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Depoimento de Lula a Moro ganha tom de embate político

10 de maio de 2017

Após histórico de troca de farpas, ex-presidente fica pela primeira vez como réu frente a frente com juiz da Lava Jato. Interrogatório sobre relação com empreiteira pode ser passo final antes de sentença.

Ex-presidente Lula é réu em cinco processos com acusações de corrupção, lavagem de dinheiro e tráfico de influênciaFoto: Reuters/P. Whitaker

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparece nesta quarta-feira (10/05) perante o juiz Sérgio Moro, num depoimento que ganhou contornos de embate político ao colocar frente a frente duas das figuras mais polarizadoras do Brasil atualmente.

O interrogatório ocorre em Curitiba, em meio a forte esquema policial, que tentará impedir que manifestantes pró e contra Lula entrem em confronto. Um perímetro de segurança foi estabelecido em torno da 13ª Vara Federal.

O comparecimento é parte do processo em que Lula é réu na Lava Jato sob a acusação de, quando presidente, receber vantagens indevidas da empreiteira OAS. Ele seria o beneficiário de um apartamento no Guarujá e da reforma de um sítio em Atibaia.

O ex-presidente nega ser o dono dos imóveis e, no fim do ano passado, chegou a afirmar num evento do PT que "não há uma viva alma mais honesta" do que ele. Nesta quarta-feira, Lula terá a primeira chance se explicar pessoalmente perante Moro sobre o caso na condição de réu.

O interrogatório é o passo final antes da sentença de Lula em um processo que já dura oito meses. O ex-presidente ainda tenta, com recursos no Superior Tribunal de Justiça, adiar o depoimento.

Recursos

A defesa do ex-presidente decidiu recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para tentar adiar o depoimento. Os advogados do ex-presidente entraram com três recursos contra a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que negou o pedido de adiamento do processo.

Lula teria recebido vantagens indevidas da OAS em forma de reforma de um triplex no Guarujá e um sítio em AtibaiaFoto: AFP/Getty Images/N. Almeida

Na noite de terça-feira, foram protocolados três novos habeas corpus no STJ. No primeiro, a defesa de Lula pede para que todo o processo seja suspenso, sendo declarada a suspeição de Moro para julgar o caso. Em outras palavras: os advogados de Lula pedem a suspensão até que haja uma definição se Moro deve ou não seguir à frente do processo.

Os outros dois pedidos ao STJ repetem solicitações que já foram negadas por Moro e pelo TRF4. Uma delas é para que seja concedido novo prazo para a apreciação das provas ligadas à Petrobras, anexadas recentemente aos autos. A outra é para que seja permitida uma gravação independente em vídeo da audiência pela defesa.

Reveses

Na véspera do aguardado primeiro encontro entre Lula e Moro, o ex-presidente sofreu reveses judiciais. A pedido do Ministério Público Federal (MPF), o juiz Ricardo Augusto Soares Leite, substituto da 10ª Vara Federal de Brasília, decidiu suspender as atividades do Instituto Lula.

Além disso, foi determinada a coleta de dados e documentos. O magistrado entendeu que o Instituto Lula, apesar de desenvolver projetos de intuito social, pode ter sido usado como instrumento ou local de encontro para o cometimento de crimes diverso, entre os quais, ilícitos fiscais.

A decisão foi tomada no processo em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu, junto com mais seis pessoas, acusado de tentar obstruir as investigações da Operação Lava Jato. Segundo a denúncia, o ex-presidente agiu para comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. O processo teve origem na delação premiada do ex-senador Delcídio do Amaral.

Troca de farpas

Lula ficará pela primeira vez como réu frente a frente com o juiz federal Moro, símbolo da Lava Jato. O ex-presidente é o último a prestar depoimento numa série de interrogatórios já realizados com acusados envolvidos nos processos referentes às reformas no triplex e em Atibaia. O depoimento acontece depois de Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, ter dito a Moro que o triplex pertence de fato a Lula.

Lula chegou a conversar diretamente com Moro em 30 de novembro, quando foi testemunha de defesa do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. A videoconferência foi cordial. Embora nunca tenham estado frente a frente, a relação entre Lula e Moro é marcada por troca de farpas.

Protesto em Brasília em apoio a Sergio Moro: juiz é uma das figuras mais polarizadores do paísFoto: Reuters/A. Machado

Em março de 2016, Lula foi alvo de um mandato de condução coercitiva durante a 24ª fase da Lava Jato. Lula disse ter se sentido um prisioneiro e acusou a ordem de ser "prepotente, um espetáculo de pirotecnia". A queixa-crime contra Moro por abuso de autoridade foi negada pela Justiça.

O caso mais emblemático foi a divulgação de uma conversa telefônica entre a então presidente Dilma Rousseff e Lula, na qual ambos discutiam a posse de Lula como ministro da Casa Civil. A gravação foi publicada duas horas após o anúncio do Palácio do Planalto. Moro chegou a pedir desculpas ao STF. Advogados de Lula chegaram a pedir a prisão do juiz em novembro. Moro respondeu afirmando ser "lamentável que autoridades públicas, no exercício de seu dever legal, fiquem sujeitas a retaliações por parte de investigados".

Em dezembro, Moro teve um bate-boca com advogados de Lula. O advogado Juarez Cirino dos Santos chegou a afirmar que o juiz atua como "acusador principal", e o advogado José Sérgio Gabrielli acusou Moro de fazer "perguntas de um inquisidor, e não as de um juiz". Num outro depoimento, Moro afirmou que os advogados do ex-presidente faziam "propaganda política" do governo petista.

Segurança reforçada

Dezenas de ônibus com militantes e sindicalistas de diferentes partes do Brasil se deslocaram nos últimos dias até Curitiba para acompanhar de perto o depoimento que Lula. Também está prevista a chegada de lideranças do PT, entre eles a ex-presidente Dilma Rousseff.

Centenas de integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) chegaram a montar uma espécie de assentamento improvisado, com barracas, tendas de lona e cozinhas. A prefeitura de Curitiba, no entanto, conseguiu uma liminar na Justiça que veta acampamentos em ruas e praças por conta do depoimento de Lula, indiciado em cinco causas penais. Está também proibida a passagem de pedestres e veículos nas áreas próximas ao prédio da Justiça Federal. 

Na entrada da noite de terça-feira simpatizantes do ex-presidente caminharam até a catedral da cidade para realizar uma vigília em defesa da democracia e dos direitos dos trabalhadores.

A segurança foi reforçada perante o temor de enfrentamentos entre defensores e críticos de Lula, que, em menor número, também se mobilizaram para o depoimento. Há vários dias, diversos cartazes espalhados pela cidade dão, em tom irônico, as boas-vindas a Lula "à República de Curitiba" e expressam seu apoio à Lava Jato. Num anúncio aparece um desenho de Lula vestido de prisioneiro, ao lado de uma mensagem que diz "Te esperamos com as grades abertas".

PV/efe/lusa/abr/ots

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