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Crise de moradia da Alemanha castiga duro estudantes

Helen Whittle
26 de outubro de 2023

Enquanto a carência de acomodação se agrava no país, dezenas de milhares de universitários estão entre os principais atingidos, e mais ainda os estrangeiros. Especialista: "É um problema da sociedade como um todo."

Calouros da Universidade de Colônia, Alemanha
Associação Estudantil da Alemanha: "Falta de moradia acessível para estudantes nas metrópoles é estado de coisas deplorável"Foto: Christoph Hardt/Panama Pictures/IMAGO

À medida que caem as temperaturas e graduados e pós-graduados acorrem às universidades para o semestre de inverno na Alemanha, dezenas de milhares se veem sem moradia de longo prazo e pouca ou nenhuma perspectiva de encontrar um leito numa casa de estudantes ou de dividir um apartamento a preço razoável.

Confirmando a gravidade da situação, a Associação Estudantil da cidade de Göttingen, no centro do país, alugou um hotel onde universitários podem se hospedar nas primeiras semanas do semestre, a preço reduzido. Em Munique, no sul, os estudantes têm que contar, em média, com 720 euros (R$ 3.840) de aluguel. Em reação, uma plataforma de camping oferece aos que não encontram acomodação a possibilidade de acampar por taxas mais baixas.

No início de 2023, o Instituto de Pesquisa Eduard Pestel constatou um déficit de mais de 700 mil apartamentos na Alemanha, sobretudo no segmento mais acessível. Além disso, os aluguéis subiram drasticamente, principalmente nas grandes cidades universitárias.

A falta de moradia acessível para estudantes nas metrópoles tem sido um "estado de coisas deplorável" há décadas, criticou o diretor da Associação Estudantil da Alemanha (DSW), Matthias Anbuhl, num comunicado divulgado em 16 de outubro. Atualmente a instituição mantém cerca de 1.700 dormitórios em todo o país, com 196 mil vagas, porém tem mais de 32 mil nomes em sua lista de espera.

Couch surf e trajetos longos

Sentado com seu laptop num sofá meio surrado no campus da Universidade Livre de Berlim (FU), o calouro de 22 anos Merlin não conseguiu um quarto num apartamento partilhado, e atualmente está alojado entre a casa dos pais, em Kleinmachnow, nos arredores da capital, e a da tia, mais perto do campus. "Eu posso pagar uns 500 euros de aluguel, e muitas vezes não recebo nem uma resposta dos proprietários", queixa-se.

Na poltrona ao lado, a estudante de veterinária Talina, de 21 anos, conta que recebeu apenas um mês de prazo para liberar seu apartamento a uma família que retorna em agosto. Sua colega Elli, da mesma idade, está morando num quarto e precisa encontrar uma alternativa antes do fim do ano.

Não vai ser fácil: a média do aluguel de um quarto num apartamento partilhado em Berlim dobrou na última década para 650 euros, 100 euros mais caro do que um ano atrás, revela um estudo do Instituto Moses Mendelssohn e da plataforma especializada WG-Gesucht.de. Atualmente o governo calcula apenas 360 euros para acomodação em seu programa federal de empréstimos e bolsas estudantis BAföG.

Merlin (dir.), da FU Berlim, ainda procura um apartamento para partilhar. Talina tem só um mês para encontrar nova acomodaçãoFoto: Helen Whittle/DW

Consequentemente, uma parcela cada vez maior dos 200 mil estudantes de Berlim se inscreve por uma vaga numa casa de estudantes, explica Jana Judisch, porta-voz da Associação Estudantil, a qual administra 9 mil vagas e conta 4.900 candidatos em sua lista, com um prazo de espera de três semestres. "Muitos estão se mudando para a periferia da cidade, e até mais longe, no estado de Brandemburgo, e se conformando com o trajeto longo", diz Judisch.

Enrolando um cigarro no sol de outono, Carla, estudante de idiomas de 30 anos, é uma das mais afortunadas. Ela encontrou um apartamento partilhado alguns anos atrás, quando os aluguéis eram muito mais baixos. Mas as coisas mudaram: "A gente teve estudantes que sublocaram quartos no nosso apartamento, e então tiveram que dormir no sofá por não encontrar nenhum outro lugar onde ir morar."

"Dinheiro não pode decidir onde se vai estudar"

Em seu escritório no campus da FU, Thomas Schmidt, encarregado de assuntos sociais do Comitê Geral Estudantil (AStA), confirma que encontrar acomodação é um dos problemas mais frequentes com que os estudantes procuram sua instituição. "Alguns conseguem alugar algo tendo os pais como fiadores. Mas para os estrangeiros é difícil, porque em geral eles não têm como apresentar esse tipo de garantia."

Schmidt gostaria que houvesse mais financiamento por parte da prefeitura de Berlim, principalmente para construção de moradias estudantis, paralelamente à implementação de medidas políticas ambiciosas, como a reintrodução, para todos os berlinenses, do teto máximo para o aumento de aluguéis.

O número de estudantes universitários cresceu cerca de 1 milhão nos últimos 12-15 anos, chegando a 2,9 milhões, mas faltou investimento na infraestrutura social que tais cifras exigem, aponta Stefan Grob, vice-secretário-geral da DSW.

"Temos receio de estar rumo a uma sociedade de duas classes, em que os mais ricos podem se permitir estudar onde queiram e pagar a acomodação, e os outros não podem. Isso seria desastroso, pois aí o dinheiro decidiria onde se pode estudar, e quão brilhante ou inteligente alguém é."

Um problema de toda a sociedade alemã

Embora desejasse um incremento do subsídio à moradia como parte do programa federal de crédito educacional, a DSW também reconhece que apenas de 10% a 11% dos estudantes se qualificam para o BAföG.

A fim de aliviar a situação, o governo de coalizão em Berlim anunciou um subsídio federal de 500 milhões de euros em 2023, como parte do esquema Junges Wohnen, que visa proporcionar acomodação acessível para estudantes, aprendizes e trainees da polícia. Segundo o Ministério alemão de Moradia, Desenvolvimento Urbano e Construção, o plano é esse subsídio se repetir em 2024 e 2025.

Grob, da DSW, saúda a iniciativa, mas ressalva que ela não ajudará os milhares de universitários atualmente à procura de um teto e uma cama para o semestre de inverno: "Os estudantes estão competindo por acomodação com outros grupos como idosos, jovens famílias, cidadãos de baixa renda, refugiados, e assim por diante. Então não estamos só falando de um problema do sistema de educação superior, mas de um problema social."

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