Crise da Ucrânia expõe divisão no Ocidente
8 de fevereiro de 2015A mensagem conjunta que os mais altos representantes da diplomacia da Alemanha, da França e dos Estados Unidos tentaram passar durante a Conferência sobre Segurança, em Munique, foi bem clara. No que diz respeito à crise na Ucrânia, Washington, Berlim e Paris caminham juntos.
Os ministros do Exterior da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, e da França, Laurent Fabius, voltaram a explicar a racionalidade por trás de seus esforços na busca de uma solução negociada para o conflito na Ucrânia e reforçaram a posição contrária de seus países ao fornecimento de armas a Kiev. Nas palavras de Steinmeier, "fornecer armas é não apenas arriscado, como também contraprodutivo"
O secretário americano de Estado, John Kerry, reforçou repetidamente e com veemência não haver um racha entre EUA e Europa com relação ao fornecimento de armas à Ucrânia. "Deixem-me esclarecer a todos: não há divisão, não há racha", afirmou Kerry. Em suas considerações, o secretário americano tentou evitar ao máximo a questão central que inquieta os líderes globais: afinal, a administração do presidente Barack Obama vai ou não fornecer armas ao governo ucraniano?
Dias atrás, o próprio Kerry afirmou que Obama iria decidir "em breve" sobre um eventual envio de armamento à Ucrânia. Em Munique, porém, ele minimizou a questão e disse apenas que "discussões" sobre o repasse às tropas ucranianas são "táticas, e não estratégicas".
Tensões profundas
Esta visão, no entanto, é facilmente refutada pelo fato de que a missão Merkel-Hollande busca o fim do conflito por meio de uma negociação de paz. Além disso, ela também não é compartilhada pelo novo presidente do Comitê dos Serviços Armados do Senado americano, John McCain.
Minutos após o discurso de Kerry, McCain deixou claro que não considera o envio de armas à Ucrânia uma questão puramente tática. O senador republicano reiterou que o Ocidente precisa fornecer armas para que Kiev possa se defender e disse considerar Putin um agressor, cujo apetite não vai parar na Ucrânia.
Em seu discurso, desta vez, McCain usou palavras muito mais afáveis do que em um outro dois dias antes, quando fez duras críticas ao governo alemão, o qual acusou de "estupidez".
Ainda assim, ficou bem claro para muitos que um protagonismo americano neste momento encontra a objeção da Alemanha, da França e, possivelmente, até mesmo do presidente dos EUA. E isso não é exatamente a imagem de uma unidade transatlântica.
"Há tensões muito, muito profundas", disse Kristian Harpviken, diretor do Instituto de Pesquisa sobre Paz em Oslo, em entrevista à DW. "Temos sentido essas tensões nos últimos anos. Mas a questão é, no caso de os Estados Unidos optarem por um apoio militar direto, se isso irá aprofundar ainda mais essas tensões ou não."
Se as tensões transatlânticas serão administradas e contidas, ou se elas acabarão levando a uma aberta discordância sobre o curso das ações com relação à Rússia e a Ucrânia, porém, vai depender de duas coisas. Primeiro, do progresso e do resultado da missão Merkel-Hollande. E segundo, da decisão da Casa Branca sobre o envio de armas. E ambos os pontos estão interligados.
"Obama está sob uma incrível pressão para fornecer armas à Ucrânia", acredita Fiona Hill, diretora do Centro para os Estados Unidos e Europa da Brookings Institutions, em Washington. "Mas até agora, ele não cedeu", ressaltou, em entrevista à DW. Ainda é incerto, porém, quanto tempo mais ele irá resistir – ou mesmo se ele quer continuar resistindo.
Para Hill, esta é uma situação "extremamente perigosa". Muitos em Washington querem ação imediata e não entendem a posição da chanceler federal alemã, Angela Merkel. O que faltou, acreditam, foi uma maior estratégia por trás dos pedidos para envio de armas à Ucrânia.
Grande risco
A divisão entre americanos que concordam com o fornecimento de armamentos a Kiev e europeus que se opõem a essa ação acaba levando a um questionamento: será que os parceiros transatlânticos estão mesmo preparados para a aposta de alto risco que a entrega de armas representa? Os europeus não estão. Os americanos republicanos, sim. A administração Obama – como de costume – ainda resiste.
"Se os Estados Unidos decidirem intervir na Ucrânia, isso fará com que as coisas melhorem ou piorem por lá? Essa é a grande questão", resumiu Sunjoy Joshi, diretor da Observer Research Foundation (ORF), baseada em Déli, questionado pela DW.