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De Villa-Lobos a Gismonti

Augusto Valente13 de junho de 2003

A música latino-americana fascinou o público alemão num concerto realizado na Filarmônica de Colônia. O já legendário duo de violonistas Assad representou o Brasil em meio a um sexteto internacional de astros.

O violoncelista Yo Yo Ma: guia numa viagem musical ao BrasilFoto: AP

Em si, o renome e a maestria absoluta dos músicos envolvidos já bastaria para tornar memorável a apresentação na Filarmônica de Colônia. Afinal, ela combinou os irmãos Sérgio e Odair Assad com o violoncelista Yo Yo Ma e o incrível clarinetista Paquito D’Rivera. Mas, se esse fato não bastasse, poucas vezes um local dedicado à música erudita abrigou tanta simpatia, admiração mútua e carinho entre os executantes.

A própria disposição cênica já evocava a atmosfera de uma conversa entre amigos: em dois sofás, à margem do palco circular, os músicos do sexteto – completado pela excelente pianista inglesa Kathryn Stott e pela percussão eficiente do suíço Mark Suter – esperavam sua vez, tornando supérfluo o ritualístico entra-e-sai dos concertos tradicionais.

Ou melhor, eles participavam à distância de cada música, acompanhando o ritmo com o corpo e, no fim, expressando sua aprovação de forma verbal e física. Aliás, a freqüência dos abraços entre os intérpretes de nacionalidades e gerações tão diversas, nos intervalos entre as peças, representou possivelmente um outro recorde da noite!

Uma generosa parcela de toda essa atenção e calor humano ficou reservada à música, é claro. Abrindo o programa dedicado ao universo latino-americano, uma peça jazzística de César Camargo Mariano, para violoncelo e piano. Seguiram-se obras de Heitor Villa-Lobos e Camargo Guarnieri, representativas do nacionalismo musical brasileiro, em arranjos especiais. Aqui, destaque para o refinamento sonoro de A Lenda do Caboclo, de Villa-Lobos, na versão de Sérgio Assad para dois violões e violoncelo.

Essa faceta melancólica e quase impressionista da música brasileira foi aparentemente uma revelação inesperada para o público numeroso, que reservou as primeiras grandes demonstrações de efusividade da noite para os tangos de Astor Piazzolla.

Um toque de humor latino

Qualquer resquício de compostura clássica que ainda pairasse no ar dispersou-se de vez com a chegada de Paquito D’Rivera, para a segunda metade do concerto. O bem humorado virtuose cubano já adentrou palco com uma gargalhada e utilizando seu instrumento como luneta.

Ao ser apresentado pelo não menos consagrado Yo Yo Ma como "legendário", concluiu: "Estou precisando procurar um cirurgião plástico!". Mais tarde, introduzindo uma obra de sua autoria, avisou: "Nós nunca tocamos esta peça juntos. Abram bem os ouvidos, pois pode ser que jamais voltemos a tocá-la!"

Uma minissuíte com choros de Pixinguinha e Jacob do Bandolim teve efeito irresistível sobre o público. Que também não poupou aplausos para a alta emotividade de Egberto Gismonti e para o frescor de Menino, de Sérgio Assad.

Porém o ápice do entusiasmo ficou mesmo para o final do programa. Em certa altura do vertiginoso Brasileirinho em ritmo de samba, os intérpretes foram assumindo, um a um, a percussão afro-brasileira – tamborim, chocalho, agogô, reco-reco e, por último, apito – para súbito retornar a seus "verdadeiros" instrumentos. E depois de um tal tour de force, o sexteto ainda teve energia e alegria para brindar o público com um triplo bis.

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