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Cruz Vermelha acerta com Maduro envio de ajuda à Venezuela

30 de março de 2019

Organização diz ter obtido permissão do regime chavista e da oposição liderada por Guaidó para distribuir assistência humanitária no país em crise. Com tamanho similar à missão na Síria, operação terá início em abril.

Operação da Cruz Vermelha visa ajudar 650 mil pessoas na Venezuela num primeiro momento
Operação da Cruz Vermelha visa ajudar 650 mil pessoas na Venezuela num primeiro momentoFoto: Getty Images/C. Sung-Jun

A Cruz Vermelha informou nesta sexta-feira (29/03) que obteve permissão do regime de Nicolás Maduro e da oposição para iniciar uma operação de entrega de ajuda humanitária na Venezuela, em meio a um impasse entre o governo chavista e o líder oposicionista Juan Guaidó sobre como lidar com a escassez de alimentos e medicamentos no país.

"Em um período de aproximadamente 15 dias estaremos prontos para distribuir auxílio. Esperamos ajudar 650 mil pessoas num primeiro momento", disse o presidente da Federação Internacional da Cruz Vermelha (IFRC, na sigla em inglês), Francesco Rocca.

"Em um país dilacerado pela luta entre poderes, o poder da humanidade prevaleceu. Esse é um passo crucial na expansão dos serviços humanitários na Venezuela, com foco específico na saúde, salvando mais vidas e aliviando o sofrimento das pessoas vulneráveis que estão enfrentando uma situação terrível", completou.

Rocca afirmou que a ajuda humanitária incluirá antibióticos, kits cirúrgicos e equipamentos para hospitais em colapso, como geradores elétricos para lidar com os frequentes apagões da Venezuela, que chegaram a deixar mortos em hospitais. Cortes de energia voltaram a deixar parte de Caracas e uma dezena de estados às escuras nesta sexta-feira.

Em relação à quantidade de ajuda a ser distribuída, Rocca afirmou que a operação venezuelana será muito semelhante à realizada atualmente pela Cruz Vermelha na Síria, país no Oriente Médio onde 89% da população vive na pobreza, segundo as Nações Unidas.

Embora a Cruz Vermelha tenha acertado a entrega de ajuda junto ao regime de Maduro e à oposição, a organização deixou claro que atuará de acordo com seus princípios de "imparcialidade, neutralidade e independência", "sem aceitar interferências de outros atores".

Rocca disse ainda que a Venezuela é um país profundamente polarizado e, por isso, é vital que nenhum lado tire proveito às custas da ajuda humanitária.

Mas Guaidó rapidamente reivindicou crédito pelo esforço. No Twitter, afirmou que o anúncio da Cruz Vermelha representa uma vitória para "nossa luta". Ele disse também que os venezuelanos devem ficar atentos para garantir que o auxílio não seja desviado para fins corruptos.

O anúncio marca uma mudança de tom na política de Maduro, que, apesar de se mostrar aberto à cooperação internacional sem "interferência", sempre negou que seu país esteja sofrendo uma crise humanitária.

Em meio à grave crise econômica e humanitária, Venezuela enfrenta uma série de apagõesFoto: picture-alliance/dpa/N. Pisarenko

Embate entre Guaidó e Maduro acerca da assistência

A entrada de alimentos e medicamentos na Venezuela tem sido um dos temas centrais do braço de ferro entre Maduro e Guaidó, que se autoproclamou presidente interino da Venezuela em janeiro e foi reconhecido por mais de 50 países, entre eles Brasil e Estados Unidos.

Em 23 de fevereiro, ele liderou uma tentativa de entrar com ajuda humanitária na Venezuela a partir das fronteiras da Colômbia e do Brasil. A operação, cujos mantimentos haviam sido enviados principalmente pelos Estados Unidos, acabou frustrada.

Maduro encarou a entrega de ajuda como uma tentativa de iniciar uma potencial intervenção militar na Venezuela e ordenou que os militares fechassem as fronteiras e bloqueassem a entrada de caminhões carregados de bens de primeira necessidade.

Vários veículos que já haviam iniciado seu trajeto em direção à Venezuela tiveram de recuar. Foram registrados momentos de grande tensão entre militares venezuelanos e civis nas fronteiras, e confrontos acabaram deixando sete mortos e centenas de feridos.

Rocca, da Cruz Vermelha, afirmou que a organização está disponível para distribuir os mantimentos que permanecem parados desde o episódio na fronteira venezuelana, tanto do lado colombiano como do brasileiro, mas, frisou, sempre conforme as regras da instituição.

"[A tentativa frustrada em fevereiro] foi muito politizada. [...] Se essa ajuda seguir as nossas regras e os nossos protocolos, estamos obviamente disponíveis para distribuí-la", disse o representante.

Mais de 90% dos venezuelanos vivem na pobreza

A Venezuela enfrenta uma grave crise política, econômica e social, em meio a uma forte escassez de alimentos e medicamentos.

A ONU alertou nesta quinta-feira que quase um quarto dos habitantes da Venezuela precisa urgentemente de ajuda humanitária. Com uma população de 30 milhões de pessoas, essa porcentagem corresponde a sete milhões de venezuelanos.

Em 2018, 94% da população do país vivia na pobreza, sendo 60% deles em situação de pobreza extrema, segundo as Nações Unidas. O órgão advertiu ainda que os registros de desnutrição e doenças também seguem uma trajetória de crescimento.

Bomba de gás lacrimogêneo foi lançada durante um discurso de Guaidó nesta sexta-feiraFoto: Reuters/I. Alvarado

Neste sábado, a Venezuela deve ser palco de novas manifestações, convocadas tanto pela oposição liderada por Guaidó como pelo regime de Maduro.

Os opositores devem protestar contra os apagões que têm afetado o país desde o início de março, enquanto os atos pró-Maduro falam em uma "operação em defesa da liberdade".

Guaidó está preparando ainda o que chama de "operação liberdade" – uma mobilização até o palácio presidencial de Miraflores, em Caracas, em uma data ainda não definida, com a intenção de assumir o controle do governo venezuelano.

"A operação liberdade é um trabalho de todos", afirmou o líder oposicionista durante um discurso a uma multidão a oeste de Caracas nesta sexta-feira. Uma bomba de gás lacrimogêneo foi lançada pouco antes de sua chegada ao local, mas ainda não se sabe por quem.

EK/afp/ap/efe/lusa/rtr

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