Como visitar o México sem falar do muro nem de Trump
10 de junho de 2017
Passagem de Angela Merkel por país latino-americano arrisca confirmar especulações de que ela queira ocupar o vácuo de poder deixado pelos EUA. Mas chefe de governo alemã não poupa esforços para desfazer tal impressão.
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Algumas perguntas simplesmente se recusam a ir embora. A que persegue a chanceler federal alemã, Angela Merkel, neste seu breve giro pela América Latina, é se ela almeja um papel de liderança mundial, agora que os Estados Unidos vão subindo a ponte levadiça em relação ao resto do mundo.
A resposta curta é: não, não há qualquer sinal de tal intenção. Pelo contrário, a chefe de governo conservadora tem repetidamente enfatizado sua missão de preparar a cúpula do G20, a fim de dispersar a impressão de qualquer tipo de aliança anti-Trump.
O encontro do G7 na Sicília, em maio, comprovou que uma dinâmica de seis contra a potência mundial EUA só aprofunda os cismas já existentes no Ocidente. Com a conferência de cúpula do G20 programada para julho na Alemanha, qualquer tipo de cenário "19 contra um", entre o presidente americano, Donald Trump, e as demais principais economias, se transformaria em sujeira para Merkel limpar. Ou pior: poderia ser visto como uma sujeira criada, em parte, pela incompetência dela como líder.
Agora, a questão real: o vácuo criado por Trump na América Latina – e, ainda mais alarmante, no resto do mundo – vai permitir a Merkel escapar do papel de "líder por falta de alternativa"? Também aqui, a resposta curta é "não". O giro da premiê pela Argentina e o México tem confirmado isso continuamente.
Encurralado pelo populismo de esquerda
No México, segunda e última parada de Merkel depois da Argentina, ela se encontra com Enrique Peña Nieto, presidente do país com o maior número de acordos de livre-comércio do mundo. Mesmo assim, contudo, com 80% das exportações indo para o poderoso vizinho ao norte, o México vive numa coleira curta, que os EUA seguram bem firme.
Acrescentando-se a ameaça do ainda ilusório muro de fronteira, tem-se uma ideia do sofrimento diário que é para Peña Nieto tentar rechaçar a ascensão do populismo de esquerda em seu país. Tudo isso se traduz em dinamite política, podendo resultar na queda de seu Partido Revolucionário Institucional (PRI) nas eleições de 2018.
O populismo mexicano se alimenta do sentimento antiamericano, o qual, não é de espantar, bate no teto desde a posse de Donald Trump. Não há dúvida de que o México saudará qualquer tipo de respaldo que Merkel tenha a oferecer. E ela está acompanhada por uma poderosa delegação de negócios, com bilionário valor potencial de investimentos.
Alternativa para o gelo comercial americano
Outra meta para o presidente mexicano é avançar o mais rápido no acordo de livre-comércio entre seu país e a União Europeia, num momento em que os EUA pressionam pela renegociação do Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta, na sigla em inglês), que inclui também o Canadá.
Da agenda dos líderes comerciais alemães consta um encontro com o renegociador-chefe mexicano do Nafta, Ildefonso Guajardo. Eles têm muito sobre que conversar. Há poucos sinais de que Washington esteja ciente daquilo que diversos líderes do comércio internacional já percebem como fato: onde os EUA se retirarem, outros logo agarrarão as oportunidades comerciais livres.
O ângulo otimista da política trumpista em relação ao México é que aquilo que atualmente soa como uma ameaça de morte para a indústria do país pode se transformar em catalisador involuntário para um futuro mais diversificado. Por outro lado, a geografia também desempenha um papel no comércio global, e essa perspectiva poderá se provar demasiado ambiciosa.
Liberdade de imprensa, crise migratória
Mas encontrar-se com Merkel significa mais do que negócios para Peña Nieto. Ele não é conhecido como paladino na livre imprensa, menos ainda por responder às perguntas desta. Mas atualmente uma série de assassinatos de jornalistas que noticiavam sobre os cartéis das drogas mostra como é mortal o aperto do narcotráfico contra as estruturas estatais mexicanas.
Jornalistas sob pressão
02:28
Uma vez que Merkel insistiu em se encontrar com organizações da sociedade civil, durante de sua estada de 20 horas no país latino-americano, a esperança é que o presidente também comece a reconhecer o papel da livre imprensa como uma aliada no combate ao crime – em vez de inimiga na batalha diária do chefe de Estado para controlar sua imagem pública.
