Líderes condenam nova lei de segurança para Hong Kong
30 de junho de 2020
UE e países como EUA e Reino Unido criticam aprovação de legislação por Pequim, mencionando ameaças a liberdades fundamentais no território semiautônomo. Lei amplia poderes da China e aperta cerco contra oposição.
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A controversa lei de segurança nacional imposta a Hong Kong pelo governo central da China nesta terça-feira (30/06) gerou uma série de condenações, com muitos líderes internacionais acusando Pequim de agir para reprimir ainda mais as liberdades fundamentais e reforçar o controle sobre a região semiautônoma.
A lei aprovada pelo Comitê Permanente do Congresso Nacional do Povo, o órgão máximo legislativo da China, visa combater o que considera atividades "subversivas e secessionistas" em Hong Kong. O texto já havia sido aprovado em maio pelo plenário do Congresso, faltando apenas o aval do comitê. Segundo o jornal South China Morning Post (SCMP), a lei foi ratificada com o voto unânime dos 162 membros do órgão legislativo.
Alguns detalhes da nova lei, mantidos em segredo pelo governo chinês, foram divulgados apenas no decorrer do dia. Entre as especificações, consta que os crimes de secessão, subversão, terrorismo e conluio com forças estrangeiras podem ser punidos até com prisão perpétua. Atos de vandalismo contra determinados equipamentos públicos e meios de transporte serão considerados atos de terrorismo.
A lei prevê ainda que empresas ou grupos que violarem a nova lei serão multados e poderão ter suas operações suspensas no território. Além disso, será ampliada a supervisão de ONGs e agências de notícias estrangeiras que atuam na região.
As atividades da nova agência nacional de segurança em Hong Kong não estarão sob a jurisdição do governo local, mas sim de Pequim. A partir de agora, as autoridades passam a ter permissão para vigiar indivíduos que representem potenciais riscos à segurança e interceptar suas comunicações.
A legislação se aplica aos residentes permanentes e não permanentes de Hong Kong. Aqueles que violarem a lei não poderão se candidatar às eleições da província semiautônoma.
A China defende que a nova lei se fez necessária após a série de protestos contra o governo local e contra Pequim – que muitas vezes terminaram de forma violenta – iniciados em junho do ano passado. As manifestações contrárias ao que muitos viam como um aumento da interferência chinesa geraram a mais grave crise em décadas no território.
A China negou que tivesse exercido interferência em Hong Kong e culpou o Reino Unido e os Estados Unidos por fomentarem os protestos. A entrada em vigor da lei a poucas horas do 23º aniversário do fim do domínio britânico sobre o território é vista como uma humilhação simbólica do governo de Londres.
Com os temores de uma brutal repressão à oposição em Honk Kong, o líder do movimento pró-democracia Demosisto, Joshua Wong, afirmou que seu grupo será dissolvido. Diversos outros grupos também anunciaram o fim de suas atividades. A lei, segundo Wong, "marca o fim da Hong Kong que o mundo conheceu".
Reações à nova lei
Os Estados Unidos – que já haviam iniciado a eliminação do status especial de Hong Kong com a suspensão de exportações de defesa e restrições do acesso à tecnologias – se juntaram à União Europeia (UE), Reino Unido e Japão ao condenar a nova legislação como uma erosão da autonomia da província, concedida no dia 1º de julho de 1997.
O porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca John Ullyot exortou Pequim a reverter o curso atual. "A aprovação da lei de segurança nacional é uma violação dos compromissos assumidos na declaração conjunta sino-britânica", destacou Ullyot. "Os EUA continuarão a tomar ações decisivas contra aqueles que asfixiam a liberdade e autonomia de Hong Kong."
O ministro do Exterior do Reino Unido, Dominic Raab, afirmou que seu país não vai ignorar os compromissos assumidos com sua ex-colônia e acusou a China de "quebrar suas promessas para com o povo de Hong Kong e ir contra suas obrigações perante a comunidade internacional".
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, também criticou a nova lei. "Já deixamos claro em diversas ocasiões, inclusive em nossos contatos diretos com a liderança chinesa, que a legislação não está em acordo com a Lei Fundamental de Hong Kong, tampouco com os compromissos internacionais da China", disse. "Estamos muito preocupados."
"Prestaremos muita atenção sobre como responder", afirmou. Von der Leyen acrescentou que a UE discute medidas a serem tomadas juntamente com parceiros internacionais, mas não forneceu maiores detalhes.
O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, disse que a legislação "arrisca ferir gravemente o alto grau de autonomia de Hong Kong e possui efeito prejudicial sobre a independência do Judiciário e o Estado de direito". "Deploramos esta decisão", declarou.
Na Alemanha, a presidente do Comitê de Direitos Humanos do Bundestag (câmara baixa do Parlamento), Gyde Jensen, pediu que a chanceler federal Angela Merkel condene a aprovação da lei de segurança nacional e que o governo imponha sanções para punir violações aos direitos humanos por parte de autoridades diretamente ligadas à nova legislação. "A Alemanha, até o momento, vem sendo bastante silenciosa no que diz respeito a reações à aprovação da nova lei", criticou.
