Apaixonada pelo estudo das plantas, Graziela Maciel Barroso só terminou a faculdade aos 50 anos. No Dia Internacional das Mulheres na Ciência, conheça a história da mais importante botânica brasileira.
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Nascida em Corumbá, no Mato Grosso do Sul, em 1912, Graziela Maciel Barroso foi educada para ser dona de casa. Aos 16 anos, ela cumpriu o seu destino como mulher: casou-se com o agrônomo Liberato Joaquim Barroso, com quem teve dois filhos. Aos 18, já era mãe. Não chegou a se formar no ensino médio.
Aos 30 anos, com os filhos já adolescentes, voltou a estudar com o apoio do marido, com quem tinha aulas de botânica em casa. Nesse período, conseguiu um estágio no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, onde Liberato trabalhava. Gostou tanto que resolveu prestar concurso público para ser naturalista da instituição. Ela foi a primeira mulher a fazer a prova.
"Nessa época não se exigia título universitário nem havia uma faculdade: os cursos eram feitos nas faculdades de filosofia, e o concurso [para o Jardim Botânico] não exigia nenhuma especialidade", contou a botânica numa entrevista concedida em 1999. "Nenhuma mulher tinha feito esse concurso, de modo que houve uma certa prevenção por parte dos candidatos homens, que eram cinco, sendo eu a única mulher. Eram cinco vagas. Eles achavam que era uma barbaridade uma mulher fazer esse concurso."
Graziela foi aprovada em segundo lugar e foi trabalhar com o marido no Jardim Botânico. Três anos depois, Liberato morreu, deixando-a viúva aos 37 anos.
Mesmo sem diploma universitário, Graziela deu prosseguimento aos estudos do marido no Jardim Botânico e orientou estagiários e até doutorandos que passavam pela instituição. Decidiu cursar faculdade somente aos 47 anos, ingressando em biologia na Universidade do Estado da Guanabara, atual Universidade do Estado do Rio de Janeiro. No segundo ano do curso, perdeu um filho.
"Meu filho era piloto, morreu em 1960", lembra. "Todo mundo pensou que eu fosse abandonar a universidade. Fiquei arrasada. Mas não só não deixei de trabalhar, como cinco dias depois estava no Jardim Botânico e na universidade. Procurei no trabalho toda a força que precisava ter."
Na academia, Graziela se dedicou a descobrir e descrever diversos tipos de vegetais. Aos 60 anos se tornou doutora em botânica pela Unicamp, com tese sobre espécies de vegetais brasileiras, sendo a maior catalogadora de plantas do Brasil.
Em 1999 se tornou a única brasileira a receber a medalha Millenium Botany Award, prêmio internacional concedido a botânicos dedicados à formação de profissionais.
Já aposentada, a botânica atuou como consultora do Jardim Botânico carioca até quase os 90 anos. Em 1989, o prédio da botânica sistemática da instituição recebeu seu nome, como homenagem.
Graziela morreu em 2003, no Rio de Janeiro, um mês antes de ser empossada na Academia Brasileira de Ciências.
Conhecida como "primeira grande dama" da botânica brasileira, Graziela foi responsável pela catalogação de vegetais nas cinco regiões do país. Cerca de 25 plantas já foram batizadas com seu nome, como a Dorstenia grazielae, popularmente chamada de caiapiá-da-graziela, e a Diatenopteryx grazielae, conhecida como maria-preta.
Graziela também foi responsável pela formação das atuais gerações de biólogos em atividade, tendo sido professora na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e na Unicamp. Em 1966 se tornou a primeira professora de botânica da UnB.
"Sempre me dediquei muito ao meu trabalho, sempre gostei muito do que faço, e a coisa mais importante é que formei todos esses botânicos novos. E eles se destacaram de tal maneira que hoje são pesquisadores internacionais, melhores do que eu", disse Graziela em 1999.
Em 2000, recebeu da prefeitura do Rio de Janeiro o diploma Orgulho Carioca. Em 2001, foi laureada com a Ordem Nacional do Mérito Científico.
Desde 2014, a Secretaria do Meio Ambiente do Mato Grosso do Sul concede o Prêmio Marco Verde Doutora Graziela Maciel Barroso a pessoas que se dedicam à proteção e recuperação do meio ambiente.
Situado em Minas Gerais, o Inhotim é hoje um centro de arte contemporânea e jardim botânico, reconhecido pela Rede Brasileira de Jardins Botânicos, tendo mais de 4 mil espécies da flora brasileira e internacional.
Foto: DW/C. Albuquerque
Inhotim em Brumadinho
Quase toda manhã, uma bruma invade as terras que antes pertenciam a um senhor inglês chamado Timothy, nas montanhas de Minas Gerais. As brumas deram nome a Brumadinho, cidade localizada a 60 quilômetros de Belo Horizonte. E o senhor Timothy, chamado Inhô Tim por seus empregados, deu nome ao bairro da cidade que hoje abriga o Centro de Arte Contemporânea e Jardim Botânico, o Instituto Inhotim.
Foto: Aziz Ary Ziebell
Jardim Botânico
O Inhotim foi idealizado pelo empresário industrial mineiro Bernardo Paz, que em meados da década de 1980 veio morar numa fazenda que ali existia. O parque foi aberto definitivamente ao público em 2006. Hoje, mais de 1,2 milhão de pessoas já visitaram o Inhotim. Embora seja mais associado ao seu acervo de arte, ele presta, como Jardim Botânico, grande contribuição para a preservação da natureza.
