Delator: Odebrecht pagava parlamentares para aprovar leis
10 de dezembro de 2016
Em delação premiada, Cláudio Melo Filho detalha como atuou no Congresso para obter apoio a projetos de interesse da construtora e diz ter repassado mais de R$ 22 milhões. Entre os mencionados estão Jucá, Renan e Maia.
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Um ex-diretor da construtora Odebrecht afirmou em sua delação premiada que pagou propinas milionárias a senadores e deputados em troca da aprovação de leis que favorecessem a empresa, relatam diversos sites de notícias neste sábado (10/12).
O ex-vice-presidente de Relações Instituições da Odebrecht Cláudio Melo Filho disse que lidava principalmente com o senador Romero Jucá (PMDB-RR), a quem repassou mais de R$ 22 milhões para serem redistribuídos a parlamentares do PMDB. Entre os beneficiados, segundo ele, estão os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL), que é presidente do Senado, e Eunício Oliveira (PMDB-CE), bem como aos deputados Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, e Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), além do próprio Jucá.
Segundo o ex-diretor, Jucá, Renan e Eunício formam o "grupo dominante do PMDB no Senado". "Esse fato dá a esse núcleo grande poder de barganha, pois possui a capacidade de praticamente ditar os rumos que algumas matérias serão conduzidas dentro do Senado", afirmou Melo Filho, segundo a Folha de S. Paulo.
O delator relata pagamentos específicos em troca da aprovação de diversas leis, por exemplo de R$ 7 milhões em troca de uma medida provisória que tratava de incentivos fiscais para a produção de etanol e para a indústria química. Segundo O Globo, Melo Filho relata pagamentos de R$ 2,1 milhões a Eunício, R$ 4 milhões para Jucá e Renan, entre R$ 1 milhão e R$ 1,5 milhão para Vieira Filho e R$ 100 mil para Maia. Nas planilhas da construtora, Renan era chamado de "Justiça", Jucá era "Caju" e Eunício era "Índio", afirmou o delator.
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O delator também afirma que teve reuniões com o presidente do Senado sobre legislações que afetavam a Odebrecht. Numa delas, Melo Filho destaca que Renan lhe pediu "expressamente" apoio para seu filho, que seria candidato ao governo do estado de Alagoas, e que verificasse se a empresa poderia contribuir. "Acredito que o pedido de pagamento para a campanha de seu filho ao governo do estado de Alagoas era uma contrapartida pelo forte apoio dado à renovação dos contratos de energia", afirma Melo Filho, que interpretou que, se não realizasse o pagamento, "poderia prejudicar a empresa de alguma forma".
Dezenas de políticos foram citados por Melo Filho na delação premiada feita em troca de uma redução de pena e que foi vazada para veículos de comunicação já nesta sexta-feira. No documento de 82 páginas, o nome do presidente Michel Temer é citado 43 vezes. A declaração de Melo Filho afirma que o atual presidente pediu ao empresário Marcelo Odebrecht R$ 10 milhões para as campanhas do PMDB em 2014.
Temer repudiou a acusação de Melo Filho. "O presidente Michel Temer repudia com veemência as falsas acusações do senhor Cláudio Melo Filho. As doações feitas pela Construtora Odebrecht ao PMDB foram todas por transferência bancária e declaradas ao TSE [Tribunal Superior Eleitoral]. Não houve caixa dois nem entrega em dinheiro a pedido do presidente", diz nota divulgada pelo Palácio do Planalto. Renan, Jucá, Eunício e Maia também negaram as acusações.
AS/efe/abr/ots
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
Foto: Reuters/S. Moraes
As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
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As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
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Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
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De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
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... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
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As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
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As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
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Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.