Desde 2015, Alemanha e México também compartilham uma experiência que transformou ambos os países. A chanceler federal tem relativamente pouca experiência em lidar com grandes contingentes de imigrantes. A maior parte de cerca de 800 mil migrantes, muitos fugindo da guerra na Síria, chegou à Alemanha dois anos atrás, quando Merkel suspendeu as regras vigentes da UE para requerentes de asilo.
Nesse tópico, o México tem certa dianteira, por ser, há décadas, tanto rota de trânsito quanto país de origem para milhões que procuram uma vida melhor nos Estados Unidos. Com a ameaça do "muro de trump", o México vem intensificando os esforços para sustar o fluxo migratório da América Central e do Sul em direção à fronteira americana. Merkel espera conquistar o apoio mexicano para a iniciativa que lançará no G20, de melhorar as condições de vida nos países africanos de onde vêm muitos dos refugiados na Europa.
Drama político ou meias palavras
Peña Nieto e Merkel são bem mais distintos em estilo político do que a premiê e o presidente da Argentina, Mauricio Macri, que ela visitou na primeira parte do giro-relâmpago.
Enquanto os dois últimos são surpreendentemente parecidos, com seu jeito calmo e controlado e linguagem objetiva, o chefe de Estado mexicano é mais inclinado a um pouco de drama político e sem medo de estabelecer publicamente "linhas vermelhas", também em relação aos EUA.
Quando Trump o convidou à Casa Branca para conversar sobre o muro fronteiriço, Peña Nieto mandou dizer que estava indisponível. Embora ela mesma não seja a interlocutora mais direta do mundo, Angela Merkel costuma valorizar parceiros que deixem clara a própria posição.
Filmes sobre a fronteira entre EUA e México
Em seu mandato, o ex-presidente americano Donald Trump prometeu construir um muro entre EUA e México. Mas, muito antes disso, esta fronteira já havia sido foco de filmes espetaculares. Veja a lista.
Foto: picture-alliance/United Archives/TBM
John Wayne em guerra
Em meados do século 19, EUA e México entraram em guerra sobre o estado do Texas, que pertencia aos mexicanos, mas foi anexado pelos americanos. A longa disputa foi muitas vezes retratada por Hollywood nos faroestes que detalhavam os violentos conflitos entre colonos americanos e o Exército mexicano. Entre os mais espetaculares está "Álamo" (1960), estrelado por John Wayne e Richard Widmark.
Foto: picture-alliance/United Archives/TBM
Dietrich e a fronteira
Em 1958, Marlene Dietrich fez uma breve aparição no brilhante suspense "A marca da maldade". O diretor Orson Welles, que teve o papel principal no filme, fez da região fronteiriça entre México e EUA o cenário para falar sobre corrupção, tráfico de drogas e outros crimes.
Foto: picture-alliance/United Archives/IFTN
"Rio Bravo"
Quando John Wayne apareceu em "Álamo", a grande era do faroeste americano estava quase no fim. Mas, quando o gênero cresceu na década de 1950, muitos faroestes se passaram na fronteira entre Texas, Novo México e Arizona de um lado, e o México, do outro. Um marco simbólico era o rio Grande que, localizado nesta fronteira, rendeu o título do legendário filme do diretor John Ford, de 1950.
Foto: picture-alliance/Mary Evans Picture Library
A fronteira em faroestes posteriores
No entanto, a fronteira entre os dois países conseguiu manter sua importância em numerosos faroestes lançados posteriormente. A região desempenhou um papel de destaque em "Meu ódio será tua herança" (1969), do diretor Sam Peckinpah, um épico do faroeste selvagem com muito sangue e que enfoca a ilegalidade em uma terra esquecida.
Foto: Imago/Entertainment Pictures
Variações modernas
O diretor americano Robert Anthony Rodriguez tem uma paixão pela região de fronteira, o que talvez se deva às suas raízes mexicanas. Muitos de seus filmes reproduzem o choque de culturas nesta região fronteiriça. Seu filme "Um drink no inferno", de 1996, viu Quentin Tarantino e George Clooney encenando irmãos que roubam bancos e que tentam fugir para o México.
