Conferência em Paris sela coalizão internacional contra o "Estado Islâmico"
15 de setembro de 2014
Representantes de 30 países e organizações consolidam formação de aliança que visa combater jihadistas no Iraque e na Síria. Irã rejeita cooperar com os EUA.
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Os líderes da França e do Iraque lançaram um apelo por uma ação imediata contra os extremistas do "Estado Islâmico" (EI), numa conferência realizada nesta segunda-feira (15/09) em Paris. O encontro, com o objetivo de formar uma coalizão contra a milícia jihadista, reuniu representantes de cerca de trinta países e organizações internacionais, mas excluiu o Irã e a Síria.
"Não há tempo a perder", afirmou o presidente francês, François Hollande, durante a abertura da conferência. "A luta dos iraquianos contra o terrorismo também é a nossa luta", reforçou Hollande, pedindo apoio internacional "claro, leal e forte" a Bagdá.
O presidente iraquiano, Fuad Masum, também destacou a necessidade de agir com urgência, alertando que, "se houver demora, se essa campanha de apoio ao Iraque atrasar, talvez o EI venha a ocupar outros territórios, e a ameaça vai se tornar ainda maior".
Masum reiterou o pedido por operações aéreas regulares contra os redutos dos terroristas. "Temos de persegui-los onde quer que estejam. Temos que secar suas fontes de financiamento", acrescentou.
Os jihadistas ocupam um quarto do território da Síria e 40% do Iraque e seu contingente já pode ter chegado a cerca de 31.500 combatentes, segundo a Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA).
Horas antes da conferência, a França anunciou que vai se juntar ao Reino Unido para realizar voos de reconhecimento, em apoio aos ataques aéreos promovidos pelos Estados Unidos contra os extremistas.
Hollande afirmou ainda que a comunidade internacional deve encontrar uma "solução durável no local onde o EI nasceu, a Síria", e defendeu o apoio total às "forças da oposição democráticas" no país.
Estratégia americana exclui Irã
Também na segunda-feira, os Estados Unidos descartaram a possibilidade de colaborar com o Irã na campanha contra o EI. "Não estamos e não iremos cooperar militarmente", afirmou a porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Jen Paski.
Ela admitiu que os dois países discutiram a crise no Iraque durante as negociações sobre o programa nuclear iraniano em Viena, em junho. E, apesar de negar qualquer cooperação entre os dois países nas investidas contra o EI, não descartou uma colaboração no futuro.
O presidente Barack Obama lançou há poucos dias uma estratégia para derrotar o EI, que inclui ataques aéreos na Síria e a expansão das operações no Iraque, onde aeronaves militares americanas já realizaram mais de 160 investidas contra os islamistas. O plano prevê também o treinamento de rebeldes moderados sírios e a reconstituição do Exército iraquiano, que sofreu deserções durante os avanços dos jihadistas no norte do país.
O secretário de Estado dos EUA, John Kerry, havia afirmado em entrevista à rede americana de televisão CBS, neste domingo, que "tudo que é necessário para atingir nossos objetivos já foi oferecido por um ou mais países". Segundo ele, todas as bases da estratégia já teriam sido cobertas.
Em Paris, um oficial americano afirmou que o número de países aderindo à coalizão internacional aumenta "quase que a cada hora", da Europa ao Oriente Médio, incluindo também o Japão, a Coreia do Sul e a Nova Zelândia.
"Os americanos têm mãos sujas"
Já o Irã rejeitou a possibilidade de se unir à coalizão internacional e afirmou ter recusado uma oferta de cooperação feita pelos EUA. Assim como a Síria, o país não foi convidado a participar da conferência em Paris.
O líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, afirmou que seu governo rejeitou, em caráter privado, uma proposta de cooperação na luta contra o EI feita pelos americanos, e alertou que uma nova incursão dos EUA na região resultará "nos mesmos problemas que eles enfrentaram no Iraque nos últimos dez anos".
Através da rede social Twitter, Khamenei afirmou ainda que, por trás da iniciativa dos americanos, estariam planos de dominar a região. "Rejeitei a oferta porque os americanos têm as mãos sujas", apontou o aiatolá, sem especificar qual teria sido a proposta feita por Washington. Por outro lado, o governo iraniano afirmou que apoia os governos do Iraque e da Síria em sua luta contra os extremistas.
Na semana passada, Kerry havia dito que não seria apropriado incluir o Irã na coalizão, reafirmando a perspectiva americana de que o país financia o terrorismo. Teerã nega a acusação.
"Estado Islâmico": de militância sunita a califado
Origens do grupo jihadista remontam à invasão do Iraque, em 2003. Nascido como oposição ao domínio xiita e inicialmente um braço da Al Qaeda, EI passou por mudanças e virou uma ameaça internacional.
