Debate
20 de março de 2009O ministro alemão das Finanças, Peer Steinbrück, é conhecido por não medir palavras. Declarações como "professores têm a escola como local de trabalho e por esse motivo não precisam descontar um escritório doméstico do seu imposto de renda" não lhe trouxeram necessariamente amigos dentro da Alemanha.
Agora foi aos suíços que uma declaração do político social-democrata alemão desagradou. No debate sobre paraísos fiscais, por ocasião do encontro de ministros das Finanças do G20, nas proximidades de Londres, na semana passada, Steinbrück comparara os paraísos fiscais com índios que se intimidam perante a cavalaria norte-americana.
O motivo da afirmação do ministro remonta à decisão da Suíça de flexibilizar seu sigilo bancário após a pressão norte-americana e a ameaça internacional de se elaborar uma "lista negra" de paraísos fiscais. Segundo o jornal alemão de economia Handelsblatt, a Suíça estaria numa "lista negra provisória" da Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE).
A cogitada "lista negra", afirmou Steinbrück, seria como "a sétima cavalaria estacionada próximo a Yuma e que poderia entrar em ação. Ela não precisa entrar em ação. Os índios só têm que saber que ela existe", declarou o ministro alemão em alusão clara ao clássico do faroeste Fort Yuma (1955).
Padrões para colaboração sobre questões fiscais
Nas negociações com vista a uma nova ordem do mercado financeiro global, Alemanha e França reiteraram por diversas vezes, nos últimos meses, o desejo de estabelecer uma lista de paraísos fiscais não cooperadores.
Na semana passada, a Suíça, a Áustria, Lichtenstein, Andorra e Luxemburgo anunciaram aceitar os padrões para colaboração sobre questões fiscais estabelecidos pela OCDE.
Mirek Topolanek, chefe de governo tcheco e presidente temporário do Conselho da União Europeia (UE), declarou na quinta-feira (19/03) que, após as decisões da Áustria e de Luxemburgo, nenhum país da UE deveria temer sua inclusão numa lista negra.
Porém, para os suíços, o caso das listras negras não se encerrou. Não somente por o país não fazer parte da União Europeia, mas, sobretudo, devido à declaração do ministro alemão de que bastaria uma ameaça para manter os índios dentro da cerca.
No passado, Steinbrück já irritara os suíços com sua ameaça de "usar o chicote" para combater paraísos fiscais. A nova declaração agravou ainda mais a situação. Além das críticas da imprensa suíça, Steinbrück foi chamado nesta semana de nazista pelo político suíço Thomas Müller.
"Intransigente, indelicado e arrogante".
Segundo o jornal suíço Tages-Anzeiger, Thomas Müller, deputado federal pelo Partido Democrata Cristão (PDC), afirmou no Conselho Nacional suíço, na última quarta-feira, que Steinbrück reeditaria a imagem negativa do alemão e faria lembrar aquela geração de alemães que há seis décadas "andava pelas ruas com casacos de couro, botas e braçadeiras".
Na ocasião, Müller recebeu aplausos da direita e foi criticado pela esquerda. A presidente do Conselho Nacional da Suíça, Chiara Simoneschi-Cortesi, repreendeu Müller por sua declaração e se desculpou pela "comparação ofensiva e fora de lugar".
Nesta sexta-feira (20/03), o deputado Müller reiterou ao jornal alemão Bild sua alusão à Gestapo (polícia secreta nazista). "Na Alemanha, a Gestapo era também somente uma elite. Alguém como Steinbrück me faz lembrar isso. Ele é intransigente, indelicado e arrogante", afirmou Müller ao jornal alemão.
Apoio de Angela Merkel
Steinbrück afirmou considerar toda essa discussão em torno de sua comparação com índios "um absurdo". Pouco antes do início do encontro de cúpula da UE, na quinta-feira em Bruxelas, o ministro declarou que "aqueles que estiveram comigo na coletiva de imprensa em Londres sabem que eu não relacionei esta imagem com a Suíça, mas com o tema da lista planejada pela OCDE". Segundo declarou ao jornal alemão Süddeutsche Zeitung (SZ), ele teria recebido cartas ameaçadoras.
Steinbrück disse ao SZ que essa atitude seria inaceitável e desproporcional, pois, segundo ele, é a Suíça que não respeita as regras internacionais e "convida estrangeiros a violarem as leis de seus próprios países", afirmou.
Na Suíça, as declarações de Steinbrück ofereceram subsídios para um debate com tons populistas, escreveu o jornal Neue Zürcher Zeitung. No entanto, não somente populistas de direita parecem ter se incomodado com a declaração do ministro alemão.
O secretário de Estado de Assuntos Econômicos da Suíça, Jean-Daniel Gerber, reclamou oficialmente de que, com sua comparação, o ministro alemão das Finanças teria ofendido muito o seu país.
Em Berlim, por outro lado, Steinbrück recebeu o apoio da premiê alemã, Angela Merkel. Sem fazer referência direta ao ministro, ela afirmou no Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão), na quinta-feira, que no caso dos paraísos fiscais seria correto "dar nome ao cavalo e ao cavaleiro".
CA/AS/ap/afp/reuters