Contagem parcial indica disputa acirrada na Turquia
15 de maio de 2023
Resultados preliminares apontam disputa voto a voto entre o presidente Recep Tayyip Erdogan, no poder há 20 anos, e o oposicionista Kemal Kilicdaroglu, sinalizando possibilidade de segundo turno na eleição presidencial
Anúncio
Os resultados parciais da eleição presidencial da Turquia apontam uma disputa voto a voto, com o atual presidente, Recep Tayyip Erdogan, levemente abaixo da marca de 50% dos votos, seguido por uma diferença de apenas quatro pontos percentuais pelo líder oposicionista Kemal Kilicdaroglu. Se ao final da contagem nenhum dos dois ultrapassar os 50%, a eleição presidencial terá um segundo turno.
No momento, apenas 69% das urnas foram apuradas. Contagens não oficiais, contudo, feitas por duas agências de notícias, uma ligada ao governo e outra, privada, mais próxima da oposição, com base em mais de 90% das urnas, indicam que Erdogan tem 49,8% ou 49,02% dos votos e seu adversário, Kilicdaroglu, 44,4% ou 45,2%.
Pelo calendário eleitoral, um eventual segundo turno ocorrerá em 28 de maio.
O resultado da eleição é encarado como crucial para o futuro político da Turquia, que é comandada por Erdogan há 20 anos. Em duas décadas, o líder turco deu uma guinada autoritária e conservadora-religiosa nesse país de 85 milhões de habitantes, que também se afastou do Ocidente e se aproximou da Rússia.
Um dos maiores símbolos do processo de combate à moderna tradição turca do secularismo lançado por Erdogan foi a reconversão da histórica Hagia Sophia, um museu em Istambul desde 1935, em uma mesquita. Em 1935, com o processo de modernização e secularização do país, ela havia sido transformada em um museu.
"Sentimos falta da democracia", declarou o opositor Kilicdaroglu, de 74 anos, com um sorriso neste domingo, ao votar. "Vocês vão ver. A primavera vai voltar para este país, se Deus quiser, e vai durará para sempre", acrescentou, referindo-se a um de seus "slogans" de campanha.
Kilicdaroglu diz que tentará devolver a Turquia ao sistema parlamentar de governança, que foi substituido pelo presidencialismo por Erdogan em 2017. Ele também prometeu restaurar a independência do Judiciário. A Human Rights Watch, em seu Relatório Mundial 2022, apontou que o governo de Erdogan retrocedeu os direitos humanos na Turquia em décadas.
Já Erdogan compareceu à sua seção eleitoral em Üsküdar, um bairro conservador de Istambul, para votar, desejando "um futuro próspero para o país e para a democracia turca". Durante sua campanha, Erdogan apostou na memória de conquistas passadas e também direcionou ataques à oposição e lançando acusações contra outros países. Tentando atiçar sua base ultraconservadora, ele também acusou a oposição de apoiar direitos LGBTQ.
No momento, a economia turca vai mal. Recentemente, a política econômica volátil de baixas taxas de juros do governo desencadeou uma espiral de crise do custo de vida e inflação. A resposta lenta de seu governo a um terremoto devastador em fevereiro no sudeste da Turquia, que matou 50.000 pessoas, também aumentou a insatisfação entre os eleitores.
Uma vitória ou derrota de Erdogan, de 69 anos, também terá repercussões além da Turquia. Membro da Otan, a Turquia de Erdogan se afastou e manteve relações tensas com aliados, como os EUA e a Alemanha nos últimos anos. Milhares de presos políticos e ativistas também podem ser libertados se a oposição prevalecer.
Em 2018, na última eleição presidencial, Erdogan venceu no primeiro turno com mais de 52,5% dos votos.
jps (AFP, Reuters, ots)
Quão europeia é Istambul?
Apesar da crise de relacionamento, Europa e Turquia têm muito em comum. Istambul, por exemplo: a metrópole de 15 milhões de habitantes não é apenas geograficamente parte da Europa. Uma viagem pela cidade dos contrastes.
Foto: Rena Effendi
Para além das categorias convencionais
Istambul é a única cidade do mundo localizada em dois continentes: Europa e Ásia. Na metrópole do Bósforo, tradição e modernidade, religião e estilo de vida secular colidem como em nenhum outro lugar. Muitos dizem que exatamente isso faz a magia da cidade.
