Desmatamento na Amazônia é 66% menor em terras indígenas
11 de agosto de 2020
Pesquisadores constatam que, com direitos de propriedade garantidos, indígenas são eficazes na preservação da floresta, sendo a taxa de desmatamento em suas terras dois terços menor que em outras áreas da região.
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Garantir a posse da terra às comunidades indígenas da Amazônia pode ser vital para conter o desmatamento na maior floresta tropical do mundo, constataram pesquisadores americanos. Um estudo publicado nesta segunda-feira (10/08) sugere que territórios sobre os quais comunidades indígenas obtiveram plenos direitos de propriedade apresentam taxas bem menores de desmatamento.
O trabalho foi publicado na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), publicação oficial da Academia Nacional de Ciências dos EUA. Ele corrobora pesquisas anteriores publicadas em 2019 sobre a Amazônia da Colômbia e em 2017 sobre a Amazônia do Peru, que mostraram que a concessão de títulos de propriedade às comunidades indígenas ajudou na preservação florestal.
Os pesquisadores combinaram informações sobre títulos de propriedade para terras indígenas demarcadas, concedidos pelo governo nas últimas três décadas, com imagens de satélite da floresta e da sua cobertura vegetal que mostram o impacto nas taxas de desmatamento de 1982 a 2016.
Coautora do estudo, Kathryn Baragwanath, doutoranda da Universidade da Califórnia, disse que territórios com plenos direitos de propriedade apresentaram uma taxa 66% menor de desmatamento anual em comparação com terras fora de suas fronteiras.
"Uma vez que os direitos de propriedade plenos são garantidos aos territórios indígenas, as populações indígenas são realmente eficazes na contenção do desmatamento", disse ela à Fundação Thomson Reuters.
Cientistas consideram a proteção da Floresta Amazônica vital para desacelerar as mudanças climáticas globais por causa das grandes quantidades de dióxido de carbono, gás que aquece o planeta, absorvidas pelas suas árvores.
Pesquisadores alertam que com o aumento das taxas de desmatamento, principalmente no Brasil, a proteção da floresta se tornou uma prioridade urgente, o que inclui aumentar os esforços para proteger as terras indígenas.
Segundo os cientistas, cerca de 2 milhões de hectares de terras indígenas aguardam para receber designação oficial como território tribal, processo normalmente demorado.
Os cientistas alertam que, enquanto isso, muitas empresas privadas sem direito sobre as áreas realizam atividades ilegais, como mineração e extração de madeira, para demonstrar o "uso produtivo da terra" visando ganhar o título de propriedade.
Garantir o direito pleno das terras indígenas é uma forma eficaz de preservar as florestas porque dá proteção legal, tornando menos provável que sejam ocupadas, contestadas e cobiçadas por empresas que procuram extrair recursos naturais, afirma Baragwanath.
Com ajuda do Fundo Amazônia, produtores rurais recuperaram 5 mil hectares de floresta e 80% das propriedades foram regularizadas na cidade. Em 2012, ela saiu da lista de grande desmatadora para entrar na de cidade verde.
Foto: DW/N. Pontes
Alta Floresta
Dos 141 municípios de Mato Grosso, 86 fazem parte da Amazônia Legal, incluindo Alta Floresta, que fica a 800 quilômetros da capital Cuiabá. Fundada em 1979 pelo colonizador Ariosto da Riva como parte da estratégia do governo militar de ocupar a Amazônia, a cidade teve o nome inspirado no cenário natural encontrado às margens do rio Teles Pires (foto).
Foto: DW/N. Pontes
Desmatamento sem controle
Anunciada como terra fértil para atrair moradores do Sudeste e Sul do país, a extração de madeira sempre fez parte da economia de Alta Floresta. Com a devastação desenfreada, em 2008 a cidade entrou para uma lista de municípios do Ministério de Meio Ambiente que reunia os dez maiores desmatadores. Na foto, o flagrante do transporte de madeira na zona rural de Alta Floresta.
Foto: DW/N. Pontes
Mudança de rumo
Com o objetivo de reduzir o desmatamento, a prefeitura de Alta Floresta criou o projeto Olhos D'Água da Amazônia, que recebeu recursos do Fundo Amazônia. Com participação dos produtores rurais, foram recuperados 5 mil hectares de floresta e 80% das propriedades foram regularizadas. Em 2012, a cidade saiu da lista de grande desmatadora e entrou para o rol de municípios verdes.
Foto: DW/N. Pontes
Polinizadores
Além da recuperação de mata em áreas de nascentes, o projeto Olhos D'Água também investiu recursos do Fundo Amazônia na criação de um apiário municipal. Os coordenadores estimam que mais de 600 colmeias foram distribuídas para os agricultores na região. A ideia é que as abelhas jataís ajudem a aumentar a produção agrícola com a polinização.
Foto: DW/N. Pontes
Plantando sementes
O projeto Sementes do Portal, gerido pelo Instituto Ouro Verde, também recebeu recursos do Fundo Amazônia na cidade. Em dez anos, a iniciativa envolveu mais de 1.500 famílias, que faziam coleta e plantio de sementes, e recuperou 2.700 hectares de mata. Com a paralisação do fundo por parte do Ministério de Meio Ambiente, a terceira fase do projeto segue cancelada.
Foto: DW/N. Pontes
Agrofloresta
A recuperação de área degradada por meio de sistemas agroflorestais fazia parte do Sementes do Portal. Da área cultivada por Diversina Silveira de Jesus, que já foi um pátio de estoque de madeira retirada da mata, hoje brotam limão e banana, entre outros. Em dez anos, o Sementes do Portal recebeu 20 milhões de reais, dos quais 75% foram direcionados diretamente para as famílias participantes.
Foto: DW/N. Pontes
Avanço da soja
Em Alta Floresta, a atividade agropecuária ainda é dominante, ocupando cerca de um terço da área total do município. O avanço da soja, porém, é notável: antigas pastagens estão dando lugar ao cultivo de grão. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que, de 2013 a 2018, a área plantada de soja aumentou quase dez vezes, passando de 2.400 a 20 mil hectares.
Foto: DW/N. Pontes
Ciência e saber indígena
O avanço da fronteira agrícola é uma preocupação do povo indígena apiaká, do Mato Grosso. Darlisson Peixoto Apiaká, liderança de sua etnia, deixou a aldeia para cursar engenharia florestal na Universidade Estadual de Mato Grosso (Unemat). Ele diz que quer unir ciência ao conhecimento tradicional de seu povo para proteger a Floresta Amazônica e as terras indígenas.