Prefeitura da cidade do oeste da Alemanha quer usar pesquisa científica para conseguir aprovação para legalizar distribuição de cannabis para maiores de 18 anos. Outros municípios alemães querem aderir à medida.
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A prefeitura de Düsseldorf deu nesta quarta-feira (07/12) o próximo passo em seu plano de legalizar a venda regulamentada de maconha a maiores de 18 anos, promovendo uma consulta com especialistas em psicologia, criminologia e economia. A reunião teve presença de representantes de outras prefeituras municipais interessadas em implementar medidas similares, incluindo Colônia e Münster.
O psicólogo infantil Armin Claus, especializado em vício juvenil, se disse preocupado que a legalização possa reduzir a consciência dos jovens sobre os perigos envolvidos com o consumo da cannabis. "Quanto mais pessoas tomam a droga, mais socialmente aceitável ela se torna e menos é vista como um possível perigo", alertou.
O psiquiatra Ulrich Preuss, diretor da clínica psiquiátrica Vitos Herborn, lembrou que quem consome maconha têm maior risco de narcodependência e transtornos de humor. Por sua vez, a deputada verde e ex-comissária de polícia Irene Mihalic argumentou que o maior risco decorre do fato de a substância ser vendida ilegalmente. "A criminalização e desregulamentação são dois lados da mesma moeda. Política de drogas é política de saúde, e deve ser separada da política doméstica e criminal".
A proposta de legalização da maconha em Düsseldorf foi apresentada pela primeira vez há um ano pela coalizão entre social-democratas, liberais e verdes. O bairro berlinense de Friedrichshain-Kreuzberg solicitou uma licença similar ao Instituto Federal para Medicamentos e Dispositivos Médicos, mas o pedido foi recusado, sob a alegação de um conflito direto com a lei de narcóticos.
Düsseldorf espera evitar o mesmo destino, usando um estudo científico para esclarecer os efeitos da cannabis legalizada. Se o estudo mostrar que os participantes não foram afetados negativamente por poderem comprar a droga legalmente, o projeto pode ser lançado para todos os adultos.
Regulação sensata
Segundo a política Angela Hebeler, do Partido Verde, a melhor forma de avançar com a proposta seria os governos regionais trabalharem juntos. "Faria sentido uma cooperação entre todas essas cidades, com uma divisão de tarefas. Talvez devêssemos criar modelos diferentes, de modo a encontrarmos um que obtenha aprovação".
No entanto Hebeler também aponta que a pesquisa proposta sobre os efeitos da legalização da maconha dependeria muito do envolvimento da comunidade científica, sobretudo no tocante ao financiamento. "As estimativas mais modestas circulam entre 800 mil e 1 milhão de euros, o que simplesmente não é praticável para Colônia, Münster ou Düsseldorf".
Georg Wurth, presidente da Associação Alemã da Cannabis, aprova iniciativas como a desenvolvida por Düsseldorf. "A proibição tem realmente muitos efeitos negativos", e não conseguiu reduzir o consumo da droga entre os jovens, alerta.
"Os consumidores são criminalizados, os negociantes do mercado negro, encorajados, a prevenção é dificultada e o custo da persecução criminal é alto, num desperdício de verbas públicas. A regulamentação sensata do mercado existente eliminaria, ou pelo menos reduziria, esses problemas."
Wurth acredita que, com várias cidades alemãs interessadas em introduzir projetos semelhantes "a pressão aumenta" para que o governo federal faça uma mudança. Ele compara a situação à luta para legalizar o tratamento assistido com heroína, há cerca de 15 anos. "Frankfurt propôs inicialmente, por conta própria, um projeto-piloto, que foi rejeitado. Mas aí sete cidades se juntaram e conseguiram aprovar as propostas."
Drogas com passado alemão
Muitos entorpecentes produzidos hoje em laboratórios clandestinos espalhados pelo mundo são criações de cientistas, militares e empresas da Alemanha.
