Um ano após o sumiço do voo MH370, o destino do avião da Malaysia Airlines ainda é um mistério. Em entrevista à DW, Sarah Bajc, companheira de um dos passageiros, não poupa críticas aos governos de Malásia e China.
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Um ano após o desaparecimento do voo MH370, famílias e amigos das vítimas continuam à espera de explicações da Malaysia Airlines. Apesar da operação de busca e salvamento mais cara da história no setor, a equipe internacional de investigadores não encontrou qualquer vestígio da aeronave até agora.
Alguns parentes dos desaparecidos rejeitam as alegações das autoridades da Malásia, de que o avião teria sido destruído por um acidente e de que todos os ocupantes morreram. Eles estão revoltados com a forma como a companhia aérea e as autoridades se comportaram, quando afirmaram que não havia evidência alguma para um acidente. Agora, temem que a busca pelo avião seja suspensa.
Desde o desaparecimento, nas primeiras horas da manhã de 8 de março de 2014, do avião, que ia de Kuala Lumpur a Pequim com 239 pessoas a bordo, o caso é envolto em especulações. Investigadores acreditam que a área mais provável onde a aeronave teria caído fica a oeste de Perth, na Austrália – em um corredor longo e estreito no sul do Oceano Índico.
Sarah Bajc, companheira de um passageiro do voo MH370, conta, em entrevista à DW, como o evento mudou sua vida, por que as famílias das vítimas desconfiam das afirmações das autoridades e como o incidente influiu positivamente na evolução da indústria de aviação.
DW: Como o destino do voo MH370 mudou sua vida?
Sarah Bajc: O desaparecimento de Philip mudou toda a minha vida. Minha vida diária e meu futuro mudaram drasticamente. Fazíamos tudo junto, fora quando estávamos trabalhando. Tomávamos café da manhã na varanda, fazíamos yoga, cozinhávamos, compartilhávamos nossos pensamentos e sentimentos.
Viajávamos muito, passávamos muito tempo com os filhos, a família e os amigos. Agora, eu estou sozinha. Também fico constantemente confusa e distraída na minha busca pela verdade. Eu passei horas pesquisando, discutindo com peritos, com outros parentes e dei entrevistas aos meios de comunicação. É como se eu tivesse dois empregos de tempo integral: dar aula na escola e procurar Philip.
Como os amigos e as famílias das outras vítimas reagiram ao desaparecimento da aeronave?
A maioria dos parentes teve oportunidade de conhecer os outros, pessoalmente ou por meio da mídia social. Em geral, é um grupo formidável, em que um dá suporte ao outro. Mas nossos esforços para compartilhar informações e nos ajudarmos uns aos outros foram bastante dificultados pelas autoridades chinesas e malaias. Ambos os governos têm impedido ativamente os parentes das vítimas de se unirem formalmente, em uma associação, por exemplo. Mesmo assim, alguns de nós se tornaram amigos próximos e vamos continuar a trabalhar juntos ativamente na procura da verdade.
Até que ponto as autoridades impediram parentes de se unir?
O governo chinês impediu reuniões de familiares, afirmando que as reuniões eram ilegais. Alguns foram ameaçados de punições legais ou foram intimidados. Os malaios foram mais sutis. Tentaram impedir debates públicos, ao oferecerem um grupo supervisionado a familiares, mas sem fazer nada em seguida, de modo que as pessoas ainda estão à espera de ajuda.
Como você avalia o comportamento das autoridades na gestão da crise?
Só há uma explicação para duas opções desagradáveis: ou o governo da Malásia age com negligência grosseira, o que se deveria à incompetência e à corrupção, e, portanto, não conseguem, assim, lidar com os aspectos mais simples dessa situação, desde o início até agora. Ou eles deliberadamente encobrem o que realmente aconteceu. Ou porque eles próprios são responsáveis ou devido à pressão de outro poder.
Algum membro do governo malaio chegou a se reunir com as famílias das vítimas?
Houve um encontro muito superficial. Na maioria dos casos, um membro do governo fez uma declaração diante dos parentes. Não há uma discussão honesta. A maioria dos e-mails, cartas e pedidos de informação foi simplesmente ignorada. Eu nunca foi contatada por um funcionário do governo por causa de Philip ou do voo MH370.
Você encomendou uma investigação paralela para esclarecer o desaparecimento da aeronave. Existem resultados?
A única coisa que descobrimos até agora é que tentaram ativamente silenciar testemunhas, destruir ou esconder provas. Dezenas de pessoas envolvidas no caso foram ameaçadas, para que não dissessem nada.