Foto: Rena Effendi
Quase 3 milênios de existência
Uma história de mais de 2.600 anos molda a paisagem urbana da Istambul de hoje. Diversos líderes se alternaram na luta pelo poder: persas, gregos, romanos, otomanos. "Constantinopla" era o centro do Império Bizantino e posteriormente do Império Otomano. Só em 1930 a cidade foi batizada "Istambul".
Foto: Rena Effendi
Entre mundos
O Bósforo é a alma azul de Istambul. O estreito separa a parte europeia da parte asiática da cidade. Todos os dias, balsas levam dezenas de milhares de um lado para o outro. Gaivotas gritam ao vento. A bordo, há chá e "simit" (anéis de gergelim). A travessia leva cerca de 20 minutos, de Karaköy, na Europa, para Kadiköy, na Ásia.
Foto: Rena Effendi
Pontes conectam
A partir da ponte Galata, é possível observar bem os navios – e outras coisas mais. Aqui, pescadores se apinham na esperança de uma boa pesca. Entre eles: comerciantes, turistas, engraxates, vendedores de milho. A primeira ponte foi construída aqui em 1845 – quando Istambul ainda se chamava Constantinopla.
Foto: Rena Effendi
"Europa é um sentimento"
"Meu nome é Vefki", diz um dos pescadores, acenando. "Eu me sinto europeu. Queremos mais liberdade, e por isso a Turquia e a UE devem se aproximar." Vefki é aposentado e a pesca é seu hobby, mas também uma renda extra. Por dois quilos de peixe, ele consegue no mercado o equivalente a cerca de oito euros.
Foto: Rena Effendi
Minaretes no coração da cidade
Na Praça Taksim, no coração da cidade, zunem máquinas de construção. Aqui, uma nova mesquita é erguida a alta velocidade, com uma cúpula de 30 metros de altura e dois minaretes. Tudo deve estar pronto até as eleições de 2019. Críticos acusam o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, de impor uma nova identidade à praça: islâmico-conservadora e neo-otomana, ao invés de secular e europeia.
Foto: Rena Effendi
Europeia e devota
O tom é mais conservador no bairro de Fatih, apesar de ele se situar na parte europeia de Istambul. Muitos que vivem aqui imigraram da Anatólia, procurando trabalho e uma vida melhor. Alguns também chamam Fatih de "bairro dos devotos": aqui são muitos os adeptos fiéis do presidente turco e de seu partido conservador-islâmico AKP.
Foto: Rena Effendi
Compras à sombra da mesquita
Quarta-feira é dia de mercado em torno da mesquita de Fatih. Tem empurra-empurra e regateio por eletrodomésticos, roupas, lençóis, frutas e legumes. Os preços são mais baixos do que em outros lugares, assim como os aluguéis. Atualmente muitas famílias sírias vivem em Fatih. Desde o início da guerra, em 2011, a Turquia recebeu mais de 3 milhões de refugiados – mais do que qualquer outro país.
Foto: Rena Effendi
"Pequena Síria" no coração de Istambul
Fatih é agora conhecida por seus restaurantes sírios: O kebab daqui vem com alho extra. "Misafir" (hóspedes) é como os refugiados são oficialmente chamados na Turquia. O status de asilo vigente na UE não existe aqui. Mas o governo prometeu cidadania turca para dezenas de milhares de sírios. Críticos veem nisso uma tentativa de angariar votos adicionais.
Foto: Rena Effendi
Vida noturna em "Hipstambul"
Quem quiser sair, fazer festa, beber álcool, tem que procurar outros bairros de Istambul. Por exemplo Kadiköy, do lado asiático. Ou vir aqui para Karaköy, um dos bairros mais antigos, mas hoje extremamente encarecido. Moradores e turistas se encontram em cafés, lojas conceituais e galerias. A política islâmica conservadora do governo não encontra muitos entusiastas por aqui.
Foto: Rena Effendi
Esperança no turismo
"Istambul mudou muito", diz Ayşegül Saraçoğlu. Ela trabalha numa loja de grife no bairro turístico de Galata. "Há alguns ano,s muitos europeus vinham para cá de férias", agora são principalmente turistas árabes. "Isso é ruim para o nosso negócio", reclama, "espero que mude em breve".