Recurso do ex-presidente contra sentença imposta pelo juiz Sérgio Moro é rejeitado por unanimidade na segunda instância em Porto Alegre. Pena do petista é aumentada para 12 anos e um mês.
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Os três desembargadores que analisaram o recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Porto Alegre decidiram de maneira unânime nesta quarta-feira (24/01) manter a condenação imposta ao petista pelo juiz Sérgio Moro.
Lula ainda teve a pena aumentada de nove anos e seis meses para 12 anos e um mês durante a análise no processo por corrupção e lavagem de dinheiro que envolve a propriedade de um tríplex no Guarujá (SP).
Os desembargadores também validaram a condução do juiz Moro no caso e dos procuradores da Lava Jato, que há quase quatro anos vêm abalando os alicerces do establishment político brasileiro. Com isso, a operação conseguiu uma segunda marca histórica: a validação de uma condenação criminal de um ex-presidente. No ano passado, Lula já havia se tornado o primeiro ex-ocupante do cargo máximo do Executivo no Brasil a ser condenado criminalmente.
Com a confirmação da condenação, a situação legal do ex-presidente se complica: ele fica mais perto de ser enquadrado na Lei da Ficha Limpa e ser barrado nas eleições deste ano. A palavra final sobre a candidatura cabe ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A situação do petista ainda deve ser objeto de longas batalhas judiciais neste ano. Favorito nas pesquisas para presidente, Lula ainda pode recorrer a outras instâncias, como Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF), para tentar manter sua candidatura e liberdade.
A própria execução da sentença de prisão também deve demorar. Os desembargadores votaram por esperar o fim da análise de pedidos de efeito suspensivo feitos ao próprio TRF-4 para determinar o início do cumprimento da pena, conforme a decisão desta quarta-feira.
O julgamento
A expectativa sobre o julgamento era alta. O ex-presidente aproveitou a ocasião mais uma vez para afirmar que é vítima de perseguição política e que sua sentença é resultado de uma conspiração das elites.
Milhares de apoiadores foram a Porto Alegre para acompanhar os procedimentos, o que levantou o temor de que poderiam ocorrer episódios de violência. A segurança acabou sendo reforçada em volta do tribunal. Adversários do ex-presidente realizaram manifestações em São Paulo e outras cidades. Políticos que se anunciam como uma alternativa ao petismo aproveitaram a ocasião para celebrar e lançar ataques ao partido do ex-presidente.
Trechos do julgamento de Lula no TRF-4
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O julgamento começou mal para Lula. O relator do caso, desembargador Gebran Neto, o primeiro a falar, negou todas as preliminares da defesa, que argumentava, por exemplo, que o juiz Moro era incompetente para julgar o caso. Em uma leitura longa, que se estendeu por mais de três horas horas, ele destacou diversos pontos que, segundo ele, ligam o ex-presidente ao esquema de corrupção na Petrobras. "Há provas acima de razoáveis de que o ex-presidente foi um dos articuladores, senão o principal, de um amplo esquema de corrupção", disse.
Ele também refutou a tese da defesa de que não há provas cabais que liguem a suposta propriedade oculta do tríplex por Lula com contratos fraudulentos da Petrobras com a empreiteira OAS. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), depoimentos e documentos, assim como a falta de explicações convincentes por parte de Lula, apoiam a tese de que o imóvel foi dado a Lula.
"Prova indireta e indícios não são provas de menor importância, são provas de igual envergadura. E o que dá validade aos indícios é a convergência deles com outras provas existentes no processo", disse.
Gebran Neto também aceitou a acusação de que dinheiro da estatal alimentava os cofres do PT. "Não faz diferença se foi para o bolso ou se foi para a campanha. O problema não é para onde vai, mas de onde vem."
No final do seu voto, Gebran não só manteve a condenação de Lula por lavagem de dinheiro e corrupção, como aumentou sua pena de 9 anos e seis meses de prisão para 12 anos e um mês. Ele, porém, rejeitou um recurso do MPF para condenar o ex-presidente por corrupção no caso do aluguel de um depósito pela OAS onde foi guardado o acervo presidencial do petista. O juiz Moro também havia absolvido Lula neste caso no ano passado.
Manifestações antecedem decisão sobre futuro de Lula
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Por fim, ele também refutou a tese de que os petistas são os grandes alvos da Lava Jato, citando que os membros do partido não foram os primeiros alvos da operação. "Não estamos tratando de pobres, descamisados", disse.
