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"Berlim precisa de mais ambições arquitetônicas"

Werner Herzog (sv)16 de dezembro de 2015

O renomado arquiteto americano tem uma relação especial com a capital alemã. Ele considera a cidade sua casa e projetou um de seus maiores símbolos: o Museu Judaico. Em entrevista, Libeskind fala sobre seus trabalhos.

Daniel Libeskind
Daniel LibeskindFoto: picture-alliance/dpa/S. Kahnert

O Museu Judaico de Berlim foi construído em 1999, a partir de um projeto de Daniel Libeskind. O arquiteto americano recebeu vários prêmios pelo feito, tendo sido o museu seu primeiro projeto de alcance internacional. Desde sua inauguração, em 2001, mais de 10 milhões de visitantes já andaram pelos corredores labirínticos da edificação criada por Libeskind no bairro berlinense Kreuzberg.

DW: A maioria das construções que você projetou possuem esse tipo de estrutura que remete ao cristal. O que há por trás de seu amor pelos cristais?

Daniel Libeskind: Não sei de onde vem o cristal, mas sei que Frank Lloyd Wright, que foi um mestre, disse certa vez que se um prédio não é um cristal, ele não é um prédio. O cristal é algo que corta, que é forte, robusto, resiliente, que não vai se deformar. É uma forma muito precisa, que brilha ao sol e à luz do céu. Ou seja, é um símbolo e não apenas uma forma. É a ideia da beleza, mas também do fogo, do calor, da intimidade e do interior da vida. Acho que isso vale também para as edificações. Elas têm um exterior forte, mas precisam funcionar intimamente no ambiente doméstico.

Qual é a importância da luz no seu trabalho?

Daniel Libeskind e seu projeto SapphireFoto: picture-alliance/Eventpress

A luz é a chave, quer dizer, não importa o que seja a edificação em questão, a luz é mais que algo físico. É a luz da orientação, da imaginação, da criatividade. Acho que ela é o cerne de qualquer edificação e também de qualquer cidade.

Sapphire – nome do seu novo projeto residencial em Berlim – remete à ideia de habitações de luxo. Qual é a ideia por trás de Sapphire?

O Sapphire não é pensado em termos econômicos, de forma alguma. A safira é uma bela pedra, um material forte, com luminosidade. De maneira que não é uma coincidência que cristais desse tipo tenham sido sempre usados para propagar a ideia de que há algo para além do concreto, algo além do lado material da vida. Há algo que brilha, que chama a atenção por si só e que também dá luz à cidade.

Foi um desafio contruir esse prédio residencial bem em frente à sede do Departamento Nacional de Informações (BND), o serviço de inteligência alemão?

Não tenho nada a dizer sobre o enorme prédio do serviço de inteligência, porque o prédio não é meu. É simplesmente uma edificação enorme! Mas mesmo um prédio pequeno, como aquele da esquina da Chaussestrasse, responde à sua função de abrigar apartamentos, de ser um lugar onde as pessoas possam viver. É íntimo e artesanal, não é massivo nem estático, mas pensado para o indivíduo. Acho que há um contraste real na rua: uma instituição enorme para milhares de pessoas versus um prédio onde os moradores podem viver suas vidas.

Você tem uma relação especial com a cidade. Você se lembra da primeira vez que visitou Berlim?

Com certeza. Cheguei bem antes de o Muro cair, quando Berlim ainda era uma cidade dividida. Mas já naquela época Berlim era um marco do século 20, mesmo tendo passado pelas catástrofes e pelos vazios deixados pelos terrores daquela época. Podemos ver Berlim como uma cidade que inventa, um cidade bela, a cidade da cultura, da arte e de novas ideias. Eu me apaixonei por Berlim desde o começo.

Como você, como judeu, pode admirar essa cidade, que carrega uma história tão difícil?

Quando vim para Berlim pela primeira vez e resolvemos morar aqui, com nossos três filhos, inclusive uma filha pequena, não foi uma decisão fácil para nós. Muitos membros de nossa geração e de nossas famílias pensaram: "Que coisa terrível. Eles estão loucos de morar na Alemanha e justamente em Berlim". Mas achei ótimo termos feito isso, porque, no decorrer de muitos anos, vi emergir uma nova geração de berlinenses e uma nova Alemanha. Acho que essa dinâmica de transformação é de fato muito impressionante. Não se deve olhar somente para trás, mas também para frente. Você pode ver que ótima é essa nova geração e que posição progressita a Alemanha ocupa agora no mundo.

Seu primeiro projeto em Berlim foi o Museu Judaico, inaugurado em 2001. A cara da cidade mudou muito nos últimos anos. Como você vê a arquitetura berlinense hoje?

Berlim é uma cidade bonita, com muitas reconstruções. No que diz respeito à arquitetura e suas tendências, não sou muito fã de simplesmente decidir a altura de um prédio ou um certo estilo para uma janela retangular. Deveria haver mais ambição em Berlim. O Sapphire mostra como você pode criar algo alinhado ao século 21, mesmo se atendo às restrições regulares e aos mesmos parâmetros dos outros prédios. Não partindo de uma fórmula convencional, mas de algo que leve à concepção de um prédio artístico.

Museu Judaico de BerlimFoto: picture-alliance/Eibner-Pressefoto

Qual é sua opinião sobre a reconstrução do histórico Castelo da Cidade (Staddtschloss) de Berlim?

O castelo é um exercício de fantasia. Não é a minha fantasia, mas algumas pessoas acreditam que você possa refazer a história com um estalar de dedos. Você não pode erigir uma fachada e fingir que está trazendo de volta a herança do passado. Isso não é possível. Sempre digo que esse projeto será muito impressionante, mas como uma grande asneira. Um ornamento no centro da cidade e talvez um sucesso justamente por isso.

Seu mais novo projeto é o da Ópera Antiga (Alte Oper), em Frankfurt. Você certa vez disse que a arquitetura deriva da música. Nesse caso, é o contrário?

Meu projeto em Frankfurt leva o nome de "One Day in a Life" ("um dia em uma vida", em tradução livre). Mas um dia são todos os dias. O que acontece em um dia de vida, acontece em todos os dias. Os lugares que frequentamos, as pessoas que encontramos, as coisas que fazemos: temos que ir para o trabalho, participar de reuniões, ter sonhos. A música é símbolo da vida e também da arquitetura, porque carrega uma estrutura. A música, embora não seja visível, tem muita semelhança com a arquitetura estrutural. Ela nos dá acessos a mundos, dos quais às vezes nem temos conhecimento. Então meu projeto em Frankfurt é o de colocar a música em lugares onde ela nunca esteve: em um hospital, em um estádio, dentro de um bonde em movimento. Ou tocá-la no metrô, em lugares secretos nos subterrâneos da cidade, onde as pessoas não saibam que há bunkers escondidos. A ideia é combinar música clássica com contemporânea, a fim de mostrar que as pessoas precisam ouvir realmente o que a música tem a dizer a elas.

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