O embaixador da ONU em Genebra, Julian Braithwaite, leu uma declaração assinada por 27 países – incluindo Alemanha, Reino Unido, França e Japão – que marca uma das raras reprimendas do Conselho de Direitos Humanos da entidade à China.
As 27 nações expressaram "preocupações profundas e crescentes" com a questão dos direitos humanos na província. "Pedimos aos governos da China e de Hong Kong que reconsiderem a imposição dessa legislação e que envolvam o povo, as instituições e o Judiciário de Hong Kong e evitem uma erosão maior dos direitos humanos e liberdades que as pessoas têm desfrutado por muitos anos."
Entre os demais signatários da declaração estão Austrália, Canadá, Nova Zelândia, Suíça e outras 15 nações da União Europeia, incluindo Holanda e Suécia.
Duas décadas depois de Hong Kong retornar ao domínio chinês, predomina entre muitos moradores a insatisfação com a ingerência de Pequim e o desejo por mais democracia.
Foto: Reuters/D. Martinez
1997 - Devolução à China
Após 156 anos de domínio britânico, Hong Kong era devolvida à China exatamente à zero hora de 1º de julho de 1997. Soldados do Exército de Libertação Popular içaram a bandeira chinesa, em sinal de supremacia sobre a antiga colônia britânica. O contrato para a devolução já havia sido assinado em 1984.
Foto: Reuters/D. Martinez
1998 - Ameaça de crise econômica
A crise financeira asiática de 1997-98 levou economias emergentes a impor controles comerciais ou à compra de ativos para tranquilizar investidores. Hong Kong surpreendeu o mercado em agosto de 1998 com uma intervenção de 15 bilhões de dólares para se defender de ataques especulativos. Os apoiadores da iniciativa dizem que isso salvou a cidade.
Foto: Reuters/L. Chan
1999 - Reagrupamento de famílias
As esperanças de um rápido reagrupamento das famílias separadas pela fronteira foram logo destruídas. Embora a Suprema Corte de Hong Kong tivesse concedido amplos direitos de residência, o governo chinês derrubou a decisão a pedido do governo de Hong Kong. Na foto, mais de cem visitantes da China continental protestaram para obter permissão de residência imediata em Hong Kong.
Foto: Reuters/B. Yip
2000 - Sucesso com a bolha
Em fevereiro de 2000, investidores entraram numa fila diante do banco HSBC para comprar ações da empresa Tom.com. Ao se lançar na bolsa de valores, a empresa – que existia apenas na internet – do bilionário Li Ka-shing conseguiu angariar quase 100 milhões de dólares pouco antes de estourar a bolha "dot-com".
Foto: Reuters/B. Yip
2001 - Conflito com grupo espiritual
Seguidores do movimento espiritual Falun Gong protestam regularmente em Hong Kong desde que o grupo foi banido pela China em 1999, sob a acusação de divulgar superstições e manipular as pessoas psicologicamente. Em 2002, 16 seguidores foram condenados por causa de protestos diante da representação da China em Hong Kong. A Suprema Corte do território reverteu metade das sentenças.
Foto: Reuters/K. Cheung
2002 - Famílias desesperadas
A questão das autorizações de residência acirrou-se em 2002, quando Hong Kong começou a deportar 4 mil chineses continentais que haviam perdido batalhas legais para residir no território. Houve protestos dos solicitantes e de seus apoiadores. Na foto, parentes de migrantes chineses depois de terem sido expulsos de um parque no centro de Hong Kong.
Foto: Reuters/K. Cheung
2003 - Nas mãos de um vírus
A Sars, uma doença viral semelhante à gripe, atingiu Hong Kong de tal forma que, em março de 2003, a Organização Mundial da Saúde a declarou uma pandemia. Até a cidade ser considerada livre da doença, em junho, 299 pessoas morreram, entre elas Tse Yuen-man. A médica de 35 anos esteve entre os primeiros voluntários a cuidar de pacientes com Sars. Em seu funeral, ela recebeu as mais altas honras.
Foto: Reuters/B. Yip
2004 - Frustração com Pequim
Centenas de milhares de pessoas participaram de protestos no sétimo aniversário da devolução à China. Pequim descartou o sufrágio universal em Hong Kong em 2007 ou 2008 e continuou freando as reformas políticas. Além disso, a China decretou que o governo de Pequim precisa aprovar qualquer alteração no direito de voto em Hong Kong, o que praticamente elimina qualquer aspiração democrática.
Foto: Reuters/B. Yip
2005 - Violência em protestos
Reuniões da Organização Mundial do Comércio regularmente são alvos de protestos dos adversários da globalização. Em Hong Kong, no final de 2005, não foi diferente. A polícia usou canhões de água e gás lacrimogêneo contra os manifestantes.