O segundo desembargador a votar foi Leandro Paulsen. Ele também absolveu Lula pelo caso do aluguel do depósito e manteve as condenações por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex e ainda votou pelo aumento de pena.
"Não é mais possível admitir que o dinheiro público viaje na bagagem da impunidade", disse. Segundo Paulsen, a participação de Lula em desvios na Petrobras é "inequívoca". Ele rejeitou a tese de perseguição ao PT e citou políticos de outros partidos também condenados pelo juiz Moro.
Após a leitura do voto de Paulsen, foi a vez do desembargador Victor Laus proferir seu voto. Logo no início, ele elogiou a postura do juiz Moro. Ao longo da leitura, ele também disse que "em algum momento, Lula perdeu o rumo". Por fim, ele decidiu acompanhar integralmente o voto do relator: manter a condenação por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex, aumentar a pena para 12 anos e rejeitar o pedido do MPF no caso do aluguel do depósito.
Lula acompanhou o julgamento na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo (SP), ao lado de diversos governadores petistas como Wellington Dias (Piauí), Tião Viana (Acre) e Fernando Pimentel (Minas Gerais). Antes do início do julgamento, ele disse que estava "extremamente tranquilo". "Tô com a consciência de que não cometi nenhum crime. A única coisa certa que pode acontecer é eles dizerem que o Moro errou", disse.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann – ela própria ré na Lava Jato –, por sua vez, voltou a insistir na narrativa da perseguição política. "Não conseguem derrotar Lula nas urnas, daí querem derruba-lo pela Justiça, sem provas!", disse.
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A trajetória política de Lula
Das greves no ABC à Presidência. Da condenação pela Lava Jato ao terceiro mandato. Os principais momentos políticos na vida de Luiz Inácio Lula da Silva.
Foto: Getty Images/AFP/C. Petroli
Lula e as greves do ABC
Em 1975, Lula foi eleito presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema e ganhou projeção nacional ao liderar uma série de greves no final da década. Em 1980, foi preso e processado com base na Lei de Segurança Nacional após comandar uma paralisação que durou 41 dias. Lula ficou 31 dias no cárcere do Dops (Departamento Estadual de Ordem Política e Social).
Foto: Instituto Lula
Fundação do PT
Em 10 de fevereiro de 1980, pouco antes de ser preso, Lula ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores (PT) com apoio de intelectuais e sindicalistas. Em maio do mesmo ano, ao sair do cárcere, foi eleito o primeiro presidente do partido. O pernambucano, então, ingressaria de vez na política: em 1982, concorreu ao governo de São Paulo e, em 1986, foi eleito deputado constituinte.
Foto: Getty Images/AFP/C. Petroli
A campanha de 1989
O PT lançou a candidatura de Lula nas primeiras eleições presidenciais diretas após o fim do regime militar. Com uma imagem de operário e um discurso de esquerda, Lula provocou temor em vários setores da economia, que se alinharam ao candidato Fernando Collor. O petista foi derrotado no segundo turno, depois de uma campanha que envolveu acusações de manipulação da imprensa a favor de Collor.
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A campanha de 1994
No embalo das primeiras denúncias de irregularidades no governo Collor, Lula lançou, em 1992, o movimento "Fora Collor" em apoio ao impeachment. Em 1994, concorreu novamente à Presidência, com Aloizio Mercadante como vice, mas foi derrotado no primeiro turno por Fernando Henrique Cardoso (PSDB), lançado como "pai do Plano Real". O PT, por outro lado, elegia seus primeiros governadores (DF e ES).
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A campanha de 1998
Em 1998, Lula sofreu uma de suas piores derrotas eleitorais. À época, o petista teve como candidato a vice o ex-governador Leonel Brizola (PDT), um dos seus rivais na eleição de 1989 e com quem disputava a hegemonia na esquerda brasileira. A fórmula não deu certo. Lula obteve só 31% dos votos, e o então presidente Fernando Henrique Cardoso foi reeleito com 53% no primeiro turno.
Foto: picture alliance/AP Photo/R. Gostoli
A posse de Lula
O eterno candidato do PT finalmente assumiu a Presidência em janeiro de 2003, após oito anos de governo do PSDB. Lula foi eleito com 61% dos votos válidos no segundo turno. A vitória foi alcançada após uma campanha que vendeu uma imagem mais moderada do petista – simbolizada no slogan "Lulinha paz e amor" – com o objetivo de acalmar os mercados e ampliar o eleitorado do partido.
