Meta central da reunião de 17 de julho de 1945 entre Churchill, Truman e Stalin era neutralizar de vez o agressor. Mas uma fresta para o retorno dos alemães à comunidade mundial permaneceu aberta.
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Naquele domingo, 17 de julho, as limusines dos principais aliados da coligação anti-hitlerista adentraram o pátio interno do palácio Cecilienhof, na cidade alemã de Potsdam.
Na construção em estilo rural inglês, eles pareciam estar bem distantes dos horrores da Segunda Guerra Mundial. A guerra na Europa terminara apenas em 8 de maio, com a capitulação da Alemanha. A partir daquele 17 de julho, a questão era como lidar com o tenebroso legado nazista.
Acentuando o peso simbólico do encontro, o presidente dos Estados Unidos, Harry Truman, o primeiro-ministro do Reino Unido, Winston Churchill, e o chefe soviético de Estado e partido, Josef Stalin, decidiram negociar em solo germânico a nova ordem para a Alemanha, agora em tempos de paz.
Além de estipular as reparações de guerra, era necessário estabelecer novas bases políticas e econômicas. Por trás de tudo pairavam questões fundamentais: por um lado, como lidar com um país que trouxera sofrimentos indizíveis ao mundo; por outro, que interesses próprios cada potência vencedora perseguia.
Posteriormente, Truman declararia na rádio americana que, em Potsdam, haviam sido feitos acordos para eliminar o nazismo e, com ele, a indústria bélica e as Forças Armadas alemãs, inclusive o estado-maior e sua tradição militar. A meta principal das reparações era "retirar da Alemanha tudo o que possa servir à preparação de uma nova guerra", explicou o presidente.
Divisão delicada
Às 17h começaram as negociações dos "três grandes" no foyer revestido de madeira do Cecilienhof. As delegações se acomodaram em torno de uma enorme mesa redonda, especialmente encomendada pelos soviéticos para o encontro e transportada de Moscou.
Logo no começo, as conversações estacaram: Churchill queria saber o que exatamente se entendia por "Alemanha". Ele se referia à distribuição geográfica e política do território.
Esse era um tema central, envolvendo não só o interesse dos Aliados em manter a área do país o menor possível – no máximo, com a extensão que tinha antes das campanhas de conquista de Hitler. Igualmente em jogo estava o tamanho relativo das zonas de ocupação e, consequentemente, o grau de influência de cada uma das potências ocupantes no centro da Europa Ocidental.
Diálogo histórico
Seguiu-se um diálogo, reconstituído mais tarde a partir das atas americanas e de um texto russo. De início, Truman ou não sabia ou não queria responder a pergunta do premiê britânico sobre o significado da Alemanha. Talvez tenha sido surpreendido, talvez só quisesse ganhar tempo para dar uma resposta fundamentada. Seja como for, o presidente dos EUA se dirigiu a Stalin.
Truman: Qual é a visão da delegação soviética?
Stalin: A Alemanha é aquilo que se tornou depois da guerra. Não existe uma outra. A Áustria, por exemplo, não é mais parte da Alemanha.
Truman: Por que não dizemos: a Alemanha de 1937?
Stalin: Excetuado o que ela perdeu em 1945.
Truman: Em 1945 ela perdeu tudo. [A ata russa acrescenta: A Alemanha não existe mais, de fato.]
Stalin: Segundo nos dizem, Alemanha é um conceito geográfico. É impossível passar por cima dos efeitos da guerra.
Truman: Mas precisamos de uma linha para tomarmos como ponto de partida. [...] Eu propus a Alemanha de 1937.
Guinada na história mundial
Os participantes da conferência concordaram em adotar a sugestão de Truman. Desse modo, decidiram dividir o país nas zonas de reparação leste e oeste, e confirmaram a autonomia das áreas de ocupação. À França coube uma área de ocupação própria.
Na prática, a Alemanha perdia, assim, sua unidade geográfica, política e econômica. A partir das zonas de reparação foram mais tarde fundadas a República Federal da Alemanha (ocidental) e a República Democrática Alemã (oriental), sob regime socialista. Assim, a Conferência de Potsdam igualmente marcou o início do pôquer de poder entre as potências do Ocidente e a União Soviética, que em poucos anos culminaria na Guerra Fria.
As negociações se estenderam até 2 de agosto, concluindo-se com a Declaração de Potsdam. Esta prescrevia, entre outros pontos, o deslocamento da fronteira oeste da Polônia até os rios Neisse e Oder. O país receberia compensação pelos territórios que fora forçado a entregar à União Soviética.
