Dicionário alemão ganha TikTok, ChatGPT, mais 3.000 palavras
Elizabeth Schumacher
19 de agosto de 2024
"Duden" é um dos léxicos mais consultados da Alemanha. Sua nova edição apresenta acréscimos importantes, de "Hyperloop" e "Ghosting" a "Salsiccia" e "Mocktail", além de termos para novas crises e conflitos.
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O conceituado dicionário alemão Duden anunciou nesta segunda-feira (19/08) que está introduzindo 3 mil novos verbetes em sua nova edição. Entre eles tão termos de tecnologia e comunicação, como "TikTok", "ChatGPT", "Hyperloop", "OpenAI" e "Ghosting", mas também conceitos comportamentais que se difundiram internacionalmente, entre os quais "Triggerwarnung" (trigger warning, alerta de conteúdo) e "Wokeness" (consciência de questões sociais).
Entretanto a maioria dos novos verbetes se refere a "culinária, crises e guerra" explica a editora-chefe do Duden, Katrin Kunkel-Razum. Aqui entraram "Sushireis" (arroz de sushi), "Tahin" (tahine), "Gojibeeren" (bagas de goji), "Salsiccia" (tipos de salsicha italiana) e "Mocktail" (coquetel não alcoólico).
Esses indicam o gosto crescente dos alemães por ingredientes diversos. Outros registram uma mudança nos hábitos de compra de alimentos, como "Gemüsekiste" (caixote de vegetais) e "Kochbox" (caixa de cozinhar), referindo-se aos cada vez mais populares esquemas de entrega em casa e kits de refeições.
Crises e conflitos
Foram também acrescentadas novas palavras relacionadas à mudança climática, como "Extremwetterereignis" (evento meteorológico extremo) e "Klimakleber" ("colador do clima": ativista que se gruda em pistas de voo e estradas para impedir o trânsito, em protesto contra o uso continuado de combustíveis fósseis).
Relativos a conflitos atuais e típicos da predileção alemã pelas aglutinações são "Ukrainekrieg" (guerra na Ucrânia) e "Russlandsanktion" (sanção contra a Rússia). Kunkel-Razum também acha interessante notar que os termos relativos à pandemia de covid-19 permaneceram, mesmo depois que acabaram os confinamentos e as restrições às viagens.
"Nós discutimos o vocabulário sobre o coronavírus intensamente", e está "mais claro" agora do que em 2020 que certas palavras vão seguir em uso, afirma. Então estrearam no dicionário "Impfzertifikat" (certificado de vacina), "Coronaleugner" (negador da pandemia de covid), "Distanzunterricht" (aula de distanciamento) e "Virusvariante" (variante de vírus).
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Quem sumiu do mapa, quem voltou
Algumas palavras consideradas obsoletas ou irrelevantes para os tempos modernos foram retiradas do dicionário Duden. Entre elas: "Juckergeschirr" (arreios para um tipo de cavalo de carroça), "Dampfradio" (literalmente "rádio a vapor", apelido para os robustos aparelhos da década de 1950) e UMTS-Handy (smartphones mais antigos, desse sistema de telecomunicações 3G).
Indagada quais eram seus conceitos favoritos, Kunkel-Razum disse ser difícil responder, pois "existem tantas palavras bonitas, originais, importantes". No entanto ela tem predileção especial por algumas que haviam sido retiradas do léxico anos antes e que agora estão voltando. Ela destaca "Hackenporsche": "Porsche de calcanhar", os carrinhos de compra pessoais onipresentes na Alemanha que estão sempre batendo no pé de quem vai na frente.
As "despalavras" da Alemanha
Escolhida desde 1991 a partir de sugestões da população, a "despalavra do ano" é votada por um júri e designa uma expressão muito disseminada, mas infeliz na sua construção ou significado. Confira as dos últimos anos.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Jansen
2023: "Remigração"
A palavra "remigração" é um conceito sociológico que define o retorno de pessoas aos países de onde emigraram, e inclui tanto o retorno voluntário como involuntário. Porém, para pesquisadores de extremismo, o termo foi apropriado por movimentos da nova direita: a palavra "remigração", evita o uso de expressões neonazistas como "fora estrangeiros" e normaliza posições extremistas de direita.
Foto: Nadine Weigel/dpa/picture alliance
2022: "Terroristas climáticos"
A palavra "Klimaterroristen", ou "terroristas do clima", foi usada no discurso público para descreditar ativistas e protestos por ações contra o aquecimento global. Os jurados avaliaram que a palavra equipara ativistas do clima a terroristas. Isso pode fazer com que manifestações não-violentas e de resistência democrática sejam estereotipadas num contexto de violência e subversão.
Foto: Christoph Soeder/dpa/picture alliance
2021: "Pushback"
O termo emprestado do inglês refere-se a diferentes medidas usadas para forçar migrantes a retornarem para o outro lado de uma fronteira, geralmente logo depois de cruzá-la, sem permitir que apresentem um pedido de refúgio. Os "pushbacks" violam a legislação da UE, o direito internacional e convenções de direitos humanos, mas foram legalizados pela Polônia em outubro de 2021.