Foto: O. Kissner/AFP/Getty Images
Economia em alta
Após as turbulências no final do governo Fernando Henrique Cardoso, a economia brasileira voltou a crescer com Lula, embalada sobretudo pelo boom das commodities. Foi o período da descoberta do pré-sal e investimentos em grandes obras de infraestrutura. O crescimento médio do PIB no segundo mandato chegou a 4,6%. O bom momento catapultou a popularidade de Lula, que chegou a 87% no final de 2010.
Foto: AP
Queda na desigualdade
Os programas sociais lançados por Lula, como Minha Casa, Minha Vida e ProUni, também contribuíram para a popularidade do presidente. O Bolsa Família, criado em 2004 a partir da unificação de outros programas de transferência de renda, se tornaria o carro-chefe. Quase 28 milhões de brasileiros saíram da zona de pobreza nos oito anos do governo Lula, afirmou um balanço em 2010.
Foto: Vanderlei Almeida/AFP/Getty Images
O escândalo do mensalão
Em 2005, o governo Lula foi atingido em cheio pelo escândalo de compra de votos de deputados, o mensalão. Apesar do desgaste, Lula sobreviveu à crise. Outros, como o ministro José Dirceu, uma das figuras fortes do governo, caíram em desgraça. No início, Lula afirmou que assessores o haviam "apunhalado", mas depois mudou o discurso e disse que o caso era uma invenção da oposição e da imprensa.
Foto: picture alliance / dpa / picture-alliance
A eleição de Dilma
Em 2007, logo após ser reeleito com mais de 60% dos votos, Lula começou a preparar o terreno para a sua sucessão. Como sucessora, ele escolheu a sua então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, uma tecnocrata sem experiência nas urnas. Nos três anos seguintes, Lula promoveu a imagem de Dilma junto aos brasileiros. A estratégia funcionou, e ela foi eleita em 2010.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/EBC
Prestígio mundial
Durante a Presidência, Lula gozou de prestígio mundial e se reuniu com os mais importantes chefes de Estado do planeta. Em abril de 2009, em um encontro do G20, o presidente dos EUA na época, Barack Obama, cumprimentou o colega e disse: "Adoro esse cara! O político mais popular da Terra". No mesmo ano, Lula apareceu em 33º lugar na lista das pessoas mais poderosas do mundo da revista Forbes.
Foto: AP
Luta contra o câncer
Em outubro de 2011, Lula foi diagnosticado com câncer na laringe, sendo submetido a um agressivo tratamento – pela primeira vez desde 1979, ele aparecia sem a barba. Exames apontaram a remissão completa do tumor cerca de cinco meses depois, e Lula voltou a se engajar nas campanhas do PT. Uma das grandes vitórias eleitorais de 2012 foi a de Fernando Haddad na Prefeitura de São Paulo.
Foto: AFP/Getty Images
Lula e a Lava Jato
Em março de 2016, Lula foi alvo de um mandado de condução coercitiva na Operação Lava Jato, que investigou escândalos de corrupção na Petrobras. O ex-presidente foi levado para depor sobre um sítio em Atibaia, um triplex no Guarujá e sua relação com empreiteiras investigadas na Lava Jato. No mesmo dia, a PF cumpriu mandados em residências do petista e de sua família, além do Instituto Lula.
Foto: Reuters/P. Whitaker
Réu em diferentes processos
Nos meses seguintes, Lula foi denunciado por uma série de crimes, como corrupção passiva, lavagem de dinheiro, obstrução da Justiça e tráfico de influência, tornando-se réu em cinco processos diferentes. O petista sempre desmentiu as acusações, negou a prática de crimes e disse ser vítima de perseguição política. Ele também negou ser proprietário dos imóveis investigados.
Foto: picture-alliance/abaca
Morre Marisa Letícia
Em fevereiro de 2017, morreu a ex-primeira-dama Marisa Letícia. Lula e Marisa se conheceram em 1973, no Sindicato dos Metalúrgicos, em São Bernardo. Ela esteve ao lado do marido durante a sua ascensão política, desde os tempos do sindicato, quando liderou passeata em apoio a sindicalistas presos, passando pela fundação do PT, costurando a primeira bandeira do partido, até a Presidência.
