Clima ameaça tubarão-da-Groenlândia, vertebrado mais longevo
Ruby Russell
14 de julho de 2022
Peixes que hoje nadam nas águas do Ártico podem ter mais de 500 anos de idade. À medida que seu habitat gelado se aquece, porém, tubarões-da-Groenlândia têm um futuro cada vez mais incerto.
Anúncio
O tubarão-da-Groenlândia é uma verdadeira excentricidade dos mares: sua carne é intragável, seus hábitos alimentares, ecléticos, e às vezes desagradáveis. Embora seja um grande caçador, não dispensa uma boa carniça, e em seu estômago já foram encontrados restos de renas e cavalos.
Outra característica menos atraente são seus olhos: crustáceos semelhantes a vermes se prendem às córneas, tornando seu hospedeiro quase cego. Felizmente, isso não parece representar um grande problema, que consegue perseguir lulas sob o gelo do Ártico, em profundidades turvas de até mais de 2 mil metros. No entanto, o aspecto mais notável desse tubarão curioso é sua vida útil, a mais longa de qualquer vertebrado.
Olhos revelam a idade
A idade de outros tubarões pode ser determinada contando os anéis de crescimento em suas vértebras – da mesma forma como se contam os anéis no tronco de uma árvore.
Mas o tubarão-da-Groenlândia tem ossos macios e gelatinosos, que revelam pouco sobre sua história de vida. Foi apenas em 2016 que os cientistas revelaram sua extraordinária longevidade, olhando profundamente em seus olhos.
Apesar de não serem muito bons para enxergar, os olhos do tubarão, como os de outras espécies, contêm proteínas que são preservadas ao longo de toda a vida do animal. Os cientistas reuniram os olhos de 28 tubarões da Groenlândia, capturados acidentalmente por traineiras de pesca, e os dataram por radiocarbono.
Tubarões menores estavam vivos desde o início dos anos 1960, quando altas concentrações de carbono-14 na atmosfera deixaram marcas de testes nucleares em seus tecidos.
Mas foi descoberto que uma fêmea adulta de cinco metros não só já existia antes da era nuclear, como bem antes da Revolução Industrial: os cientistas avaliaram seu nascimento em algum ponto entre 1504 e 1744.
Anúncio
Ameaçados pelo derretimento do gelo
Esse espécime sobreviveu a uma época em que tubarões eram caçados pelo óleo de seu fígado, usado em lâmpadas pré-elétricas. Altas concentrações de óxido de trimetilamina tornam sua carne venenosa. Consta que um processo de fermentação de meses a transforma numa delícia, mas certamente não é um prato para todos os gostos. Porém isso não impede de acabarem presos, como pesca indesejada, em redes destinadas a espécies mais apetitosas.
Milhares de tubarões-da-Groenlândia encontram seu fim desse modo, a cada ano. E a ameaça aumenta à medida que as águas do Ártico esquentam e o gelo derrete, abrindo novas extensões de seu habitat para a pesca comercial.
O ritmo lento de suas vidas não ajuda: com um metabolismo excepcionalmente vagaroso, adaptado ao habitat gelado, eles só atingem a maturidade sexual aos cerca de 150 anos de idade. Por isso a crise climática também pode ser fatal para o tubarão-da-Groenlândia. Se uma nova geração conseguir sobreviver, o mundo em que viverá será muito diferente do de seus pais.
Animais raros e estranhos
De ursos d'água e lulas de 13 metros a "galinhas monstro sem cabeça", ainda há muito para a biologia descobrir no planeta. Conheça nove novas espécies animais – e uma participação especial do reino vegetal.
Foto: Imago/Science Photo Library
Mola tecta
Este animal de dois metros de largura e aparência bizarra encalhou numa praia da Califórnia em fevereiro de 2019, deixando atônitos os moradores locais. Trata-se de uma variedade rara de peixe-lua, apenas identificada oficialmente em 2017 e até então avistada exclusivamente nas águas do Hemisfério Sul, nas proximidades da Nova Zelândia e Austrália.