As somas de ressarcimento só foram fixadas por alto. Não havia um procedimento padrão: cada nação devia cobrir suas exigências com os recursos de sua própria zona de ocupação. Além disso, os "três grandes" acordaram quanto à expulsão da população alemã da Polônia, da então Tchecoslováquia e da Hungria.
Potsdam também marca uma guinada na história mundial. Com o "Terceiro Reich" aniquilado, a coligação das potências aliadas começava a se esfacelar. Além disso, em meio às negociações, o carismático premiê Churchill foi substituído pelo líder trabalhista Clement Attlee, vencedor das primeiras eleições britânicas do pós-Guerra. E Truman – pouco experiente em política externa, tendo sucedido a Franklin Roosevelt em abril, após a morte deste – deu a ordem para o primeiro lançamento de uma bomba atômica ainda durante a conferência.
Esperança de volta à civilização
Embora a ênfase oficial fosse a punição do agressor bélico, para a Alemanha a conferência trouxe um sinal de esperança. Nem mesmo chegaram a ser discutidas sugestões anteriores para que os alemães fossem escravizados e transformados num povo de lavradores.
A porta para um reingresso da Alemanha na comunidade internacional permanecia ligeiramente aberta. Até porque os Estados Unidos reconheceram desde logo a importância estratégica da Alemanha Ocidental diante de uma União Soviética em expansão.
Num discurso radiofônico após seu retorno a Washington, o presidente Truman comentou que estava vindo de uma cidade "a partir da qual os alemães quiseram dominar o mundo". Agora ela era uma cidade-fantasma, em que os prédios, a economia e as pessoas jaziam por terra.
"Vamos fazer o que pudermos para que a Alemanha volte a ser uma nação decente. Para que, por fim, encontre o caminho para sair do caos econômico em que ela própria se colocou, voltando a ocupar seu lugar no mundo civilizado."
Em vários locais da Alemanha são mantidas partes de edificações destroçadas pela violência bélica. Elas recordam o poder devastador das armas e quanto a paz é preciosa.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Wolf
Testemunhas eloquentes
Difícil acreditar: em 1945, numerosas cidades alemãs estavam tão destruídas como, hoje, partes do Iraque ou da Síria. Destroçadas por bombardeios e nunca mais reconstruídas, ruínas em meio às metrópoles do país ainda prestam testemunho eloquente dos horrores da Segunda Guerra Mundial. Em sua maioria, trata-se de edificações sacras, como a Igreja Memorial do Imperador Guilherme, em Berlim.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Hiekel
Novo e antigo
Inaugurada em 1895, no estilo neo-romântico, a Igreja Memorial do Imperador Guilherme (Kaiser Wilhelm Gedächtniskirche) sucumbiu a um ataque aéreo dos Aliados em 23 de novembro de 1943. Apenas a ruína da torre principal, com 71 metros de altura, foi preservada como memorial. Os quatro prédios que a rodeiam ficaram prontos em 1961, e hoje todo o complexo arquitetônico é tombado.
Foto: picture alliance/akg-images
Do culto à cultura
A história da Igreja do Convento Franciscano no bairro berlinense de Mitte remonta ao ano 1250. Em consequência da Reforma Luterana, em 1539 o convento foi fechado. E, em 3 de abril de 1945, o fogo choveu do céu. As ruínas da igreja foram protegidas, como único prédio da época a sobreviver à Segunda Guerra. Restaurada, desde 2004 ela abriga exposições, apresentações teatrais e concertos.
Foto: gemeinfrei/imago/F. Berger
Memorial no Reno
Destruída e jamais recuperada, a Igreja de Santo Albano fica na parte histórica da cidade renana de Colônia. Na foto veem-se os restos do coro. A antiga nave, hoje descoberta, serve de memorial para os mortos da guerra. Em seu centro, uma escultura evocativa apela pela paz: "Pai e mãe de luto", de Ernst Barlach, com base num desenho de Käthe Kollwitz.
Foto: CC BY-SA 3.0/Raimond Spekking
Sobrevivente solitária
A pouca distância de Santo Albano está Santa Colomba, uma das mais antigas igrejas paroquiais de Colônia. Sua pedra fundamental foi lançada em 980. Após a destruição quase total em 1943, além de uns poucos resquícios dos muros externos, datando do fim da Idade Média, restou apenas uma figura de Nossa Senhora, em meio aos escombros.
Foto: picture-alliance/dpa/F. Gambarini
Destaque no museu
Para abrigar essa estátua da Virgem construiu-se no mesmo local, já em 1947-50, uma capela octogonal. Desde então ela é, para os colonianos, a "Madona dos Escombros". Em 1956-57, a capela marista foi ampliada em capela sacramental quadrilateral. Em 2007, a Igreja de Santa Colomba foi totalmente integrada ao edifício do novo Museu Episcopal Diocesano.