Informações importantes, que normalmente deveriam ser publicadas, são mantidas em sigilo: a lista completa de frete, todos os registros e gravações do controle de tráfego aéreo, os dados dos sistemas de radar militares e da central da companhia aérea. Caso realmente tenha ocorrido um acidente, todos esses dados teriam que ser divulgados para confirmar esse diagnóstico. Em vez disso, eles são mantidos em segredo. Por quê?
Você tem esperança de que esse avião seja encontrado?
Não acredito na versão oficial, de que o voo MH370 está no sul do Oceano Índico. Por isso, na minha opinião, os esforços da Austrália são um total desperdício de recursos. O governo da Austrália ou é estúpido o suficiente para ficar procurando no fundo do mar sem ter evidências sólidas de que o avião caiu lá, ou colabora para encobrir algo.
A Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO) da ONU propõe, desde o ocorrido com o voo MH370, um novo padrão, segundo o qual aviões comerciais devem informar sua posição a cada 15 minutos.
Certamente é um passo na direção certa, apesar de eu achar que intervalos de cinco minutos façam mais sentido e, tecnicamente, provavelmente não seja um grande esforço. Isso devia ter sido introduzido muitos anos atrás.
Outras mudanças urgentemente necessárias são um maior número de transponders seguros que não podem ser desligados, e geradores de sinal muito mais fortes que a caixa-preta, distribuídos em vários pontos da aeronave, com baterias significativamente mais duradouras.
O mistério do voo MH370
Já se passou mais de um ano desde que o jato da Malaysia Airlines desapareceu, abrindo uma discussão sobre a segurança da aviação global. A DW reuniu os momentos mais importantes sobre as buscas pela aeronave.
Foto: Reuters/Zinfos974/P. Bigot
Decolagem
No dia 8 de março, o voo MH370 da Malaysia Airlines com destino a Pequim decolou à 00h41 do aeroporto internacional Kuala Lumpur, na Malásia, com 239 passageiros a bordo. Após 26 minutos da decolagem, o sistema Acars, responsável por enviar informações cruciais sobre a condição da aeronave, foi desligado.
Foto: picture-alliance/dpa
Últimas palavras
Minutos após o Boeing 777 sair do espaço aéreo da Malásia e entrar no território do Vietnã, alguém da cabine do piloto disse: “Boa noite, Malaysia três, sete, zero”. A companhia aérea acredita que era o co-piloto Fariq Abdul Hamid. A aeronave voava com boas condições do tempo.
Foto: picture-alliance/dpa
Fora do radar
O avião desapareceu das telas do controle aéreo civil quando o equipamento que transmite a localização e altitude foi desligado à 1h31 da madrugada. Quando um radar militar identificou aeronave às 2h15, ela estava localizada em um ponto ao sul da ilha de Phuket no estreito de Malaca, a centenas de quilômetros fora da rota.
Foto: picture-alliance/dpa
Sete horas mais tarde
A última comunicação da aeronave com satélites, sete horas mais tarde, a localizava em algum lugar em uma das duas regiões: a primeira, ao norte que se estende da Tailândia até a fronteira do Cazaquistão e do Turcomenistão, ou ao sul, numa área que vai da Indonésia ao sul do Oceano Índico. O último sinal foi recebido às 8h11, sugerindo que o avião pode ter continuado a voar por horas.
Foto: NASA/dpa
Começa a busca
Pouco tempo após o desaparecimento, Malásia e Vietnã organizam juntos uma missão de busca. A área de procura logo foi expandida, cobrindo parte do golfo da Tailândia, entre Malásia e Vietnã. Verificou-se também que dois passageiros usavam passaportes roubados da UE, alimentando temores de um ataque terrorista. Mais tarde, a polícia descobriu que os homens eram imigrantes ilegais iranianos.
Foto: reuters
Mar de destroços
Até 12 de março, a área de busca atingiu ambos os lados da península da Malásia, o que totaliza uma área com cerca de 90 mil quilômetros quadrados. No total, 12 países participaram da operação de busca. Um satélite chinês localizou três grandes objetos flutuando no Mar do Sul da China que poderiam ser destroços da aeronave desaparecida.
Foto: picture alliance/AP Photo
"Ação deliberada"
Dois dias após, o primeiro-ministro da Malásia, Najib Razak, (à direita na foto) confirma que o avião desviou da rota planejada, com movimentos que "sustentariam a tese de uma ação deliberada por alguém do avião". Autoridades iniciaram uma investigação criminal, levantando identidades e antecedentes da tripulação e dos passageiros. As casas do comandante e do co-piloto foram revistadas.
Foto: Reuters
Nova fase das buscas
Onze dias após o incidente, o número de países envolvidos na operação de busca cresce de 14 para 26 países. Os investigadores focam em duas grandes áreas que o avião poderia ter sobrevoado. A área de busca agora já cobre 2,24 milhões de milhas náuticas quadradas.
