Composição conjunta de Mozart e Salieri reestreada em Praga
Augusto Valente18 de fevereiro de 2016
Afinal, o italiano envenenou mesmo o gênio austríaco por inveja? Reencontrada após dois séculos, uma cantata composta em parceria desbanca de vez a lenda da inimizade fatal entre os dois compositores clássicos.
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Uma cantata de quatro minutos de duração, em italiano, composta em parceria pelos compositores Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791), Antonio Salieri (1750-1825) e o desconhecido Cornetti, foi executada nesta terça-feira (16/02) na capital tcheca, Praga.
Datando de 1785, Per la ricuperata salute di Offelia (Pela saúde recuperada de Ofélia), para voz e piano, foi reencontrada no Museu Tcheco de Música depois de mais de 200 anos perdida.
O musicólogo e compositor alemão Timo Jouko Herrmann a descobriu em novembro de 2015, enquanto pesquisava no catálogo da instituição. "Nós conhecíamos o título de um anúncio de 1795. Fiquei empolgado ao lê-lo. Pensei: 'Será que a peça está em Praga e ninguém a detectou?'", disse.
Na época capital da cultura europeia, Praga foi uma importante estação de atividade profissional para Mozart. Sua Sinfonia nº 38, de 1786, foi apelidada com o nome da cidade, e suas óperas Don Giovanni e La clemenza di Tito, estreadas lá em 1787 e 1791, respectivamente.
Crônica de uma inimizade fictícia
O fato de ter sido escrita em parceria confere sensação adicional à redescoberta de Per la ricuperata salute di Offelia. Definitivamente popularizada no filme Amadeus, do cineasta tcheco Milos Forman, a lenda de que Salieri teria participado na morte prematura do colega austríaco, aos 36 anos, já data do início do século 19.
Em 1830, o autor russo Alexander Pushkin escreveu o drama em versos Mozart e Salieri – transformado 67 anos mais tarde numa ópera por Nikolai Rimsky-Korsakov –, em que postulava que, movido pela inveja diante de um talento superior, o compositor italiano teria envenenado Mozart.
Em 1979, o dramaturgo inglês Peter Shaffer retomou a ideia em sua peça Amadeus, com grande sucesso internacional. A adaptação para o cinema, dirigida por Forman, conquistou oito Oscars e quatro Golden Globes em 1985, entre muitos outros prêmios.
O diretor de pesquisa da Fundação Mozarteum de Salzburgo, Ulrich Leisinger, toma partido. "Nós todos conhecemos o filme Amadeus. Salieri é falsamente representado nele. Ele não envenenou Mozart, os dois compositores se encontravam regularmente e colaboravam em Viena."
O texto da cantata dedicada à soprano inglesa Nancy Storace (a "Ofélia" do título) é de Lorenzo da Ponte, também autor pelos libretos de As bodas de Fígaro, Don Giovanni e Così fan tutte.
O responsável pelo achado musicológico confirma que a peça "mostra uma colaboração bastante amistosa entre dois compositores", e acredita que a descoberta poderá ser seguida de outras surpresas.
"Até onde sei, esta é a única peça escrita em conjunto por Mozart e Salieri. Mas, quem sabe, numa casa de tesouros como esta, tudo pode acontecer", comentou Herrmann, referindo-se ao Museu Tcheco de Música.
Os canhotos da música
Eles são minoria e, no passado, encontravam dificuldades em orquestras e escolas. Dez grandes nomes mostram que tocar com a mão esquerda não impede o sucesso.
Foto: Getty Images/AFP/D, Nagl
O revolucionário da guitarra
Mesmo que seu pai tenha tentado "livrá-lo do demônio", Jimi Hendrix resolveu tocar guitarra com a mão esquerda. Mas ele segurava o garfo e o lápis com a direita. O americano foi o primeiro a inverter as cordas de uma guitarra comum, adaptando-a para os canhotos. Em 1967, no Festival de Monterrey, o americano levou o público à loucura ao incendiar o instrumento no palco.
