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Dez anos depois, explosão de foguete ainda trava setor espacial brasileiro

Janara Nicoletti22 de agosto de 2013

Uma década após acidente com VLS-1, Brasil continua em busca de lançar seu primeiro foguete. Catástrofe em Alcântara matou 21 pessoas e deixou um vácuo no setor, que sofre também com baixos investimentos.

Foto: picture-alliance/dpa/dpaweb

Em 22 de agosto de 2003, às 13h26, a explosão daquele que seria o primeiro foguete produzido no Brasil a ser enviado ao espaço causou a morte de 21 pessoas. O acidente vitimou alguns dos cientistas considerados expoentes na pesquisa espacial brasileira. "No desastre em Alcântara, a gente acabou perdendo praticamente toda a força de recursos humanos especializada que existia na época. Isso é muito difícil de repor", lamenta Fernando Martini Catalano, coordenador do curso de engenharia aeronáutica da Universidade de São Paulo (USP).

Há dez anos, a combustão intempestiva do primeiro estágio provocou a falha do acionamento do terceiro protótipo do VLS-1 testado, no Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão. Antes, em 1997 e 1999, outros dois protótipos também apresentaram falha durante testes.

Falta de investimentos e de pessoal qualificado impedem a decolagem de um plano que possui mais de cinco décadas e a história marcada por um grave acidente. "O investimento é muito menor comparado a outros países emergentes. A Índia, por exemplo, já possui e lançou foguete próprio, detém tecnologia de motor a foguete líquido, e o Brasil ainda não tem isso ", pontua Catalano.

Cortado pela Linha do Equador, o Brasil é considerado um país estratégico do ponto de vista espacial. O território está localizado em uma área propícia para o lançamento de foguetes, apresenta condições de dominar todos os ciclos da indústria: desde a produção de foguetes e satélites, até o domínio de locais propícios para o lançamento. Mas não é competitivo.

Depois do acidente, modificações aumentaram a segurançaFoto: AP

Mudanças na política

Na época do acidente em Alcântara, uma Comissão Externa da Câmara dos Deputados apontou como principais causas os baixos investimentos na área, carência de pessoal capacitado e problemas na estrutura organizacional do Programa Espacial Brasileiro. Outro ponto destacado foi a baixa valorização dos especialistas – os salários variavam entre 2.800 e 5177,20 reais. O valor variava entre 11 e 20 salários mínimos da época, fixado em 240 reais.

As mesmas questões foram destacadas no estudo sobre a Política Espacial Brasileira, que analisou o setor em 2009. O levantamento resultou em mais de 500 páginas e no Projeto de Lei 7526. Apresentado no mesmo ano pelo relator do documento, o então deputado federal Rodrigo Rollemberg (PSDB-DF), hoje senador, propõe a criação do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria Espacial (Padie) e estabelece medidas de incentivo à inovação, à pesquisa científica e tecnológica no setor espacial. Mas o texto ainda não entrou em pauta na Câmara.

Depois do acidente, uma equipe de especialistas russos sugeriu várias modificações para aumentar a segurança e confiabilidade. As alterações foram implementadas e a expectativa era de que um novo lançamento fosse realizado em 2012. O que não aconteceu.

Falta de investimentos e qualificação

O estudo Política Espacial Brasileira evidenciou um cenário de falta de recursos para a área. Rollemberg afirma que é necessário aplicar recursos mais significativos e regulares para fomentar a pesquisa nesta área e a formação de mão de obra qualificada.

Catalano reforça que, diferente do segmento aeronáutico, no qual o país se destaca em nível internacional e já existe há quase um século, a área espacial ainda é jovem e demanda muito investimentos, em especial, na produção de foguetes lançadores. " Criar pessoas especializadas demora pelo menos 10 anos. Tem que fazer um PHD fora. Tem que ter uma certa maturidade para começar a desenvolver isso", acrescenta.

A descontinuidade de investimentos se mantém ao longo dos anos. O maior aporte de recursos foi entre 1984 e 1989, quando os valores investidos chegaram ao equivalente a 200 milhões de reais. A partir de 1990, os investimentos caíram para cerca de 60 milhões ao ano. De acordo com o Projeto de Lei Orçamentária do Governo Federal para 2013, o setor deve receber 325 milhões – em 2012 foram 419 milhões.

Aposta em novas tecnologias

Explosão destruiu também a Torre Móvel de IntegraçãoFoto: picture-alliance/dpa/dpaweb

Na área de satélites, o Brasil possui importante representatividade em nível mundial. Apesar disso, o país ainda depende de outros países para fazer os lançamentos. "O Brasil não possuir seu próprio lançador traz problemas até sob o ponto de vista de para onde vai o lançador, para você posicionar seu satélite na região que interessa para o Brasil. Às vezes, ele vai para um lugar que não é exatamente onde se quer", comenta Catalano.

Questão que não se consegue resolver rapidamente. "O Brasil desenvolveu uma linha de foguetes movidos a propelentes sólidos e isto foi comprometido. Teve o acidente que acabou cancelando várias coisas, inclusive o conhecimento humano. Por outro lado, é uma oportunidade de se desenvolver novas coisas, até outros tipos de motores de propulsão, com pessoas especializadas nesta área", comenta Catalano.

Outro ponto que limita a competitividade brasileira no setor espacial é o acesso à tecnologia produzida em países líderes do setor. Apesar de o Brasil possuir inúmeras parcerias internacionais nesta área, ainda sofre com o cerceamento de acesso às tecnologias na área espacial – seja para combustíveis, lançamento de foguetes, a colocação em órbita de satélites de maior porte.

"Isso faz com que o Brasil tenha muita dificuldade de acesso", analisa Paulo Motta, coordenador de articulação do Centro de Estudos e debates da Câmara dos Deputados. Para ele, há a expectativa de que, nos próximos anos, com o lançamento do foguete VLS-30 e outros que estão sendo produzidos, o Brasil possa encontrar nichos de mercado e despontar na área espacial.