Daniel Barenboim lança canal de música e política no YouTube
Suzanne Cords / Augusto Valente17 de agosto de 2016
Renomado maestro e pianista israelo-argentino quer aproximar música clássica do grande público, em vídeos semanais de cinco minutos sobre obras importantes. Mas promete também abordar temas políticos da atualidade.
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O renomado regente e pianista Daniel Barenboim inaugurou seu canal pessoal na plataforma de vídeo YouTube. "Vou falar sobre peças musicais que são importantes para mim e que, espero, vão lhes interessar", ele saúda os usuários. No entanto, prossegue, também abordará temas sociais e políticos que talvez preocupem os seus seguidores: "Então, por favor, fiquem ligados."
Como ocorre no Digital Concert Hall da Filarmônica de Berlim (como serviço pago), o artista multinacional quer não só disponibilizar peças musicais para audição, mas também aproximá-las do público através de breves descrições. O maestro titular da Staatskapelle Berlin e diretor musical da Staatsoper de Berlim se decidiu pelo YouTube devido ao alcance ilimitado da plataforma, onde pretende postar vídeos uma vez por semana.
Brahms em cinco minutos
Na primeira edição do canal, que foi ao ar na sexta-feira passada (12/08), no vídeo em inglês com legendas em alemão intitulado 5 Minutes On..., o músico nascido na Argentina e de nacionalidade israelense, palestina e espanhola apresentou o Concerto para piano e orquestra nº 1 de Johannes Brahms.
Ao piano do saguão superior da Staatsoper (atualmente instalada no Schiller Theater), ele discorre sobre os aspectos relevantes da obra, de forma compreensível para os leigos, ilustrando as explicações com trechos orquestrais e pianísticos.
Com entusiasmo, Barenboim fala do contraste entre o dramático início orquestral e a entrada lírica do instrumento solista. Em seguida aborda a atmosfera quase religiosa do segundo movimento, que é seguido por um veloz rondó "à maneira cigana".
Como pianista, ele próprio gravou a peça pela primeira vez em 1967, revela aos espectadores, e por último em 2015, sob a regência do venezuelano Gustavo Dudamel, um jovem colega de talento extraordinário e que ele preza muito como ser humano, enfatiza.
Bom começo para a iniciativa
Ao fim, o veterano de 73 anos encoraja o público do YouTube a lhe enviar comentários e sugestões para novas lições musicais. A reação não demorou: dentro de 24 horas os pedidos concretos incluíam o Réquiem de Wolfgang Amadeus Mozart, o primeiro concerto para piano de Piotr Tchaikovsky e o quinto de Ludwig van Beethoven.
Um usuário reclamou que cinco minutos não bastavam para música clássica. Outro perguntou: "Por que sempre se diz que a música clássica vale mais do que a pop?" Um terceiro pediu ao maestro argentino que também poste os vídeos em espanhol, para seus fãs na América Latina.
Cinco dias após a estreia, o vídeo sobre Brahms já fora acessado 21 mil vezes, e o de abertura, mais de 29 mil. Ainda longe da audiência de vídeos de gatos ou de outros temas semelhantes, esse já um ótimo começo para a iniciativa.
Muitos se manifestaram ansiosos para escutar os comentários extra-musicais do Barenboim. "O homem domina as manchetes, principalmente em Berlim, onde ele faz mais política do que música", comentou um usuário.
Da música à política
De fato: além de ser um peso-pesado do mundo musical, com uma carreira de mais de meio século e numerosos prêmios e honrarias, Barenboim não se esquiva de se envolver em questões sociais e políticas. Movido por um carinho especial pelos adolescentes e jovens, ele se propôs usar a música para construir uma ponte entre povos tradicionalmente inimigos.
Assim, fundou em 1999, juntamente com o literato americano nascido em Israel Edward W. Said (1935-2003), a West-Eastern Divan Orchestra, formada por contingentes iguais de estudantes israelenses e árabes. Ao que tudo indica, o projeto logrou sua meta: superar as tensões entre os músicos através da aproximação e do trabalho em conjunto.
Por iniciativa do maestro, também fundou-se em Berlim um projeto semelhante: a Barenboim-Said Akademie. A partir do semestre universitário 2016-17, a escola superior de música internacional e anticonvencional formará estudantes da região de crise israelo-árabe.
"Minha academia trilha um novo caminho pela paz no Oriente Médio": essa é a esperança de Daniel Barenboim. Ele já anunciou que tematizará esse seu projeto no canal do YouTube, cuja marca é uma clave de sol e as iniciais DB. A primeira edição, no entanto, deixou a música falar em primeiro plano.
Dez músicas dedicadas a Berlim
De David Bowie a Bloc Party, passando por Ramones e Rufus Wainwright: todos eles se encataram pela capital alemã. E todos declararam seu amor pela cidade fazendo o que sabem fazer melhor.
