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SociedadeCoreia do Sul

Coreia do Sul avalia proibir consumo de carne de cachorro

Julian Ryall
26 de novembro de 2021

Defensores dos direitos dos animais aplaudem proposta, enquanto grande maioria da população apoia a proibição do comércio de carne canina. Por outro lado, tradicionalistas defendem que prato é receita típica sul-coreana.

Protesto contra o consumo de carne de cachorro em Seul, Coreia do Sul
Protestos contra o consumo de carne de cachorro, como este de 2018, ocorrem há alguns anos no paísFoto: Getty Images/AFP/E. Jones

O governo da Coreia do Sul anunciou nesta quinta-feira (25/11) que planeja criar um comitê de aconselhamento para discutir uma possível proibição do consumo de carne de cachorro no país.

A comissão de 20 membros será composta por especialistas, membros de organizações privadas e autoridades do governo, informou o Ministério da Agricultura sul-coreano, e deverá chegar a um consenso sobre a questão até abril de 2022.

Por um lado, o projeto é exaltado por ativistas e donos de animais de estimação. Os tradicionalistas, por outro, alegam que a carne é uma receita típica sul-coreana e que as pessoas devem ser livres para consumi-la.

O tema entrou na agenda governamental depois que o presidente Moon Jae-in sugeriu, em setembro, que seria hora de impor uma proibição à venda e ao consumo da carne de cachorro.

Moon, que é um adorador de animais, disse que comer cães tem se tornado cada vez mais controverso na comunidade internacional. E isso não é recente. Em 1988, por exemplo, o governo fechou todos os restaurantes que serviam carne de cachorro em Seul durante os Jogos Olímpicos, a fim de evitar uma imagem negativa da culinária local.

Queda brusca de popularidade

Ainda que a carne de cachorro faça parte da culinária coreana há séculos, sua popularidade tem caído drasticamente nos últimos anos.

Em 2019 foram contabilizados menos de cem restaurantes servindo cachorros em Seul, e a indústria relatou que as vendas tiveram queda de até 30% em um ano. O maior abatedouro de cães do país, em Seongnam, fechou em 2018. O último grande mercado de carne canina, na cidade de Daegu, fechou no início deste ano.

Todos os anos, porém, são criados até 1,5 milhão de cães para fins de alimentação em fazendas espalhadas pelo país. A maioria é consumida nos meses quentes e úmidos do verão, em meio à crença de que comer carne de cachorro aumenta a resistência e a virilidade dos homens.

Segundo uma pesquisa de opinião pública divulgada em 2020 pela ONG de defesa dos direitos dos animais Sociedade Humana Internacional (HSI), 84% dos coreanos não comem ou não querem comer cachorro, e 60% disseram apoiar uma proibição do comércio.

"Na última década, com cada vez mais pessoas tendo cães de estimação em casa, os animais são vistos como parte da família, e não como alimento. A maioria dos jovens na Coreia sente-se horrorizada e enojada com a ideia de comer cachorro", afirma Nara Kim, que dirige a campanha "End dog meat" (Pare com a carne de cachorro), da HSI.

"Além do aumento no número de donos de animais, cresceu também a conscientização das questões de bem-estar animal e, especificamente, o sofrimento animal que ocorre nas fazendas e nos matadouros", diz Kim.

A mídia coreana demorou para informar a sociedade sobre a real situação das fazendas de cães. Mas quando os ativistas da HSI começaram a levar repórteres até esses locais, os telespectadores ficaram chocados não só com as condições, mas ao verem animais que consideram de estimação esperando para ser abatidos.

Alimento tradicional ou animal de estimação?

Segundo a ativista Nara Kim, a indústria da carne de cachorro na Coreia do Sul busca convencer a população de que os animais criados para comer são diferentes dos de estimação. "Quase como um animal diferente, sem alma. Quando as pessoas veem que isso não é verdade, isso tem um grande impacto", destaca.

Enquanto pesquisas mostram que cada vez menos coreanos apreciam a carne de cachorro, Kim reafirma que o alimento não pode mais ser considerado parte da cozinha tradicional.

"É mais correto dizer que é um hábito ultrapassado, principalmente para homens idosos que gostam de acreditar que influencia em questões de saúde", afirma. "Como coreana, é meio que um insulto e uma vergonha que o Ocidente pense que a carne de cachorro é uma tradição coreana."

Nos últimos seis anos, a HSI cooperou com 18 criadores de cães que queriam deixar esse mercado e os ajudou na transição para um negócio diferente, enquanto encontrava um lar para seus cães, inclusive na Europa.

Kim se diz "cautelosamente otimista" de que a medida planejada pelo governo saia do papel, embora preveja uma forte resistência da indústria.

"Apenas criadores de grandes fazendas estão ganhando dinheiro com isso. As pequenas e médias não são lucrativas e certamente os fazendeiros com os quais conversamos regularmente sabem que esta é uma indústria em extinção e que é hora de deixá-la para trás, ainda que as associações de carne de cão não estejam cooperando", diz.

Há quem apoie

Ainda que menor nos últimos anos, ainda há um certo grau de apoio ao consumo de carne de cachorro na sociedade sul-coreana. Young-chae Song, professor do Centro de Criação e Colaboração Global da Universidade Sangmyung de Seul, argumenta que, com cada vez menos adeptos ao prato, não seria necessário aprovar uma lei para proibi-lo.

"A demanda é tão baixa agora que o mercado deve decidir quais restaurantes devem sobreviver e continuar servindo carne de cachorro. E qualquer um que queira deve ter permissão para isso", afirma.

"Não é muito diferente das tradições alimentares em outros países. Estive recentemente em Taiwan e vi pessoas passeando com porcos de estimação, mas os taiwaneses ainda comem carne de porco. Para mim, alguns animais podem ser tanto de estimação quanto comida, e se minha família ou amigos me convidassem para ir a um restaurante de carne de cachorro, eu iria."

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