Foto: picture-alliance/United Archives
Não há lugar para envelhecer
Ganhador de vários Oscars em 2008, entre eles o de melhor filme e direção, "Onde os fracos não têm vez" foi dirigido pelos irmãos Joel e Ethan Coen. A produção aborda as drogas, máfia, assassinatos e fraudes. O filme se passa na fronteira entre EUA e México – um lugar perigoso, onde a morte é comum e poucos envelhecem.
Foto: picture-alliance/dpa/Paramount Pictures
Ao sul de Albuquerque
Albuquerque, no Novo México, é o cenário da extremamente popular série de televisão "Breaking Bad", que foi produzida entre 2008 e 2013. Ela enfoca histórias na região envolvendo drogas. Ao sul de Albuquerque, fica a lendária fronteira entre Estados Unidos e México.
Foto: Frank Ockenfels 3/Sony Pitures
O lado obscuro do comércio
No filme "Desaparecidos" (2007), o diretor alemão Marco Kreuzpaintner escolheu contar a história de crianças mexicanas que atravessam a fronteira para os Estados Unidos como parte do tráfico de escravos sexuais. A estrela de Hollywood Kevin Kline desempenhou o papel principal.
Foto: picture-alliance/kpa
Guerra de drogas na fronteira
"Sicario: terra de ninguém" examina o impacto das guerras do narcotráfico na área de fronteira entre Arizona e México. O cineasta canadense Denis Villeneuve fez o agitado suspense em 2015, tendo Benicio del Toro no papel principal. A obra foi filmada no sul do Arizona.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Lionsgate/Richard Foreman Jr.
Filmes sobre drogas
A questão do narcotráfico parece atrair diretores de forma mágica. Em 2013, o cineasta britânico Ridley Scott filmou um suspense também nesta região fronteiriça. "O conselheiro do crime", estrelado por Brad Pitt e Michael Fassbender, foi filmado em El Paso, no Texas, e na Espanha.
Foto: picture-alliance/dpa
Crime e política
Há 17 anos, o diretor Steven Soderbergh lançou o renascimento dos filmes sobre a guerra das drogas. Em "Traffic", ele retrata a complexa relação entre polícia, traficantes e políticos – cujos laços uns com os outros estão indissociavelmente interligados para além das fronteiras geográficas.
Foto: picture-alliance/United Archives
Histórias de detetive
Além de faroestes e suspenses sobre drogas, inúmeras histórias de detetives e assassinatos misteriosos decorrem na fronteira entre EUA e México. Um clássico do gênero é o filme "O perigoso adeus" (1973), de Robert Altman, baseado em um romance de Raymond Chandler. O filme foi gravado na Califórnia, mas também em Tepoztlán, no México.
Foto: picture-alliance/United Archives/Impress
A fronteira em tempos de globalização
Em 2006, o diretor mexicano Alejandro González Iñárritu filmou o drama narrativo múltiplo "Babel". A obra traça os destinos entrelaçados de várias pessoas de diferentes regiões do mundo, e é uma parábola cinematográfica sobre a questão do significado da fronteira para as pessoas em tempos de globalização.
Foto: picture alliance/kpa
Comédia de fronteira
Não há muito o que rir quando se trata de uma fronteira. A maior parte dos filmes que lida com os laços entre EUA e México tendem à seriedade. Mas, em 2004, James L. Brooks fez a comédia "Espanglês" sobre um encontro com muito clichê entre um americano rico (Adam Sandler) e uma faxineira mexicana (Paz Vega).
Foto: picture-alliance/United Archives
Drama sobre imigração
Nos últimos anos, mais e mais filmes foram produzidos sobre imigração e pobreza na região. No ano passado, a coprodução Alemanha-França-México "Soy Nero" estreou na Berlinale. O diretor Rafi Pitts, com raízes iranianas, conta a história de um jovem mexicano que atravessa a fronteira para os EUA em busca de uma vida melhor.
Foto: picture-alliance/dpa/Neue Visionen
Um clássico moderno
Talvez o filme mais impressionante sobre a imigração do Sul para o Norte tenha sido feito por Cary Fukunaga, em 2009. "Sem identidade" retrata o destino de vários jovens do México que estão tentando chegar aos EUA. Enquanto alguns estão tentando escapar de bandos criminosos de suas cidades, outros procuram o paraíso na Terra.