Na Segunda Guerra
Nas campanhas na Polônia, em 1939, e na França, em 1940, Hitler enviou soldados drogados para o front. Na ocupação da França, teriam sido dados às tropas 35 milhões de comprimidos de Pervitin, que tinha o apelido de "chocolate de tanque" ou "pílula de Hermann Göring". A substância ativa, metanfetamina, é um estimulante do sistema nervoso central. Mas também os Aliados dopavam seus soldados.
Foto: picture-alliance/dpa-Bildarchiv
Alerta, destemido e sem fome
A droga foi produzida por um japonês, inicialmente em forma líquida. Químicos da fábrica berlinense Temmler aperfeiçoaram o produto e o patentearam em 1937. Um ano mais tarde o medicamento era lançado no mercado. Ele era usado contra cansaço, sensação de fome e sede e medo. Hoje em dia, o Pervitin é comercializado ilegalmente sob novo nome: Crystal Meth.
High Hitler?
Historiadores divergem se Adolf Hitler era dependente de Pervitin. Nas anotações de seu médico pessoal, Theodor Morell, aparece um "X" com frequência. Nunca foi esclarecido o que ele significa. Sabe-se, no entanto, que Hitler recebia medicamentos fortes, a maioria provavelmente muito aquém das atuais leis de combate às drogas.
Foto: picture alliance/Mary Evans Picture Library
"Milagrosa" heroína
A criatividade dos produtores de drogas na Alemanha já havia começado muito mais cedo. "Fim à tosse graças à heroína", era o slogan da fabricante alemã Bayer no final do século 19 para o seu sucesso de vendas. Em pouco tempo, a heroína passou a ser prescrita contra epilepsia, asma, esquizofrenia e doenças cardíacas, mesmo em crianças. Como efeito colateral, a Bayer apontava prisão de ventre.
Pai da aspirina e da heroína
O químico e farmacêutico Felix Hoffmann é celebrado especialmente como o inventor da aspirina. Sua segunda grande descoberta aconteceu quase por acaso, enquanto experimentava com ácido acético. Ele resolveu combinar este ácido com morfina, obtido do suco da papoula usada para produzir ópio, criando assim a heroína. O produto só se tornaria ilegal na Alemanha em 1971.
Cocaína para oftalmologistas
Já desde 1862, a alemã Merck fabricava cocaína, usada na época pelos oftalmologistas como anestésico local. Ao pesquisar folhas de coca da América do Sul, o químico Albert Niemann havia isolado um alcaloide, que chamou de cocaína. Niemann morreu pouco depois de sua descoberta, vítima de um problema pulmonar.
Foto: Merck Corporate History
Freud e cocaína
Sigmund Freud consumia cocaína para fins científicos. Em seus "Escritos sobre a cocaína", o pai da psicanálise escreveu que ela não traz inconvenientes. Segundo ele, a substância transmite euforia, energia para viver, e motiva a trabalhar. Seu entusiasmo, no entanto, acabou com a morte de um amigo por causa da droga. Naquele tempo, a cocaína era prescrita contra dor de cabeça e dor no estômago.
Foto: Hans Casparius/Hulton Archive/Getty Images
O barato do Ecstasy
Embora o americano Alexander Shulgin seja considerado o inventor da pílula Ecstasy, a receita para sua produção estava em mãos da fabricante alemã Merck. Em 1912, foi dada entrada para a patente de uma substância oleosa sem cor chamada metilenodioximetanfetamina (MDMA ). Na época, os químicos consideraram que ela não teria valor comercial.
Foto: picture-alliance/epa/Barbara Walton
Efeitos de longo prazo
Os efeitos destas descobertas são implacáveis. As Nações Unidas calculam que em 2013 morreram 190 mil pessoas no mundo devido ao consumo de drogas ilegais. Em relação a bebidas alcoólicas, que não são proibidas, os números são mais impressionantes: a Organização Mundial da Saúde estima que em 2012 5,9% de todos os casos de morte no mundo (3,3 milhões) foram uma consequência do consumo de álcool.