Foto: Policja Podlaska/REUTERS
2020: "Ditadura do coronavírus" e "patrocínio de repatriação"
Pela primeira vez, foram escolhidos dois termos como as piores palavras: a expressão "ditadura do coronavírus" difama as medidas restritivas impostas para conter o avanço da covid-19. Já "patrocínio de repatriação" descreve um esquema no qual países da União Europeia que se recusarem a receber refugiados devem organizar e financiar a deportação de requerentes de asilo que tiveram o pedido negado.
Foto: Arne Dedert/dpa/picture alliance
2019: "Histeria climática"
"Klimahysterie" (histeria climática) foi escolhida como a pior palavra de 2019 no idioma alemão. A expressão visa "difamar os esforços e o movimento de proteção climática e desacreditar os debates" sobre o tema, afirmou o júri de linguistas da Universidade Técnica de Darmstadt, que a cada ano escolhe a "despalavra do ano".
Foto: picture alliance/dpa/APA/H. Punz
2018: "Indústria antideportação"
A expressão "indústria antideportação" é do ex-ministro alemão dos Transportes, Alexander Dobrindt, ao atacar críticos à política alemã de enviar à força aos países de origem os requerentes de refúgio cujo pedido de acolhimento foi negado. Dobrindt deu a entender que, a fim de ganhar dinheiro, quem apoia os requerentes de asilo rejeitados também protege os refugiados que se tornaram criminosos.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Arnold
2017: "Fatos alternativos"
"Fatos alternativos" indica a tentativa de substituir argumentos factuais por afirmações não comprováveis, influenciando assim o debate público, explicou o júri da "despalavra". A expressão foi usada por Kellyanne Conway, assessora do então presidente dos EUA, Donald Trump, ao se referir à afirmação errada do porta-voz da Casa Branca de que a posse presidencial teria tido recorde de público.
O termo é um "legado de ditaduras, entre elas a nazista", justificou o júri. Quando usada como crítica a políticos, é uma "despalavra" difamatória que sufoca discussões, necessárias à manutenção da democracia. Foi usada, por exemplo, contra o então ministro alemão da Economia, Sigmar Gabriel, que havia mostrado o controverso dedo do meio aos participantes de uma manifestação de direita.
Foto: Sören Herbst
2015: "Gente boazinha"
Embora composta por dois termos comuns – gut (bom) e Mensch (ser humano) –, a junção de ambos no substantivo "Gutmensch" dá uma conotação de desprezo e malícia à palavra, disse o júri. Na época da onda de migrantes no país, foi tachado assim quem se engaja em prol dos refugiados, reduzindo os voluntários a gente simplória, com síndrome de bom samaritano.
Foto: Imago/C. Ohde
2014: "Imprensa da mentira"
O termo "imprensa da mentira" já era usado como arma pelos nazistas, que difamaram a mídia independente dessa forma. Mais recentemente, na Alemanha, apoiadores do movimento de direita Pegida usaram o termo em suas manifestações. Isso compromete a liberdade de imprensa, concluiu o júri.
Foto: picture alliance/dpa/D.Naupold
2013: "Turismo social"
"Alguns políticos e a mídia usam o termo para se referir a imigrantes indesejados, especialmente os vindos do Leste Europeu", concluiu o júri, insinuando a intenção de se aproveitar dos benefícios sociais. A combinação de "social" e "turismo" é particularmente polêmica por sugerir que a migração por necessidade seria uma viagem de lazer.
Foto: picture-alliance/dpa
2012: "Assinatura de vítima"
O termo "Opfer-Abo" foi cunhado por um antigo apresentador da previsão do tempo alemão, Jörg Kachelmann. Depois de ser julgado e absolvido por estupro, ele reclamou numa entrevista que as mulheres dispõem de uma "assinatura de vítima", ou seja, são sempre consideradas vítimas. O júri criticou como inaceitável a insinuação de que mulheres inventem a violência sexual.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Dedert
2011: "Döner-Morde" (Mortes kebab)
O termo se referiu ao assassinato de oito turcos e um grego na Alemanha, que inicialmente se acreditou ser uma rixa entre as vítimas, em sua maioria donos de mercado, quiosque ou lanchonete. Investigações mostraram que os crimes foram cometidos por neonazistas. De acordo com o júri, o prato turco "döner kebab" foi usado para descrever todo um grupo populacional de forma racista e discriminatória.
2010: "Sem alternativa"
O termo foi cunhado pela chanceler federal, Angela Merkel, em relação à ajuda financeira à falida Grécia. De acordo com o júri, o termo "sem alternativa" foi posteriormente usada de forma inflacionária por políticos. Ele sugere falsamente "não haver, desde o início, alternativas num processo de tomada de decisão e, portanto, não há necessidade de discussão e argumentação".