Dilma diz estar inconformada com condução coercitiva a Lula
4 de março de 2016
Presidente classifica medida como "desnecessária". Em pronunciamento, Dilma rejeita as supostas acusações de Delcídio do Amaral e diz que "desejo de vingança" por não receber apoio teria motivado senador.
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Durante um pronunciamento em Brasília, a presidente Dilma Rousseff, ao lado de 12 ministros, afirmou nesta sexta-feira (04/03) estar inconformada com a "desnecessária condução coercitiva" contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e rejeitou as denúncias da suposta delação premiada feita por Delcídio do Amaral.
Dilma reafirmou declarações que já havia feito em nota, na qual considerou excessivo o mandado contra Lula. "O respeito aos direitos individuais passa, nas investigações, pela adoção de medidas proporcionais, que jamais impliquem em providências mais fortes, ou seja, mais gravosas do que aquelas necessárias para o esclarecimento dos fatos ", disse no pronunciamento.
A presidente também rebateu os pontos das denúncias feitas na suposta delação premiada de Delcídio do Amaral, na qual o senador teria afirmado que Dilma sabia de irregularidades na Petrobras e tentou influenciar as investigações da Lava Jato e beneficiar empreiteiros presos.
"Acredito ser lamentável que ocorra ilegalmente o vazamento de uma hipotética delação premiada, que, se chegou a ser feita, teve como motivo único a tentativa de atingir a minha pessoa e o meu governo, provavelmente pelo desejo de vingança, pelo imoral e mesquinho desejo de vingança, e de retaliação, a quem não defendeu quem não poderia ser defendido pelos atos que praticou", disse Dilma.
Na suposta delação, que não foi confirmada por Delcídio, o senador teria acusado a presidente de nomear ministros para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) para tentar soltar empreiteiros presos e pedido ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, interferir na Lava Jato.
Dilma rejeitou as acusações e afirmou que, tanto Lewandowski, quantos os ministros do STJ que teriam sido citados por Delcídio já negaram as supostas tentativas do governo de interferir nas investigações. "A afirmação atribuída ao senador assim foi claramente desmentida", ressaltou a presidente.
Com relação à suposta afirmação de Delcídio de que Dilma saberia de irregularidades envolvendo a compra de uma refinaria em Pasadena, nos Estados Unidos, pela Petrobras, a presidente disse que em 2014 prestou esclarecimentos à Procuradoria-Geral da República e que o processo foi arquivado, pois não havia indícios que comprovassem as denúncias.
Compromisso no combate à corrupção
Antes do pronunciamento, Dilma divulgou uma nota na qual já criticava o mandado contra Lula. "Manifesto meu integral inconformismo com o fato de um ex-presidente da República que, por várias vezes, compareceu voluntariamente para prestar esclarecimentos perante às autoridades competentes, seja agora submetido a uma desnecessária condução coercitiva para prestar um depoimento", disse.
Na nota, a presidente reiterou o compromisso de seu governo com o combate à corrupção e ressaltou que sempre garantiu a autonomia de investigações, afirmando que elas devem continuar até a punição dos culpados.
Dilma criticou, porém, o uso de medidas "desnecessárias" para o esclarecimento dos fatos. "Vazamentos ilegais, prejulgamentos antes do exercício do contraditório e da ampla defesa, não contribuem para a busca da verdade, mas apenas servem para animar a intolerância e retóricas antidemocráticas", disse.
CN/rtr/ots
Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
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O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
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As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
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As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
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Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
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De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
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... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
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As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
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As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
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Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
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Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.