Foto: picture-alliance/AP Photo
A origem do "Estado Islâmico"
A trajetória do "Estado Islâmico" (EI) começou em 2003, com a derrubada do ditador iraquiano Saddam Hussein pelos EUA. O grupo sunita surgiu a partir da união de diversas organizações extremistas, leais ao antigo regime, que lutavam contra a ocupação americana e contra a ascensão dos xiitas ao governo iraquiano.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Braço da Al Qaeda
A insurreição se tornou cada vez mais radical, à medida que fundamentalistas islâmicos liderados pelo jordaniano Abu Musab al Zarqawi, fundador da Al Qaeda no Iraque (AQI), infiltraram suas alas. Os militantes liderados por Zarqawi eram tão cruéis que tribos sunitas no Iraque ocidental se voltaram contra eles e se aliaram às forças americanas, no que ficou conhecido como "Despertar Sunita".
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Aparente contenção
Em junho de 2006, as Forças Armadas dos EUA mataram Zarqawi numa ofensiva aérea e ele foi sucedido por Abu Ayyub al-Masri e Abu Omar al-Bagdadi. A AQI mudou de nome para Estado Islâmico do Iraque (EII). No ano seguinte, Washington intensificou sua presença militar no país. Masri e Bagdadi foram mortos em 2010.
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Volta dos jihadistas
Após a retirada das tropas dos EUA do Iraque, efetuada entre junho de 2009 e dezembro de 2011, os jihadistas começaram a se reagrupar, tendo como novo líder Abu Bakr al-Bagdadi, que teria convivido e atuado com Zarqawi no Afeganistão. Ele rebatizou o grupo militante sunita como Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).
Foto: picture alliance/dpa
Ruptura com Al Qaeda
Em 2011, quando a Síria mergulhou na guerra civil, o EIIL atravessou a fronteira para participar da luta contra o presidente Bashar al-Assad. Os jihadistas tentaram se fundir com a Frente Al Nusrah, outro grupo da Síria associado à Al Qaeda. Isso provocou uma ruptura entre o EIIL e a central da Al Qaeda no Paquistão, pois o líder desta, Ayman al-Zawahiri, rejeitou a manobra.
Foto: dapd
Ascensão do "Estado Islâmico"
Apesar do racha com a Al Qaeda, o EIIL fez conquistas significativas na Síria, combatendo tanto as forças de Assad quanto rebeldes moderados. Após estabelecer uma base militar no nordeste do país, lançou uma ofensiva contra o Iraque, tomando sua segunda maior cidade, Mossul, em 10 de junho de 2014. Nesse momento o grupo já havia sido novamente rebatizado, desta vez como "Estado Islâmico".
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Importância de Mossul
A tomada da metrópole iraquiana Mossul foi significativa, tanto do ponto de vista econômico quanto estratégico. Ela é uma importante rota de exportação de petróleo e ponto de convergência dos caminhos para a Síria. Mas a conquista da cidade é vista como apenas uma etapa para os extremistas, que pretenderiam avançar a partir dela.
Foto: Getty Images
Atual abrangência do EI
Além das áreas atingidas pela guerra civil na Síria, o EI avançou continuamente pelo norte e oeste iraquianos, enquanto as forças federais de segurança entravam em colapso. No fim de junho, a organização declarou um "Estado Islâmico" que atravessa a fronteira sírio-iraquiana e tem Abu Bakr al-Bagdadi como "califa".
Foto: Reuters
As leis do "califado"
Abu Bakr al-Bagdadi impôs uma forma implacável da charia, a lei tradicional islâmica, com penas que incluem mutilações e execuções públicas. Membros de minorias religiosas, como cristãos e yazidis, deixaram a região do "califado" após serem colocados diante da opção: converter-se ao islã sunita, pagar um imposto ou serem executados. Os xiitas também eram alvo de perseguição.
Foto: Reuters
Guerra contra o patrimônio histórico
O EI destruiu tesouros arqueológicos milenares em cidades como Palmira (foto), na Síria, ou Mossul, Hatra e Nínive, no Iraque. Eles diziam que esculturas antigas entram em contradição com sua interpretação radical dos princípios do Islã. Especialistas afirmam, porém, que o grupo faturou alto no mercado internacional com a venda ilegal de estátuas menores, enquanto as maiores eram destruídas.
Foto: Fotolia/bbbar
Ameaça terrorista
Durante suas ofensivas armadas, o "Estado Islâmico" saqueou centenas de milhões de dólares em dinheiro e ocupou diversos campos petrolíferos no Iraque e na Síria. Seus militantes também se apossaram do armamento militar de fabricação americana das forças governamentais iraquianas, obtendo, assim, poder de fogo adicional.