Foto: Reuters/L. Jae-Won
2006 - Conflito com o Japão
A China e o Japão disputavam um grupo de ilhas desabitadas. Acreditava-se que perto delas houvesse reservas de petróleo e de gás. Em outubro, um barco com ativistas de um comitê para defender as ilhas Diaoyi e que tem base em Hong Kong se aproximou 20km da ilha principal até ser interceptado por um barco de patrulha japonês.
Foto: Reuters/P. Yeung
2007 - Preservar a história
Um píer da era colonial tornou-se pivô de nova polêmica. O governo queria removê-lo para recuperar terras e construir estradas. Ativistas furiosos que consideravam o píer um local histórico lutaram pela sua preservação. O embate atingiu seu ponto alto em agosto, quando a polícia removeu um acampamento de ativistas e pessoas em greve de fome que já durava três meses. Em 2008, o píer foi demolido.
Foto: Reuters/P. Yeung
2008 - Morar em gaiolas
Terrenos cada vez mais caros tornaram os aluguéis impagáveis para muitas pessoas em Hong Kong. Milhares de moradores passaram a viver em gaiolas, onde dispunham de cerca de 1,4 m2. Em geral, um cômodo tem oito dessas caixas de arame. Em 2017, estima-se que 200 mil pessoas vivam assim ou disponham de apenas uma cama em apartamentos divididos.
Foto: Reuters/V. Fraile
2009 - Contra o esquecimento
Moradores de Hong Kong vestidos de preto e branco fizeram uma vigília no 20º aniversário da violenta repressão aos manifestantes pró-democracia na Praça da Paz Celestial em Pequim em 1989. O Victoria Park, no centro de Hong Kong, transformou-se num mar de velas.
Foto: Reuters/A. Tam
2010 - Projetos indesejados
Crescia em Hong Kong a insatisfação devido à falta de democracia e o fato de o governo não ter de prestar contas. As raiva coletiva é descarregada em forma de protestos contra os planos do governo de construir um trajeto para trens de alta velocidade ligando Hong Kong ao continente. O projeto ferroviário, não implementado até hoje, previa a destruição de um vilarejo.
Foto: Reuters/B. Yip
2011 - Protestos com papel
Um controverso projeto de lei que eliminou o mecanismo de eleições suplementares para o Conselho Legislativo gerou vários dias de protestos em frente ao prédio do conselho. Centenas de manifestantes jogaram aviões de papel com mensagens políticas contra o prédio.
Foto: Reuters/B. Yip
2012 - Desafios da administração
Leung Chun-ying (à esquerda) presta juramento como chefe de governo da região administrativa especial, diante do então presidente chinês, Hu Jintao. Ele prometeu mais democracia e moradias mais acessíveis. Apesar de medidas de contenção, os preços continuaram subindo, e as reformas políticas ainda estão emperradas. Leung Chun-ying não concorreu a um novo mandato.
Foto: REUTERS/File Photo/B. Yip
2013 - Hong Kong no foco da imprensa
Quando começaram a ser publicadas notícias sobre Edward Snowden e segredos dos EUA, o especialista em TI estava em Hong Kong. Apesar de os Estados Unidos terem pedido sua extradição, Hong Kong deixou Snowden voar para Moscou, onde ele recebeu asilo político. Enquanto alguns veem em Snowden um denunciante corajoso, outros o consideram um traidor da pátria.
Foto: Reuters/B. Yip
2014 - Protestos de guarda-chuva
Durante dois meses, Hong Kong teve grandes manifestações pró-democracia. A exigência era a escolha completamente democrática do chefe de governo. A marca registrada dos protestos foram os guarda-chuvas usados pelos manifestantes para se proteger do spray de pimenta da polícia. As manifestações são vistas como o maior desafio à autoridade da China desde o movimento por mais democracia, em 1989.
Foto: Reuters/T. Siu
2015 - Liberdade de expressão no estádio
A partida de futebol entre China e Hong Kong pelas eliminatórias da Copa de 2018 foi palco de protestos. Torcedores de Hong Kong empunharam cartazes com os dizeres "Hong Kong não é China" enquanto era tocado o hino nacional chinês. Há muita tensão entre os dois lados desde os "protestos dos guarda-chuvas". O jogo acabou em 0 a 0.
Foto: Reuters/B. Yip
2016 - Até correr sangue
Novos protestos foram realizados em Hong Kong. Mais uma vez, a polícia usou spray de pimenta e cassetetes. A razão: as autoridades tentaram remover vendedores de rua ilegais num bairro operário. Foram as mais violentas batalhas de rua desde os protestos de 2014.
Foto: Reuters/B. Yip
2017 - O tempo passa
No parque memorial rei George 5º, um dos poucos parques onde ainda há uma ligação com o passado colonial, as raízes de uma figueira cobrem uma placa, 20 anos após a devolução de Hong Kong à China pelos britânicos.