Foto: DW/C. Albuquerque
Grevílea-anã
O Inhotim se localiza num ecótone, ou seja, numa transição entre dois biomas, a quente e úmida Mata Atlântica e o cerrado, mais seco. Além disso, ele é entrecortado pela vegetação de altitude da Serra do Espinhaço. Assim, há condições relativamente favoráveis para a maioria das espécies de plantas, como esta grevílea-anã. De origem australiana, seu néctar é muito apreciado pelos beija-flores.
Foto: Aziz Ary Ziebell
Coração-magoado
Segundo Pedro Nehring, paisagista do instituto, Burle Marx visitou o Inhotim no final da década de 1980 e sempre foi uma grande inspiração. Em vez do tradicional jardim florido, texturas e palmeiras marcam os caminhos e ajudam a amenizar a rigidez dos espaços construídos, gerando um belo com espontaneidade, como as manchas vermelhas deste cróton, conhecido como coração-magoado.
Foto: DW/C. Albuquerque
Mulungu
O conceito paisagístico teve início já em meados dos anos 1980 na fazenda de Bernardo Paz. Ali, Pedro Nehring aproveitou o entorno das matas do meio ambiente local para fazer um jardim com plantas da flora brasileira. Um exemplo disso está na presença destes mulungus, que na foto aparecem em frente à obra "Desert Park", um projeto site-specific da artista francesa Dominique Gonzalez-Foerster.
Foto: Aziz Ary Ziebell
Orquídeas
As plantas de origem tropical, como esta orquídea chuva-de-ouro, crescem num ambiente sem estações do ano marcantes. Com mais tons de verde e maior variedade de formas e tamanhos, é possível trabalhar o conceito pictórico que as diferentes texturas desses ambientes propiciam. Sem esquecer que, nos trópicos, as plantas florescem e frutificam o ano todo.
Foto: Aziz Ary Ziebell
Orquídea-bambu
De origem asiática, a orquídea-bambu se adaptou muito bem à serra mineira. Segundo o paisagista Pedro Nehring, no início do Inhotim, tudo foi feito de forma intuitiva, sem planejamento. O paisagismo nasceu do grande jardim na fazenda de Bernardo Paz e foi inserindo, então, as obras de arte contemporânea. Com a abertura do parque, teve início o planejamento dos acessos.
Foto: DW/C. Albuquerque
Orquídea Cattleya
A Cattleya é um dos gêneros de orquídeas mais populares no Brasil. Ela precisa de temperaturas amenas e luz indireta para crescer. Assim, além de bromélias, orquídeas também são cultivadas nas estufas do Inhotim. Mas, de acordo com o Inhotim, se alguém perguntar ao iniciador Bernardo Paz se ele é um colecionador, ele irá dizer: "não, do que eu gosto é do belo."
Foto: Aziz Ary Ziebell
Estrelítzia ou ave-do-paraíso
Assim, segundo Pedro Nehring, o paisagismo segue a linha do belo, da exuberância, com plantas da flora brasileira e também plantas exóticas do mundo inteiro. Como estas estrelítzias. De origem africana, seu nome é uma homenagem à princesa alemã Sophie Charlotte von Mecklenburg-Strelitz, que se tornou rainha da Grã-Bretanha e Irlanda após o casamento com rei George 3°.
Foto: DW/C. Albuquerque
Heliconia augusta
Também chamada de falsa ave-do-paraíso, em regiões mais quentes, esta Heliconia augusta produz flores o ano inteiro. As helicônias se encaixam bem na disposição paisagística do acervo do Inhotim, que segue, segundo os botânicos do parque, a concepção dos chamados jardins compostos por espécies de origem tropical, onde há peculiaridades distintas de climas temperados.
Foto: DW/C. Albuquerque
Maria-sem-vergonha
De origem africana, esta florzinha chamada maria-sem-vergonha ou beijo-turco se adaptou muito bem no Brasil. Seu crescimento rápido lhe garantiu o nome científico de Impatiens walleriana. Ela gosta de umidade e prefere o calor, apresentando flores nas mais diversas cores. A maria-sem-vergonha é uma das mais de 4 mil espécies de plantas encontradas no Inhotim.
Foto: DW/C. Albuquerque
Bastão-do-imperador
De origem indonésia, o bastão-do-imperador também é muito apreciado pelos beija-flores. Na Tailândia, ele é servido até em saladas. No Inhotim, tudo é belo. Um conceito que se aplica até nos lagos artificiais. Ali é usado um produto natural que, além do controle de oxigenação, permite uma coloração ora mais verde ora mais azulada às águas cristalinas com peixes e tartarugas.
Foto: DW/C. Albuquerque
Alocasia gigantea
Com mais de 700 espécies desta planta, o Inhotim possui uma das maiores coleções de palmeiras do mundo. Ali se descobre que a palmeira vai para muito além dos coquerios ou daquelas de formato imperial. No acervo do Inhotim também se destaca outra família de plantas: as aráceas. São quase 400 espécies, entre elas, esta Alocasia gigantea, de origem asiática.
Foto: DW/C. Albuquerque
Antúrio
O antúrio pertence à família das aráceas, como copo-de-leite, O iniciador do Jardim Botânico era um colecionador de aráceas. Hoje, boa parte de sua coleção se encontra no Inhotim, que faz parte da Rede Brasileira de Jardins Botânicos, com o compromisso de preservação e troca de plantas com outros jardins. Uma estufa equatorial abriga a maioria das aráceas.
Foto: Aziz Ary Ziebell
Philodendron maximum
Entre as aráceas cultivadas na estufa equatorial do Inhotim está o Philodendron maximum. Trata-se de uma das maiores espécies de aráceas. No futuro, o Inhotim pretende trazer um pedaço da Amazônia e de outros oito biomas a Minas Gerais, por meio de um projeto de estufas que ocuparão 20 hectares de área no Jardim Botânico do Inhotim.