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Crise econômica na Venezuela contagia Cuba

Andreas Knobloch, de Havana (av)13 de julho de 2016

Após otimismo gerado pela reaproximação com EUA, colapso venezuelano pesa sobre cubanos. Com cortes de gastos públicos e energia pela frente, teme-se reviver dificuldades dos anos 90, quando caiu o socialismo europeu.

Avenida Malecon em Havana, Cuba
Avenida Malecon em HavanaFoto: Fotolia/kmiragaya

Ramón é um entre as centenas de motoristas de Havana, que, com admirável talento improvisador, trafegam pelas ruas da capital cubana em carros históricos recauchutados transformados em táxis coletivos. Agora ele tem que explicar a seus fregueses que a tarifa aumentou, devido à alta da gasolina.

Enquanto isso, repartições e empresas estatais decidiram encurtar a jornada de trabalho e limitar o uso dos aparelhos de ar condicionado, a fim de poupar energia. Tudo indica que o verão vai ser duro no país caribenho.

Em seu discurso à Assembleia Nacional, na semana passada, o presidente Raúl Castro preparou a população para tempos difíceis na economia, e novas restrições. Os cortes de gastos públicos e energia, afirmou, se devem à queda dos preços dos clássicos produtos de exportação cubanos, como níquel, petróleo refinado ou açúcar, ao mesmo tempo em que está sendo importado menos petróleo da Venezuela.

Dependência do petróleo

No primeiro semestre de 2016, a economia cubana cresceu 1%, apenas a metade do previsto. No mesmo período do ano anterior, o crescimento foi de 4,7%.

Embora a escolha do momento para o anúncio de Castro possa surpreender, ele já havia alertado em dezembro passado para possíveis dificuldades. A reaproximação com o ex-inimigo Estados Unidos gerou decerto muito otimismo, mas a Venezuela – aliado mais próximo e principal parceiro comercial de Cuba – está seriamente abalada pela queda continuada dos preços do petróleo no mercado mundial. E sua crise econômica agora contagia Cuba.

A própria república caribenha produz quase 25 milhões de barris de petróleo por ano, o equivalente a 40% de sua demanda de energia. O restante, ela compra dos venezuelanos a condições especiais. Em contrapartida, cerca de 25 mil médicos e profissionais da saúde cubanos trabalham na Venezuela.

Lealdade a Caracas

Analistas calculam que nos últimos tempos o Estado sul-americano só vinha fornecendo 53.500 barris de petróleo por dia para os cubanos, 40% a menos do que no primeiro semestre de 2015.

Computados os produtos de petróleo refinado, a redução ainda fica em 20%, segundo a agência de notícias Reuters. No passado Cuba utilizava uma parte do combustível venezuelano e revendia o resto. Esses ganhos adicionais, portanto, também teriam agora encolhido.

Por isso, o país teria que cortar gastos desnecessários, substituir importados por artigos de produção nacional, investir em setores que rendam divisas e empregar a própria energia de forma mais eficaz, instou Castro em seu discurso. No entanto, a cooperação com Caracas não deve ser restringida.

"É nos momentos difíceis que se reconhecem os verdadeiros amigos, e nós, cubanos, não esqueceremos jamais o apoio da Venezuela quando estivemos em dificuldades", prometeu o presidente cubano.

Independentemente disso, há anos a ilha caribenha tenta conter seu consumo através de programas de racionamento de energia, para diminuir a dependência dos combustíveis fósseis. Havana declarou a independência energética como prioridade nacional: até 2030, pretende ter elevado dos atuais 4% para 24% a participação das fontes renováveis em sua matriz energética.

Sinal de crise: venezuelanos atravessam fronteira para comprar remédios e alimentos na ColômbiaFoto: picture-alliance/dpa/S.Mendoza

Como nos anos 90?

A população já teme um "período de exceção em tempos de paz", como é denominada em Cuba a crise econômica do início dos anos 1990, quando o país esteve à beira do colapso devido à queda dos "Estados irmãos" socialistas no Leste Europeu. Na época, a eletricidade era cortada quase diariamente. Hoje, poucos podem sequer imaginar passar os meses do verão caribenho sem ar condicionado nem ventilador.

Mas, segundo o chefe de Estado cubano, a coisa não deverá chegar a tal ponto. "Já há especulações sobre um colapso iminente da nossa economia, como na época do período de exceção", admitiu Castro. "Nós não negamos que possa haver consequências, até maiores do que no momento. Mas estamos preparados e em melhores condições para lidar com a situação do que naquela época." As conquistas sociais serão defendidas e gradualmente melhoradas, assegurou.

Castro também apelou à compreensão dos credores internacionais. O país cumprirá suas obrigações como devedor: "Não vamos desistir da meta de restabelecer a confiança internacional na economia cubana."

Nos últimos anos, Havana entrou em entendimento com quase todos aqueles que lhe concederam empréstimos, entre os quais o Clube de Paris, um grêmio informal em que credores estatais e devedores se encontram. Desse modo, Cuba se livrou de grande parte de suas dívidas.

Em contrapartida, passados mais de três meses desde o anúncio de Washington de que permitiria a Cuba o emprego de dólares em seus pagamentos internacionais, continua não sendo possível para o país executar transações em moeda americana, criticou Castro.

Cortes energéticos futuros

A semana de sessões parlamentares na Assembleia Nacional – que só se reúne em ritmo semestral, uma vez que os deputados não são políticos de profissão e exercem suas ocupações regulares no período sem sessões – foi marcada por debates sobre a atualização das diretrizes econômicas e sociais para os planos de reforma de 2016 a 2021, aprovada no congresso do Partido Comunista em abril.

O ministro responsável por essa atualização, Marino Murillo, mencionou, entre as restrições planejadas, uma redução total de 6% do consumo de energia. Contudo as residências particulares, que consomem 60% da energia no país, não serão afetadas. Também poupados dessas medidas serão o setor turístico e a produção de níquel e açúcar.

Mas nem todos os cubanos confiam nos anúncios. "Alguns de meus conhecidos e amigos já cancelaram as férias de verão reservadas, e pegaram seu dinheiro de volta. Porque, quem sabe o que realmente vem pela frente?", comenta o taxista Ramón. Ele mesmo é otimista por natureza, ressalva, e parte em seu calhambeque recauchutado, explicando aos passageiros sobre o aumento dos preços.

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