Foto: Reuters
Procurando um motivo
Funcionários apresentaram um novo cronograma, mostrando que a última transmissão de voz do avião ocorreu antes do corte do sistema de comunicação. Foram investigadas as possibilidades de sequestro, sabotagem ou suicídio do piloto. Mas investigações sobre os passageiros não conseguem apontar motivos que indicassem motivação política ou criminosa para derrubar o avião ou sequestrá-lo.
Foto: picture-alliance/dpa
Espera dolorosa
Teorias conflitantes surgem para tentar explicar o incidente. Mas sem achar os destroços, fica difícil apurar os fatos. Isso prolongou a dolorosa espera dos familiares e amigos dos desaparecidos. No avião, havia passageiros de 14 países diferentes, a maioria vinha da China (153) e da Malásia (38).
Foto: Reuters
Parentes dos passageiros protestam
Em 24 de março, o primeiro-ministro Naib Razak anuncia que, de acordo com dados de satélites, o voo MH370 caiu ao sul do Oceano Índico. A declaração desencadeou uma tempestade de tristeza e raiva dos familiares das vítimas. Parentes irritados protestaram em frente à embaixada da Malásia em Pequim e e queixaram de falta de informações confiáveis.
Foto: Reuters
Frustração
Por vezes, as buscas davam motivos para frustração, como quando objetos dados como parte do avião eram, na verdade, só lixo. As buscas se tornaram um desperdício de tempo. Alguns objetos rastreados na água eram só redes de pescas enroscadas, bóias ou pedaços de geladeiras de isopor.
Foto: Reuters
Mistério sem solução
Em 3 de abril, quase um mês após o sumiço, as autoridades continuaram perplexas. O premier Najib Razak disse que a busca não será interrompida até que as respostas sejam encontradas, o primeiro-ministro australiano, Tony Abbott, descreveu o caso como “o mais difícil na história da humanidade”.
Foto: picture-alliance/dpa
Sinal detectado
Em 5 de abril, um navio chinês detectou um sinal pulsante no Oceano Índico. Dois dias depois, um navio australiano identifica dois sinais distintos, um de longa duração e outro que parece contínuo, como os sinais de caixas pretas de aeronaves. A equipe internacional percorre cerca de 850 quilômetros quadrados do Oceano Índico por semanas, mas não consegue encontrar evidências.
Foto: picture-alliance/dpa
Austrália move buscas mais para o sul
Em outubro, a Austrália move a área de busca mais para o sul, onde a empresa de satélite britânica Immarsat calculou o possível local da queda do avião com base em breves conexões que o avião fez com um dos satélites. A área fica ao oeste de Perth, na Austrália. O local é identificado como um dos mais prováveis para se achar o avião. Mas nada é encontrado.
Foto: atsb.gov.au
Malásia declara ocorrido como acidente
No final de janeiro de 2015, o departamento de aviação civil da Malásia declarou oficialmente que o voo foi um acidente e que todas as pessoas a bordo eram dadas como mortas. O anúncio foi feito de acordo com as regras da aviação global, que permite que as famílias dos passageiros tentem uma indenização.
Foto: Roslan Rahman/AFP/Getty Images
"Desculpa conveniente"
No entanto, alguns familiares dos passageiros do voo MH370 se recusaram a aceitar a conclusão da Malásia. Pouco depois, Sarah Bajac, cujo o parceiro Philip Wood estava na aeronave, disse à DW que isso era uma “desculpa conveniente”, argumentando que nenhuma evidência foi encontrada para apoiar a alegação das autoridades.
Foto: privat
Novas regras de aviação
No esforço para melhorar a segurança dos voos após o desaparecimento do MH370, a Organização de Aviação Civil Internacional propôs recentemente uma nova medida que exige a confirmação da posição de aeronaves comerciais a cada 15 minutos. Essa orientação é a primeira etapa de uma proposta que visa assegurar que os aviões possam ser rastreados com rapidez.
Foto: Getty Images
Busca complicada
As equipes de busca encontraram muitos desafios. Alguns deles associados com a área de busca. O afastamento e o tamanho da área exigiram que todos os aspectos da operação fossem planejados e executados meticulosamente. Em comparação com outros acidentes aéreos, a operação de busca do MH 370 foi a mais cara da história.
Foto: cc-by/ATSB/Photo by Chris Beerens/RAN
Nova pista
Mais de um ano após o desaparecimento do voo, investigadores se dirigiram à Ilha da Reunião, no Oceano Índico, para determinar se o destroço de um avião levado até as margens é parte do Boeing 777-200 da Malaysia Airlines. O destroço de aproximadamente dois metros de comprimento, que parece ser parte de uma asa, foi encontrado em Saint-André, na costa leste da ilha.