Foto: CC BY-SA 3.0/Elke Wetzig
Esplendor barroco perdido
Datando do século 12, o Palácio Zerbst, na Saxônia-Anhalt, era residência dos príncipes de Anhalt-Zerbst. Reformas no século 17 lhe deram uma estrutura em três alas, e passou a constar entre as principais edificações barrocas da Alemanha central. Em criança, a princesa Sofia Augusta Frederica de Anhalt-Zerbst ia visitar lá os seus parentes. Ela seria coroada em 1762 Catarina 2ª, czarina da Rússia.
Foto: picture-alliance/AKG
Ainda há esperança
Em abril de 1945, o Palácio Zerbst foi atingido por bombas aliadas e totalmente consumido no incêndio subsequente. Sua preciosa decoração interna se perdeu. A reconstrução teria sido possível, mas foi rejeitada por motivos políticos. Somente a ruína da ala leste escapou à demolição, e uma associação de amigos cuida para que seja mantida. Sua meta é a restauração fiel da parte exterior da ala.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Wolf
De "bunker" a igreja
Apesar de não ser uma ruína, este "hochbunker" (abrigo de superfície) em Düsseldorf é mantido como memorial. Para fins de proteção, no início dos anos 1940 ele fora camuflado como igreja. A partir de 1949, foi então transformado de fato em casa de culto. O prédio tombado, que também funciona como local de exposições, é arquitetonicamente ímpar, sendo considerado a igreja mais segura do mundo.
Foto: CC BY-SA 3.0/Ilion
Usina memorial
Este antigo abrigo de superfície em Hamburgo-Wilhelmsburg é igualmente único no mundo. Enquanto, após o fim da guerra, grande parte dessas edificações sucumbiram ao tempo, ele foi amplamente saneado e transformado num "Energiebunker". Equipado com painéis fotovoltaicos e uma usina regeneradora dotada de armazenador de calor, o colosso de concreto fornece eletricidade e calefação à população.
Foto: picture-alliance/dpa/B. Marks
Altura fatídica
As origens da Igreja de São Nicolau de Hamburgo remontam a 1195. Após um incêndio em 1842, foi consagrada no local, 32 anos mais tarde, uma casa de culto totalmente nova, em estilo neogótico. Por um tempo, sua torre de 147 metros foi a construção mais elevada do mundo. Porém, em 23 de julho de 1943, sua altura provou-se fatídica, ao servir de ponto de orientação para os bombardeiros dos Aliados.
Foto: gemeinfrei
Hamburgo-Gomorra
Somente a torre e os porões abobadados resistiram. Ao fim da Segunda Guerra, o Senado hamburguês decidiu não reerguer a Igreja de São Nicolau. Suas ruínas permanecem até hoje como ferida aberta, dedicadas "às vítimas da guerra e da ditadura entre 1933 e 1945". Nos porões criou-se um centro de documentação, com a mostra permanente "Gomorra 1943 – A destruição de Hamburgo na guerra aérea".
Foto: picture-alliance/dpa
Sobrevivência por um triz
Em 1945 jazia em destroços, em Dresden, a famosa Frauenkirche, a igreja protestante de Nossa Senhora. Após sobreviver aos devastadores ataques aéreos de 13 e 14 de fevereiro, no dia seguinte a cúpula de pedra dessa chamada "pérola do Barroco" desmoronou. A Alemanha Oriental não tinha verbas para reerguê-la, e por muitos anos as ruínas jazeram como memorial contra a guerra e a destruição.
Foto: Hulton Archive/AFP/Getty Images
Esperança contra a devastação
Com a Reunificação, iniciou-se em 1996 a reconstrução da Frauenkirche, concluída em 2005. O financiamento do projeto de 180 milhões de euros envolveu 16 associações de amigos no país e no exterior, assim como doações de todo o mundo. As pedras da edificação original foram integradas nos novos muros. A igreja reerguida tornou-se, assim, um símbolo de esperança e do entendimento entre os povos.
Foto: DW/Holm Weber
Recomeço a partir dos escombros
Já em 1947, a Igreja da Ressurreição de Pforzheim, sul da Alemanha, foi a primeira construída no país, no pós-Guerra. Como material de construção, 30 mil tijolos das casas circundantes foram desenterrados, coletados e meticulosamente limpos. Além de sinalizar um recomeço, ela serviu de modelo para 46 "igrejas de emergência" nas cidades alemãs destruídas na Segunda Guerra.