Foto: picture alliance / dpa
O mestre do heavy metal
Tony Iommi, guitarrista e líder do Black Sabbath, influenciou toda uma geração de metaleiros com seus riffs pesados e marcantes. Canhoto, o britânico por pouco não teve que abandonar o instrumento. Aos 17, ele perdeu as pontas dos dedos médio e anelar da mão esquerda num acidente de trabalho. A solução foi simples: Iommy fez duas capas de plástico para os dedos e continuou tocando.
Foto: Kevork Djansezian/Getty Images
O rebelde do grunge
O ídolo Kurt Cobain usava uma guitarra para destros com as cordas invertidas para tocar com a esquerda. O líder do Nirvana era o único canhoto da banda. Quando tocava bateria, ele ocasionalmente usava a mão direita. As famosas últimas linhas de sua carta de despedida também foram escritas com a direita: "Não sinto mais paixão [...] é melhor queimar do que se apagar aos poucos."
Foto: Getty Images
O primeiro beatle canhoto
costumava tocar o baixo do modelo Höfner 500 com a mão esquerda, assim como outros instrumentos de cordas. Bateria, porém, era sempre com a direita. Depois do fim dos Beatles, em 1970, o parceiro de composição de John Lennon seguiu com a banda Wings e com uma muito bem-sucedida carreira solo.
Foto: Getty Images/J. Dyson
O segundo beatle canhoto
Ringo Starr também é canhoto. Porém, como Kurt Cobain e Paul McCartney, ele usa a mão direita para tocar bateria. O costume, porém, não é causado por limitações no instrumento: todo kit de bateria pode ser adaptado para canhotos – para isso, é só inverter as posições das peças.
Foto: Getty Images/M. Webb
O baterista-vocalista
Finalmente, um canhoto de verdade: Phil Collins come, escreve e toca a bateria com a mão esquerda. Isso significa que o londrino, que ficou famoso como integrante da banda de rock progressivo Genesis, ataca o contratempo e o bumbo com a mão esquerda – diferentemente, claro, dos destros. Na juventude, os Beatles eram os ídolos do londrino. Assim, ele se acostumou desde cedo com canhotos tocando.
Foto: picture-alliance/dpa/T. Bozoglu
O baterista tatuado
Nos anos 1990, os americanos do Blink-182 deram uma cara mais pop ao punk rock. Todo tatuado e canhoto, o baterista Travis Barker chama atenção nos palcos. A rebeldia de Barker, porém, vai além das tatuagens – o americano toca com um kit de bateria montado para destros.
Foto: Imago
A canhota inventiva
Elizabeth Cotten foi uma cantora e violonista de blues. Falecida em 1987, a americana fazia parte do pequeno grupo de canhotos que simplesmente invertem um violão para destros, sem alterar a ordem das cordas. A técnica foi batizada de "Cotten picking".
Foto: Imago
O ator genial e músico nas horas vagas
Nascido na Inglaterra, Charles Chaplin foi bem cedo para os Estados Unidos. Lá, surgiram seus primeiros curtas. Em "O Vagabundo" (1916), Chaplin aparece tocando um violino – com a mão esquerda. Além de ótimo ator, Chaplin também tocava, nas horas vagas, violino e violoncelo, sempre como canhoto. De acordo com colegas, ele aproveitava cada pausa nas gravações para praticar os instrumentos.
Foto: picture-alliance/AP Photo
O maestro canhoto
Nascido em Buenos Aires, Daniel Barenboim teve aulas com grandes mestres do piano. Mais tarde, ele se formou maestro. O argentino fundou a Orquestra West-Eastern Divan, a única orquestra de Israel a contar com músicos palestinos e israelenses. Desde 1992, ele é diretor musical da Staatsoper Unter den Linden, de Berlim, a qual rege levando o bastão na mão esquerda.