Foto: Reuters/T. Turner
Enypniastes eximia
Filmado em 2018 ao largo do leste da Antártida, este pepino-do-mar atende por um apelido saído de um filme de terror: "galinha monstro sem cabeça". Antes, ele só fora localizado no Golfo do México. Enquanto outras espécies da mesma classe habitam o fundo do oceano, a "galinha" passa o dia flutuando pelas águas, só aterrissando para se alimentar.
Medindo (monstruosos, na escala apiária) 3,8 centímetros, a abelha-gigante Wallace foi localizada por cientistas na selva da Indonésia 38 anos após ser registrada pela primeira vez. Durante 25 anos, chegou a constar da lista das espécies "mais procuradas" da Global Wildlife Conservation. Apesar das assustadoras mandíbulas, sua dieta é basicamente de néctar e pólen, como a das primas menores.
Foto: Clay Bolt
Architeuthis dux
Tendo provavelmente inspirado o mito do "Kraken", o calamar-gigante escapou aos biólogos durante décadas: a primeira fotografia de um espécime vivo foi tirada em 2004. E aqui vê-se um quadro da primeira filmagem de um dos cefalópodes em seu habitat natural, feita em 2012. Não se sabe ainda que dimensões podem alcança, mas o maior já registrado media 13 metros.
Foto: Reuters
Hyorhinomys stuempkei
Em 2015, cientistas confirmaram oficialmente a descoberta de uma nova espécie de mamífero na ilha indonésia de Sulawesi. Não se sabe por que o órgão olfativo a que o rato-de-nariz-de-porco deve seu nome tem essa forma, mas ele também ostenta assustadores dentes vampirescos – embora se alimente principalmente de minhocas e larvas de besouros.
Foto: picture-alliance/dpa/Museum Victoria
Neopalpa donaldtrumpi
Descoberta na Califórnia do Sul em 2017, esta minúscula mariposa atraiu a atenção da mídia graças ao "topete" amarelado que ostenta, espantosamente aparentado ao penteado de Donald Trump. Por ironia, o habitat do inseto se estende até o estado mexicano de Baixa Califórnia, ameaçado de ser dividido pelo muro que é a obsessão do presidente americano.
Foto: picture-alliance/dpa/V.Nazari
Chaunacidae
Parece não haver endereço melhor para criaturas de aparência excêntrica do que as profundezas do oceano. Esta raramente fotografada "rã marinha" foi descoberta em 2009, durante a expedição Deep Down Under no Mar de Coral da Austrália. Os peixes, que vivem no fundo de areia, pertencem à família dos xarrocos, cuja característica mais espetacular é a isca bioluminescente que portam defronte da boca.
Foto: picture-alliance/dpa/MARUM Universität Bremen/LMU München
Sciaphila sugimotoi
Num breve desvio para o reino vegetal, a descoberta no Japão desta extraordinária planta, em 2017, despertou interesse por todo o mundo – também pelo fato de a flora do país ser tão bem documentada. Trata-se de uma das poucas espécies de plantas que praticamente abandonaram o processo de fotossíntese, alimentando-se, em vez disso, das raízes dos fungos hospedeiros, sejam cogumelos ou mesmo bolor.
Foto: picture-alliance/ESF International Institute for Species Exploration/Takaomi Sugimoto
Xuedytes bellus
Uma nova espécie de besouro foi descoberta em 2018 numa caverna de calcário da província de Guangxi, no sul da China. Seu corpo alongado e compacto, pernas finas e longas e total ausência de olhos ou asas fazem do besouro-das-cavernas um exemplo perfeito de adaptação à vida na escuridão absoluta, assim como de evolução convergente.
Foto: picture-alliance/Sunbin Huang/Mingyi Tian/ESF International Institute for Species Exploration/dpa
Tardigrada
Embora a ciência conheça os microscópicos tardígrados desde 1777, uma nova espécie foi descoberta em 2018, justamente num estacionamento no Japão, quando um pesquisador arrancou um pedaço de musgo do concreto e levou-o para testar no laboratório. Os também chamados ursos-d'água, são praticamente indestrutíveis, e a nova espécie pode ser descendente de uma linha arcaica.