Foto: Reuters/N. Doce
Caravana pelo país
Visando uma nova candidatura à Presidência no ano seguinte, Lula começou em 2017 uma caravana pelo Brasil que reuniu milhares de pessoas. Em junho de 2018, o PT confirmou sua pré-candidatura, mesmo com ele já preso. Em agosto, o Tribunal Superior Eleitoral impediu que ele concorresse. Como sucessor, Lula escolheu Fernando Haddad, que chegou ao segundo turno, mas foi derrotado por Jair Bolsonaro.
Foto: Ricardo Stukert /Instituto Lula
Lula é condenado
Lula foi condenado pela primeira vez em 12 de julho de 2017. A sentença do juiz Sergio Moro determinou 9 anos e 6 meses de prisão pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva, ligados ao triplex no Guarujá. O TRF-4 confirmou a condenação em segunda instância, além de aumentar a pena para 12 anos e um mês de prisão. Foi a primeira condenação de um ex-presidente por corrupção no Brasil.
Foto: Abr
Derrota no STF
Por 6 votos a 5, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) negaram, em 4 de abril de 2018, um pedido de habeas corpus preventivo apresentado pela defesa de Lula para evitar uma eventual prisão após o fim dos recursos na segunda instância da Justiça Federal. Manifestantes contrários e a favor de Lula foram às ruas por ocasião do julgamento.
Foto: picture alliance/AP Photo/S. Izquierdo
Lula se entrega à PF
Em 7 de abril de 2018, Lula se entregou à Polícia Federal, na sede do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, após ordem de prisão expedida por Sergio Moro. Antes de se entregar, Lula fez um discurso acalorado aos apoiadores. De Congonhas, Lula partiu de avião para Curitiba, onde começou a cumprir sua pena.
Foto: Paulo Pinto/Instituto Lula
Vigília em frente à PF em Curitiba
Depois da prisão de Lula, apoiadores do ex-presidente revezaram-se em um acampamento em frente à Polícia Federal de Curitiba, onde ele permaneceu preso. O local recebeu constantes visitas de políticos e de artistas, do Brasil e do exterior. Apoiadores também realizaram caravanas pelo país, com o slogan "Lula Livre". Em fevereiro de 2019, Lula também foi condenado no caso do sítio em Atibaia.
Foto: Ricardo Stuckert
Solto após 19 meses na prisão
Lula deixou a prisão em 8 de novembro de 2019, depois de passar um ano e sete meses na sede da Polícia Federal em Curitiba. A soltura ocorreu após o STF derrubar uma decisão que autorizava a prisão em segunda instância, beneficiando diretamente o petista, que passou a recorrer em liberdade. Após deixar a prisão, Lula fez um discurso para apoiadores repleto de críticas à Lava Jato.
Foto: picture-alliance/AP Photo/L. Correa
Supremo anula condenações
Após o fim da prisão, a campanha "Lula Livre" focou na anulação de suas condenações. Os advogados do petista recorreram até o Supremo, alegando que ele era vítima de perseguição judicial. Em abril de 2021, o plenário do Supremo concluiu que Moro não era o juiz competente para atuar nos processos do petista, e dois meses depois decidiu que Moro era parcial. As condenações de Lula foram anuladas.
Foto: Alexandre Schneider/Getty Images
Uma aliança inesperada
A preparação da sexta campanha presidencial de Lula envolveu uma costura política inusitada. O petista e aliados articularam para ter como vice o ex-governador paulista Geraldo Alckmin, que foi filiado ao PSDB por 33 anos e era seu antigo adversário. A aproximação teve o objetivo de atrair o voto conservador e vingou: em abril de 2022, o PSB, novo partido de Alckmin, confirmou sua indicação.
Foto: Ricardo Stuckert/AFP
Em busca do voto anti-Bolsonaro
Lula lançou sua pré-candidatura em maio de 2022, defendendo a união de pessoas de orientações políticas variadas contra a reeleição do presidente Jair Bolsonaro. No evento, Alckmin prometeu lealdade, disse que o futuro do Brasil "está em jogo" e foi aplaudido pelos petistas.
Foto: NELSON ALMEIDA/AFP
Triunfo na busca por terceiro mandato
Após uma das campanhas mais tensas da história brasileira, Lula conquistou novamente a Presidência. Com apoio de uma frente ampla que reuniu forças de centro e antigos adversários, o petista impôs uma derrota inconteste sobre o extremista de direita Jair Bolsonaro. Aos 77 anos, Lula se tornou o político mais velho a conquistar o Planalto.