria casa em Goslar, na Baixa Saxônia, atraindo a atenção da imprensa ao servir chá ao colega.

Em várias ocasiões, Çavusoglu descreveu o ministro alemão como seu "amigo Sigmar" – um aliado de quem ele espera ajuda para expandir a união aduaneira da União Europeia (UE) para que esta inclua a Turquia. Outra medida esperada pelo governo turco é que a Alemanha continue auxiliando Ancara no setor armamentício e militar. Gabriel, por sua vez, deixou claro que mais fornecimento de armas depende da resolução de problemas – incluindo o caso de Deniz Yücel.

Ações de solidariedade com Deniz Yücel chamam atenção para direitos humanos na TurquiaFoto: picture-alliance/dpa/A. Arnold

Moeda de troca

O jornalista expressou preocupação de que os governos dos dois países possam tentar usá-lo como instrumento de negociação política. Em entrevista à agência alemã de notícias DPA por meio de seus advogados, Yücel mencionou acordos que o governo da França teria feito com a Turquia, dizendo não querer que sua liberdade seja "manchada com acordos de tanques [da empresa] Rheinmetall" ou pela extradição, pela Alemanha, "de oficiais pró-golpe". Ele deixou claro: "Não estou à disposição para acordos sujos." Já Gabriel rebateu a afirmação, dizendo que não há "acordo sujo" em andamento.

Yücel não deve se calar. Ele diz que pretende continuar observando, escrevendo e trabalhando como jornalista, mesmo que tenha de fazê-lo na prisão. Quando estava sob custódia da polícia, chegou a escrever ao lado de ilustrações de um exemplar do livro O Pequeno Príncipe, que foi depois contrabandeado para fora. Em seu novo livro, ele promete continuar seu trabalho, "porque não está aqui para brincar".

A intenção é compartilhada pelos colaboradores da nova obra: "Existe só um motivo para prender pessoas como Deniz Yücel: querem obrigá-las a, finalmente, se calar. Para que fique claro que isso não vai dar certo, publicamos este livro", escreve Doris Akrap no prólogo.

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