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Itália 150 anos

17 de março de 2011

Entre separatistas, Máfia e perplexidade política, a terra do "cavaliere" Berlusconi não tem muito do que se orgulhar no sesquicentenário da proclamação do Reino da Itália, em 17 de março de 1861.

Show comemorativo da 'Unità' em RomaFoto: picture-alliance/dpa

Assim como a Alemanha, durante séculos a Itália ficou dividida em pequenos principados, cujos soberanos pertenciam a diferentes dinastias europeias: austríacos, franceses, espanhóis, entre outros. O caminho foi longo até o 17 de março de 1861, quando Vítor Emanuel 2º (1820-1878) proclamou o Reino da Itália.

Monumento ao rei Vítor Emanuel 2º na Piazza Venezia, em RomaFoto: Fotolia/RoHe

Porém na celebração do sesquicentenário da unificação, boa parte do Belpaese governado por Silvio Berlusconi não manifesta o orgulho que se poderia esperar. Prova disso foram as vaias que acompanharam a aparição do premiê em Roma, durante as festas da Unità, nesta quinta-feira (17/03).

Antes, foram acalorados os debates sobre se as crianças deveriam ser liberadas da escola nesse dia, ou não. Por fim, o gabinete decretou o 17 de março feriado nacional, para desagrado de boa parte dos ministros.

Os protestos mais veementes partiram da Liga Norte ("Lega Nord", em italiano), de veleidades autonomistas (ou separatistas, diriam outros). Atualmente, o partido tenta por todos os meios fazer passar no Parlamento uma lei que fortalecerá o federalismo no país. E assim separará ainda mais as regiões mais ricas do norte do pobre sul italiano.

Tirol autônomo

Terra da música e dos prazeres sensoriais, os tons que dominam a Itália na segunda década do século 21 estão bem longe de serem harmônicos, comenta o publicista da agência de notícias DPA, Hanns-Jochen Kaffsack. A começar pelo alto norte.

Nem tudo é idílio no Tirol do SulFoto: picture-alliance/ dpa/dpaweb

Com toda clareza, o presidente da região de Trentino-Alto Ádige (Tirol do Sul), Luis Durnwalder, comunicou ao presidente da república, Giorgio Napolitano, não ter nada a ver com a celebração do 17 de março.

Sua justificativa: "O grupo de língua alemã não tem nada para festejar. Em 1919 ninguém nos perguntou se queríamos fazer parte do Estado italiano". Quando o Reino da Itália foi proclamado em 1861, na cidade de Turim, o Tirol do Sul ainda pertencia à Áustria, e neste meio tempo conquistou pronunciada autonomia dentro da Itália.

Embora assegurando não querer abrir velhas feridas com suas palavras, foi precisamente isso o que Durnwalder fez.

Liga Norte

Um pouco mais ao sul, é a Liga Norte que – de manhã cedo até a noite – se manifesta contra a "unidade" do país. O partido é formado por diversos movimentos de autonomia regional, e o mais curioso – sobretudo no contexto do jubileu – é o fato de ser ele o principal parceiro de coalizão do primeiro-ministro Berlusconi.

Dentre os três ministros da Liga Norte no gabinete, foi justamente Roberto Calderoli que tachou o novo feriado nacional como "anticonstitucional e economicamente insano". Ele é o chefe do Departamento de Simplificação Normativa, encarregado de racionalizar as leis e regulamentos italianos.

Flagelo Berlusconi

Visão política não é o forte do premiê BerlusconiFoto: AP

No Centro da Itália encontra-se a capital Roma, tão injuriada pela Liga Norte. Aqui, quem impera (ainda) é um czar da mídia e bilionário de 74 anos, com uma irresistível queda por mulheres bem mais jovens.

Há 17 anos Silvio Berlusconi marca a imagem da Bell'Italia. Embora seja menos a sua atuação política a ditar os destinos da nação. O "Ano da Unidade" a encontra em meio a um impasse econômico, e politicamente paralisada pelas infindáveis intrigas em torno do cavaliere Berlusconi.

E ele nem é necessariamente o culpado, se o país parece tão dilacerado, 150 anos depois de ser proclamada sua unidade. Os historiadores confirmam: em 1961 já era assim. Porém os anos sob Berlusconi têm sido uma época de chumbo: muito motivo para comemorar, não há, na opinião do jornalista Kaffsack.

"Salviamo l'Italia"

"Em que outro país do mundo os cidadãos se veem com tanto desprezo quanto na Itália?", pergunta o historiador inglês Paul Ginsborg. Ele mora há 18 anos no país, e recentemente se naturalizou italiano. "Certamente, não os gregos, nem os franceses, tampouco os americanos ou os britânicos", afirma.

Em sua breve, porém reveladora publicação Salviamo l'Italia (Salvemos a Itália) Ginsborg registra a perplexidade da comunidade internacional pelo fato de a nação não conseguir dar um grito de libertação. Falta uma oposição digna desse nome, talvez também um "movimento de rua" de grandes proporções, avalia o pesquisador.

Já seu renomado colega romano Emilio Gentile é bem mais rigoroso com os próprios compatriotas. Em seu livro Né stato né nazione (Nem Estado nem nação), ele os denomina "inimigos da Itália"; suas principais virtudes são... o vício. Os italianos são indiferentes, egoístas, preguiçosos no trabalho e sempre interessados em "se dar bem", prossegue Gentile. Com gente assim, não é mesmo possível formar um Estado – é o veredicto do historiador.

Protesto contra a Máfia em Nápoles, março de 2009Foto: AP

"Mezzogiorno" sem lei

Seguindo ainda mais para o sul, uma pichação anônima num velho muro da capital sarda, Cagliari, diz: "A Sardenha não é Itália". Também aqui é cada vez mais premente o clamor por autonomia.

Todo o Mezzogiorno – como é denominado o território meridional que vai da cidade de Nápoles até Reggio Calabria – continua dependendo das verbas de Roma para subsistir. Mas, apesar dos bilhões de euros que fluem, o abismo norte-sul não para de crescer.

A explicação para tal é provavelmente a frase tantas vezes citada: "Aqui, quem governa é a Máfia". Hoje, a organização criminosa mais poderosa é a calabresa 'Ndrangheta. Certas zonas na ponta da bota da Itália são consideradas terra sem lei: como um faroeste sem xerife.

De fato: de uma nação marcada por tantos problemas é mesmo muito difícil exigir clima de júbilo comemorativo no 17 de março, Dia da Unificação Italiana.

AV/dpa/afp/dapd

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