Foto: picture-alliance/dpa
Marlene Dietrich: "Ich hab noch einen Koffer in Berlin"
A relação entre Marlene Dietrich e sua cidade natal era conturbada. A ascensão do nazismo levou a estrela a um exílio eterno – mas seu anseio conflituoso por Berlim nunca cessou. E acabou capturado, de forma comovente, em "Ich hab noch einen Koffer in Berlin" (Eu ainda tenho uma mala em Berlim). Ela só voltou à terra natal em 1992, para ser enterrada ao lado da mãe.
Foto: picture-alliance/dpa
Iggy Pop: "The Passenger"
"The Passenger" fala sobre como é ver o mundo passando da janela de um metrô de Berlim e se tornou um hino da contracultura. Gravado no legendário Hansa Studios, próximo ao Muro, enquanto Iggy Pop estava no exílio autoimposto na cidade dividida, a música do álbum "Lust for Life" (1977) impulsionou o ex-vocalista dos Stooges ao sucesso comercial.
Foto: picture-alliance/dpa
David Bowie: "Where are we now"
Na sequência de especulações sobre sua saúde, Bowie levou frenezi ao mundo da música com o single "Where are we now?" Ele gravou a maior parte da "Berlin Trilogy" na cidade, nos anos 1970 – incluindo a obra-prima "Heroes". Mas "Where are we now?" revisita a cidade como um senhor idoso. Um passeio nostálgico pela Berlin que ele chamou de casa: "A man lost in time near KaDeWe".
Foto: imago/LFI
Lou Reed: "Berlin"
Diferentemente de Bowie e Iggy Pop, Lou Reed nunca morou em Berlim. Mas isso não o impediu de inspirar-se na cidade para seu álbum no estilo Kurt Weill chamado "Berlin", de 1973. A letra da faixaque leva o mesmo nome do disco evocou perfeitamente o espírito da época de uma geração: "In Berlin, by the Wall / You were five feet, ten inches tall / It was very nice / candlelight and Dubonnet on ice".
Foto: Getty Images/Afp/Stringer
Leonard Cohen: "First we take Manhattan"
Como judeu, Cohen sempre teve problemas com Berlim. Mas, como compositor, ele se sentiu atraído pela história explosiva da cidade no século 20. Em seu clássico cult "First we take Manhattan", de 1987, o canadense faz referências diretas à cidade e canta: "First we take Manhattan…then we take Berlin". A poderosa crítica à hegemonia global estimulou inúmeras versões cover.
Foto: F. Coffrini/AFP/Getty Images
U2: "Zoo station"
Em 1991, o U2 procurava um recomeço após "Rattle and Hum", que dividiu a crítica. E Bono procurou uma nova inspiração em Berlim. Ao fugir para o Hansa Studios, compôs uma música que definiria uma nova e ousada época: "Zoo station". Batizada em homenagem à estação de trem, a banda usou a metáfora para uma Berlim reunida e a nova ordem mundial, intitulando o álbum de "Zooropa".
Foto: picture-alliance/AP Photo/J. Hayward/The Canadian Press
Bloc Party: "Kreuzberg"
No início deste século, Berlim tornou-se santuário para os que buscavam se achar, atraídos por este lugar entre o velho e o novo século. Os integrantes da banda britânica de rock alternativo Bloc Party estava entre eles e tentavam dar um novo sentido às suas vidas. O single "Kreuzberg", de 2007, alfinetou: "There is a wall that runs right through me / Just like this city, I will never be joined".
Foto: picture-alliance/Jazzarchiv
Rufus Wainwright: "Tiergarten"
Enquanto a maioria é atraída a Berlim por causa da história mais recente da cidade, Rufus Wainwright foi buscar inspiração no cabaré e na decadência dos anos 1920, na República de Weimar. "Tiergarten" provou ser uma de suas baladas mais duradoras. Muitos perderam o fôlego com o refrão: "Won't you walk me through the Tiergarten / Doesn't matter if it's raining / Won't you walk me through it all".
Foto: picture-alliance/AP Photo
Black Rebel Motorcycle Club: "Berlin"
O que você faz quando está em uma das bandas mais descoladas do mundo? Você escreve, claro, uma música para uma das cidades mais descoladas do planeta. Segunda faixa do álbum "Baby 81", de 2007, "Berlin" não faz nenhuma referência particular à capital alemã, ainda que o som da progressão de acordes da guitarra seja inconfundível como Berlim: petulante, provocativa e sexy.
Foto: picture-alliance/Geisler-Fotopress
The Ramones: "Born to die in Berlin"
Desde o primeiro "hey ho, let's go", a banda Ramones não escondeu sua fascinação por todas as coisas teutônicas – e, de forma provocativa, deu o nome "Blitzkrieg Bop" ao seu single de estreia, de 1976. Dee Dee Ramone, principal compositor da banda, é filho de uma alemã e cresceu em Berlim. E seu amor pela capital (e as drogas) ficariam para sempre na história com "Born to die in Berlin", de 1995.